A Internacional

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sábado, fevereiro 11, 2012

Arménio Carlos: "Sacrifícios não criam riqueza, deixem-nos respirar"

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Entrevista ao secretário-geral da CGTP

11.02.2012 - 09:23 Por João Ramos de Almeida, Raquel Martins
<p>Arménio Carlos disse que a economia está a regredir em vez de crescer</p>
Arménio Carlos disse que a economia está a regredir em vez de crescer
 (Nuno Ferreira Santos)
A três dias da manifestação marcada para esta tarde em Lisboa, Arménio Carlos, secretário-geral da CGTP, mostrava-se confiante na capacidade de mobilização dos portugueses. Defende a renegociação da dívida para que o país possa criar riqueza e emprego.

Quais são as suas expectativas em relação à manifestação do próximo sábado (hoje)?


Vamos ter uma das maiores manifestações de sempre. Trata-se de um momento-chave que se segue à assinatura do acordo de concertação, cujos conteúdos contestamos, e imediatamente após às declarações do primeiro-ministro - que são de um desrespeito - a dizer que os portugueses são piegas e que custe o que custar isto [o memorando] tem que avançar. Os trabalhadores, os pensionistas, os jovens, os desempregados, as famílias, os micro e pequenos empresários é que estão a pagar o custe o que custar. 



Porquê o Terreiro do Paço?



É um espaço simbólico. Há muitos anos que o movimento sindical não fazia uma manifestação no Terreiro do Paço. Também aqui é preciso haver criatividade. Correndo o risco, porque se trata de um espaço enormíssimo. 



Espera uma alteração do comportamento das empresas depois da manifestação?



Não sei se haverá uma alteração, porque como sabemos uma parte das entidades patronais está na expectativa de poder vir a concretizar, por via da legislação laboral, as alterações que resultam do acordo. O que temos em curso é uma subversão do direito do trabalho, que sempre teve como pressuposto proteger a parte mais fraca - os trabalhadores, passando a ser o direito do trabalho das entidades patronais. É isso que vamos combater.



Na situação que se vive não será necessário perder alguns direitos para assegurar a sobrevivência das empresas e do emprego?



As empresas só sobrevivem se a economia estiver bem. Estas políticas estão a indicar-nos que a economia em vez de crescer está a regredir. Estamos com uma riqueza que caiu ao nível de 2001 e com uma dívida que vai atingir os112%, quando há um ano estava na ordem dos 92%. 


Nestas alturas por norma também há entidades patronais menos escrupulosas que aproveitam a oportunidade para, a pretexto de reestruturações, afastar trabalhadores efectivos na perspectiva que amanhã os poderá substituir por outros trabalhadores com vínculos precários, menos direitos e menos salários. 



Depois a facilitação dos despedimentos e a redução das indemnizações são um incentivo para que as empresas passem a fazer despedimentos com maior regularidade, generalizem a precariedade, reduzam salários e protecção social, com tudo o que isso implica. 



A redução dos salários e a diminuição do emprego tem uma ligação directa com a sustentabilidade financeira da Segurança Social (SS). É todo um puzzle que está em marcha e que procura pôr em causa as funções essenciais do Estado.



Então acha que há então uma intenção deliberada?



É uma concepção neoliberal. Se associarmos o memorando, o acordo e o programa do Governo está lá tudo: estado mínimo para os trabalhadores e a população e estado máximo para os grandes grupos económicos e financeiros. 



As medidas de apoio ao emprego [previstas no acordo] não deixam nenhuma dúvida. Vemos que a Segurança Social (SS) é chamada para financiar as empresas, ajudar a baixar os salários, generalizar a precariedade. As medidas do passado não corresponderam aos objectivos definidos inicialmente, mas a resposta foi mantê-las e acrescentar mais algumas.



Nesta fase não serão úteis e um estímulo para manter algum emprego?



Não vão manter emprego nenhum, vão mexer nas estatísticas. Admitimos que a SS possa apoiar a criação de emprego, mas tem que haver uma contrapartida de que o emprego se vai manter. As políticas activas podem minimizar aqui e ali os problemas, mas não os resolvem. Até porque as empresas para produzirem mais precisam de escoar os seus produtos. A solução para os problemas do país tem que passar pela política económica.



Se fosse possível rever o memorando que políticas colocaria?



A revisão do memorando passa desde logo pela renegociação da dívida em prazos, juros e montantes. Se nos derem prazos mais alargados podemos criar políticas económicas que dinamizem a economia e criem emprego. Há uma parte do montante que é dívida e que tem que ser paga, outra que é resultado da especulação. Temos condições para pagar uma dívida com juros na ordem dos 13 ou 15%? Temos que rever os juros.



Além da renegociação da dívida que outras alternativas propõem?



Defendemos também a alteração do regulamento do Banco Central Europeu para que abra uma linha de crédito e faça os empréstimos aos Estados a um juro de1%. A outra componente tem a ver com o período para a redução do défice, que deve ser prolongado no tempo. É importante que se reduza o défice, mas que esse valor se atinja daqui a mais alguns anos. Eram dispensáveis estes sacrifícios e sobrava algum dinheiro para o Estado fazer investimentos públicos. 



Mas isso resolvia o problema? Na base não está um défice de competitividade da economia e parte da responsabilidade não é também a criação do Euro?



O euro teve como finalidade servir os interesses de alguns países, nomeadamente da Alemanha. Portugal é prejudicado com o euro.



O problema não se resolve apenas em torno da discussão da questão do euro, mas sobretudo em torno das questões económicas e financeiras da própria UE. 



Temos um país que vai à frente, a Alemanha, e determina as condições. Mas se é verdade que estes problemas financeiros com que os países se estão a confrontar são problemáticos para os da periferia, também é verdade que isto já está a afectar a economia dos países de maior dimensão.



A situação portuguesa não se resolve isoladamente?



Naturalmente que há dependência relativamente ao que se está a passar na UE. Mas há medidas que têm que se assumir internamente como a renegociação da dívida ou o prolongamento do período de ajustamento. Mas há outras. Há algum país no mundo que se desenvolva se não apostar no sector produtivo? São medidas que, admitimos, não têm efeitos imediatos no espaço de um ou dois anos, mas tem que haver uma visão estratégica. Falamos muito nas importações e nas exportações. O problema do défice comercial resolve-se exportando mais, mas precisamos de importar menos e isso implica dar uma maior atenção ao sector produtivo.



Mas isso só se faz por uma reestruturação completa da indústria de modo a criar condições para maior valor acrescentado.



A primeira prioridade é a aposta no sector industrial. É uma questão de opção política. Se não for assim como propomos, as medidas que este governo está a seguir vão resolver os problemas do país? Vamos ter um sector produtivo mais dinâmico e com condições para responder às necessidades dos próximos anos? Vamos ter mais emprego? Mais riqueza? Pagar o que devemos nas condições que nos a estão a impor? Não vamos. Veja-se o exemplo da Grécia.



Seguindo esse exemplo então vamos caminhar para o abismo. Na sua opiniãoo que poderá acontecer?



O futuro do país e dos portugueses não vai ser risonho. O que estamos a antever é o aumento das desigualdades e a generalização da pobreza. O valor do limiar da pobreza está nos 434 euros. Um trabalhador que recebe o 485 de salário mínimo, fica com 432 euros, depois dos descontos, dois euros abaixo do limiar. Logo aqui temos 400 mil pessoas que, estando a trabalhar, estão a empobrecer. Além dos pensionistas. Mais de um milhão vive com pensões inferiores ao limiar da pobreza. Além disso, 58 em cada 100 desempregados não recebe subsídio de desemprego. Para onde estamos a caminhar?



O empobrecimento seria maior se saíssemos do euro?



A manutenção ou a saída do euro tem sempre que preservar os interesses nacionais. O problema ainda não se colocou. O que existe é a intenção de alguns países, nomeadamente os mais poderosos, afastarem outros do euro. Nós dizemos não. A entrada para o euro fez-se de uma forma leviana a partir do pressuposto de que tínhamos que ir pelo pelotão da frente, dando ideia de que estávamos em igualdade de circunstâncias quando estávamos com distâncias gritantes. Já que cá estamos queremos discutir. Estamos em Portugal com este problema e o que fazemos, aceitamos as condições?



Dentro de umas semanas estará aí a troika para fazer o ponto de situação. Se no plano económico analisarmos as consequências temos que reconhecer que estamos numa situação muito mais difícil do que anteriormente. Mais do que governar para calmar os mercados, este governo devia governar para defender os interesses nacionais.



Mas o Governo não quererá cumprir agora para aumentar a margem de negociação?



Essa é uma boa tese, mas basta ver o que se passa na Grécia. Vamos ter condições para pagar o que devemos nos moldes e nos prazos previstos? Não vamos. O problema aqui tem a ver com soberania. O país vai ficar mais dependente do exterior, com menos riqueza, menos condições para negociar e menos condições para pagar. E quando chegar a altura vamos negociar de mão estendida.



E será necessário tomar mais medidas?



Necessário não será, mas na lógica deles cada negociação implica um novo pacote. Há uma diferença entre o que defendemos para Portugal e o que se está a passar na Grécia. Na Grécia cada reestruturação é acompanhada de mais pacotes de austeridade. O que defendemos é que austeridade e sacrifícios não criam riqueza e impedem que cumpramos as nossas obrigações. Deixem-nos respirar.



Deixe-nos voltar à questão do euro. Se essas políticas arriscam a que a Grécia possa sair do euro, por que razão a saída do euro não é objecto de debate?



Acima de tudo porque há, da parte do Governo e de um conjunto de organizações e individualidades que o apoiam muito pouco à-vontade – ou seja, medo – de fazer essa discussão. Porque levaria à discussão do que foi a nossa entrada no euro e à situação em que neste momento estamos. Daqui se poderia retirar um conjunto de ilações muito negativas e muito comprometedoras para os actores desse processo. Em segundo lugar, iriam no sentido oposto às políticas que neste momento estão a ser seguidas. Nomeadamente, a assinatura do memorando e outras que tais. 



Que o problema tem de ser discutido, tem. E com isso não estamos a dizer que temos de sair do euro ou de ficar no euro. Tem de haver frontalidade e seriedade na reflexão e na discussão.



Há dias, no Programa Prós e Contras, foi-lhe dito que nunca tivera responsabilidades empresariais e nunca soubera o que era não dormir por não ter dinheiro para pagar os salários. Não deveria haver um maior envolvimento dos trabalhadores na gestão das empresas?



Não confundimos a participação activa dos trabalhadores na gestão das empresas com a co-gestão. Cada coisa no seu lugar. Os trabalhadores têm uma função, as entidades patronais têm outra função. 



Nós muitas vezes vamos para casa e não conseguimos dormir com situações como a que constatei em Valadares. Os trabalhadores estão ali todos os dias a defender os postos de trabalho, a exigir o pagamento dos seus salários e dizer que querem pôr a empresa a funcionar desde que a administração cumpra os direitos. E ver que, do outro lado, há posicionamentos patronais que não só não honram assuas obrigações, como jogam na lógica do desgaste. Isso é que é que me preocupa. 



Há muita gente interessada em defender as empresas, a começar pelos empresários. Mas não há ninguém mais interessada em manter as empresas do que os trabalhadores. Temos empresas bem geridas, e temos trabalhadores que já provaram que conseguem produzir aqui como produzem no estrangeiro. 



Temos consciência de que, nesta fase difícil que o país atravessa, há empresas que estão com dificuldades e não conseguem escoar os seus produtos. E qual o papel do Estado aqui? Facilitar o acesso ao financiamento e até ao próprio crédito, a questão dos custos de produção, da energia, das telecomunicações.



Porque não se vai por aí?



Boa pergunta. 



A Confederação da Indústria Portuguesa defende o mesmo.



Claro. Mas aí geram-se as contradições dos próprios intervenientes. Porque quando estamos a falar dos custos de produção da energia e das telecomunicações, estamos a falar de interesses instalados que são assumidos em duas componentes: os interesses daqueles que estão à frente das empresas e daqueles que são simultaneamente accionistas das empresas que prestam serviços. 



Acha que a CIP defende essa lógica?



A CIP nunca foi além da declaração que é preciso reduzir os custos de contexto. Nunca assumiu uma posição dizendo “esta é uma prioridades e nós queremos que isto vá para a frente”.



Mas se os custos de contexto são os mais elevados, também teriam vantagem em reduzir a maior parcela de custos. Nesse caso jogam contra eles próprios?



Estão a jogar contra o sector produtivo e o desenvolvimento do sector produtivo. Mas pode ser o interesse imediato. Se não é assim, se estamos a ser injustos, então têm uma boa maneira de provar o contrário. Que é assumir publicamente perante o Governo que os custos de produção têm mesmo de baixar. Até podem fazer uma contrapartida: não se toca na legislação laboral e reduz-se nesses custos. 



O que está em marcha não tem nada a ver com os interesses dos micro e pequenos empresários, mas dos grandes empresários. Estas políticas económicas não vão resolver problema nenhum das pequenas e médias empresas.



Versão completa da entrevista publicada às 14h55.

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