A Internacional

__ dementesim . . Do rio que tudo arrasta se diz que é violento Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem. . _____ . Quem luta pelo comunismo Deve saber lutar e não lutar, Dizer a verdade e não dizer a verdade, Prestar serviços e recusar serviços, Ter fé e não ter fé, Expor-se ao perigo e evitá-lo, Ser reconhecido e não ser reconhecido. Quem luta pelo comunismo . . Só tem uma verdade: A de lutar pelo comunismo. . . Bertold Brecht

sexta-feira, junho 22, 2012

Para que não se percam os frutos da civilização!


A CHISPA !

"Só é marxista quem torna extensivo o reconhecimento da luta de classes ao reconhecimento da Ditadura do Proletariado" Lénine

Quarta-feira, 20 de Junho de 2012

Para que não se percam os frutos da civilização!


Um artigo bem importante e que no entender da "A Chispa!"pode abrir as portas à unidade das forças revolucionárias comunistas e à  criação de uma alternativa revolucionária proletária, ao sistema social capitalista, caso se proceda à sua discussão e aprofundamento.


Por Manuel Raposo
I
Escolhi como título desta intervenção a frase "Para que não se percam os frutos da civilização" que é parte de um parágrafo de uma conhecida carta de Karl Marx a Pavel Annenkov (de 1846) em que Marx dá a sua opinião acerca de Proudhon, antes ainda de ter escrito a Miséria da Filosofia. O parágrafo inteiro diz o seguinte: 


"Os homens nunca renunciam ao que ganharam, mas isso não quer dizer que não renunciem à forma social em que adquiriram certas forças produtivas. Muito pelo contrário. Para não serem privados do resultado obtido, para não perderem os frutos da civilização, os homens são forçados a mudar todas as suas formas sociais tradicionais, a partir do momento em que o modo do seu comércio já não corresponde às forças produtivas adquiridas." [1]

("Comércio" no sentido lato de relação, transacção) 

Esta afirmação da necessidade histórica das revoluções sociais é acompanhada de uma crítica impiedosa ao desejo de Proudhon de conciliar as contradições do sistema capitalista em vez de pensar "no derrube da própria base dessas contradições". E Marx comparava essa tentativa de conciliação ao que sucedera nas vésperas da revolução francesa de 1789, afirmando os seguinte:


"No século XVIII uma multidão de cabeças medíocres estava ocupada em encontrar a verdadeira fórmula para equilibrar as ordens sociais, a nobreza, o rei, os parlamentos, etc., e no dia seguinte já não havia rei, nem parlamento, nem nobreza. O justo equilíbrio entre esse antagonismo (conclui Marx) era o derrube de todas as relações sociais, que serviam de base a essas existência feudais e ao antagonismo dessas existências feudais." [2]


Marx mostra aqui como são inúteis as tentativas de conciliar os termos irredutíveis das contradições sociais quando elas chegam ao seu ponto culminante – isto é, quando as sociedades se abeiram do seu termo histórico.


A ideia que trago a este debate é a de que a actual crise capitalista é uma radiografia do estado terminal a que chegou a civilização burguesa. De que não estamos a passar apenas por mais um ponto baixo de mais um ciclo do processo produtivo, mas estamos a viver a falência do sistema produtivo capitalista que chegou a um limite, que entrou na sua fase senil.


Com isso está em causa todo o edifício social que assenta nesse sistema produtivo. As contradições em que o capitalismo está enredado não podem ser resolvidas dentro dele próprio; só uma revolução social o pode fazer da única maneira viável: pondo fim às relações sociais capitalistas.


Consequentemente, a acção do comunismo marxista, tem de ser guiada por este propósito se quiser ter um papel na transformação social que está em gestação. 


Passo aos argumentos. 

II 

O discurso dominante sobre a crise procura encerrar o problema numa espécie de círculo de giz "económico". É a tentativa de absolver o sistema social capitalista. Na verdade, o que está em causa não é a "economia" (que é uma coisa que em si não existe), mas a economia capitalista; e a crise não é dos negócios, mas de uma civilização inteira.

Mas esta restrição da crise ao "económico" domina. E domina de tal modo que penetrou, ainda que sob formas modificadas, o senso comum e mesmo a esquerda.

O círculo de giz funciona. 

Funciona, por exemplo, quando se trata o neoliberalismo como uma deriva mental duma fracção da burguesia responsável pela deriva material do sistema, aceitando a ingenuidade de pensar que uma qualquer ideologia possa alterar as leis de funcionamento do capitalismo;

Ou quando se atribui à globalização e à financeirização do capital a origem da presente crise mundial, em vez de ver nelas recursos a que o sistema deitou mão para atenuar e adiar a crise;

Ou ainda quando se cai na ilusão de que existem medidas políticas (nomeadamente medidas de política económica) que podem solucionar os problemas sem tocar no quadro do próprio sistema capitalista, esquecendo que os problemas existem e avolumam-se precisamente porque esse quadro se vai mantendo. 

Creio estar aqui boa parte da razão pela qual o movimento revolucionário pelo socialismo não dá sinais de crescer, apesar da decadência do capitalismo. É este a meu ver o nó da situação: um movimento revolucionário bloqueado no meio de uma crise geral do sistema capitalista. 

III 

Se não é uma crise de negócios, nem uma simples deriva ideológica – então o que é a presente crise? 

As correntes marxistas que me parece terem uma posição mais clara sobre o assunto chamam a atenção para o facto de as raízes do colapso financeiro de 2007-2008 remontarem aos anos de 1970. De facto, depois do crescimento impetuoso subsequente à segunda grande guerra, o ritmo de acumulação do capitalismo dos grandes centros mundiais foi sofrendo uma desaceleração. Com altos e baixos, mantém-se há perto de 40 anos com reduzidas taxas de acumulação. O estoiro de 2007-2008 (iniciado no coração do capitalismo mundial, é de notar) terá sido o desembocar deste longo processo. E este último trambolhão arrasta agora mesmo os novos centros de acumulação que entretanto se afirmavam – a China, a Índia, o Brasil – cujas taxas de crescimento sofreram quebras importantes. 


Todo o sistema capitalista mundial está portanto em quebra, contrariamente à ideia de que se assiste apenas a uma transferência de poderes. 


Quarenta anos de crise é coisa que parece contrariar a própria ideia de crise que, na acepção de Marx, é um momento, mais ou menos curto, de acerto de contas entre o excesso de produção e a escassez do mercado. Engels todavia fornece uma pista importante em dois momentos. Numa nota de 1885 à Miséria da Filosofia aponta a possibilidade de "a estagnação crónica [passar a ser] o estado normal da indústria moderna, apenas com ligeiras oscilações" [3] . Também numa nota (talvez de 1886, segundo Maximilien Rubel) ao Livro III de O Capital , Engels insiste na possibilidade de os ciclos regulares (até então mais ou menos decenais) terem dado lugar a uma situação caracterizada por "uma alternância mais crónica, mais alongada, a uma melhoria relativamente breve e fraca dos negócios e a uma depressão relativamente longa e indecisa atingindo vários países industriais em momentos diferentes." [4] 

Parece ser este o caso de hoje, com a agravante de o marasmo atingir o grosso dos países capitalistas ao mesmo tempo. Onde está a origem deste declínio arrastado? 

Ao que tudo indica, num factor que acompanha e condiciona o processo de crescimento capitalista: a queda da taxa de lucro. 

Socorro-me de três estudos, que me parecem dignos de nota, que chamam a atenção para a queda efectiva da taxa de lucro do capital, fruto precisamente, como Marx bem vincou, do progresso capitalista. 

O francês Claude Bitot, em 1995, mostra que a taxa de lucro nos 25 países da OCDE foi decaindo à medida do desenvolvimento posterior à segunda grande guerra [5] . 

Outro francês, Tom Thomas, vinca o carácter crónico da actual crise, pegando na hipótese colocada por Marx de uma sobreprodução absoluta de capital [6] .

Recentemente, em 2011, o norte-americano Andrew Kliman constata também a queda da taxa de lucro nos EUA ("um longo declínio iniciado na segunda metade dos anos 50"). Segundo ele, terá sido essa a causa que foi puxando para baixo os ritmos de crescimento e que tornou débeis as recuperações subsequentes à grande crise dos anos de 1970 e às várias crises dos anos 80 e 90 – acabando por fazer a cama ao colapso de 2007-2008 [7] . 

A importância que vejo neste ponto de vista é que ele coloca a tónica não em supostas derivas ideológicas (neoliberal ou outra), nem na hipertrofia financeira do capital – mas no bloqueio da própria produção capitalista. 

Numa situação em que o capitalismo vê declinar a sua força motriz, que é o lucro, todo o sistema social esgota o seu papel histórico, tornando-se então "um obstáculo ao desenvolvimento da produtividade". "Com isso", diz Engels, [o capitalismo] "prova, simplesmente, uma vez mais, que entra no seu período senil e que, cada vez mais, se limita a sobreviver". [8] 

IV 

Portanto – bloqueio da acumulação, fase senil. 

Sabemos que o capital ao reproduzir-se reproduz também as relações sociais que lhe são próprias. Ora, a crescente dificuldade de reprodução do capital traduz-se numa dificuldade crescente de reprodução das relações sociais – daí a decomposição das instituições (nomeadamente do Estado), o esvaziamento da democracia, o abandono do estandarte do progresso, o apagamento das grandes crenças burguesas (nação, pátria, família, deus). 

A civilização burguesa terá então entrado numa etapa final. É isso que transparece na própria maneira como a burguesia fala do seu regime. A ideologia do progresso contínuo, da prosperidade, que foi desde sempre a marca do positivismo burguês, da superioridade sobre as formações sociais atrasadas, transfigurou-se num discurso de justificação do retrocesso: não mais emprego garantido, não mais melhoria de vida de pais para filhos, não mais consumo livre, não mais lazer, não mais saúde e instrução para todos, não mais nada disso. 

Visto no seu sentido de fundo este é um discurso que denuncia a incapacidade das classes dominantes para convencerem as classes dominadas da superioridade do seu sistema; denuncia a incapacidade de uma civilização para mobilizar o todo social em torno dos seus objectivos de classe. 

Uma sociedade que já só assegura (não apenas nos factos mas também pela voz dos seus mentores) um amanhã pior que o dia de hoje – e que afirma só poder subsistir nessa condição! – é uma sociedade que caminha para o fim. 

Podia dizer-se – uma sociedade já sem apresentação... 

Em termos históricos não há portanto remendos possíveis – e isso está de resto patente na ineficácia das tentativas, tanto do capitalismo puro e duro como do reformismo, de colmatar as brechas do edifício. 


Dito isto, então a verdadeira causa da nossa época é pôr termo ao capitalismo. 

Certo. Mas a revolução social não está de modo nenhum ao virar da esquina. Como disse antes, o movimento comunista está bloqueado no meio da crise do sistema capitalista. 

É difícil encontrar uma explicação completa para este facto, mas não erro se disser que concorrem para isso: 

as enormes mutações sociais no proletariado mundial pelo menos desde 1970-80; 

a dissolução ideológica que o marxismo revolucionário sofreu no século XX, acompanhando o longo estertor da revolução soviética; 

e, no presente, a ausência de um claro ataque político às bases do sistema capitalista (porque, como disse Marx, é a própria base das contradições que deve ser derrubada).

Este estado de coisas, no entanto, não está congelado. Há sinais de mudança, embora a prazo que não se pode medir. 

Centro-me nas mudanças de natureza social dos últimos 30-40. 

Até 1970 a classe operária produtora de mais valia cresceu nos principais países capitalistas [9] . 

Nas décadas seguintes foi decaindo nesses países. Mas à escala global o seu número aumentou em termos absolutos devido aos crescimentos enormes verificados no Terceiro Mundo. Deu-se portanto uma proletarização maciça nos países periféricos e um aumento em valor absoluto do proletariado mundial. Isto quanto ao número. 

Também a partir de meados dos anos de 1970, o desemprego cresceu muito nos países mais desenvolvidos, colocando fora da produção milhões de trabalhadores [10] . 

Ao mesmo tempo, sobretudo nos anos mais recentes, uma grande parte, e uma parte crescente, dos desempregados passaram a ser desempregados permanentes – ou como precários ou mesmo como excluídos do sistema do salariato. 

Em qualquer caso, é de notar que esta desagregação do proletariado se faz por rebaixamento de uma parte dos trabalhadores à condição de um sub-proletariado ou mesmo de um lumpen-proletariado – não por aburguesamento ou ascensão social. 

Esta evolução traduz, de forma gritante, o processo de substituição do trabalho vivo por trabalho morto que acompanha a acumulação capitalista [11] . 

E o que fica demonstrado não é a impossibilidade da revolução social, mas a inutilidade histórica do capitalismo da nossa época que se tornou incapaz de transformar o progresso material em benefício social. 

Apesar, portanto, da complexidade desta evolução social e dos solavancos por que passa, uma coisa é certa: o processo vai na direcção de ampliar enormemente as classes proletárias, na acepção de classes despojadas de qualquer meio de produção. Mais ainda, como grande parte dessa massa não tem ocupação no quadro da produção capitalista – e é mesmo, em boa parte, impedida pelo sistema de ter uma ocupação útil – os factores de explosão social crescem também em proporção. Os motins de Londres ou Paris, ou as revoltas árabes são disso exemplos. 

Em resumo: não será por falta de actores que a revolução social deixará de se fazer. 

VI 

Mas há ainda um outro argumento, que tem a ver com uma camada social particular: as chamadas classes médias. 

As sociedades capitalistas mais desenvolvidas caracterizam-se, pelo menos desde os começos do século XX, por gerarem uma vasta camada social, na maioria assalariada, situada, pela sua condição de vida, entre o operariado e a burguesia. 

A sua função, em termos gerais, é enquadrar a produção, intervir na circulação do capital e proporcionar a realização da mais valia. 

Essa camada social é um sinal distintivo das sociedades imperialistas, como Lenine, por exemplo, bem vincou. 

Olhando para os últimos 50 ou mesmo 100 anos, um dos seus principais papéis tem sido o de assegurar a estabilidade social e política dos regimes capitalistas desenvolvidos. Aliadas naturais da burguesia, essas camadas garantiram o balancé que tem sido a sucessão de republicanos e democratas nos EUA, de trabalhistas e conservadores no Reino Unido, de social-democratas e democratas-cristãos na Alemanha, dos equivalentes no Japão, em França e na Itália – e até de PS e PSD em Portugal nos últimos 38 anos. 

Todo o mundo mais desenvolvido tem tido nessas camadas o fiel de balança no que respeita a manter o poder do capital sem agitações, servindo de barreira a qualquer movimento com cariz de classe da parte do proletariado. 

Mas como os tempos mudam, interessa notar o seguinte: 

Mais ou menos até final do século XX o crescimento do sector terciário absorveu em parte os despedimentos da indústria. Esse facto, além de diminuir o impacto do desemprego, manteve entre os trabalhadores a crença de que o capitalismo sempre assegurava as hipóteses de ascensão social [12] . 

As classes médias, porém, entraram em retrocesso. Por um lado, porque também nos serviços a rentabilidade do trabalho aumentou e permite dispensar mão-de-obra; por outro lado, porque o pântano da produção capitalista obriga agora a burguesia a penalizar mesmo os seus parentes próximos. 

Depois de ter levado a massa proletária produtiva à pobreza ou à beira disso e de a castigar por todas as formas – a maré da crise não parou de subir e molha já os pés das classes intermédias. O significado deste facto parece-me importante: o ascensor social empanou; a burguesia capitalista aliena o apoio social e político do seu principal aliado; o confronto de classes clarifica-se, aproximando as sociedades capitalistas do modelo (digamos assim) canónico de duas classes antagónicas: burguesia, proletariado.

A choradeira oficial sobre o empobrecimento da classe média é apenas uma forma de comiseração do poder, um gesto para tentar ainda segurar esse parceiro histórico. Mas a tendência de proletarização dessas classes parece irreversível, dando mais um sinal do fim de uma época. 


Do ponto de vista do comunismo só há que saudar essa clarificação. 

(Faço um parêntese para dizer que esta evolução não se traduz, nem de imediato nem necessariamente, num posicionamento anticapitalista dessas camadas – pelo contrário, o primeiro reflexo de boa parte delas será o de defenderem os privilégios anteriores, de aderirem a ideologias nacionalistas e mesmo fascistas, de se demarcarem da massa proletária, reagindo como uma espécie de aristocracia falida. Mas isso não anula o facto de, a prazo, a burguesia capitalista ir ficando mais só no terreiro – dependendo o comportamento político das classes médias do papel que a massa proletária propriamente dita desempenhar no confronto de classes.) 

VII 

Último argumento. 

Arrisco afirmar que a ideia axial que percorre a obra de Karl Marx é a de que o capitalismo é perecível, não é eterno – que é uma formação social com um papel histórico limitado e portanto também com um tempo de vida determinado. O papel histórico é socializar o trabalho, libertar os produtores da propriedade – enfim, "fazer crescer sem freio e em progressão geométrica a produtividade do trabalho humano". 

É fácil ver na evolução do último século a larguíssima socialização do trabalho, a extensíssima abolição da propriedade individual em todo o globo e o aumento colossal da produtividade do trabalho. Isso, sem dúvida, aproximou a humanidade do socialismo, colocando-nos hoje muito adiante daquilo que era o mundo, por exemplo, em 1917. 

O que já não é tão fácil é prever o tempo de vida do capitalismo, porque isso não depende apenas do descalabro do sistema; depende decisivamente, das forças sociais que se decidam a pôr-lhe termo. 

Mas o desenrolar da crise tem o condão de ajudar a rasgar os véus com que a sociedade burguesa se recobre e de pôr à vista a natureza da sua dominação classista. 

O que é que a crise põe à vista? 

Põe à vista o Estado, não como árbitro dos conflitos sociais, ou como expressão de um suposto interesse colectivo, nacional – mas como instrumento de uma classe; 

Mostra a democracia, na realidade, como uma plutocracia de que as massas populares estão inteiramente arredadas; como uma ditadura da burguesia que assume feições cada vez mais totalitárias; 

Mostra a classe capitalista, toda ela, com um único plano para aliviar a crise – que consiste em explorar mais eficazmente as classes trabalhadoras; 

Mostra que a condição de uma eventual recuperação económica é a destruição de meios de produção, seja pela gradual desvalorização do capital, seja pela violência da guerra; 

Mostra em plena acção a lei geral da acumulação capitalista, visível na criação de uma massa crescente de desempregados e de marginalizados e no aumento da pobreza; 

Mostra que o tempo ganho pela sociedade graças ao aumento da produtividade não se traduz em menos tempo de trabalho obrigatório, mas sim na irracionalidade de mais desemprego e maior grau de extorsão dos trabalhadores em actividade; 

Mostra ainda a acção concertada das burguesias por cima dos limites nacionais, mostra a semelhança dos problemas sofridos pelas massas trabalhadoras dos diferentes países – e mostra portanto a falta que faz, da banda dos proletários, um internacionalismo que vá para lá da mera solidariedade moral e se traduza numa efectiva coordenação prática das acções de resistência. 

O esclarecimento e a mobilização das massas proletárias não podem passar ao lado destes factos. Eles são os elementos educativos por excelência que a realidade prática nos fornece para mostrar o limite a que chegou este sistema social e o absurdo que é prolongar o seu tempo de vida. 

De resto, se bem percebo o sentimento que os trabalhadores têm a respeito do mundo em que vivem, não é a confiança no capitalismo que os leva a aceitá-lo – é antes a noção resignada de que não há alternativa viável que o substitua, e sobretudo de que não há força que o possa deitar abaixo. 

Ora, na linha do marxismo revolucionário, a tarefa não é reabilitar ou remendar o capitalismo, mas desacreditá-lo aos olhos do proletariado. 

Atacar as bases do mundo capitalista não é, sobretudo nas circunstâncias actuais, uma ideia desgarrada da realidade quotidiana. Ao contrário, é a condição de estimular e reunir as forças de classe dos trabalhadores e de os levar a encarar a necessidade de construir um mundo conduzido por regras opostas às do mundo capitalista. 

Que o burguês não veja a crise para além do défice, da dívida, da quebra do lucro, da falta de crédito e dos remédios correspondentes para esse tipo de males – está certo. Mas que os proletários vejam as coisas pelo mesmo prisma – está errado. 

O proletariado já teve de fazer muitos sacrifícios por causas alheias. Chegou a altura de afirmar a sua própria causa. 

Propor ao proletariado a saída do círculo de giz do capitalismo – é esse, a meu ver, o papel do comunismo marxista. 





terça-feira, junho 05, 2012

Paul Buchheit - Os muito ricos e o mito de que seriam "criadores de empregos"


3 DE JUNHO DE 2012 - 6H47 

Os muito ricos e o mito de que seriam "criadores de empregos"


Em 1889, em seu artigo O Evangelho da Riqueza [Gospel of Wealth], Andrew Carnegie ensinava que os norte-americanos deveriam considerar bem vinda a concentração da riqueza nas mãos de poucos, porque “a superior sabedoria, experiência e habilidade” dos ricos garantiria benefícios para todos. 

Por Paul Buchheit*, no Commondreams


Mais recentemente, Edward Conard, autor de Unintended Consequences: Why Everything You've Been Told About the Economy Is Wrong [Consequências indesejadas: por que tudo que lhe contaram sobre a economia está errado], disse: “Como sociedade, não estamos oferecendo aos nossos raros talentos recompensa suficiente. Estamos pagando pouco aos que correm riscos”. [1] 

Será verdade? Será que, se dermos todo o dinheiro aos norte-americanos mais ricos, estará garantido que o empregarão sabiamente e que criarão empregos e estimularão os investimentos em pequenos negócios e, assim, beneficiarão toda a sociedade? Isso parece ser o que pensam os 18 altos executivos de grandes empresas que escreveram, em carta ao Secretário do Tesouro Timothy Geithner, que qualquer aumento nos impostos sobre ganhos de capital reduzirá o investimento, “quando precisamos formar capitais nos EUA para criar empregos e expandir nossa economia.” 

Os 18 empresários e executivos que assinam a carta não listam qualquer prova a favor de suas ideias, porque não há o que prove esse tipo de delírio. Os fatos são outros: 

Os muito ricos não gostam de investimentos de risco 

Analistas de mercado de Marketwatch estimam que mais de 90% do patrimônio acumulado pelos milionários está aplicado numa combinação de investimentos de baixo risco (bonds e dinheiro), no mercado de ações e em propriedade imobiliária. Segundo o economista Richard Wolff, cerca de metade do patrimônio do 1% mais rico está aplicado em fundos não incorporados (contas comerciais pessoais). O Wall Street Journal anota que cerca de mais de ¾ do patrimônio dos que valem individualmente mais de US$ 20 milhões está investido em fundos hedge. 

A parte do investimento aplicada em negócios iniciantes em 2011 não chegou a 1% dos investimentos dos ricos nos EUA. 

A pesquisa de Mendelsohn Affluent Survey confirmou que os muito ricos gastam menos de 2% do próprio dinheiro para estimular negócios iniciantes. A última coisa que querem, pelo que se pode ver, é investir no arriscadíssimo negócio de contratar gente para inovar. 

Os muitos ricos não gostam de arriscar em empregos 

Os profissionais da alta gerência e da administração financeira representavam, em 2005, cerca de 60% do 1% de norte-americanos mais ricos. Os empresários empreendedores não chegavam a 3%. Estudo recente constatou que menos de 1% de todos os empresários empreendedores vinham de ambientes muito ricos ou muito pobres. 

A grande massa dos investimentos dos norte-americanos mais ricos toma o rumo do exterior – para fora dos EUA, onde os mais ricos aplicam 57% do próprio dinheiro e enchem suas fábricas com trabalhadores mal remunerados e superexplorados. Números do Departamento de Comércio mostram que as empresas norte-americanas cortaram cerca de 2,9 milhões de empregos nos EUA entre 2000 e 2009. Ao mesmo tempo, criaram 2,4 milhões de subempregos fora dos EUA. 

O mais provável é que os muito ricos absolutamente nunca pensem em criar empregos, sejam quais forem, nos EUA. Pesquisas mostram que 60% dos investidores com patrimônio de US$ 25 milhões ou mais estão investindo no exterior até 1/3 de tudo que têm. Nos EUA, a riqueza extra que teria sido criada pelos cortes de impostos da era Bush evaram aos “piores números do trabalho, de toda a história”. O grande criador de empregos nos EUA, como diria Nick Hanauer, [2] é o consumidor de classe média. 

As empresas norte-americanas muito ricas não gostam de investir nos EUA

Como as empresas gastam o próprio dinheiro? Em larga medida, não gastam. Segundo a agência Moody's, o caixa de empresas não financeiras norte-americanas subiu 3% entre 1980 e 2011 e chega hoje a US$ 1,24 trilhões. A razão patrimônio/dinheiro das empresas quase triplicou entre 1980 e 2010. Estima-se que o dinheiro paralisado como reserva de caixa nas empresas norte-americanas bastaria para manter empregados 3,5 milhões de pessoas a mais, durante cinco anos, com salário anual de US$ 40 mil. 

As empresas que mais preservam suas reservas de caixa, entre as quais Apple, Google, Intel, Coca Cola e Chevron, gastam seu dinheiro na recompra de ações (o que faz subir o preço das ações preferenciais), em dividendos para investidores e na compra de empresas subsidiárias. Segundo Bloomberg, a recompra de ações alcança hoje um dos mais altos picos dos últimos 25 anos. 

A empresa Apple alega ter criado 500 mil empregos para a economia dos EUA, mas aí estão contados entusiastas da construção de aplicativos e os motoristas da Fedex que entregam iPhones a domicílio. A Apple emprega hoje nos EUA 47 mil pessoas: é um décimo da força de trabalho da General Motors nos anos 1990s. 

Os riquíssimos investem, isso sim, no exterior. Também investem mais em “drenar cérebros” para o exterior – empresários, cientistas, médicos – do que em apoiar a melhoria da educação nos EUA. 

Há um campo no qual as grandes empresas gostam de gastar dinheiro: em bônus aos altos executivos. Bancos, sobretudo, cujos gastos extras são muitas vezes cobertos por empréstimos de juro zero que lhes garante o FED - Federal Reserve. 

Os mais ricos – indivíduos e empresas – são muito bons em acumular fortunas. E são melhores ainda na arte de cultivar o mito de que seriam “criadores de empregos”.

Notas de rodapé

[1] New York Times, 1/5/2012, “The Purpose of Spectacular Wealth, According to a Spectacularly Wealthy Guy” [O objetivo da riqueza espetacular, segundo alguém espetacularmente rico], assinado por Adam Davidson, onde se lê:

“(...) recentemente, encontrei Edward Conard na 5ª. Avenida, entre a Av. Madison e a Rua 57, bem em frente de seu escritório [na empresa] Bain Capital, o Fundo de Investimento em Participações que ele ajudou a converter em negócio multibilionário, à custa de comprar empresas em frangalhos, consertá-las e revendê-las com gordos lucros. Conard, que se aposentou há três anos, quando completou 51 anos, não é membro só do 1%: é membro também do 0,1%. Sua fortuna está na casa das centenas de milhões: vive em uma casa no Upper East Side, perto da 5ª. Avenida; e é um dos principais doadores de campanha de seu antigo patrão, depois sócio, e amigo, Mitt Romney”. 

Conard pode ser ouvido, em entrevista a Fareed Zakaria, da CNN, a seguir:

[2] Para saber quem é, ver em: “Raise Taxes on Rich to Reward True Job Creators: Nick Hanauer” (em inglês) E também em: “TED rejeita palestra de um capitalista contra o papel dos capitalistas” (em português)

*Paul Buchheit é professor universitário, membro ativo dos US Uncut Chicago, fundador e desenvolvedor de sites educacionais e promotores de justiça social (UsAgainstGreed.org, PayUpNow.org, RappingHistory.org); e autor e editor principal do “American Wars: Illusions and Realities” (Clarity Press). e-mail: paul@UsAgainstGreed.org .

Fonte: Rede Castorphoto. Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu