A Internacional

__ dementesim . . Do rio que tudo arrasta se diz que é violento Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem. . _____ . Quem luta pelo comunismo Deve saber lutar e não lutar, Dizer a verdade e não dizer a verdade, Prestar serviços e recusar serviços, Ter fé e não ter fé, Expor-se ao perigo e evitá-lo, Ser reconhecido e não ser reconhecido. Quem luta pelo comunismo . . Só tem uma verdade: A de lutar pelo comunismo. . . Bertold Brecht

domingo, março 31, 2013

serafim lobato - PAPADO ROMANO: DA TRAGÉDIA À FARSA

Sexta-feira, 29 de Março de 2013

PAPADO ROMANO: DA TRAGÉDIA À FARSA


1 -Numa obra muito célebre intitulada “o 18 de Brumário de Luís Bonaparte”, o filósofo e economista político alemão Karl Marx escrevia, no século XIX, indo buscar o argumento inicial a Hegel, segundo o qual os grandes factos e pensamentos da história universal aparecem como que duas vezes.

E acrescentava, então da sua autoria, que tal acontecia uma vez como tragédia e a outra como farsa.

A história da nomeação dos últimos quatro papas da Igreja Católica Romana tem todos os ingredientes económicos, políticos e sociais numa interligação com a evolução societária mundial desde a crise de 1973, que, em grande medida, atingiu também o próprio sistema financeiro capitalista onde se movimenta e medra a estrutura dirigente do Vaticano.
Nos primeiros quatro a cinco anos da década de 70 do século passado, o Vaticano, através do IOR, com a liderança do arcebispo norte-americano Paul Marcinkus, já falecido, envolveu-se juntamente com a Máfia dos Estados Unidos e Itália, numa enorme fraude de compra e venda de títulos, aparentemente falsificados, de grandes companhias e bancos, bem como de investimentos obscuros que levaram a movimentações ilegais de tráfico de dinheiro que ascendeu a vários mil milhões de dólares. 

Uma fonte histórica, não desmentida, para uma parte substancial deste acontecimento, é o livro “Escândalo no Vaticano”, do norte-americano Richard Hammer, (Publicações Europa- América – 1982), que se baseia nas investigações policiais oficiais efectuadas, quer pelas autoridades de Washington, Alemanha e Interpol.

O Sumo Pontífice da Igreja Católica Paulo VI esteve envolvido até ao pescoço, neste e noutros negócios, igualmente escandalosos, que emaranharam, candida e sinistramente, pelas paredes do palácio papal.
Paulo VI – ou melhor dizendo, o cardeal Giovanni Battista Enrico Antonio Maria Montini -, que já chafurdava no maquiavelismo financeiro da Igreja Católica, desde os tempos que estivera na Secretaria de Estado, onde se iniciou em 1922 e ascendeu à sua chefia, principalmente, com o Papa Pio XII, o aristocrata cardeal Pacelli. 

Que, aliás, enobreceu, com todo o espírito prático, quase toda a sua família mais próxima.


Ora, o sucessor de Montini, o cardeal patriarca de Veneza Albino Luciani, porque não apresentava grandes sintomas visíveis da lama do pântano fraudulento bancário e bolsista vaticanista, foi escolhido, a dedo, para tentar limitar os efeitos nefastos do poder temporal do seu antecessor, com o objectivo de preconizar uma “ruptura” com o sistema de administração financeira da Santa Sé. 

O que sucedeu apenas como “uma pretensão pia”, porque o Papado, em si, não domina a justiça social, mas, está estreitamente ligado a o poder do sistema financeiro internacional.

Durou apenas um mês a sua permanência no cargo (26 de Setembro a 28 de Setembro de 1978).

Apareceu morto na sua cama, ao princípio do dia, sem que a Cúria tivesse divulgado a causa da morte, com contradições, na altura, das fontes oficiais vaticanas de como teria ocorrido esse falecimento. Enterrado sem autópsia.

Foi a tragédia.

2 - O papa seguinte, o cardeal polaco Karol Wojtyla, personalidade religiosa que representava e representou o papel da evolução pró-nazi da Igreja Católica na Polónia, embora oponente ao regime contra-revolucionário ditatorial existente no país, com rotulagem de socialista, foi o escolhido.

Havia, já então, uma aliança política, financeira e militante entre os hierarcas católicos daquele país e a Administração norte-americana, cujo expoente foi, no pós II Guerra, o cardeal primaz Wyszynski, um agente do regime de Washington.

Nomeado pelo sector dos hierarcas cardinalícios imbricados no sistema financeiro instituído do Vaticano, o papa Wojtyla procurou, nos seus rituais iniciais, assemelhar-se ao falecido cardeal Luciani, ligando o seu novo cargo ao do antecessor, intitulando-se João Paulo II, e dizendo-se apostado em reestruturar a decadente estrutura político-religiosa da Santa Sé.

O cardeal polaco organizou uma imagem de “missionário” viajante e de manipulador de multidões, alicerçado numa mensagem política de defesa da “democracia ocidental”.

Na realidade, foi o impulsionador da mais destravada especulação financeira mundial em íntima ligação com os financeiros judeus de Wall Street e o crime organizado da Máfia e da Cosa Nostra.

Foi um dos banqueiros da Máfia norte-americana, Michelle Sindona, o principal conselheiro económico de João Paulo II, Sindona este que, mais tarde, foi assassinado numa das grande prisões de alta segurança de Itália, quando se prontificava a falar sobre o que sabia nos negócios do Capital internacional.

A investigação judicial e parlamentar desenvolvida em Itália depois do envolvimento criminoso da Loja Maçónica P-2, veio a mostrar a íntima ligação entre o Papa João Paulo II e a Cúria Papal (os cardeais Agostino Casaroli, Jean Villot, John Cody - o homem da Igreja Católica considerado mais poderoso nos EUA - e ao arcebispo Paul Marcinkus, entre outros) nas tentativas de subversão do regime italiano para edificar um poder ditatorial, e os negócios mais tenebrosos da lavagem de dinheiro, falsificações de títulos, agiotagem, assassinatos, como do jornalista Mino Pecorelli e do banqueiro Roberto Calvi.



Roberto Calvi enforcado

A que se somava o imenso processo de corrupção nacional, envolvendo os principais partidos, chamado de Tangentopoli , e que levou a dissolução da Democracia Cristã e do Partido Socialista italiano.

Entre os homens da P-2, acobertados pelo Vaticano estava um capitalista em ascensão chamado Silvio Berlusconi, protegido de Giulio Andreotti e sempre em ligação estreita com a Santa Sé, através dos seus homens de mão, primeiro, no negócio, depois, na governação berlusconiana ( a dupla Letta e Tremonti, ministros e o seu homem de mão Bisignani, antigo assessor de imprensa de Andreotti, como primeiro-ministro) e, posteriormente, no executivo de Mário Monti .


Karol Wojtyla foi um dos maiores “inquisidores” de toda a tentativa de “mudar introduzir novas ideias no interior da Igreja Católica”, em especial a perseguição material e ideológica a padres e instituições religiosas que pretendiam uma “Igreja dos pobres”, como os promotores da Teologia da Libertação. 

Quase todos tiveram de sair da corporação religiosa para seguir as suas ideias, como o teólogo suíço Kung e o franciscano brasileiro Boff.

O executor desta política de “ostracismo” foi um então obscuro cardeal alemão, mas ligado,como civil, ao nazismo hitleriano, e, já dentro da carreira religiosa alemã, abertamente conotado com “o conservadorismo mais puro” do catolicismo, chamado Joseph Ratzinger, que foi nomeado por João Paulo II, líder da Congregação para a Doutrina da Fé, como se intitula hoje, no ritual romano, a antiga Inquisição.

Wojtyla não condenou o sistema político existente em El Salvador, que assassinou, em 1980, o arcebispo Óscar Romero, nem se atreveu a questionar as ditaduras sul-americanas, fazendo questão mesmo de ir apoiar Augusto Pinochet, quando este já estava e, agonia do seu poder, em 1987.

O Papa João Paulo II interveio, directamente, no derrube ou intrusão nos assuntos internos de governos, que não mantinham ligações ou não toleravam a interferência da Igreja Católica nos negócios materiais e assuntos de natureza religiosa, como o caso da Polónia (financiou com perto de 300 milhões de dólares os movimento liderados pelos padres e por um chefe de uma equipa de operários chamado Lech Walesa, que alçaram, mais tarde, a Chefe de Estado polaco), Federação Jugoslava (o Papa foi um dos principais apoiantes, juntamente com a Alemanha e os Estados Unidos na desagregação daquela, apoiando abertamente a cessão da Croácia), Argentina, na transição política da ditadura, Brasil, entre outros.

Foi ainda com o reinado do cardeal polaco, que se descobriu que o Papado entravou as investigações ao papel de vários criminosos da II Grande Guerra, como Ante Pavelic, Klaus Barbie e Adolf Eichmann, os quais teriam recebido protecção no final da guerra.

Mas, foi João Paulo II o principal encobrir dos abusos sexuais de crianças – pedofilia – quando os casos de hierarcas começaram a ter relevo público. 

Propositadamente.

Sabe-se hoje que Wojtyla protegeu o fundador de uma das seitas internas da Igreja Católica, a Legião de Cristo, Marcial Maciel, das centenas de crimes que cometeu, e evitou que fosse presente à Justiça.

João Paulo II, para se impor numa estrutura teocrática, monárquica, e ditatorial que é o Vaticano, teve de se apoiar e intrigar entre as mais influentes instituições religiosas que pululam em torno do que se convencionou apelidar de Igreja Católica Apostólica Romana, enquadrada em Estado material vulgar, mas anormal, com o nome de Santa Sé.



Marcial Maciel e o Papa


E uma delas, possivelmente, a mais importante e poderosa financeiramente, foi o OPUS DEI, que, na sequência do escândalo do Banco Ambrosiano, socorreu as finanças vaticanas com a sua teia subterrânea bancária mundial.

A ascensão do Opus Dei foi visível nesse período, desde a elevação da seita a uma prelatura pessoa, cujo líder se tornou bispo, sob supervisão do Chefe da Igreja Romana, o fundador Escrivá tornou-se santo, à escolha de vários cardeais do Obra, bem como a sua colocação em lugares de destaque na hierarquia do Vaticano, como espanhol Julián Herranz, presidente do Pontifício Conselho para os Textos Legislativos, e a nomeação para seu porta-voz de um influente membro, Joaquin Navarro-Valls.
Claro que esta preferência levou ao afastamento de outros grupos dentro da Igreja Católica do poder que detiveram muitas dezenas de anos atrás, como os jesuítas.

A escolha do novo Chefe da Igreja Católica, em 2005, que recaiu no alemão Joseph Ratzinger, um braço direito do anterior, aparentemente reforçado com o poder económico do “ramo teutónico” do Vaticano – é das congregações europeias católicas mais ricas, quer em economia, quer nas finanças – veio, no entanto, na orientação central do poder do dinheiro.

O OPUS DEI tinha-se apoderado do IOR, o Banco do Vaticano, e ditava leis.

Além do mais representava, em termos ideológicos, um dos ramos do “poder conservador” que submergia, de dia para dia, a orientação vaticanista.

Desde Paulo VI, que fechou o badalado Concílio Vaticano II, já prenunciava o atoleiro vigarista financeiro onde o Vaticano estava metido e as instituições que lidaram com a entrada da Igreja Católica nos meandros do sistema capitalista financeiro mundial, como os jesuítas, franciscanos e outros sugeriam uma aplicação diferente dos dinheiros do potentado .


Com o alargamento do Vaticano nos negócios mundiais e, principalmente, fazendo parte do lúmpen grande capital financeiro, os dirigentes de topo da estrutura da Santa Sé – Cúria e leigos que lhe serviam (e servem) de correia de transmissão - apostaram, também, numa ideologia mais radical, de direita, pró-nazi, de presença na cena política mundial.

E esta ideologia estava e está concentrada nas chamadas “comunidades” modernas, que recrutam nas élites políticas, económicas e sociais sem escrúpulos, que mobilizam as multidões que se concentram nas visitas do Sumo Pontífice da Santa Sé nas suas viagens pelo mundo.

Além do Opus Dei, adquiriram preponderância “Os legionários de Cristo”, o “neocatecumenismo” (uma seita populista, de raiz ditatorial, nascida, em Espanha, com o beneplácito de Paulo Vi e oficializada em 2012 pelo Papa Bento XVI, com largo apoio na Cúria Papal e entre os cardeais pró-fascistas, que permitiu que se tornasse, através do seu líder, um laico, Francisco José Gómes Arguelo Wirtz, auditor da XIII Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos), a Sociedade Pio X (SSPX), que o cardeal Ratzinger reintegrou na hierarquia da Igreja Católica e a Sociedade de São Pedro.

3 – A farsa.

A 28 de Fevereiro findo, numa reunião de cardeais, num ritual muito ao gosto do tradicionalismo papal, pronunciou-se em latim, cuja transcrição se faz: "No mundo de hoje sujeito a rápidas mudanças e agitado por questões de grande relevância para a vida e para a fé, para governar a barca de Pedro e anunciar o Evangelho, é necessário vigor, tanto do corpo como do espírito, vigor que, nos últimos meses, diminuiu de tal modo em mim que devo reconhecer a minha incapacidade de administrar bem o ministério a mim confiado. (...) Deverá ser convocado, por quem de direito, o Conclave para a eleição do novo Sumo Pontífice.

O acto apareceu como algo inesperado, uma coisa nunca vista desde a Idade Média no seio da Igreja Católica.

Um Papa deve permanecer no seu posto até ao fim.

É o único monarca teocrático no interior do Vaticano, não pode haver dois. Mas, vai haver e, naturalmente, ir-se-ão confrontar, no futuro, ainda que, possivelmente, subterraneamente.
A razão principal da renúncia não foi a idade, pois o cardeal Ratzinger, que viveu anos e anos, na Cúria Papal em Roma, que foi o ideólogo do seu antecessor, sabia muito bem aos trabalhos que se metia quando foi escolhido aos 80 anos.

Aliás, para um estudioso mediano do que se passa nos meandros do Vaticano sabe que, em primeiro lugar, está a enormidade do poder económico-financeiro da Santa Sé, como entidade aparentemente unida numa crença metafísica irracional, e, o crescimento de poder também económico-financeiro das diferentes instituições e grupos de interesses que germinam no seu interior, mas que são concorrentes e até divergentes, não só na economia política, mas na geo-estratégia e até na própria concepção ideológica com que deve ser regido o colosso do Vaticano.

Além do mais verifica-se uma diminuição drástica dos chamados “fiéis” católicos no mundo, ao mesmo tempo que a opulência e a arrogância dos magnatas cardeais e bispos, e dos leigos intimamente ligados à Santa Sé, provocaram a inversão de todos os valores que aquela procurava fazer crer do que seria a chama da sua “evangelização” casta e humilde do cristianismo.


A realidade é outra: a corrupção entrou por todos os poros, os hierarcas tornaram-se pederastas, capitalistas gananciosos, mentores das maiores tropelias em todo o mundo e no próprio submundo.

Com a sua base de apoio a fugir-lhe, inclusive da parte da “sua” base nacional alemã, o cardeal Ratzinger estava fechado numa concha.


Tinha perdido o poder autocrático papal.

Fugia-lhe entre os dedos a obediência canina de outrora. (Tudo isto aparece retratado no livro do jornalista Italiano GianLuigi Nuzzi “Sua Santidade – As cartas secretas de Bento XVI /COMO O VATICANO VENDEU A ALMA”).


As ordens e congregações da Igreja Católica, como os jesuítas, beneditinos, franciscanos, entre outros, que outrora influenciavam as decisões negociais vaticanas foram afastadas do grupo mais próximo dos Papas, desde os anos 70 do século passado.

Mas não se afastaram de Roma.

Eles intrigaram, fizeram movimentar o seu poder material, actuaram sobre os próprios seus representantes junto dos grandes bancos e instituições de crédito e grande empresas capitalistas.

Tudo isto se enrodilhou, quer nos países onde são poderosos, quer nas redondezas do palácio papal.

Quer os próximos do Papa e beneficiados directos da sua “generosidade”, quer os mais afastados, todos eles, desde cardeais a padres, desde administradores laicos a simples bispos de locais distantes, são “gestores” encobertos ou identificados do poder de bens móveis e imóveis imensos, controlam o sistema de saúde e de educação em grande parte do Mundo.

4 – Ora, o central de todo o emaranhado e imbróglio que domina o Vaticano é, justamente, a crise capitalista económico-financeira e societária que percorre e está a afundar, em primeiro lugar, o chamado mundo ocidental, em particular os Estados Unidos e a União Europeia.

E esta crise perpassa, precisamente, por um dos principais esteios desse mundo, o Vaticano, o outro é Wall Street, de Nova Iorque, e, em plano secundário, mas muito importante para o papado, a City londrina, onde aquele investiu, em grande, desde que Benito Mussolini e o papa Pio XI, assinaram o Tratado de Latrão, que fez acorrer ao cofre do IOR muitas centenas de milhões de dólares.

Este mundo ocidental é o centro político, actuante, da Igreja Católica Romana.

Ele está estraçalhado pela crise. Os valores patrimoniais do Vaticano estão, portanto, em risco nesta parte do Mundo.


Se o bolo pode diminuir, os interesses concorrentes entram em choque mais acentuado pelo seu controlo.

E mais conflitos podem duplicar, porque a entrada de dinheiro também pode minguar por outra via: há menos fiéis a contribuir.

Mas, acrescente-se um outro dado, este de pura economia política, o centro produtivo internacional está a desenvolver-se, rapidamente, noutras partes do globo.

E com isso novas estruturas de grande poder económico e financeiro se incrementam nessas regiões, em que a influência da Igreja Católica não é tão preponderante como no chamado “primeiro mundo”.

Para pôr em prática uma “nova política económica” no Vaticano teria – ou terá – de haver “uma revolução” mexendo essencialmente nos interesses instalados na Cúria, e principalmente, no domínio central do Banco do Vaticano.

5 – Aqui é que a farsa “amadurece” dentro do grupo dirigente que domina a Santa Sé para lançar um tipo de responsável máximo, despojado dos “pecadilhos” do centro.

O grupo lúmpen capitalista financeiro e os seus ideólogos pró-nazis lançam mão de um cardeal que, já na reforma, pode ser uma “lança” nos chamados países emergentes, sem ferir a linha ideológica dominante, o argentino Jorge Maria Bergoglio, colaborante, por omissão activa ou passiva, ou até participante, com a Junta Militar fascista que governou a Argentina nos anos 60 e 70.

É o primeiro Papa católico, saído dos jesuítas (Ordem de Jesus), uma das congregações religiosas mais tenebrosas da História do Catolicismo.

Numa manobra demagoga, escolhe o nome de Francisco, e di-lo, com toda a candura e sem pejo de vergonha, que o fez, porque quis associar-se á pretensa obra “de pobreza” do fundador dos franciscanos, Francisco de Assis.



Videla e o cardeal argentino: alegria do encontro

Embora se apresentem como modelo de religiosos despojados de bens terrenos, a Companhia de Jesus é a maior e a mais poderosa Ordem da Igreja Católica.

Domina, praticamente, todo o ensino privado de elite em todo o Mundo, e penetrou, também, profundamente, nos negócios financeiros, bolsistas e grandes empresariais, não só dos Estados Unidos, mas de toda a América Latina.

Dos seus documentos oficiais, retira-se que detêm em todo o globo mais de 200 Universidades e 225 grandes Colégios.

Só nos Estados Unidos estão referenciadas, pelo menos, 28 universidades, a mais famosa das quais a de Georgetown (Washington), que além do ensino, é um poderoso centro de pesquisas, no campo médico, da economia, da saúde pública.

Por exemplo, foi sob o impulso da Ordem que se montou e desenvolveu uma das maiores empresas de frutas mundiais, a Di Giorgio Fruit CO, que opera em larga escala, na Florida, na Califórnia, estendendo-se para a América Central. Tem inclusive uma frota mercante marítima para mercadejar pelo mundo.

Mas também se pode exemplificar com a sua penetração no grande sistema financeiro norte-americano, onde se admite que controla uma parte substancial do conglomerado accionista do Bank of America.

Refira-se igualmente esta ligação bancária com outras estruturas accionistas que passam pela Boeing, Lockheed, Douglas, entre outras, cujos braços se expandem pelos grupos poetrolíferos desde os EUA até à Venezuela.
O Papa Francisco, com as suas tiradas em torno da pobreza e da humildade, será o títere da manipulação e mistificação, porque o essencial do papel real será efectuado pelos “senhores do Capital” dentro do Vaticano.

Naturalmente, uma Igreja Católica em crise financeira, terá de se reestruturar e evolucionar no meio do decadente sistema capitalista onde ela se impulsionou e ganhou foros de grande potência.

Esse será o papel verdadeiro que o cardeal argentino terá de enfrentar, no meio da farsa, que foi a sua nomeação. 

A sobrevivência do poderio da Igreja Católica está na própria sobrevivência do sistema capitalista mundial, que ela co-lidera com a Wall Street e a City Londrina.



Ângelo Alves: O Chipre só tem uma solução!

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31 de Março de 2013 - 8h06                 

O desenrolar dos acontecimentos no Chipre, sujeito a um autêntico assalto comandado pela Alemanha por via do Eurogrupo, levanta um sem número de questões. Tentaremos por isso centrarmo-nos apenas em alguns aspectos chave da situação.

Por Ângelo Alves, no Jornal Avante!


Uma primeira nota vai para o carácter sistémico dos acontecimentos. Não estamos apenas perante um roubo descarado ao Chipre, criminoso de todos os pontos de vista, incluindo o político e de relacionamento entre estados. Nem apenas perante um ato de chantagem descarada sobre todo um povo como o demonstrou o ultimato do BCE ameaçando com uma autêntica bomba atômica financeira.

Estamos também perante um novo patamar de desenvolvimento da crise do capitalismo na União Europeia. Um patamar em que o processo de extorsão de recursos para a esfera financeira e de centralização e concentração de capital atinge um nível superior e é decidido à margem de qualquer controlo político, é esse o “modelo” de que vem agora falar a Comissão Europeia. É a total submissão do poder político ao poder econômico, como o comprova o fato de o roubo às poupanças dos cipriotas e aos ativos de centenas de pequenas e médias empresas ter sido decidido em Berlim, acordado em Bruxelas e imposto ao Chipre sem passar sequer pelo seu Parlamento.

Mas os acontecimentos no Chipre demonstram ainda um outro traço do desenvolvimento da crise do capitalismo. E esta é a segunda nota: o aprofundamento das contradições entre diferentes sectores do grande capital e por consequência entre potências económicas capitalistas no contexto do aprofundamento da crise. A medida de roubo às poupanças tem objetivos que demonstram até que ponto vai, no contexto da continuação dos processos de desvalorização de capital típico de uma crise de sobreprodução, a guerra económica entre sectores do grande capital.

O confisco criminoso das poupanças depositadas nos dois maiores bancos cipriotas tem duas consequências imediatas: a mais do que previsível fuga de capitais do conturbado Chipre para o “seguro” centro da Europa, mais propriamente para os mesmos mega bancos alemães; e a perda de muitos milhares de milhões de euros por parte de sectores do capital russo. Ora o que motivou parte da violência desta medida foi exatamente o que está por detrás das medidas que até agora vinham sendo tomadas em relação a países como Portugal. Ou seja, as economias do ‘centro’ da Europa tentam a todo o custo construir cordões sanitários em torno do ‘seu’ grande capital. Para isso arrasa-se economias, cria-se o caos económico e social e transfere-se para a periferia as ondas de choque da crise. O que é relativamente novo na situação do Chipre é que essa ‘exportação’ de perdas é feita já não só para a periferia da União Europeia, mas também para a Rússia. E é isso que está a irritar de sobremaneira Putin, defensor acérrimo dos interesses do grande capital russo e das suas máfias.

A terceira nota vai para a hipocrisia. Tenta-se justificar esta medida com a ideia hipócrita de que o sector financeiro cipriota estava sobredimensionado porque a sua economia tem uma forte componente de offshore. Ora os que agora afirmam isto são os grandes defensores da liberalização de circulação de capitais, os mesmos que se recusam a taxar o capital e as operações financeiras, aqueles que nem querem ouvir falar do fim de offshores como o Luxemburgo ou a Madeira. Hipocrisia pura para tentar justificar um roubo.

A quarta e última nota vai para o que não se fala. É que em Abril o Parlamento cipriota vai ser chamado a votar o “verdadeiro” memorando da troika. E nesse memorando estão todas as medidas que Portugal bem conhece. Cortes em salários e pensões, destruição de serviços públicos, privatizações, aumentos de impostos, etc... Com um acrescento: os falcões estão de olho nas reservas de gás recentemente descobertas em Chipre. Portanto, como afirma o AKEL, a solução está fora do quadro do memorando, e essa é a única solução!

Rasul Gudarzi - co o Brics: duro golpe nos EUA, FMI e Banco Mundial

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31 de Março de 2013 - 10h02  
 
Que desafios os membros do Brics enfrentam para estabelecer seu banco de desenvolvimento? Que desafios este banco cria para o FMI, o Banco Mundial e seus patrocinadores?

Por Rasul Gudarzi*

Os países emergentes do Brics, formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul decidiram estabelecer um banco de desenvolvimento que entre outros objetivos terá a tarefa de se contrapor ao Banco Mundial e ao Fundo Monetário Internacional. Os países do Brics trabalham também no estabelecimento de um fundo de reservas de divisas de contingência por um valor inicial de 100 bilhões de dólares.

O acordo foi alcançado durante a quinta conferência que reuniu os presidentes dos países membros do grupo econômico emergente em Durban, África do Sul. O banco de desenvolvimento acordado pelo Brics tem como objetivo "mobilizar recursos", fomentar a construção de infraestruturas e o "desenvolvimento sustentável" em países emergentes e em vias de desenvolvimento.

Esta iniciativa enfrenta a oposição de algumas potências hegemônicas como os Estados Unidos e o Reino Unido, uma vez que estes dois países, mediante o FMI e o Banco Mundial, promoviam seus planos contra os países em vias de desenvolvimento. Fica bem claro que a iniciativa do Brics para estabelecer este banco e ajudar os países em vias de desenvolvimento vai se deparar com enormes obstáculos por parte do Ocidente.

Tal como sabemos, os países do Brics representam 43% da população mundial, ocupam um lugar destacado dentro da economia global, já que dispõem de enormes riquezas naturais, o maior mercado do mundo, uma base industrial sólida e recursos humanos qualificados, abarcando quase 30% do Produto Interno Bruto global.

Tendo em conta estas destacadas cifras, nota-se claramente a influência que pode ter este bloco em nível mundial e nas regiões, onde se localizam estes países. Por esta razão, o banco de desenvolvimento do Brics pode substituir facilmente o FMI e o Banco Mundial liderados pelos Estados Unidos e o Reino Unido, algo que não convém ao sistema hegemônico, já que não pode impulsionar mais seus planos de saqueio dos países em vias de desenvolvimento.

Quando o Fundo Monetário Internacional como ideia foi proposto em 22 de julho de 1944 durante uma convenção da ONU em Bretton Woods, New Hampshire, Estados Unidos e começou a funcionar em 1945, seus estatutos declaravam como principais objetivos a promoção de políticas cambiais sustentáveis em nível internacional, facilitar o comércio internacional e reduzir a pobreza. Não obstante, o que se conseguiu foi o contrário, já que nem este fundo monetário nem o Banco Mundial funcionam de maneira independente.

Uma vez que os Estados Unidos são o principal provedor do fundo desta entidade internacional e os especialistas estadunidenses desempenham um papel importante no manejo das políticas deste organismo internacional, nota-se que o FMI se converteu em uma ferramenta em mãos da Casa Branca.

Historicamente, o diretor-gerente do FMI sempre foi europeu e o presidente do Banco Mundial sempre foi estadunidense. Os conselheiros executivos, que atuam com o diretor-gerente, são escolhidos pelos ministros de finanças dos países que representam. O primeiro subdiretor-gerente do FMI, que ocupa o segundo posto de comando, tradicionalmente tem sido um estadunidense, algo que põe em relevo a influência dos Estados Unidos e do Reino Unido nestes dois organismos.

Argumenta-se que as receitas do FMI sob a influência dos Estados Unidos provocaram uma desaceleração da industrialização, ou desindustrialização na maioria dos casos, as recessões em vários países latino-americanos em finais dos anos 1990 e as crises financeiras, como a da Argentina em finais de 2001.

Considerando os defeitos mencionados do FMI e do Banco Mundial, pode-se concluir que o banco de desenvolvimento do Brics é um duro golpe nos Estados Unidos e no Reino Unido e contribui para impedir suas políticas colonialistas nos países em vias de desenvolvimento.

À margem da cúpula do Brics em Durban foi adotada outra medida que prejudica ainda mais os Estados Unidos, qual seja, a eliminação do dólar dos intercâmbios comerciais entre dois polos gigantes da economia mundial, o Brasil e a China, a fim de proteger seus intercâmbios das flutuações da moeda estadunidense.

O câmbio de divisas 'antidólar', com um valor de 30 bilhões de dólares anuais e formulado para um período de três anos, foi firmado por representantes de ambos os países. Ademais, o ministro brasileiro das Finanças, Guido Mantega, anunciou que oferecerá um acordo similar a presidentes dos outros Estados membros do organismo que representa quatro dos cinco continentes do mundo.

Ao adotar esta medida, o grupo Brics se aproxima de transformar-se em um sólido bloco político, econômico e militar em nível mundial, rivalizando, assim, com os interesses dos Estados Unidos.

Os Brics, com a grande população e o imenso PIB que possui pode promover seus planos e desmantelar os do capitalismo estadunidense e britânico, deve esperar os obstáculos destes países em seu caminho.

Rasul Gudarzi é jornalista iraniano da Rede Hispan TV

Blog da Resistência www.zereinaldo.blog.br

A guerra do ocidente contra a África

DanGlazebrook*

26.Mar.13 :: Outros autores
DanGlazebrookA imagem clássica da África, difundida pela imprensa-empresa ocidental – um saco gigante, cheio até a boca de guerras infindáveis, fome, crianças abandonadas – cria a ilusão de um continente que dependeria existencialmente do que lhe dê a caridade ocidental. A verdade é exaCtamente o contrário disso. O ocidente é que depende existencialmente do que extraia da África.

O que o ocidente obtém da África é obtido de várias, muitas maneiras. Dentre essas maneiras, os fluxos ilícitos de recursos; os lucros que, invariavelmente, acabam nos cofres dos bancos ocidentais pelas trilhas dos paraísos fiscais, como já está fartamente documentado no livro PoisonedWells [Poços envenenados], de Nicholas Shaxson. Ou pelo mecanismo de extorsão do sistema das dívidas nacionais, pelo qual bancos ocidentais emprestam dinheiro a governantes militares, quase sempre postos no poder com a ajuda de forças ocidentais, como Mobutu, ex-presidente do Congo; esses governantes apropriam-se do dinheiro emprestado, quase sempre em contas privadas no próprio banco que emprestou ao país, cabendo ao país a missão de pagar juros exorbitantes que crescem exponencialmente.
Pesquisa recente de LeonceNdikumana e James K. Boyce descobriu que mais de 80 centavos de cada dólar emprestado deixaram o país devedor em “voos do capital”, no período de um ano, sem jamais terem sido investidos no país devedor; e que US$ 20 bilhões são drenados da África, por ano, como pagamento “do serviço da dívida” desses “empréstimos” essencialmente fraudulentos.
Outra via pela qual a África serve ao Ocidente, muito mais que o contrário, é o saque de minérios. Países como a República Democrática do Congo são saqueados por milícias armadas que roubam recursos naturais do país e os revendem a preços inferiores aos dos mercados a empresas ocidentais; muitas dessas milícias são controladas de países vizinhos, como Uganda, Ruanda e Burundi, os quais, por sua vez, são patrocinados pelo ocidente - como relatam rotineiramente os relatórios da ONU.
E há também a via, talvez a mais importante, pela qual a África serve ao Ocidente, muito mais que o contrário: os preços escandalosamente baixos pagos na compra de matérias primas da África e, sempre, da força de trabalho africana que minera minérios, cultiva o que seja cultivável ou colhe o que tenha de ser colhido. Assim acontece que a África, de fato, subsidia os altos padrões de vida no ocidente e as empresas e corporações ocidentais.
Esse é o papel atribuído à África pelos donos da economia capitalista ocidental: fornecedora de recursos e de mão de obra de baixo preço. Para que o trabalho e os recursos continuem baratos, exige-se, basicamente, que a África continue subdesenvolvida e pobre; se prosperar, os salários crescem; se se desenvolver em termos tecnológicos, os preços dos recursos se somarão ao valor agregado antes da exportação; e valor agregado tem de ser pago.
Assim sendo, a extração de petróleo e de recursos minerais a baixo preço depende de manter os estados africanos frágeis e desunidos. A República Democrática do Congo, por exemplo - cujas minas produzem dezenas de bilhões de dólares de minérios todos os anos - só arrecadou, em recente ano fiscal, miseráveis US$32 milhões de impostos sobre material extraído das minas, por causa das guerras por procuração que o ocidente mantêm ativas na região, entre milícias patrocinadas pelo ocidente.
A União Africana (UA), criada em 2002, surgiu como ameaça nova contra tudo isso: um continente africano mais integrado e unificado, não seria tão facilmente saqueado. O que mais preocupou os estrategistas ocidentais foram os aspectos financeiros e militares da unificação africana. Num nível financeiro, os planos para a constituição de um Banco Central Africano (que criaria uma moeda africana única, o dinar, com lastro-ouro) ameaçariam gravemente a capacidade de EUA, Reino Unido e França para continuar a saquear o continente. Todo o comércio africano feito mediante o dinar-ouro implicaria, em última instância, que os países ocidentais teriam de pagar em ouro por recursos africanos que comprassem, não mais, como até agora, em libras, francos ou dólares que, bem feitas as contas, sempre podem ser impressos em papel podre.
As duas outras instituições financeiras previstas pela União Africana - o Banco Africano de Investimentos e o Fundo Monetário Africano - também comprometeriam fatalmente a capacidade de instituições como o Fundo Monetário Internacional para manipular as políticas econômicas dos países africanos mediante seu monopólio das finanças. Como o economista Jean-Paul Pougala mostrou, o Fundo Monetário Africano, com capital inicial previsto de $42 bilhões “rapidamente suplantará as atividades africanas do Fundo Monetário Internacional, o qual, com apenas $25 bilhões, conseguiu pôr de joelhos o continente inteiro e obrigou a África a engolir um processo muito questionável de privatizações, forçando os países africanos a converter-se em monopólios privados.”
Além desses desenvolvimentos fiscais potencialmente ameaçadores, houve também movimentos no front militar. A reunião de cúpula da União Africana em 2004 em Sirte, Líbia, decidiu elaborar uma Carta de Defesa e Segurança Comum Africana, que incluía um artigo que estipulava que “qualquer ataque contra um país africano é considerado ataque contra o continente como um todo” - copiada, de fato, da Carta da Otan. Em seguida, em 2010, foi criada uma Força Reserva Africana (FRA), com delegação para defender e fazer valer as definições da Carta de Defesa. Bem evidentemente, se a Otan tivesse de desmontar a unidade africana pela força das armas, quanto mais depressa agisse, melhor para a Otan.
Mas a constituição da Força de Reserva Africana representou, além de uma ameaça, também uma oportunidade. Embora houvesse, sem dúvida, a possibilidade de ela vir a ser força genuína para a independência, para resistir ao colonialismo e para defender a África contra a agressão imperialista, criava-se, simultaneamente, a possibilidade de, adequadamente manobrada e sob a liderança adequada, aquela mesma força converter-se em seu oposto - uma força para promover a subjugação colonial, ligada numa cadeia de comando ocidental. As apostas eram - e são - altíssimas.
Os preparativos militares dos ocidentais na África
O ocidente também já iniciara seus preparativos militares para a África. O declínio econômico do ocidente, além da ascensão da China, indicava que o ocidente já não poderia depender tão essencialmente da chantagem econômica e da manipulação financeira para manter o continente fraco e subjugado. Vendo claramente que isso implicava a necessidade crescente de ação militar para manter a dominação, documento publicado em 2002 pela Iniciativa Grupo de Política para o Petróleo Africano [orig. AfricanOilPolicyInitiativeGroup] recomendava que “um foco novo e vigoroso sobre a cooperação militar dos EUA na África subsaariana inclua o projeto de uma estrutura de comando militar subunificada que possa produzir dividendos significativos na proteção dos investimentos dos EUA.” Essa estrutura veio à luz em 2008, sob o nome de Comandos dos EUA na África, AFRICOM.
Contudo, os custos - econômicos, militares e políticos – da intervenção direta no Iraque e no Afeganistão (só o custo da guerra do Iraque já ultrapassa os US$ 3 trilhões) indicavam que o AFRICOM teria de depender basicamente de tropas locais, para o serviço de guerrear e morrer. O AFRICOM teria de ser o corpo que coordenaria (e coordenou) a subordinação de exércitos africanos presos a uma cadeia ocidental de comando. Isso, em outras palavras, converteu exércitos africanos em exércitos ocidentais ‘por procuração’.
O maior obstáculo a esse plano era a própria União Africana, que, em 2008, categoricamente rejeitou qualquer presença de militares dos EUA em solo africano, o que forçou o AFRICOM a instalar seu quartel-general em Stuttgart, Alemanha, humilhação para o presidente George W. Bush, que já anunciara, pessoalmente, sua intenção de implantar o AFRICOM em território africano. O pior viria em 2009, quando o então líder líbio MuammarKadafi – o mais empenhado inimigo das políticas imperialistas no continente – foi eleito para presidir a União Africana. Sob o comando de Kadafi, a Líbia já se convertera em principal mantenedora e financiadora da União Africana. Agora, o mesmo Kadafi propunha processo rápido de integração africana, que incluía a constituição de exército africano unificado, moeda única e passaporte único.
O destino de Kadafi já é de conhecimento público. Depois de montar a invasão da Líbia a partir de um pacote de mentiras ainda maior do que o que servira de pretexto para a invasão do Iraque, a Otan destruiu a Líbia, reduziu o país à condição de mais um estado africano falhado e facilitou a tortura e o assassinato de Kadafi. Assim se viu livre de seu principal opositor.
Naquele momento, tudo levava a crer que a União Africana teria sido domada. Três de seus membros – Nigéria, Gabão e África do Sul – votaram a favor da intervenção militar na Líbia, no Conselho de Segurança da ONU; e o novo presidente, Jean Ping, apressou-se a reconhecer o novo governo que a Otan impôs na Líbia e pôs-se a denegrir as realizações de Kadafi. Fez mais: proibiu a assembleia da União Africana de fazer um minuto de silêncio, depois do assassinato de Kadafi.
Mas esse quadro não durou. Os sul-africanos foram os primeiros a arrepender-se do apoio à intervenção; nos meses seguintes, o presidente Zuma e o ex-presidente ThaboMbeki fizeram sérias críticas à Otan. Zuma disse – com razão – que a Otan agira ilegalmente ao impedir o cessar fogo e as negociações que a Resolução da ONU exigia, já intermediados pela União Africana e com os quais Kadafi já concordara. Mbeki foi além: disse que o Conselho de Segurança da ONU, ao ignorar as propostas da União Africana, estava tratando “os povos da África com absoluto desprezo”, o que fez aumentar “a sanha das potências ocidentais para intervir em nosso continente, inclusive com força armada, para proteger os próprios interesses, sem considerar a posição dos próprios africanos.”
Experiente diplomata sul-africano, do Departamento de Relações Internacionais do Ministério de Relações Exteriores da África do Sul, disse que “muitos estados da Comunidade Sul Africana de Desenvolvimento [orig. Southern AfricanDevelopmentCommunity, SADC], sobretudo África do Sul, Zimbábue, Angola, Tanzânia, Namíbia e Zâmbia, que tiveram papel chave nas lutas de libertação sul-africanas, não estavam satisfeitos com o modo como Ping conduziu a questão do bombardeio da Líbia pelos jatos da Otan.” Em julho de 2012, Ping foi forçado a deixar a presidência da União Africana e foi substituído – com apoio de 37 estados africanos – por NkosazanaDlamini-Zuma, ex-ministra de Relações Exteriores da África do Sul, braço direito de Mbeki e, bem claramente, militante do campo oposto ao dos capitulacionistas de Ping. Mais uma vez, a União Africana estava sob comando de forças comprometidas com genuína independência.
O assassinato de Kadafi, porém, não tirou de campo apenas um poderoso membro da União Africana; removeu também o eixo em torno do qual girava todo o sistema de segurança regional na região do Sahel-Sahara. Usando cuidadosa e complexa mistura de força, projeto e desafio ideológico e negociação, a Líbia de Kadafi sempre foi a cabeça de um sistema de segurança transnacional que conseguira impedir que milícias salafistas se implantassem na região - como reconheceu, em 2008, o embaixador Christopher Stevens, dos EUA: “O governo da Líbia empreendeu operações agressivas para interromper o fluxo de combatentes estrangeiros, inclusive com monitoramento cerrado dos portos e aeroportos de entrada, e rechaçou o apelo ideológico do Islã radical (…). A Líbia coopera com estados vizinhos no Saara e Sahel, para conter o fluxo de combatentes extremistas e terroristas transnacionais. MuammarKadafi negociou recentemente um muito divulgado acordo com líderes tribais tuaregues da Líbia, Chade, Niger, Mali e Argélia, conseguindo que desistissem de suas aspirações separatistas e das práticas de contrabando (de armas e de extremistas transnacionais) em troca de assistência para o desenvolvimento dos seus países e apoio financeiro (…) Nossa avaliação é que o fluxo de combatentes estrangeiros da Líbia para o Iraque e o fluxo reverso de veteranos do Iraque para a Líbia diminuiu por causa da cooperação entre a Líbia e outros estados” - disse Stevens.
Essa “cooperação entre a Líbia e outros estados” refere-se à CEN-SAD (Communityof Sahel-SaharanStates / Comunidade de Estados Sahel-Saharianos), organização lançada por Kadafi em 1998 visando ao livre comércio, livre movimentação de pessoas e desenvolvimento regional de seus 23 estados-membros, mas com foco principal na segurança mútua e na paz. Além de conter a influência das milícias salafistas, a CEN-SAD desempenhou papel chave mediando conflitos entre Etiópia e Eritreia e na região do rio Mano; e negociou solução duradoura e sustentável para a rebelião no Chade. A CEN-SAD tinha sede em Trípoli e a Líbia, sem dúvida, era a principal força do grupo. De fato, o apoio da CEN-SAD foi fator determinante para a eleição de Kadafi à presidência da União Africana em 2009.
A própria eficácia desse sistema de segurança local foi um duplo golpe contra a hegemonia do ocidente na África: não apenas aproximou a África de uma condição de paz, na qual a prosperidade local tornava-se possível, como, também, simultaneamente, esvaziava o pretexto chave para todas as intervenções militares do ocidente no continente. Os EUA haviam criado uma sua ‘Parceria de ContraterrorismoTrans-Sahara’ [orig. ‘Trans-SaharaCounter-TerrorismPartnership’ (TSCTP)], mas, como MutassimKadafi (conselheiro de Segurança Nacional da Líbia) explicou à ex-secretária de Estado Hillary Clinton em Washington em 2009, a “Comunidade de Estados Sahel-saharianos (CEN-SAD) e a Força de Reserva tornam dispensável qualquer TSCTP.”
Enquanto Kadafi esteve no poder e comandou um efetivo e poderoso sistema de segurança regional, as milícias salafistas no Norte da África não podiam ser usadas como “terrível ameaça” para justificar invasões e ocupação pelo ocidente, para salvar os nativos desamparados. Ao conseguir fazer o que o ocidente diz desejar (mas, em todos os pontos, fracassa sempre) - neutralizar o “terrorismo islamista” – a Líbia tirou dos imperialistas um pretexto chave para todas as guerras que fizeram contra a África. Ao mesmo tempo, impediram que as milícias continuassem a desempenhar outra função histórica que sempre tiveram, servindo ao ocidente como força ‘alugada’, que agia por procuração, para desestabilizar estados seculares independentes, como Mark Curtis documentou em seu excelente Secret Affairs. O ocidente apoiou esquadrões da morte salafistas em campanhas para desestabilizar a URSS e a Iugoslávia, com grande sucesso; e planejava fazer o mesmo contra a Líbia e a Síria.
A África depois de Kadafi
Com a Otan trabalhando para fazer da Líbia estado falhado, esse sistema local foi destroçado. As milícias salafistas não receberam só equipamento militar ultra moderno, cortesia da Otan; receberam também carta branca para saquear os arsenais do governo líbio e um paraíso seguro a partir do qual organizar ataques por toda a região. As fronteiras entraram em colapso, com a aparente conivência do novo governo líbio e de seus patrocinadores na Otan – como registra um trágico relatório da empresa de segurança global Jamestown Foundation.
Segundo esse relatório, “Al-Wigh era importante base estratégica do regime Kadafi, localizada em região próxima das fronteiras com Niger, Chade e Argélia. Depois da queda de Kadafi, a base passou a ser controlada por combatentes da tribo Tubu, sob comando nominal do Exército Líbio, mas sob comando local de um comandante tubu, SharafeddineBarkaAzaiy, que reclamou que “durante a revolução, controlar essa base era assunto de máxima importância estratégica. Conseguimos ocupar a base. Agora nos sentimos abandonados. Não temos equipamento suficiente, nem viaturas nem armas para proteger a fronteira. Embora sejamos parte do exército nacional, ninguém nos paga soldo.”
O relatório conclui que “o Conselho de Governo Nacional Líbio (GNC) e o que havia antes dele, Conselho Nacional de Transição (TNC), falharam na segurança de importantes instalações militares no sul e permitiram que a segurança de vastas porções de fronteira no sul fossem de fato ‘privatizadas’ nas mãos de grupos tribais, conhecidos há muito tempo pela prática, ali tradicional, de contrabando. Isso, por sua vez, põe em risco a segurança da infraestrutura do petróleo líbio e a segurança das regiões vizinhas. Com a venda e o transporte de armas líbias já convertidos em mini-indústria na era pós-Kadafi, as imensas quantidades de dinheiro com que conta a Al-Qaeda no Maghreb Islâmico conseguem abrir muitas portas, em região empobrecida e subdesenvolvida. Ainda que a invasão francesa no norte do Mali consiga desalojar os militantes islamistas, nem assim haverá o que impeça os mesmos grupos de estabelecer novas bases nas áreas mal controladas do deserto selvagem no sul da Líbia. Enquanto não houver estruturas de segurança controladas por autoridade central na Líbia, o interior desse país continuará a ser ameaça de segurança para todas as demais nações na região.”
A vítima mais óbvia dessa desestabilização foi o Mali. Não há analista sério que não saiba que a tomada do Mali pelos ossalafistas é consequência direta da ação da Otan na Líbia. Um dos resultados do avanço da desestabilização promovida pela Otan no Mali é que a Argélia – que perdeu 200 mil cidadãos numa guerra civil contra os islamistas nos anos 1990 – está hoje cercada por milícias salafistas pesadamente armadas em duas fronteiras: ao leste (fronteira com a Líbia) e ao sul (fronteira com o Mali). Depois da destruição da Líbia e da derrubada de Hosni Mubarak no Egito, a Argélia é hoje o único estado do norte da África ainda governado pelo partido anticolonialista que conquistou a independência contra a tirania das forças coloniais europeias.
Esse postura de independência ainda está bem evidente na atitude da Argélia em relação à África e à Europa. No front africano, a Argélia é forte apoiadora da União Africana, contribuindo com 15% do orçamento da organização; e tem 16 bilhões de dólares empenhados na constituição do Fundo Monetário Africano, o que faz dela o maior contribuinte do FMA. E nas relações com a Europa, a Argélia tem-se recusado repetidamente a fazer o papel de nação subordinada que a Europa espera dela. Argélia e Síria foram os dois únicos países da Liga Árabe que votaram contra o bombardeio da Otan contra a Líbia e a Síria. E, como se sabe, a Argélia deu abrigo a membros da família Kadafi que fugiam de ser massacrados pela Otan.
Mas, do ponto de vista dos estrategistas europeus, muito mais preocupante que tudo isso é, provavelmente, que a Argélia – com o Irã e a Venezuela – constituem o que eles chamam de uma “[Organização dos Países Produtores de Petróleo] OPEC linha dura”, empenhados em vender caro o acesso aos seus recursos nacionais. Como se lia recentemente em furibundo artigo publicado no London Financial Times, “o nacionalismo dos recursos” impera. Resultado disso, “as Grandes do Petróleo padecem muitas dificuldades na Argélia; as empresas reclamam da burocracia que as esmaga, dos controles fiscais duríssimos e do comportamento abusivo da Sonatrach, a empresa estatal de energia, que participa de quase todos os contratos de petróleo e gás.” Na sequência, o artigo observa que a Argélia implementou “um controverso imposto monstro” em 2006, e cita um executivo de petroleira ocidental em Argel, que disse que “as empresas [de petróleo] estão fartas da Argélia.”
É instrutivo observar que o mesmo jornal também acusou a Líbia de “nacionalismo dos recursos” - ao que parece, o crime mais hediondo, na avaliação daqueles leitores -, apenas um ano antes da invasão da Otan.
Evidentemente, “nacionalismo dos recursos” significa precisamente que os recursos de uma nação sejam usados, em primeiro lugar, para promover o desenvolvimento em benefício da própria nação, não em benefício de empresas estrangeiras e, nesse sentido, a Argélia bem merece a ‘acusação’. A Argélia exporta mais de cerca de $70 bilhões em petróleo por ano, e muito desse dinheiro tem sido usado em investimentos massivos em moradia e saúde pública, além de um financiamento recente de $23 bilhões, num programa de estímulo para pequenos comerciantes. De fato, esses altos níveis de investimentos sociais são considerados por muitos como a principal razão pela qual não se viram levantes da “Primavera Árabe” na Argélia, em anos recentes.
A mesma tendência de “nacionalismo dos recursos” também aparece anotada em recente material distribuído por STRATFOR, empresa de inteligência global, que escreveu que “a participação estrangeira na Argélia sofreu, em larga medida, por causa de políticas protecionistas aplicadas pelo governo militar fortemente nacionalista.” Seria evento particularmente preocupante, diz STRATFOR, em momento em que a Europa aproxima-se de situação em que se tornará muito mais dependente do gás argelino, com as reservas no Mar do Norte em processo de esgotamento. “Desenvolver a Argélia como grande exportador de gás natural é imperativo econômico e estratégico para os países da União Europeia, em momento em que a produção da commodity entra em declínio terminal na próxima década. A Argélia já é importante fornecedor de energia para o continente, mas a Europa precisará de acesso expandido àquele gás natural, para suprir o declínio de suas reservas indígenas” – diz STRATFOR.
Os planos das Grandes do Petróleo para a África
Prevê-se que as reservas britânicas e holandesas de gás no Mar do Norte estarão esgotadas no final dessa década; e que as da Noruega entrarão em acentuado declínio a partir de 2015. Com a Europa temerosa de tornar-se superdependente do gás da Rússia e da Ásia, o relatório anota que a Argélia - com reservas de gás natural estimadas em 4,5 trilhões de metros cúbicos, e reservas de gás de xisto de 17 trilhões de metros cúbicos – tornar-se-á fornecedora essencial. Mas o maior obstáculo para que a Europa controle esses recursos ainda é o governo da Argélia – com suas “políticas protecionistas” e seu “nacionalismo dos recursos”.
Sem dizê-lo abertamente, o relatório conclui sugerindo que uma Argélia desestabilizada e convertida em “estado falido” seria sempre preferível a uma Argélia sob governo “protecionista”. E sugere que “o envolvimento que se vê hoje das majors de energia da União Europeia em países de alto risco, como Nigéria, Líbia, Iêmen e Iraque, indica saudável tolerância à instabilidade e a problemas de segurança.”
Em outras palavras: em tempos de segurança privada, o BigOil já não carece de estabilidade ou da proteção do estado para seus investimentos. Zonas de desastre são toleráveis. Intoleráveis, só estados fortes e independentes.
Já aparece, portanto, no radar dos interesses estratégicos da segurança energética do ocidente, uma Argélia reduzida a estado falhado, exatamente como o Iraque, o Afeganistão e a Líbia um dia apareceram no mesmo radar.
Com isso em mente, é fácil ver como a política aparentemente contraditória de armar milícias salafistas num primeiro momento (na Líbia) e imediatamente depois passar a bombardeá-las (no Mali) faz, de fato, perfeito sentido. A missão francesa de bombardeio visa, nas próprias palavras dos franceses, à “total reconquista” do Mali. Na prática, implica empurrar os rebeldes gradualmente para o norte do país. Quer dizer: diretamente para a Argélia.
Vê-se afinal que a deliberada destruição do sistema de segurança que a Líbia coordenava em toda a região do Sahel-Sahara trouxe vastos benefícios para os que contam com que a África permaneça presa no papel de fornecedora subdesenvolvida de matéria prima barata. O processo já armou, treinou e assegurou território para milícias que, em seguida, serão usadas na destruição da Argélia - o único grande estado rico em recursos naturais do norte da África ainda empenhado numa genuína unidade africana, com independência. A operação também persuadiu alguns africanos de que - diferente da rejeição unânime contra o AFRICOM, há pouco tempo - eles realmente precisam, hoje, de que o ocidente os “proteja” daquelas milícias.
Como a clássica venda de proteção à moda das máfias, o ocidente cuida de tornar sua proteção “necessária”: arma e atiça ele mesmo as forças contra as quais, adiante, as pessoas terão de ser protegidas.
Agora, a França está ocupando o Mali; os EUA estão montando uma nova base de drones no Niger; e o primeiro-ministro britânico David Cameron fala de seu compromisso com uma nova “guerra ao terror” que se alastrou sobre seis países e durará décadas.
Mas nem tudo caminha bem, no front imperialista. Longe disso, porque o ocidente, sem dúvida alguma, contava com não ter de mobilizar seus próprios soldados. O objetivo inicial era sugar a Argélia e colhê-la exatamente na mesma armadilha já usada com sucesso contra a União Soviética nos anos 1980 – exemplo anterior de Reino Unido e EUA, patrocinando violenta insurgência sectária nas fronteiras do território inimigo, para atrair o inimigo-alvo para guerra destrutiva de retaliação. A guerra da URSS no Afeganistão, no final, não apenas fracassou: ela também, no processo, destruiu a moral e a economia do país e foi fator chave por trás da autodestruição do estado soviético em 1991.
Mas a armadilha para pegar a Argélia não funcionou. A jogada de Clinton e François Hollande, fazendo a cena do ‘policial bonzinho’ e ‘policial durão’ – uma “pressionando para a ação” em Argel, em outubro; e as ameaças dos franceses, dois meses depois – deu em nada.
Simultaneamente, em vez de se manterem fiéis ao roteiro, os imprevisíveis salafistas, na função de simulacros locais do ocidente, optaram por expandir sua base no norte do Mali, não na direção da Argélia, como previsto, mas para o sul, rumo a Bamako, ameaçando desestabilizar um regime aliado do ocidente, ali instalado, por golpe, menos de um ano antes. Os franceses foram obrigados a intervir, para mandar os salafistas de volta para o norte, de volta contra o estado que, desde o início, deveria ter sido seu alvo real.
Até aqui, essa invasão parece contar com certo nível de apoio entre os africanos que temem os salafistas simulacros do Ocidente, ainda mais do que temem os próprios soldados ocidentais. Mas, à medida que a ocupação se aprofunde, desconstruindo a credibilidade dos salafistas e ultrapassando-os em número de soldados ocupantes, ao mesmo tempo em que se for conhecendo a brutalidade dos ocupantes e de seus aliados… então, veremos. Veremos quanto tempo durará tudo isso.
(*no Al-AhramWeekly, 26.02.2013)

http://www.odiario.info/?p=2813


 Fonte Redecastorphoto. Traduzido pelo Coletivo de Tradutores da Vila Vudu

sábado, março 30, 2013

Banco Central Europeu: o enrascanço e a defesa secreta

     

por Yéti
E ainda há a 'exposição' do BCE. Todos para os abrigos! Reina o pânico no Banco Central Europeu dirigido por Mario Draghi, homem de confiança como todos sabem ou deveriam saber, do tristemente célebre Goldman Sachs. Assim, os sitiados levantam as barricadas para salvar seus cofres em perigo. Dois elementos novos acabam de confirmar esta impressão, um revelado pelo alemão Deutsche Wirtschaftsnachrichten e o outro pela Mediapart .

Eis o que é esta embrulhada

As Deutsche Wirtschaftsnachrichten (Notícias económicas do outro lado do Reno) acabam de dar um esclarecimento sábio sobre os subterrâneos do plano de "salvamento" de Chipre pelo BCE.

Ao contrário do que se passara com o desconto dos empréstimos gregos, o das obrigações cipriotas era muito simplesmente impossível pois estas estavam ligadas a garantias finais pelo BCE. O BCE estava ainda mais preso na armadilha do embaraço cipriota!

Com a bancarrota dos bancos cipriotas, o próprio BCE teria perdido uns 12 mil milhões de euros e teria desencadeado um sistema automático de transferência imediata equivalente ( Target 2 ) da parte dos países membros, em verdadeiro dinheiro sonante e vivo. Três mil milhões a serem desembolsados só pela Alemanha da sra. Merkel.

Compreende-se melhor o encarniçamento da Troika e, mais precisamente de Mario Draghi, em "salvar" custe o que custar o que podia restar do edifício bancário cipriota. Ela deixa pulverizar o tabu da inviolabilidade superior dos credores e dos accionistas. E deixa violar as próprias regras da UE em matéria de liberdade de circulação de capitais.

Compreende-se também que nossos patifes de Bruxelas a vociferarem não possam mais deixar cair o euro sob pena de ver seus protegidos de credores perderem drasticamente todas as dívidas emitidas sob um Target 2. Deutsche Wirtschaftsnachrichten :
"Visto sob este ângulo, o saqueio organizado dos bancos cipriotas é o que há de menos grave. Draghi e os salvadores do euro não se batem pelo salvamento de Chipre, eles batem-se pela sua própria sobrevivência".
O BCE sob a protecção... da defesa secreta!

Mediapart, decididamente o único media francês de investigação que se respeita, acaba de levantar um outro faisão sintomático do pânico que se apoderou dos nossos oligarcas de Bruxelas e Frankfurt.

O Tribunal de Justiça Europeu acaba de voar em socorro do BCE concedendo-lhe o benefício... da defesa secreta ! O que isenta a fortaleza do sr. M. Draghi, já fora de todo controle democrático, de prestar contas do que comete se assim quiser.

Algo que cai perfeitamente bem quando se sabe que esta decisão faz sequência a um pedido de documentos da agência Bloomberg no sentido de saber como a Goldman Sachs – onde oficiava um certo Mario Draghi – havia podido depenar a Grécia fazendo explodir sua taxa de endividamento. Martine Orange (Mediapart):
"Quando o BCE viu o pedido destes documentos, recusou-se alegando que estavam ultrapassados. O embaraço das instâncias europeias era tanto mais manifesto pois o assunto punha em causa o seu controle, a responsabilidade da Goldman Sachs e fazia suspeitar de Mario Draghi".
Como se vê, os caranguejos defendem com unhas e pinças os seus haveres e estão prontos para tudo, absolutamente tudo, a fim de não acabar no tribunal-caldeirão de uma justiça popular que não poderiam roubar. Não é só no frígido norte da Islândia que há bandidos, de difícil inocência presumível devido à perversão intrínseca do sistema a que servem, que neste momento estão inquietos .

Mas perfilam-se em 2014 eleições que darão ampla oportunidade oara por esta roupa suja em cima da mesa. E, quem sabe, de aproveitar para chutar alguns trazeiros.
27/Março/2013

O original encontra-se em http://yetiblog.org/index.php?post/bce-sauve-qui-peut

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
29/Mar/13

José Pacheco Pereira - Por que não saímos da cepa torta

 Por que não saímos da cepa torta

Não há melhor exemplo da miséria da nossa vida pública, na sua versão mediática, do que o facto de José Sócrates ser a sua figura dominante num dia só, quanto mais por meia dúzia de dias. Isso, sim, é que é revelador e preocupante, não a figura do antigo primeiro-ministro, ou, acima de tudo, o que ele disse ou possa vir a dizer, e muito menos a sua putativa futura vida política, que, qualquer pessoa com um mínimo de bom senso e conhecimento da realidade sabe que, se passar pelo voto, tão cedo não existe. Mas a cerimónia colectiva de incomodidade e embasbacamento com a entrevista, essa sim, é um péssimo sinal da anomia dos nossos tempos e das fortes correntes de nostalgia e radicalismo que a atravessam.

Tudo isso explica o “efeito Sócrates”, tão intenso quanto é nula a importância do que disse, um da série de obsessões, mentiras e falsificações de números, estatísticas e factos, que tiveram um papel muito relevante no agravamento da crise do país e em colocá-lo numa situação de bancarrota. Sim, porque, com mais ou menos “narrativa”, a acção de Sócrates como primeiro-ministro conduziu o país a um abismo. E sobre isso não se soube nada de novo. Pior: confirmaram-se todas as suspeitas do que ele nos tinha feito e continua capaz de fazer.

Se o fez por ser um “animal feroz”, ou por ter aquela determinação cega que ninguém lhe nega e tão evidente foi na entrevista, eu ainda me preocupo mais, porque o teor autoritário e dominador da personagem junto dos espíritos fracos foi uma razão do seu sucesso político. Se ser “animal feroz” foi ou é qualidade, então essa qualidade serviu para nos atirar a todos para uma crise maior e sem fim, quando podia ser bem mais pequena e moderada nos seus efeitos. O radicalismo que a reacção a Sócrates revela numa parte da opinião pública e publicada, poderia ser a descoberta do populista salvífico que muitos esperam, se não fosse tão viva a memória das suas malfeitorias. É porque não quero que essa memória se esvaia, na fácil máquina de esquecimento que é a comunicação social, que também aqui o trato como assunto, porque o mal que ele traz alimenta-se do silêncio, não da fala.

Este homem foi um perigo, ajudou, e muito, a afundar-nos colectivamente, e seria hoje de novo um perigo, se não houvesse tão recente e viva memória dos seus “feitos”. Mas o que é interessante é perceber que dele não nos defenderam muitos dos iluminados da nossa praça, à direita e à esquerda, como agora também não seriam capaz de o fazer. A razão por que me preocupa a reacção à entrevista é esta: este homem seria o populista ideal, e muita gente abre-lhe alas, apenas porque ele fala alto e grosso, num mundo em que Seguro é o que é e Passos e Relvas são que são e não suscitam nem temor, nem entusiasmo. Apenas tédio e preocupação.

Quando falei da nostalgia que alimenta esta reacção à entrevista foi disso mesmo: a direita precisa de um inimigo e trata-o como a quinta-essência das malfeitorias da esquerda, coisa a que nunca pertenceu, porque precisa de encontrar identidade pela construção de um adversário. Sócrates é o adversário ideal, e é por isso que foi com a sua colaboração e assentimento que o Governo lhe abriu as portas da “sua” televisão. Para além disso, calcula que, por muito que possa vir a ser atingido por um ou outro remoque certeiro, Sócrates será um problema essencialmente para o PS. Os estragos que Sócrates possa vir a fazer ao Governo serão sempre entendidos como danos colaterais, aceitáveis pela enorme vantagem de ele impedir, pela sua mera existência semanal na televisão, a consolidação da liderança de Seguro. Por outro lado, a vendetta pessoal de Sócrates contra Cavaco é também bem-vinda, porque, para o grupo à volta de Passos Coelho, Relvas, Menezes e Ângelo, colocar o Presidente na ordem é uma necessidade estratégica. E pensa, e bem, que não será possível a Sócrates no seu comentário escapar à “síndroma” de Santana Lopes em que qualquer coisa discutida em 2013 vai dar, por volta da terceira frase, à incubadora, ou, no caso de Sócrates, aos eventos de 2011 e à contínua autojustificação de tudo pela traição alheia.

O mesmo fenómeno de nostalgia e radicalização existe à esquerda. A esquerda, principalmente a que está órfã no PS de Seguro, enfileira atrás daquilo que pensa ser um cabo de guerra a sério e não de um clone com falinhas mansas. Há demasiada orfandade na actual “oferta ”política para deixar um lugar para Sócrates e ele ocupa-o não porque queira o lugar de Seguro, mas também porque, para ele, as dificuldades de Seguro serão a sua versão dos danos colaterais. O “animal feroz” para “tomar a palavra”, que nele significa o mesmo que “tomar um castelo”, sabe que prejudica Seguro, mas é suficientemente obcecado com a sua pessoa e a sua missão para não se preocupar com isso.

A comunicação social, com quem Sócrates manteve uma relação muito próxima até ao momento em que iniciou a sua queda, quando, à maneira portuguesa, todos os que lhe apararam o jogo, o começaram a calcar com a mesma veemência com que o adulavam, gosta de festa e Sócrates dá-lhes festa. Este homem que, como Relvas, mas com muito mais poder e cumplicidades, usou todos os meios ao seu alcance para afastar os jornalistas que se lhe opunham e punir todos os que o afrontavam, volta hoje a ser tratado com a mesma complacência com que se aceitavam sem questionar os seus anúncios propagandísticos e sua contínua manipulação dos factos e estatísticas. O modo como se menoriza o próprio conteúdo da sua entrevista — insisto um sem novidades de tudo aquilo que andou a dizer em 2010-11 —, em detrimento do folclore do seu “efeito”, mostra isso mesmo.

A história da “narrativa” é reveladora. Sócrates apresentou-se como pretendendo combater a “narrativa” que a direita fazia da sua governação e queda, opondo-lhe a sua própria “narrativa”. Esta história das “narrativas”, um modismo para designar uma construção ficcional de eventos, preso exactamente pelo fio da narrativa, é atractiva porque procede a uma selecção de factos, moldados pela sequência cronológica escolhida, que pode não ser a que aconteceu, e pela eliminação dos “factos-problema”, que podiam prejudicar a clareza ficcional da história. Na sua “narrativa”, Sócrates coloca o seu principal motor interior, a sua vontade, cuja determinação varreu com tudo, bom senso, estudo, conhecimento, verdade, atenção ao real, custos, condições, tudo. E levou-nos ao que se sabe.

É, no fundo, um argumentário político, que pode ter uma maior ou menor aproximação à realidade ou à ideologia, e que serve como discurso de justificação, mas não é, nem foi, o que aconteceu, não é a realidade, nem a verdade. Não foi o que aconteceu nem na “narrativa” contra Sócrates, nem na do próprio Sócrates. Mas a escolha por Sócrates desta figura da “narrativa” mostra como, para ele, os factos contam pouco, mas sim o conflito mediático entre interpretações, o que é consistente com a recusa que sempre teve da palavra “verdade” no vocabulário político. Ele não diz “no que aconteceu”, mas sim “na narrativa do que aconteceu”. Há quem ache que isto é que é a essência do “discurso político”, a moldagem da realidade pela vontade política. Sócrates era desta escola, uma variante mais animada do que a moldagem da realidade pelas folhas de Excel, mas em ambos os casos com efeitos desastrosos.

Aliás, Sócrates deu muito poucos factos, e os que deu estão manchados, por serem falsos (a escolha de números e estatísticas manipuladas, uma sua pecha de sempre) ou poderem ter uma outra leitura e interpretação. Por exemplo, a aprovação do PEC IV, com o apoio europeu (desvalorizado na “narrativa” da direita), que tipo de ajudas garantia para Portugal? Desconhece-se. Essas ajudas poderiam sobreviver à crise grega e à subida exponencial dos juros nos mercados, sem darem origem a um qualquer “plano de resgate”? Duvido. Por aí adiante. Como é que se poderia manter um primeiro-ministro que, no momento em que mais precisava de alargar a sua base de apoio, à frente de um Governo minoritário, hostilizava tudo e todos? Por aí adiante. Nada foi verdadeiramente explicado na sua “narrativa”, que, no essencial, nos mostrou o mesmo homem que nada aprende, nada esquece, e cuja vaidade e vontade varrem tudo à frente.

Não foi a entrevista que foi interessante. Foi o seu efeito. O sucesso do retorno de Sócrates não é o sucesso do governante de 2005-2011, nem a sua reabilitação, mas o sucesso do populismo e da orfandade do país político de 2013. Faz uma diferença. Faz toda a diferença. 
 

quinta-feira, março 28, 2013

PEC IV TODA A VERDADE PEC IV

PEC IV TODA A VERDADE PEC IV – março de 2011 Medidas adicionais para 2011:
  • Corte total de 1360 milhões; saúde – 85 milhões; SEE -170 milhões; AP, incluindo FSA -170 milhões; segurança social -170 milhões; despesa de capital (investimento público) 595 milhões.
  • Saúde – redução de custos com medicamentos, sendo que o balanço do ano de 2011 se traduziu de facto numa redução da despesa do Estado em 19,2% mas em paralelo num aumento de 9,3%, isto é mais 66 milhões de euros, de despesa para os utentes.
  • Corte despesa SEE em 15%. Traduziu-se por exemplo em aumentos médios que segundo o Governo eram de 15%, mas que em muitos casos de passes e outros títulos de transportes muito utilizados chegou aos 20 ou 25%.
  • Corte nos serviços públicos (administração direta e SFA – exceto SNS, CGA e ensino superior)
  • Corte no investimento público, designadamente escolas, equipamentos coletivos e infra estruturas de transportes em 400 milhões de euros
  • Aumento de receitas com concessões do jogo, comunicações e energia e também venda de património
Para 2012 e 2013 em concreto quadro II.2, página 15 e seguintes
Despesa:
  • Redução da despesa em pensões 425 milhões de euros em 2012
  • Redução de custos com medicamentos e subsistemas públicos de saúde 510 milhões em 2012 e 170 milhões em 2013, dos quais: acordo com a Apifarma de redução de 140 milhões em 2012 de que não se sabe exatamente o resultado, sabendo-se contudo do já referido aumento dos custos com medicamentos para os utentes em 66 milhões de euros; corte nos hospitais públicos de 5% em 2012 e 4% em 2013; corte na saúde dos trabalhadores da administração pública (ADSE e outros) de 170 milhões; agregação em centros hospitalares e agrupamentos de centros de saúde, corte de 10 milhões em 2012 e 20 milhões de 2013.
  • Encerramento de escolas e outros cortes na educação, incluindo mega agrupamentos – redução de 340 milhões em 2012 e 170 milhões em 2013.
  • Outros cortes na administração pública (“consumos intermédios”) 340 milhões em 2012 e 170 milhões em 2013, incluindo por exemplo “racionalização da rede de tribunais”, isto é, encerramento de tribunais equivalente ao corte de 60 milhões em 2012 e 2013.
  • “Controlo da atribuição das prestações sociais”, isto é, agravamento da aplicação da condição de recursos nas prestações sociais, restrições ao acesso ao subsídio de desemprego e de doença, congelamento até 2013 do IAS com consequência em todas as prestações que lhe estão indexadas e em paralelo aumento de cobrança de contribuições aos trabalhadores no valor de 340 milhões em 2013.
  • Reduções no SEE, designadamente indemnizações compensatórias (por exemplo no serviço público de rádio e televisão), planos de investimentos e custos operacionais (por exemplo investimentos em escolas, outros equipamentos e infraestruturas de transportes) 595 milhões em 2012 e 170 milhões em 2013.
  • Corte regiões autónomas e autarquias 170 milhões em 2012.
Receitas:
  • Redução das deduções e benefícios em IRS, isto é, aumento deste imposto, com aumento de receita (em conjunto com alterações ao IRC) de mais 680 milhões em 2012 e 170 milhões em 2013.
  • Aumento do IRS para reformados e pensionistas (nivelamento por baixo da dedução específica) em 255 milhões de euros a partir de 2012.
  • Alteração de taxas do IVA (“progressiva simplificação”) com um aumento de cobrança de receitas de 170 milhões em 2012 e 510 milhões em 2013.
  • Aumento de outros impostos sobre o consumo em mais 255 milhões em 2012.
Entretanto o PEC IV vangloria-se de medidas já em curso (“reformas estruturais”) como a chamada “melhoria da flexibilidade e adaptabilidade do mercado de trabalho com uma revisão da legislação laboral que teve importantes reflexos, por exemplo, no indicador de flexibilidade do mercado de trabalho construído pela OCDE”. Trata-se afinal da conhecida revisão para pior, pela mão de Vieira da Silva, do código de Bagão Felix. Aliás com o PS tivemos: o fim do princípio do tratamento mais favorável; uma ainda maior generalização da precariedade por exemplo com um novo contrato de trabalho intermitente; a alteração do período experimental para 180 dias (depois declarada inconstitucional); a desregulamentação dos horários de trabalho com os bancos de horas, as adaptabilidades e medidas afins; facilitação do processo de despedimento e diminuição dos recursos de defesa dos trabalhadores; o ataque à contratação coletiva com a caducidade dos contratos; o ataque à liberdade de organização sindical e ao direito à greve, designadamente com a tentativa de instituição abusiva de regras de serviços mínimos.
Facto significativo também é o compromisso com a “antecipação do programa de privatização” face ao PEC III, prevendo-se um valor de 2184, 2255 e 1145 milhões respetivamente em 2011, 2012 e 2013.

terça-feira, março 26, 2013

Desemprego na França deve chegar a cifra recorde

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26 de Março de 2013 - 9h22         

O ministério do Trabalho da França publicará nesta terça-feira (26) as estatísticas de desemprego correspondentes a fevereiro, que segundo os prognósticos serão elevadas pelo vigésimo segundo mês consecutivo, e podem romper o recorde histórico. 


Até agora a cifra mais alta de desempregados foi registrada em 1997, quando o fenômeno alcançou 3,195 milhões de pessoas.

Essa quantidade, entretanto, poderia continuar rebaixada nesta terça quando a agência estatal
Pôle Emploi publicar os novos dados oficiais.

Segundo Erick Heyer, do Observatório Francês de Conjunturas Econômicas, o flagelo afeta praticamente todos os setores laborais do país, inclusive jovens com boa preparação.

A indústria segue sendo a atividade onde mais desemprego é gerado, indicou Heyer, mas paulatinamente a situação estende-se pelos demais ramos da economia, em boa medida pelos programas de austeridade aplicados na França e em outros países da Europa.

Nesta semana foram dadas novas más notícias neste sentido, quando a empresa produtora de PVC Kem One anunciou que apresentará uma declaração de insolvência ante as autoridades, um passo prévio para sua colocação sob a supervisão judicial e posterior encerramento.

Ao menos 1.300 trabalhadores perderão seus postos nas cinco fábricas desta empresa instaladas em diversos lugares do território francês.

Kem One, do estadunidense Gary Klesch, é herdeira da indústria química Arkema, mas desde seu arranque há oito meses sofre graves perdas devido sobretudo, segundo os sindicatos, aos escuros manejos financeiros de seu proprietário.

A fabricante francês de móveis Cauval Industrie também será posta em liquidação ao vencer na véspera o prazo outorgado pelos tribunais para achar um eventual comprador.

Ao menos 400 trabalhadores deste grupo ficarão cessantes a partir de 8 de abril, data fixada para executar o fechamento e colocar à venda todos os ativos da firma.

Ante o incremento constante do desemprego, o primeiro-ministro gaulês, Jean-Marc Ayrault, anunciou a contratação de 2.000 novos conselheiros para fortalecer o trabalho de Pôle Emploi, cujo objetivo é ajudar as pessoas desempregadas a buscar um posto.

Esta quinta-feira (28) o presidente François Hollande dirigirá uma mensagem à nação, em que se espera que abordará o tema do desemprego e as medidas do governo para contê-lo.

Fonte: Prensa Latina
Tradução da redação do Vermelho

segunda-feira, março 25, 2013

Raquel Varela - 25 de Abril: Revolução ou Transição?

 

25 de Abril: Revolução ou Transição?

Por ocasião do bicentenário da revolução francesa uma polémica marcou a historiografia mundial. No debate destacou-se François Furet que na obra Pensando a Revolução Francesa[1], caracterizava a revolução de 1789 como um «acidente histórico» e procurava separar o processo iniciado em 1789 das revoluções posteriores, sobretudo da russa de 1917. Do outro lado da controvérsia, Eric Hobsbawm publicou uma série de ensaios, reunidos na obra Ecos da Marselhesa[2], onde defendia que a posição de François Furet e de outros historiadores com esta visão resultava de pressões ideológicas (no sentido de falsa consciência) revisionistas e não de uma investigação renovada da revolução francesa: «(…) O revisionismo na história da Revolução Francesa é, simplesmente, um aspecto de um revisionismo muito maior sobre o processo do desenvolvimento ocidental – e mais tarde global – na era do capitalismo e em seu interior (…)»[3].
Uma polémica semelhante deu-se em Portugal quase 15 anos depois, também a propósito de um aniversário, o trigésimo da revolução portuguesa, em Abril de 2004. Embora já houvesse uma discussão em torno da caracterização da mudança de regime – Medeiros Ferreira, por exemplo, discute a questão no texto «25 de Abril, uma revolução?»[4] –, é a partir de 2004 que a questão se avoluma. No seguimento da escolha do cartaz oficial comemorativo para a celebração ter a inscrição «Abril é Evolução», uma polémica chegou às páginas dos jornais sobre o que tinha sido a revolução portuguesa. O debate rapidamente se centrou na questão sobre que deveria ser salientado em Portugal depois do fim da ditadura: a revolução ou a evolução do País no período pós-revolucionário.

António Costa Pinto, na altura comissário para as comemorações dos 30 anos do 25 de Abril, escreveu no calor da polémica que: «No panorama habitualmente morno das comemorações de datas históricas, algumas dimensões das celebrações dos 30 anos do 25 de Abril provocaram pelo menos um esboço de debate. O trogloditismo saudosista, com a excepção dos escassos defensores de uma história ao serviço da ‘revolução hoje e sempre’, teve escassa visibilidade. (…) Comemorar os 30 anos de evolução para a democracia e o desenvolvimento que se seguiu à Revolução de 1974 não agradou a uma parte da esquerda, o que é natural. Ver o centro-direita de cravos a comemorar o 25 de Abril foi-lhe desagradável»[5]. O historiador Fernando Rosas criticou o envolvimento de António Costa Pinto naquilo que considerou ser uma «pseudocientificidade»: «Abril não foi evolução porque as direitas portuguesas foram historicamente incapazes de realizar um processo de transição, isto é, de levar a cabo, a partir do próprio regime, um processo endógeno e sustentado de reformas»[6]. Outros cientistas sociais, como António Borges Coelho, Manuel Villaverde Cabral e Luís Salgado de Matos, envolveram-se no debate[7].
Hoje, o termo revolução convive, na academia, para designar exactamente o mesmo período, com termos como «transição», «processo de democratização» ou ainda «normalização democrática», «transição por ruptura». Cientistas sociais e historiadores de inspiração marxista que estudaram a revolução portuguesa, como Loren Goldner, Valério Arcary ou John Hammond, não questionam o termo revolução e contra-revolução, embora controvertam se se tratou de uma situação revolucionária ou pré-revolucionária e qual o grau de radicalização da mesma[8]. Mas mesmo fora do campo do marxismo muitas obras mantiveram o uso do conceito de revolução e contra-revolução, como é o caso dos estudos de Boaventura Sousa Santos e Medeiros Ferreira[9]; e/ou distinguiram claramente o período da revolução (1974-75) do período de transição para a democracia, que se inicia em 1976, como nas obras de João Medina e Fernando Rosas[10]. Outros autores, porém, usam indiferentemente os dois conceitos. Josep Sanchez Cervelló em «O Processo democrático português 1974-75»[11], Maria Inácia Rezola em Os Militares na Revolução de Abril. O Conselho da Revolução e a Transição para a Democracia em Portugal (1974-76)[12] e Tiago Moreira de Sá em Carlucci vs. Kissinger[13] usam indistintamente, para falar do mesmo período, o termo revolução e transição. É na área da ciência política que se destacam os trabalhos que tendem a usar exclusivamente o conceito de «transição» para a mudança de regime ocorrida em Portugal, tendo como influências determinantes as obras de Philippe Schmitter[14] e António Costa Pinto[15].
Na verdade, dificilmente se pode afirmar que em todos os casos os termos são usados tendo por base uma discussão teórica prévia e uma opção científica teórico-metodológica, desde logo porque o debate teórico entre a historiografia portuguesa é amiúde desprezado. Mas a indefinição terminológica tem consequências epistemológicas. A polémica é incontornável porque revela, mais do que um conceito, uma visão histórica sobre o que é uma revolução, os seus sujeitos, as suas consequências, os seus derrotados e vencedores.
Em primeiro lugar, o conceito de revolução tem um significado histórico que podemos e devemos debater, mas que de forma alguma se confunde com uma visão teleológica que associa uma mudança de regime revolucionária à consolidação de um regime democrático liberal. O período após a década de 70 do século XX viu surgir no Mundo uma vaga de novos regimes de democracia representativa que inspiraram um paradigma na ciência política, de tradição fortemente ligada ao pensamento liberal, como argumenta Ronald Chilcote[16], que é simultaneamente teleológico – as sociedades caminhariam inevitavelmente para um tipo de regime, a democracia liberal – e ideológico – na medida em que todas essas análises, como assinala Matheus Silva, ou propõem «o aprofundamento do modelo neoliberal como forma de solucionar os problemas da democracia contemporânea» ou procuram a «melhoria da democracia dentro do âmbito da democracia liberal actualmente existentes»[17].
Esta análise tem sido alvo de críticas mesmo em Espanha, o modelo deste paradigma, onde a mudança de regime se deu por negociação entre a classe dominante e as direcções das organizações operárias e de trabalhadores (PCE, PSOE, CCOO). Encarnación Lemus por exemplo, lembra que a democracia não era o desenlace obrigatório da luta política e social que ocorreu em Espanha em 1975: «Por um lado, em 1975, o socialismo como princípio ideológico e como sistema social não estava desautorizado; a via socialista estava a ser tentada em Portugal; por outro lado, ainda existia o Governo republicano no exílio, que reclamava a legalidade, e os partidos da oposição, tanto os socialistas como o PCE, eram republicanos»[18]. Carlos Taibo escreve que «boa parte da literatura sobre transições «não se limita a analisar as transições, mas agrega a estas um destino final desejado: a democracia»[19]. Com um efeito a jusante, que é o próprio estudo das democratizações estar inquinado por visões que desprezam as variáveis sociais, como lembra o cientista político Gabriel Vitullo: «A necessidade de resgatar e dar maior atenção às variáveis estritamente políticas – antes não tidas em conta – não pode autorizar que a democratização seja vista apenas como o resultado de uma eleição ou opção estratégica das elites dirigentes, omitindo o restante da sociedade, os sectores populares e a própria história, como fica manifesto na colectânea de Higley e Gunther (1992)[20], cujo objectivo primordial parece ser o de adoptar o compromisso das elites como pré-condição fundamental para a consolidação da democracia. Como criteriosamente argumenta Bunce (2000, p. 635)[21], ficar nesse único plano de análise implica dizer que são as elites e não a sociedade, a política e não a economia, os processos internos e não as influências internacionais, os que constituem os factores cruciais da democratização e que, portanto, agregaríamos, a democracia pode ser confeccionada ou desmontada de acordo com as opções ou decisões tomadas por um reduzido grupo de lideranças políticas»[22].
A democracia, nos termos em que se consolidou em Portugal, foi o resultado da luta de classes, da revolução e da contra-revolução, mas não foi o seu resultado inevitável, o que pode legitimamente ser deduzido dos estudos que analisam as transições para a democracia na Europa do Sul. Poder-se-á ponderar, no caso português, os factores que pendiam a favor da consolidação de Portugal como uma democracia liberal – geograficamente inserido na Europa Ocidental e portanto, no quadro da divisão de Ialta e Potsdam, na esfera de influência da NATO; peso das classes médias portuguesas; qualidade da direcção da contra-revolução, que repousou em grandes dirigentes políticos como Mário Soares, etc. – e também os factores que faziam perigar essa hipótese – a existência de uma revolução; a profunda crise económica e militar do País; o prestígio, ainda nesta altura, das sociedades onde a burguesia tinha sido expropriada e que representavam 2/3 da humanidade; a existência de países onde a contrario dos factores internacionais, a expropriação se deu, como Cuba; a «onda revolucionária» aberta com o Maio de 68 em França[23]. A ponderação de uns e outros factores – só citámos alguns – é parte do trabalho de historiador. Mas não autoriza argumentos contra-factuais. A democracia não era, não se pode afirmar que era, inevitável.
Mas um outro argumento desconceitua o termo «transição para a democracia» para designar o período revolucionário. A revolução é um período distinto do regime democrático que se seguiu à contra-revolução e portanto não é correcto inserir processos distintos numa única noção de «transição para a democracia». Houve de facto duas rupturas em Portugal entre 1974 e 1976: passou-se do regime fascista para um período revolucionário (que aliás se pode dividir em dois subtipos, um essencialmente democrático até 11 de Março de 1975 e outro de disputa objectivamente socialista a partir dessa data) e desse para outro democrático liberal, que se começa a formar a partir de Novembro de 1975. O novo nasce do velho. Mas é necessário recordar que a revolução portuguesa não foi o «acidente» que deu origem à democracia. Foi uma situação distinta do regime democrático liberal que se lhe seguiu – e cuja matriz genética é a própria revolução[24] – mas que assenta em dois pressupostos radicalmente distintos do período revolucionário: a democracia representativa e o respeito pela propriedade privada dos meios de produção.
O termo «transição por ruptura» também não elimina esta omissão, uma vez que houve duas rupturas muito bem delimitadas cronologicamente, em termos de direcção política, e em termos da organização das forças armadas em Portugal: o golpe militar de 25 de Abril de 1974, que iniciou a revolução, e o golpe militar de 25 de Novembro, que iniciou a contra-revolução e o regime democrático-liberal. A única fronteira que não é clara na mudança ocorrida em 25 de Novembro é precisamente no campo das lutas sociais (as ocupações de terras, por exemplo, prosseguiram para lá de Novembro de 1975). Uma vez que a contra-revolução também é ela própria um processo (que começa num golpe militar, mas a ele não se resume) e vai-se dar num curto e médio prazo (os bancos serão desnacionalizados uma década depois). Mas do ponto de vista de regime a mudança foi clara, com o fim da “indisciplina” nos quartéis logo a partir de 25 de Novembro 1975 e a realização de eleições legislativas em Abril de 1976.
Um outro argumento ainda lembra que o próprio conceito de revolução tem uma história. Carlos Taibo lembra, a propósito das mudanças de regime da Europa de Leste (1989), que os conceitos de revolução e de transição dificilmente são compatíveis[25]. Norberto Bobbio assinala que a terminologia revolução tem uma história e significação própria, que o cientista político italiano opõe a reforma e não a transição[26]. O conceito de revolução, inclusive, é para este politólogo menos controverso que a extensão da radicalidade da mudança numa revolução: «Afirmemos desde já que a dificuldade para emitir um juízo sobre a radicalidade da mudança é bem maior do que a dificuldade para definir o evento revolucionário em relação à natureza do movimento»[27] (Bobbio, 2000: 606).
O termo transição é, finalmente, desajustado porque a ele está associado um “como” – negociação entre “elites”, ou seja, acordo entre dirigentes das classes em conflito –, mas não está explicado “porquê”, o que em última análise faz repousar sobre a vontade individual dos dirigentes a razão de tal negociação.
Em resumo, verifica-se entre um sector da investigação histórica e política uma tendência para considerar a revolução portuguesa como uma doença que surge num momento em que já se estava a dar uma transição no País no sentido da democratização, ou seja, tende a dominar uma visão de que a revolução interrompeu, como que despropositadamente, uma transição/modernização que já estaria em curso e que permitiria assegurar a mudança e simultaneamente a estabilidade do Estado. O uso do conceito de “transição” não é, neste caso, uma escolha inconsciente, porque o próprio conceito ergue uma visão historiográfica, acarretando consigo uma visão teleológica das sociedades: o regime democrático como fim da história. É aliás esta mundivisão ideológica que justifica que algumas obras sobre a revolução portuguesa, que não se ancoram nas teorias da transitologia e têm por base um levantamento histórico rigoroso, não se tenham inibido de classificar a revolução como uma patologia, como é o caso da obra Portugal em Transe, de José Medeiros Ferreira[28] ou Os Dias Loucos do PREC, dos jornalistas José Pedro Castanheira e Adelino Gomes[29].
Parece-nos que este debate é assim incontornável e o seu aprofundamento, para o qual damos aqui apenas um contributo, é proveitoso e desejável. Porém, erguer uma historiografia competente, rigorosa e capaz de resistir às pressões do poder político implica muito mais do que o debate da terminologia. Implicará porventura, entre outros caminhos, a rejeição das teorias filosóficas pós-modernas que desvalorizam o labor da própria história em detrimento de disciplinas mais especulativas; e exigirá um retorno inovado à história social e à centralidade dos conflitos sociais para explicar o processo histórico. No caso do estudo da revolução portuguesa, este esforço levar-nos-á à centralidade das revoluções anticoloniais contra o império português e ao levantamento amplo dos conflitos operários e populares durante a revolução.
Raquel Varela é autora de História do PCP na Revolução dos Cravos (Bertrand, 2011) e Revolução ou Transição?. História e Memória da Revolução dos Cravos (Bertrand, 2012).
Artigo 8 – Este artigo faz parte de uma  série: 25 Artigos para 25 Dias, 2013. Publicado também em http://raquelcardeiravarela.wordpress.com/