A Internacional

__ dementesim . . Do rio que tudo arrasta se diz que é violento Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem. . _____ . Quem luta pelo comunismo Deve saber lutar e não lutar, Dizer a verdade e não dizer a verdade, Prestar serviços e recusar serviços, Ter fé e não ter fé, Expor-se ao perigo e evitá-lo, Ser reconhecido e não ser reconhecido. Quem luta pelo comunismo . . Só tem uma verdade: A de lutar pelo comunismo. . . Bertold Brecht

sexta-feira, maio 30, 2014

Porque é que Seguro Caiu?

Porque é que Seguro Caiu?

pessoas-01Há em Portugal aquele péssimo, erróneo e contra-revolucionário hábito de se entender que os partidos políticos não se devem meter na vida uns dos outros, deixando que cada qual cozinhe à sua maneira e nas suas próprias águas as crises políticas por que vai passando, como se tudo aquilo que acontece a um partido, por mais ou menos influente que seja, nada tivesse a ver com as classes e com a luta de classes que caracterizam a vida política no País e não devesse merecer de todos os partidos, de todas as classes e de todos os cidadãos conscientes uma apreciação interessada e criteriosa.
Esse hábito reaccionário e burlesco reanimou-se agora com a grave crise política que abala e envenena o partido socialista . Do PCP ao CDS, passando pelo PSD, o BE e até pelo recém-chegado cónego Pinto, todos se escusam de proferir opinião própria sobre a crise do PS, invocando em apoio ideológico aqueles consabidos provérbios ultra-reaccionários de não meter foice em seara alheia, nem colher entre marido e mulher, sem sequer curarem de saber se Costa e Seguro gostarão ou não de se verem representados em tão equívocas intimidades...
Ora a questão, do maior interesse como se vê, é esta: porque é que Seguro, ao cabo de três anos e sem passar pelo escrutínio legislativo, caiu como um tordo numa tarde alentejana? Dir-me-ão que não caiu ainda... Mas a sua queda é absolutamente inevitável...
Na verdade, Seguro caiu – ou irá cair muito em breve – por causa de uma contradição absolutamente insanável, que caracteriza a natureza do partido socialista: um partido que se reclama do apoio dos trabalhadores e da classe média (a pequena-burguesia), mas que propaga e defende a política definida e aplicada contra os trabalhadores e a pequena-burguesia pelas instituições europeias, pelos credores do Estado, pela Tróica, pelo capital monopolista germânico e pelo imperialismo.
Tal é a contradição que provoca todas as crises cíclicas do PS e, mais dia menos dia, vai dar cabo dele, como já deu cabo do partido socialista italiano, já atirou para quarto lugar do espectro eleitoral o partido socialista grego (Pasok), já despachou para terceiro lugar, com 13% do eleitorado, o partido socialista francês, ainda há dois anos com a maioria absoluta, que lhe permitiu eleger um presidente da República à primeira volta, já expulsou para terceiro lugar o partido trabalhista britânico e até já expediu para urgente congresso extraordinário de recauchutagem o partido socialista espanhol na oposição, afectado da mesma doença oncológica que atinge o partido de Seguro e de Costa.
Ao contrário do que pretendem os comentadores políticos encartados nos órgãos de comunicação social, não foram os resultados das últimas eleições europeias que provocaram a actual crise do partido socialista; ao invés, esses resultados apenas contribuíram para pôr a nu a verdadeira crise que consome o PS e que assenta na contradição política e ideológica que acima ficou descrita.
Decerto que nenhum operário esqueceu ainda – e também não o esqueceu nenhum elemento da classe média – que a situação de exploração, de roubo e de miséria em que todo o povo português vive hoje se deve à política do governo de Sócrates e, na sua continuação, à política do governo de traição nacional Coelho/Portas.
Quando António José Seguro, após a clamorosa derrota eleitoral de Sócrates, que entregou o Poder à direita e à extrema-direita, se alcandorou ao cargo de secretário-geral do partido socialista, esperar-se-ia que o novo líder dos chamados socialistas portugueses criticasse, sem ambiguidades, a política de Sócrates e do respectivo governo do PS, apresentando no congresso da vitória a linha e o programa políticos que iriam substituir a linha e o programa derrotados de José Sócrates.
Mas não! Seguro não só não criticou Sócrates e o caminho do seu governo reaccionário, responsável pelo resgate dos credores externos, imposto a Portugal pelo memorando de entendimento e pelo controlo da Tróica, não só não criticou Sócrates e o seu governo nem submeteu todo o PS à correspondente autocrítica política, como se declarou pronto a assumir as responsabilidades provenientes daquela política governamental suicida.
Seguro aceitou o memorando de entendimento, aceitou a Tróica, aceitou a política da Tróica e aceitou, votando a favor no parlamento, os primeiros orçamentos do governo Coelho/Portas impostos pela Tróica.
Pode ser que já ninguém se lembre hoje, mas Seguro aprovou, com o seu voto de traição, o orçamento de ladrões e de ladroagem assinado por Coelho, por Portas e por Gaspar.
Seguro, esse mesmo seminarista que está agora de saída para Penamacor, apoiou o traidor Proença, líder da UGT, na assinatura do acordo tripartido (UGT, governo e patronato) dito de competitividade e emprego, que é o instrumento responsável pela emigração compulsiva de meio milhão de jovens, pelo desemprego, inemprego e inempregabilidade de dois milhões de trabalhadores, pelo aumento da duração da semana de trabalho de um mínimo de quarenta horas para um limite que pode ultrapassar as cinquenta horas semanais, pelo despedimento sem justa causa, pela redução do salário no trabalho extraordinário, pela eliminação de quatro feriados sujeitos a trabalho não pago.
Foi Seguro e todo o grupo parlamentar do PS quem se absteve na votação de todos os orçamentos do segundo ano de Tróica, e quem se absteve, com o mesmo grupo parlamentar, na votação do novo Código do Trabalho, código que em quase nada se distingue, não viesse ele recomendado por Merkel e Schäuble, dos regimes nazis de trabalho que existiam em Auschwitz, Dachau ou Treblinka.
Seguro mancomunou-se com o xexé de Boliqueime e, aqui tão perto como no Verão passado, esteve prestes a chegar a um acordo com o governo de traição nacional Coelho/Portas, impedindo, em todo o caso, que esse governo caísse e o presidente se visse forçado a dissolver a Assembleia da República e a convocar eleições legislativas antecipadas.
Seguro é aquele trânsfuga socialista que, ainda só há cinco meses, se aliou com o governo de vende-pátrias Coelho/Portas e permitiu que os capitalistas operando em Portugal vissem um desconto de 2% no imposto que haveriam de pagar ao Fisco, isto num momento em que até pensões miseráveis inferiores a 500 euros eram compelidas a pagar 18 euros de contribuição extraordinária de solidariedade...
E mais! Foi ainda este mesmo Seguro que, mais uma vez, assinou o Tratado Orçamental, tratado que liquidou totalmente a soberania portuguesa na elaboração do seu próprio orçamento, fixando-lhe antecipadamente o tecto máximo da dívida externa em 40% do PIB e o défice orçamental em 0,5%.
Este Seguro foi ao ponto de apoiar Coelho e Portas na reforma do regimento da Assembleia da República, liquidando alguns dos poucos direitos que a oposição conservava desde 1976.
Mas não é tudo. O pior é que Seguro e seus capangas, por mais do que uma vez, deixaram bem claro que, em caso de não obterem maioria – ou mesmo obtendo-a a sua preferência para alianças parlamentares ou governativas iria para o PSD ou até para o PSD e o CDS.
Ora, como é possível que um povo, massacrado nos últimos três anos por uma política de desemprego, emigração, roubo salarial, cortes nas pensões, aumento nos impostos, austeridade e pobreza, pode permitir que um partido, que se reclama dos trabalhadores e da classe média e é o principal partido da oposição, se proponha alianças futuras imediatas com a coligação que tem estado no Poder nestes últimos três anos de extrema miséria?
Claro está que aquela contradição superior e suprema, que representa a natureza e a matriz do PS, não irá desaparecer com a queda de Seguro.
O problema existencial do PS não é Seguro nem nenhum dos membros da sua elite dirigente: António Costa, Ferro Rodrigues, José Sócrates ou qualquer outro. Também estes últimos já expressaram, por mais do que uma vez, a sua disponibilidade para amanhã, ganhasse o PS as eleições legislativas, se aliarem às forças que hoje exploram e oprimem no governo os trabalhadores e o povo português.
Já alguma vez viu o leitor, nestes últimos três anos, António Costa, por uma só vez que fosse, condenar a assinatura do tratado orçamental por Seguro; condenar a votação parlamentar ou a abstenção dos orçamentos apresentados pelo governo PSD/CDS; condenar a abstenção na votação do novo Código do Trabalho ou o corte de 2% do imposto dos capitalistas?
Não, com certeza que nunca viu! Eles – Seguro, Costa, Sócrates, Ferro Rodrigues – são todos iguais dirigentes oportunistas de um partido oportunista.
O partido socialista português pode desaparecer - como aliás já desapareceu uma vez, quando tinha à sua frente homens da maior consideração como Antero de Quental ou Fontana -, mas não se espere que, com os actuais dirigentes, se ligue alguma vez à esquerda, aos operários, aos trabalhadores e constituam, como o obrigam as suas bases de apoio, uma frente democrática e patriótica, capaz de salvar o país da crise em que vive e de restituir-lhe a democracia, a soberania e a independência nacional.
O caminho está traçado há muito pelos operários e pelo povo. Veremos, todavia, sem nenhuma espécie de ilusões, como cai Seguro e como se alevanta quem o vai substituir.
Sempre sem ilusões!

http://www.lutapopularonline.org/index.php/pais/104-politica-geral/1132-porque-e-que-seguro-caiu



terça-feira, maio 06, 2014

os 25 mais ricos de Portugal em 2013


Público

Américo Amorim recupera a liderança dos 25 mais ricos de Portugal




A lista dos 25 mais ricos de Portugal, elaborada pela revista Exame, volta a ser liderada pelo empresário Américo Amorim, posição que em 2012 tinha sido ocupada por Alexandre Soares dos Santos, que ocupa este ano o segundo lugar.
As terceira e quarta maiores fortunas do ranking anual da revista pertencem à família Guimarães de Mello e a Belmiro de Azevedo.
Américo Amorim já ocupou a liderança do ranking em 2008, 2009, 2010 e 2011.A conquista do primeiro lugar e a quase duplicação da fortuna do empresário no último ano, avaliada em 4500 milhões de euros, ficou a dever-se, segundo a revista, à “subida em flecha do preço das acções que detém na Galp Energia, no Banco Popular e na Corticeira Amorim”.
De acordo com a Exame, as 25 maiores fortunas em Portugal somam 16.700 milhões de euros em 2013, o que revela um crescimento face aos 14.400 milhões que valiam em 2012.
“Os tempos podem ser de crise, mas as maiores fortunas nacionais continuam a crescer”, escreve a publicação, que será publicada esta quinta-feira.
Segundo a revista, as maiores fortunas equivalem a 10% do PIB nacional, acima dos 8,4% do PIB que representavam em 2012.
Alexandre Soares dos Santos perdeu a liderança mas viu a fortuna crescer, de 2100 milhões para 2200 milhões de euros.
A família Guimarães de Mello manteve a terceira posição, com uma fortuna de 1700 milhões de euros, seguida de Belmiro de Azevedo, que viu duplicar a fortuna no último ano, para 1200 milhões de euros, mantendo o quarto lugar. Belmiro Já foi o homem mais rico do país.
A mulher mais rica do país volta a ser Maria Isabel dos Santos, uma das principais accionistas da Jerónimo Martins, que sobe do 9º lugar para o 7º lugar no ranking, com uma fortuna de 574,9 milhões de euros.
No grupo dos 10 mais ricos consta mais uma mulher, por entrada directa. Trata-se de Maria do Carmo Espírito Santo Silva, com uma fortuna avaliada em 497,4 milhões de euros.

Notícia corrigida quinta-feira, às 11h40. No segundo parágrafo, onde se referia que a quarta e quinta maiores fortunas pertencem à família Guimarães de Melo e Belmiro de Azevedo, deve ler-se que se tratam da terceira e quarda maiores fortunas.

http://www.publico.pt/economia/noticia/americo-amorim-volta-a-recuperar-lideranca-dos-mais-ricos-de-portugal-1614179

Europa reocupada por César Príncipe

  * César Príncipe

A República Federal da Alemanha absorveu a República Democrática Alemã. Aumentou a massa corporal e muscular. A reincorporação não ocorreu por magia, não obstante a Conversão da Rússia constar dos apostolados. O milagre teve os seus agentes e artífices: na sombra, operou a inteligência germano-americana; à luz do dia, actuou o complexo mediático; e como seguro contra todos os riscos da blitzkrieg 89, a camarilha da Perestroika desguarneceu as muralhas do Kremlin. Até acreditou ou simulou acreditar na promessa de que a NATO jamais integraria estados e regiões da área de influência e segurança da URSS. O ataque-relâmpago do Novo Eixo mereceu tratamento de visita guiada. Gorbachev confessou (sem pingo de rubor) que, no Ocidente, à excepção dos USA, todos estavam contra a queda do muro e a reunificação, desde Thatcher a Andreotti, a Mitterrand: Todos vieram até mim, um após o outro, pedindo isso. Mitterrand era ferozmente contrário. Mais esperto do que os outros, dizia: “Amo a Alemanha de tal forma que prefiro ter duas” Só depois, quando tudo se precipitou, todos assinaram. [1] Os amigos ocidentais (ingleses, italianos, franceses, etc.) chegaram a implorar que o Exército Vermelho esmagasse o levantamento. Contudo, o Actor Principal da Glasnost , capitulacionista de salão e padecente da doença infantil do capitalismo, deu ouvidos ao interlocutor de facto. Genuflectiu como se uma superpotência real não tivesse argumentário. O valentaço Gorby foi o mesmo que, anos antes, noutra entrevista, declarou, visando a marioneta Ieltsin: Temos uma Rússia fraca e um presidente fraco. [2] Quanto à Europa NATO/UE, resmunga e amua mas não passa de pátio dianteiro dos USA, recomendável para acampamentos do Pentágono, estações e prisões da CIA, mobilizações predatórias, vendas de armas e pacotes de propaganda, jogos bolsistas e fundistas, colocação de apples, googles, cineprodutos, transgénicos, fármacos, heroína do Afeganistão e cocaína da Colômbia (demarcações da Esfera político-militar USA). O narcomercado é um dos super-negócios do planeta. Os USA são o guardião- dealer. Na definição dos interesses vitais e dispositivos da sua manutenção, não admira, pois, que a chamada Europa não tenha nem esteja autorizada a ter política de defesa nem política externa fora dos varais e canais dos USA, embora a sede da NATO e a sede da UE, irmãs gémeas, se encontrem na mesma cidade (Bruxelas), com moradas autónomas para fingir independência ou disfarçar que não são geridas desde Washington. Dominique Villepin, ex-ministro dos Negócios Estrangeiros e antigo primeiro-ministro de França, desabafou (cito de memória), num momento de franqueza e finura de guilhotina: Não há NATO. Há generais americanos. A própria Alemanha está sob tutela do patrono atlântico: os USA mantêm em solo alemão cerca de 60 mil efectivos e 227 bases, algumas dotadas de bombas nucleares. As instalações norte-americanas funcionam ainda como parabólicas de espionagem, constituindo a nação-hospedeira um dos alvos. A Alemanha é um ocupante-ocupado, como Portugal foi um colonizador-colonizado. De resto, na linha de reactualização e reconfiguração do Eixo (também o Japão se acha ocupado pelos USA), que aí dispõem de 50 mil efectivos em 135 bases, algumas equipadas com cargas atómicas. A Alemanha e o Japão jazem sob o dicktat dos USA, que lhes distribui guiões e fixa taxas de empenhamento no tarefário geo-estratégico, particularmente no cerco à Rússia e à China. O Império norte-americano não levanta ferro. Nem sequer entreabre a cortina.

Muro da vergonha
Caiu em Berlim
Vergonha só lá
Muros há sem fim 
[3]

O mundo estava cortado e recortado por altos e grossos muros e continuou a levantar vedações de betão, arame farpado, cabos eléctricos e torres de metralhadoras, mas só um foi apodado de vergonhoso. Todavia, convém destapar outras barreiras, as credoras de aplauso, de compreensão, tolerância ou esquecimento da comunidade internacional, tão proficientemente facetada e discricionariamente representada pelos USA e pelos seus carros de guerra psicológica, as televisões, as rádios, os jornais. Eis uma lista de muros deixados em paz pelas chancelarias e pelos agitadores de direitos universais: USA-México, Índia-Bangladesh, Índia-Paquistão, Índia-Birmânia, Paquistão-Afeganistão, Marrocos-Sara Ocidental, Botsuana-Zimbábue, Coreia do Sul-Coreia do Norte, China-Coreia do Norte, Uzbequistão-Quirquistão, Irão-Paquistão, Arábia Saudita-Iraque, Israel-Cisjordânia, Israel-Líbano, Egipto-Gaza, Grécia-Turquia, Chipre (divisória greco-turca), Ceuta/Melilla (Espanha), Belfast (Irlanda do Norte), Bagdad (Iraque), La Molina (Peru), Rio de Janeiro (Brasil). Todos se encontram de pé e prometem durar e perdurar. Inadiável era a queda do Muro de Berlim, prenúncio aparatoso e ruidoso do desabamento da URSS e do bloco socialista. Festejável com música rock, tanques de cerveja, pichagens alucinogénias. Vinte anos depois, enquanto os redesenhadores de mapas e as trupes do Wall Show celebravam a efeméride, a população da ex-Alemanha Democrática sentia o ferrete da anexação ou reunificação. [4] 
IV Reich em acção 

Demolido o muro, riscada do planisfério a Alemanha socialista, a Alemanha capitalista e imperialista encetou o desarme das alfândegas continentais, acobertando-se sob as vestes da confraria europeia: instituiu a livre circulação de capitais; fixou taxas de câmbio irrevogáveis; fez entrar o marco em circulação com nome de euro, assim se posicionando como player nos mercados de divisas e condicionando as exportações, especialmente dos países do Sul/Leste; desestruturou as actividades concorrenciais (desmantelamento e deslocalização de indústrias, abate de frotas pesqueiras, subsídios de funeral para as agriculturas). De seguida, a Nova Alemanha, a que carrega 100 milhões de mortos (contabilidade do séc. XX) e uma vasta geografia de ruínas, acelerou a reocupação dos submetidos na II Grande Guerra. Só a Noruega resistiu. Acertaram o passo com o ex-ocupante: Áustria, Bélgica, Bulgária, Checoslováquia (República Checa e Eslováquia), Dinamarca, Estónia, França, Grécia, Hungria, Itália, Jugoslávia (Croácia/ Eslovénia/ Macedónia/ Sérvia/ as duas últimas à espera que o ex-ocupante aceda ao pedido de reocupação), Letónia, Lituânia, Luxemburgo, Mónaco, Holanda, Polónia, República Checa, San Marino, Ucrânia (a caminho da reocupação). Paralelamente, o IV Reich foi ornando o cinturão de caça com uma série de troféus que no período do III Reich haviam demonstrado comportamento de bons alunos : Espanha, Finlândia, Portugal, Roménia. Há igualmente que inscrever a zona grega do Chipre e a República de Malta na Cartografia da Grande Guerra Financeira. Pelo meio, com a Alemanha Democrática reintegrada, dissolvida e recentrada, a Germânia liderou a desintegração da República Federativa da Jugoslávia, que tinha de levar uma ensinadela por se manter não-alinhada, soberana e socialista. O Curso de PatroNATO durou de 24/03/ a 11/06 de 1999, sem mandato das Nações Unidas, a pretexto de instantes razões humanitárias. O programa NATO School incluiu escombros generalizados e selectivos, doses de urânio empobrecido com certificado de garantia para centenas de milhares de anos, extensas manchas de sangue e lágrimas e a imposição de um estado fantoche e artificial (Kosovo), com uma super-base USA, governado com savoir-faire pelo mundo do crime (local e sem fronteiras).

Wehrmacht do Euro 

O Euro é o Marco do Neo-Expansionismo. Na guerra económico-financeira, os Estados do Sul, previamente desarmados, entre a espada da moeda forte e a parede da economia fraca, tentaram o salto em frente, seduzidos pelo crédito de torneira aberta e pela carteira de fundos, contraindo a doença da dívida galopante e do défice excessivo, estimulada pelos credores, apostados em arrastar os esfomeados de barriga dilatada para uma situação de emergência. Sob a bota e a batota da usura, com governos-carpete que vendem a pataco as jóias da economia e tripudiam os princípios da soberania, o capitalismo euroglobal lançou os seus rapazes ou rapaces sobre os activos sociais (salários, reformas, pensões, receitas fiscais, reservas de ouro e divisas, serviços públicos) e os activos empresariais do Estado. A operação de saque amigo foi implacavelmente montada. Nem será preciso recorrer a teóricos de última geração da economia de guerra e do garrote financeiro. Bastará rebuscar fontes da mesma água, validadas pela constância dos factos e a didáctica dos séculos. Neste caso, fontes euro-americanas. Portadoras de credenciais. Insuspeitíssimas. Uma a jorrar da bocarra de um banqueiro, alemão e judeu, e outra da carranca de um fazendeiro, congressista e presidente com direito a efígie monetária e a inscrição In God We Trust/Deus Seja Louvado/Confiamos em Deus. 

Eis a voz da banca:
Dai-me o controlo da moeda de um país e não me importará quem faz as leis. [5]

Eis o porta-voz:
Há duas maneiras de submeter e escravizar uma nação: uma é pela espada e outra é pela dívida. A dívida é uma arma contra os povos. Os juros são as munições. [6]

Guião falangista 

De sublinhar que o projecto de domínio regional e intercontinental está a ser assessorado pela extrema-direita. Cada vez mais motivada com chavões anticomunistas, anti-semitas, racistas, xenófobos, homofóbicos, machistas. Está a levedar um microclima século XX, anos 30. O capitalismo volta a dar corda à delinquência falangista, a fim de ensaiar governos de mão dura para acentuar a espoliação e conter a resistência popular. Enraivecer e desnortear as massas, desviando-as dos referenciais democráticos e do sentido de classe, faz parte do caderno de encargos da besta negra. Os operacionais de trabalhos sujos da História aí estão nas ruas e os branqueadores movem-se pelos parlamentos, pelos governos, pelos meios de comunicação, pelas academias. É o caldo de cultura dos bárbaros. Que não estão às portas da Europa: estão dentro. A Ucrânia é o mais recente caso de tomada do poder pelo bandoleirismo nazifascista, redoutrinado, treinado, municiado e subvencionado (com especial zelo pela Alemanha e pelos USA). Em termos eleitorais e sociais, Holande e Valls, garçons de bureau do alto capital e catapultas da assunção aos céus de Nôtre Dame Le Pen, são o cartaz mais patético da França e a caricatura mais servil da social-democracia. Phillipe Pétain, marechal da desonra, primeiro-ministro e presidente da República (1940-1944), condenado à morte por traição e indultado por De Gaulle, sepultado na Île d`Yeu, sorrirá como só as caveiras sabem sorrir.
(1). La Repubblica, entrevista de Fiammetta Cucurnia, 09/11/2009, 20º aniversário da queda do muro. 
(2). Jornal de Notícias, entrevista de César Príncipe, 17/06/1995, no 4º aniversário da dissolução da URSS. 
(3) César Príncipe, Correio Vermelho, Seara de Vento, 2008.
(4) O dia em que se comemoram os 20 anos sobre a queda do Muro de Berlim, uma sondagem conclui que os alemães de Leste consideram que a reunificação não foi consumada e que a esmagadora maioria sentia-se bem na antiga Alemanha Democrática. O estudo indica que 50 por cento dos cidadãos da antiga Alemanha Democrática lamentam as diferenças reais do nível de vida, lembrando que no Leste o desemprego é maior, os salários são mais baixos e o PIB é de apenas de um terço do registado no lado ocidental do país. Doze por cento dos inquiridos recordam com saudade os tempos da RDA e outros tantos defendem mesmo que o muro devia ser reconstruído. Somente um quinto dos alemães de Leste considera que a reunificação vai no bom sentido e muitos outros dizem que os irmãos do Ocidente os tratam com arrogância. [TSF , 09/11/2009)
(5) Mayer Amschel Rothschild (1744-1821), fundador da dinastia de banqueiros.
(6) John Adams (1735-1826), presidente dos USA. 


Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

sexta-feira, maio 02, 2014

Ser e não ser – Notas sobre a Revolução portuguesa de 74/75 no seu 40º aniversário


A democracia política em Portugal não foi uma outorga do poder. Foi uma conquista imposta ao poder. O mesmo quanto à democratização social, o direito à greve, a liberdade sindical, o salário mínimo, as férias pagas, a redução do horário do trabalho e os fundamentos de um sistema universal de segurança social. Artigo publicado no nº 5 da revista Vírus.
Foto Victor Valente/Direitos reservados.
  1. O movimento militar vitorioso a 25 de Abril de 1974 deu origem, desde o próprio dia, à explosão de um movimento revolucionário de massa, um verdadeiro abalo telúrico que subverteu a ordem estabelecida a todos os níveis da sociedade. Ele tentou criar e articular novas formas democráticas de organização e expressão da vontade popular em milhares de empresas, nos bairros populares das periferias das cidades, nos campos do sul, nas escolas, nos hospitais, nos órgãos locais e centrais do Estado e até nas Forças Armadas. Um movimento revolucionário de massas que no seu processo, nos seus distintos períodos ofensivos, ocupou fábricas, as terras do latifúndio, as casas de habitação devolutas, descobriu a autogestão e o controlo operário, impôs a nacionalização da banca e dos principais sectores estratégicos da economia, saneou patrões e administrações, criou Unidade Coletivas de Produção para a Reforma Agrária e geriu a vida de milhares de moradores pobres de Norte a Sul do país. Um movimento que no seu ímpeto impôs na rua, pela sua própria força e iniciativa, como conquistas suas, as liberdades públicas, a democratização política do Estado, a destruição do núcleo duro do aparelho repressivo do anterior regime e a perseguição dos seus responsáveis, o direito à greve, a liberdade sindical, as bases de uma nova justiça social. Um mundo voltado de pernas para o ar, os 19 meses em que o futura era agora, um curto e raro instante em que as mulheres e os homens comuns, o povo do trabalho e da exploração, sonhou poder tomar o destino nas suas próprias mãos. A isso se tem chamado, e a meu ver bem, a Revolução portuguesa de 1974/1975.
  2. Esta Revolução tem uma primeira e essencial particularidade a que normalmente se dá pouca atenção. É que ela é detonada por um golpe militar de características singulares na longa história dos golpes militares dos séculos XIX e XX em Portugal. Um movimento militar fruto do cansaço da guerra colonial que se arrastava há 13 anos, sem vitória possível e com graves derrotas à vista, travada contra os ventos da história, injusta e a prazo breve ruinosa. Num país impedido pela ditadura de se expressar e decidir livremente sobre este assunto, o descontentamento contra a guerra, numa dessas ironias em que a história é fértil, vai ser interpretado pelos jovens oficiais que a conduzem no terreno, os capitães e majores que comandavam as companhias, unidades matriciais da quadricula da ocupação militar colonial. Ou seja, não é um complot de generais, almirantes e coronéis (até ao fim fiéis ao regime e ao esforço de guerra, salvo raras exceções. É um movimento de oficiais intermédios a que, no processo, aderirão oficiais subalternos e milicianos. Uma conspiração que, no contexto de descontentamento popular crescente e no ambiente político e ideológico da época, rapidamente evolui dos objetivos corporativo-profissionais (que, aliás, o Governo satisfaz em Outubro de 1973) para um propósito político subversivo: de Setembro a Dezembro de 1973, dos plenários de oficiais de Évora ao de Óbidos, o movimento assumira claramente a consciência da necessidade de derrubar o regime. Sem democratização não haveria solução política para acabar com a guerra.
  3. A rápida extensão e politização da conspiração dos oficiais intermédios, o seu controlo ou neutralização da maioria das principais unidades operacionais dos três ramos das FA no país, criava, assim, uma situação não imediatamente percetível mas decisiva: privava drasticamente o Estado e a hierarquia de força militar, ou seja, transformava-a, na realidade, e ao seu juramento de obediência ao regime, numa patética e inútil “brigada do reumático”. Numa cabeça sem corpo e sem consciência de o não ter. Mas retirava esse poder operacional, também, aos raros generais dissidentes convencidos que tinham na mão um golpe militar. As primeiras horas do “25 de Abril” e do seu rescaldo foram uma amarga surpresa tanto para os comandantes hierárquicos como para o general Spínola e os oficiais que o seguiam.
  4. Disto decorre uma segunda característica central: a neutralização/anulação do papel tradicional das FA. A vitória do movimento dos oficiais intermédios, na realidade, rompe a cadeia hierárquica de comando das FA, subtrai-as ao controlo tradicional do Estado e das chefias por ele designadas, dessa forma paralisando a função das FA como órgão central da violência organizada do Estado. Nesse sentido, em rigor deixa de haver FA, sucedendo-lhe – o que era coisa bem distinta -, o MFA, que a breve trecho controlará o essencial do poder militar operacional mais relevante através do COPCON. Neste inicial período spinolista, até à sua derrota em 28 de Setembro de 1974, quando muito, há a luta desesperada dos restos da velha hierarquia (aliás largamente saneada na “noite dos generais” pelos oficiais do revoltosos, logo a 6 de Maio) para eliminar o MFA. A derrota do spinolismo consagra assim essa espécie de anulação das FA como espinha dorsal da violência do Estado.
  5. Convém acrescentar que essa circunstância tem ainda uma outra consequência relevante: a paralisação, pulverização e enfraquecimento geral do poder e autoridade do Estado. O que emerge do golpe militar é um poder poliédrico de competências conflituantes e debilitadas: uma Junta de Salvação Nacional sem poder real nas FA, um Governo provisório sem poderes sobre as FA e com as forças policiais e ministérios paralisados, um Conselho de Estado de competências largamente retóricas e, fora desta lógica institucional (ainda que representada no Conselho de Estado), a Coordenadora do Programa do MFA, única sede de poder efetivo, mas em forte disputa com a fação spinolista nas FA e nos demais órgãos. O velho poder caíra, já não ameaçava ninguém, e deixava um campo indefinido e vulnerável a uma drástica alteração da relação de forças no plano social e político.
  6. Finalmente, assunto que não desenvolverei aqui, o processo que se vem descrevendo tem um outro efeito: a cessação a curto prazo da guerra colonial nas três frentes e a formação, quer nos contingentes em África, quer na opinião pública portuguesa, de um forte movimento recusando novos embarques de tropas para as colónias, exigindo a litoralização do dispositivo militar e o regresso das tropas, pressionando pela imediata abertura de negociações com os movimentos de libertação nos termos por eles apresentados, ou, nas zonas de guerra, substituindo o combate pela confraternização com o “inimigo”. O exército colonial e a opinião pública recusavam-se a continuar a guerra. A descolonização irá ser negociada pelo MFA e o Governo Provisório, sem opinião pública, sem FA e sem apoio internacional para algo que não fosse a autodeterminação e a independência para os povos das colónias.
  7. A conjugação dos fatores acima indicados (o apagamento da função das FA como garante central da “ordem” e a deliquescência do poder do Estado) com a forte tensão política e social acumulada no período final do regime marcelista, origina a explosão revolucionária. O movimento de massas, largamente espontâneo, por virtude de um desses “mistérios” que caracterizam as situações revolucionárias maduras para a ação, teve, na própria manhã do golpe – o emblemático desenlace do confronto na Rua do Arsenal terá tido nisso o seu papel1 – a dupla intuição que podia e devia tomar a iniciativa. A intuição do momento e a intuição da força própria: “é agora, porque agora somos mais fortes do que eles”. A compreensão quase intuitiva de que a correlação de forças, naquele momento indesperdiçável, era favorável à iniciativa popular. E de espectador, o movimento de massas passa a actor principal. Antes do golpe militar, por si só, não obstante a sua força e radicalidade, não conseguiria derrubar o regime. Mas agora agarrava a oportunidade que esse particular movimento militar lhe facultava, entrando de rompante pelas “portas que Abril abriu”. O golpe, ao contrário do que pretendeu a tentativa de A. Cunhal o recuperar para a velha narrativa do “levantamento nacional”2, não era a expressão armada da “insurreição popular” (inicialmente quereria mesmo evitá-la…), não era a explosão revolucionária, todavia, pelas suas características particulares, contribuiria decisivamente para a desencadear.
  8. Na sua imparável dinâmica inicial, entre Maio e Setembro de 1974, o movimento popular revolucionário conquista na rua, nas fábricas, nos bairros populares, nas escolas, nas zonas rurais, muito do essencial: os fundamentos da democratização política, as liberdades fundamentais, a liquidação dos órgãos de repressão e censura política e das milícias fascistas, muito antes de tudo isso ter consagração legal. A democracia política em Portugal não foi uma outorga do poder. Foi uma conquista imposta ao poder. O mesmo quanto à democratização social, o direito à greve, a liberdade sindical, o salário mínimo, as férias pagas, a redução do horário do trabalho e os fundamentos de um sistema universal de segurança social. O movimento de massas fez tudo isso enfrentando com os seus órgãos de vontade popular eleitos em plenários de fábricas ou assembleias de moradores, a oposição sistemática da Junta de Salvação Nacional (JSN), do Governo Provisório (GP) e do PCP e da Intersindical nessa fase investidos em guardiões da “ordem democrática” contra o “esquerdismo irresponsável” (ao jeito da I República, chegaram a convocar manifestações contra as greves). No entanto, foi a força desse movimento que se mostrou decisiva na derrota da 1ª tentativa contra-revolucionária do spinolismo, em Setembro, de alguma forma impondo o MFA como força político-militar hegemónica no processo
  9. A partir de Outubro de 1974, a crise económica, o encerramento ou a pilhagem de muitas empresas pelos patrões em fuga, o disparar do desemprego, alteram e radicalizam os padrões de ação: os trabalhadores ocupam as empresas, e, a partir de Janeiro, as herdades dos agrários alentejanos e do Baixo Ribatejo, experimentam a autogestão ou exigem a intervenção do Estado ou do MFA, ensaiam várias formas de controlo operário e fazem-no através de Comissões de Trabalhadores ou de moradores por si eleitas. Manter as empresas a funcionar, derrotar a sabotagem económica, assegurar o emprego, cedo coloca a questão da nacionalização dos sectores estratégicos da economia (a começar pela banca). O propósito é conquistado no rescaldo da derrota da segunda tentativa contrarrevolucionária dos spinolistas, em 11 de Março de 1975. Aprova-se a nacionalização da banca (na prática dos grandes grupos financeiros) e legaliza-se a Reforma Agrária já em curso. O controlo operário está na ordem do dia. O processo revolucionário parecia dar um passo em frente. Na realidade, era o último.
  10. Efetivamente, o heteróclito campo da revolução iria sofrer, nos meses seguintes, três derrotas sucessivas e determinantes. A primeira, com as eleições de Abril de 1975 para a Assembleia Constituinte. Não são só os modestos resultados do PCP (12,5%), do MDP (4,1%) e da UDP (0,7%): é alteração do critério legitimador do poder em redefinição. Na realidade, com as eleições de Abril 1975 legitimidade eleitoral impõe-se definitivamente sobre a legitimidade revolucionária. E a verdade é que o PS vencera as eleições constituintes com 37,8% dos votos. A revolução não tivera nem a capacidade de as adiar/anular como na Rússia de 1917 (o que era difícil num país onde a oposição fizera das eleições livres a sua bandeira de sempre), nem a força de as ganhar (como o chavismo venezuelano dos nossos dias). É precisamente a partir daqui, desta crise de legitimidade que nem a retórica tutelar do I Pacto MFA/Partidos consegue minimizar, que se inicia a rotura dos sectores intermédios com o processo revolucionário, argumentando contra a hegemonia totalizante que nele tendia a assumir o papel do PCP. Rompe-se o Governo Provisório com a saída do PS e do PSD (unicidade sindical, caso República) e explicita-se a crescente e já indisfarçável desagregação do MFA. A extrema-direita terrorista passa à ação em todo o país contra as sedes e militantes de esquerda e a hierarquia católica distancia-se do PREC a pretexto da ocupação da Rádio Renascença. Inicia-se a mobilização de massa contra o processo revolucionário com os grandes comícios e manifestações convocados pelo PS a favor de uma democracia parlamentar e “europeia” e as concentrações de apoio ao episcopado no Norte e Centro do país. Na realidade, em Julho de 1975, com a formalização do “Grupo dos 9”, está constituído, tendo como eixo os “Nove” e o PS, um campo político-militar de oposição e alternativo ao dividido campo revolucionário que lhe vai disputar, palmo a palmo, as posições-chave no aparelho militar e no Governo, como primeiro passo para o derrotar no plano da mobilização social. Um campo apoiado abertamente pela direita política e dos interesses, por sectores maoistas que reificavam o perigo de um regime tutelado pelo PCP e, mais na sombra, pelas, sabemos hoje melhor, largas ramificações da extrema-direita fascista e terrorista do ELP/MDLP e grupos afins.
  11. Precisamente, a segunda derrota do campo da revolução socialista, em Agosto/Setembro de 1974, é o afastamento generalizado da “esquerda militar”, sobretudo da mais próxima de Vasco Gonçalves e do PCP, não só da liderança do Governo provisório como das fortes posições detidas no aparelho militar: é encerrada a v Divisão, Vasco Gonçalves é afastado de 1º Ministro e impedido de assumir o cargo de CEMGFA, Eurico Corvelo é demitido da chefia do RMN, os “gonçalvistas” são colocados em minoria no Conselho da Revolução perdendo 9 conselheiros, são readmitidos os conselheiros do “grupo dos 9”, o VI Governo é uma clara guinada à direita. Sobram Otelo e o COPCON, mas o cerco a este último núcleo do revolucionarismo militar começa de imediato. O que sai deste embate é uma substancial alteração da correlação de forças a nível político e militar: nas chefias e no Governo, instalam-se agora opositores ao curso revolucionário. Não era o fim, mas era o prefácio do fim
  12. Com o processo revolucionário em curso, deter as cúpulas do poder político e até das chefias militares não era resolver a situação. Havia um movimento de massas disposto a lutar pelo que tinha conquistado. A “contra ofensiva das lutas populares”, como lhe chamará o PCP, será forte e prolongada, mas representa já, não obstante a sua capacidade de mobilização entre Setembro e Novembro, um processo claramente defensivo contra o “avanço da reação” e a iminência de um golpe militar, na realidade, em preparação a partir do “grupo dos 9” e desde a” limpeza” desse Verão. Considerar essa radicalização terminal, quase desesperada e sem orientação clara, como o “momento insurrecional” ou o “assalto final” ao poder do Estado3, parece-me ser uma abordagem que nada tem a ver com a realidade. As importantes mobilizações desse período, de uma forma geral, não colocavam a questão da tomada do poder: reclamavam as posições perdidas (demissão de Corvacho, desativação do CICAP, silenciamento à bomba da Renascença, atentados bombistas…), denunciavam os planos político-militares, esses, sim, ofensivos, do campo contra-revolucionário, em suma, estavam à defesa e tentavam segurar o que tinham obtido. Isso não é incompatível, na ausência de um movimento de massas unificado e de uma direção política clara, com o deixar-se arrastar para a aventura golpista incipiente protagonizada pelos paraquedistas e as unidades do COPCON da Região Militar de Lisboa (RML) com o apoio de certos sectores sindicais afetos ao PCP e da militância da extrema-esquerda (ocupação das bases aéreas, de alguns pontos estratégicos da capital, da RTP e da EN). A 25 de Novembro, isso constituiu o pretexto há muito esperado para se desencadear o contra-golpe militar a sério. O que precisamente é revelador neste contexto é a surpreendente facilidade com que, praticamente sem resistência (excetuando o breve confronto na Polícia Militar), o Regimento dos Comandos subjugou, uma a uma, as unidades rebeldes. As escassas centenas de pessoas que as "defendiam" dispersaram e os seus chefes, disciplinadamente, se foram entregar ao Palácio de Belém. A terceira derrota era, agora, definitiva para o processo revolucionário.
  13. O novembrismo está para a contra-revolução, como o movimento militar de 25 de Abril estive para a revolução. Ele não era a contra-revolução, mas a alteração da correlação de forças que impôs, abriu o campo a que ela paulatina, progressiva e constitucionalmente se instalasse como política dominante da situação pós-revolucionária. Dissimulada e prudente ela entrava pelas portas que Novembro abrira. A 25 de Novembro, o golpe ordena a prisão de 118 militares, saneava da RTP e da EN 82 trabalhadores e demitia as administrações e direções da imprensa estatizada, substituídas por gente do PS e PSD ou militares afins. Ao contrário do que pretendiam a extrema direita e certos sectores da direita, não houve prisões massivas de “vermelhos”, anulação das liberdades públicas, dissolução de partidos ou encerramento de sindicatos ou das suas publicações, O PCP manteve-se no Governo Provisório e a Constituição de 1976 consagraria o objetivo do socialismo, a irreversibilidade das nacionalizações, a Reforma Agrária, o controlo operário e o papel das CT.
  14. Na realidade, o Grupo dos 9 negociara discretamente com o PCP uma contenção pactuadado processo revolucionário (o PCP travara no terreno os ativistas sindicais, os militantes civis e os militares arrastados para a aventura iniciada pelos paraquedistas) o que resultaria num processo obviamente distinto de uma clássica e violenta resposta contra-revolucionária. Um acordo que fazia a economia de uma contra-revolução sangrenta, mas em que os vencedores alteravam as regras do jogo em dois aspetos cruciais: impunham a consagração da legitimidade eleitoral sobre a legitimidade revolucionária e, sobretudo, liquidavam o MFA, repunham a hierarquia tradicional dos FA e, nesse sentido, anulavam a aliança essencial com esse braço armado de que dispusera o movimento popular no processo revolucionário. Regressavam as FA como espinha dorsal da violência legal do Estado. É certo que a revolução terminava. Mas deixava na democracia parlamentar que lhe sucedia a marca genética das suas conquistas políticas e sociais, dos direitos e liberdades que arrancara na luta revolucionária e cuja continuação impusera e defendia na nova situação política. É por isso que a equiparação esquemática que por vezes se faz entre a contra-revolução e a democracia parlamentar4 desconhece que, no caso português, ela é fruto do compromisso com um processo revolucionário que profundamente a marcou. Ao contrário do que afirma a direita política e historiográfica – em curiosa aproximação com o citado ponto de vista – a democracia política não existe em Portugal apesar da revolução, mas porque houve a revolução.
  15. Há, portanto, e um ser e um não ser na revolução portuguesa de 1974/75. Ela teve a força de subverter a ordem estabelecida atingindo os fundamentos do próprio sistema capitalista, mas não conseguiu segurar e, menos ainda, aprofundar essas aquisições num poder socialista durável. Foi travada a meio caminho e perdeu boa parte das suas conquistas mais avançadas na contrarrevolução mansa que se estabeleceu com a “normalização democrática”. Ou seja, foi derrotada pelas formidáveis reações que despertou tanto nacional como internacionalmente. O que conduz à necessidade de tentar analisar, ainda que sumariamente, algumas das suas principais dificuldades de fundo.
  16. Em primeiro lugar, a situação de “duplo poder” criada pelos milhares de órgãos de vontade popular eleitos nas empresas, nos bairros e nos campos do Sul pelos trabalhadores e moradores, nunca se constituiu numa organização nacional una e articulada. Muito menos, na sua dispersão, assumiu maioritariamente uma orientação política clara ou se colocou a questão da tomada do poder. Ao contrário do que acontece nos sovietes da Rússia de 1917 ou na revolução conselhista alemã de 1918/19, não há na revolução portuguesa um “poder popular” paralelo unificado, por isso se não colocou nunca, na prática, a questão de “todo o poder aos órgãos de vontade popular”. Até Julho de 1975 o PCP e a sua estrutura sindical opõem-se às CT e, antes e depois disso, cada grupo político da esquerda radical tem as “suas” CT e CM, as “suas” estruturas de articulação parcial, frequentemente guerreando-se entre si e com as que o PCP cria, finalmente, nesse Verão.
  17. Em segundo lugar, na revolução portuguesa, os órgãos de vontade popular não estão armados, novamente num contraste essencial com as citadas experiências soviética e conselhista. Eles são apoiados por um aliado externo a si próprios, um movimento militar, ou parte dele, ou até por algumas unidades dessa parte, à medida que a esquerda do MFA se vai dividindo e subdividindo. Não há operários, camponeses e soldados em armas como alguns sectores da esquerda radical reclamavam. Aliás, o PCP e as organizações radicais de esquerda mantiveram organizações nas FA mais para influenciar os oficiais do MFA do que para promover o insurrecionalismo dos soldados. Nestes termos, há um processo revolucionário dos trabalhadores externamente apoiado, quando foi, por um movimento de oficiais crescentemente dividido e debilitado. A vulnerabilidade era evidente: se e quando a reação ao processo revolucionário lograsse reenquadrar o MFA na cadeia de comando das FA, eliminando-o, o movimento de massas, mesmo se se mantivesse, perdia a sua indireta expressão armada e subversora, retomando a natureza de movimento reivindicativo sem capacidade de colocar a questão do poder. Passava à defesa. Foi precisamente isso o que aconteceu
  18. Em terceiro lugar, o campo político da revolução estava profundamente dividido sobre a natureza do poder a construir e os caminhos para lá chegar. E não houve, nem uma força claramente hegemónica susceptível de marginalizar as demais, nem a capacidade de encontrar uma plataforma mínima de ação comum (a própria FUP, Frente de Unidade Popular, constituída em 25 de Agosto de 1975 entre o PC e outros 7 grupos, já com propósitos claramente defensivos e sem parte dos maoistas, começa a desfazer-se 3 dias depois com a saída do PCP). A divergência central seria entre a estratégia cunhalista de progressiva ocupação do aparelho civil e militar do Estado, do MFA, das direções dos sindicatos e dos jornais/rádio/RTP, das autarquias, etc… quase sempre à margem de qualquer escrutínio democrático, de “cima para baixo”, e a orientação comum à esquerda radical de criar na luta de classes um “poder popular” capaz de partir ao assalto revolucionário do Estado. Mas mesmo no subcampo da extrema-esquerda, a guerra dos sectarismos em torno da “pureza” revolucionária era generalizada. E tudo isso, claro está, se reflete em cheio na coesão do MFA mais à esquerda, já em rotura com o “Grupo dos 9”.
  19. Na realidade, uma das singularidades da revolução portuguesa que o preconceito ideológico de boa parte da historiografia sobre este período tende a ocultar, é que a extrema-esquerda, mesmo pulverizada e em guerra interna, teve a força social e política suficiente para impedir a hegemonia político-ideológica do PCP no processo, sem, todavia, lograr impor um caminho alternativo. Este impasse no campo da revolução abriu uma guerra no seu seio onde a violência sectária, frequentemente, não foi só verbal, dando lugar a agressões, saneamentos, manipulações e até a repressões massivas na tentativa de eliminar politicamente o campo maoista mais hostil ao PCP5 Este conflituoso bloqueio afastou, naturalmente, aliados sociais instáveis ou desiludidos, evidenciou impotência na resposta, exprimiu desunião e fraqueza, isolou o campo em si mesmo, e nele se hão-de buscar algumas das razões que levam à incapacidade de resistir com sucesso a contra-ofensiva no Verão de 1975 e ao que se lhe seguiu.
  20. Concluindo, pode dizer-se com segurança que a revolução portuguesa não foi um assunto encerrado pelo novembrismo de 1975. A força telúrica que explodiu nesse “dia inicial inteiro e limpo” não bastou para vencer, mas permitiu-lhe, todavia, recuar lutando e condicionar fortemente o que se seguiu. É a partir da defesa, consolidação e alargamento desse património que ainda hoje se define a esquerda portuguesa.

Artigo publicado na revista Vírus nº 5
  • 1.
    Na manhã do dia 25 de Abril de 1974, na Rua do Arsenal, em Lisboa, tanques da Escola Prática de Cavalaria, de Santarém, aderente ao movimento militar, enfrentou os da Cavalaria 7, comandados pelo brigadeiro Junqueira dos Reis, fiel ao regime. Depois de várias tentativas de conversações, o brigadeiro dá ordem de fogo contra o capitão Salgueiro Maia que comandava a força do RC7. O alferes que chefiava a guarnição do tanque recusa-se a obedecer e recebe voz de prisão. O cabo que, em seguida, recebe ordem idêntica, também desobedece. Parte da força passa-se para os revoltosos e os outros voltam para trás. Tornou-se claro que o regime não tinha força militar que o defendesse.
  • 2.
    Cf. Álvaro Cunhal, A Verdade e a Mentira na Revolução de Abril (a contra-revolução confessa-se), ed Avante, Lx, 1999, pag. 101 e segs
  • 3.
    Cf. Raquel Varela, História do Povo na Revolução Portuguesa (1974-1975), Bertrand editora, Lx, 2014, pag. 421 e segs e pags 496 a 498.
  • 4.
    Ibidem, pag. 482 e segs.
  • 5.
    A 28 de Maio de 1975, forças do COPCON, sob proposta dos oficiais mais próximos do PCP no MFA, ataca as sedes do movimento maoista MRPP na Região Militar de Lisboa e prende várias centenas de militantes e ativistas, encerrados nas cadeias de Caxias e Pinheiro da Cruz onde serão sujeitos a um tratamento brutal, denunciado pela opinião pública. Serão libertados progressivamente até 18 de Julho de 1975.
http://www.esquerda.net/artigo/ser-e-nao-ser-notas-sobre-revolucao-portuguesa-de-7475-no-seu-40o-aniversario/32360