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"e como que a experiência é a madre das cousas, por ela soubemos radicalmente a verdade" (Duarte Pacheco Pereira)
A Internacional
sexta-feira, junho 08, 2007
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sexta-feira, maio 04, 2007
Uma pocilga infecta
* Antunes Ferreira
Vem isto a propósito de uma infecta situação que me causou uma enorme indignação a princípio. Depois, fiz por esquecer o imbróglio, mas tal foi-se tornando impossível. Muitos Amigos e muitos leitores que eu nem conheço começaram a mandar-me missivas inquirindo qual o motivo porque me metera numa esterqueira que dá pelo nome de «Portugalclub».
Outros disseram-me que estavam a receber esse escarro «internético» em quantidades colossais e que não queriam que tal sujeira lhes fosse enviada. Acentuaram muitos que, além do mais, os escritos lhes enchiam as caixas de correio, impedindo-os de acolher coisas decentes.
Comecei por esclarecê-los da enorme deselegância de um tal Casimiro Rodrigues, patrão do pasquim informático. E especifiquei que, escassos dias depois de ter publicado ali uns textos, porque um Amigo (que julgava muito bom…) me dissera que eu deveria fazê-lo para contrabalançar a sujeira que ali saía a público, dera expressamente por acabada a minha colaboração. Por escrito.
E disse-lhes também que fora eu o culpado de que tal lhes estivesse a acontecer, pois o homúnculo roubara a minha lista de endereços, não sei como o fez – mas fê-lo. E aconselhei-os a escreverem para o gatuno (à frente explico este nome) dizendo que não lhe permitiam que lhes enviasse o folhetim sujo.
Santa ingenuidade, a de um velho com 65 anos já feitos, estúpido procedimento, insana veleidade tive, pensando levar algo diferente do saudosismo, salazarentismo, fascismo que enxameiam a folha de couve. Não sabia do problema em que metera. Passo a explicar. Depois me dirão os que se me dirigiram ou, até, os que escreveram algo sobre isto neste blogue.

O já citado Casimiro, analfabeto praticante, revelou-se-me igualmente um chantagista contumaz. Ele que fora todo amabilidades quando eu entrara (que asneira!!!!!!!...) na desrazoada publicação (?), começou a telefonar-me e a mandar-me msns dizendo (tenho gravações e cópias) que era o Partido Socialista que me proibira de escrever ali. Só numa escassa hora e meia nocturna, tentou invadir-me o Messenger com 27 chamadas. Disso também tenho provas.
Como lhe mandara o meu curriculum vitae para que ele soubesse quem eu era (infelizmente só iria descobrir depois desses três ou quatro dias de colaboração, o carácter do infame) e apenas para isso, o sôr Casimiro publicou-o na íntegra, congratulando-se com o novo elemento que vinha prestigiar o já mencionado e intragável PClub. Disse-lhe então que ele procedera mal, mas que já estava feito. Por isso... Aliás, outros colaboradores (entre os quais alguns conhecidos meus e até amigos) felicitaram igualmente o patrão e a sua «obra» pela minha entrada…
Face à minha auto-exclusão da folha incrível, pois o proibira de publicar o que quer que fosse mais, o infecto começou um novo arrivismo: foi (e vem) a este blogue, roubando textos que publica como se eu fosse seu colaborador. Alguns mesmo assinando-os com Tenente Antunes Ferreira. O que é um acinte, para além do mais. Fui tenente miliciano, por ter prestado cinco anos de serviço militar obrigatório. Fui. Já não sou. Não quero interpretar o que o homenzinho (?) quer com tal parvoíce.
Acrescento que, e muitas vezes o disse já, esses cinco anos fardado – fruto de ser considerado um perigoso subversivo naquele tempo – não me originaram qualquer trauma nem servem de justificação para o clássico tempo perdido com o SMO. Tenho muito orgulho e honra de o ter sido. Não concordava com o chamado Estado Novo/Velho, bati-me contra ele - mas entendi que devia respeitar a farda do Exército Português. Não desertei. E aprendi muito com a vida militar e com os militares.
Esta é uma estória para esquecer. A última diligência que fiz foi solicitar à nossa Embaixada em Brasília para fazer o favor de tentar junto do energúmeno o possível para que ele não continue a incomodar-me. Já o avisei de que levaria, sendo necessário, o caso aos tribunais. Ripostou-me, no abjecto objecto, que eu estava a tentar intimidá-lo.
Acabou-me a paciência. Bato com a mão no peito, repetindo a contrição pela minha argolada, reforço o pedido de desculpas aos que são meus Amigos e aos que me lêem, prometo que tudo farei para que o procedimento pulha do mencionado sujeito seja eliminado. Mais – não posso. Infelizmente.
Um abração para todos. Veremos o que isto vai dar. Quousque tandem?
in
http://travessadoferreira.blogspot.com/2007/04/uma-pocilga-infecta-antunes-ferreira-t.html
O Cuanhama, aiué
* Antunes Ferreira
Chove se deus a manda. Cordões de água empapam a terra vermelha, acompanhados por raios e coriscos - uma trovoada das antigas – que fazem doer a alma da gente. Em miúdo, na sanzala, a mãe Miquelina atirava-lhe com berros e aiués pela mania que ele tinha de correr, nu, pelo terreiro tomando um banho que lhe tirava os caramunhos da cabeça. Minino você tens de aprender a ser um home civilizado. Seu pai lhe queria que tu fosse assim.
Ele não respondia. O seu pai. Por onde andaria ele, algarvio de torna viagem, que estivera ali sediado durante a enormidade de dois anos com um comércio geral de fancaria e que emprenhara a Zefa Catemba, em resultado do que nascera ele, José Paulo de Carvalho Simões, mulato claro, de olhos verdes como os do sacana do progenitor. E continuava a correr na chuva, conduzindo com mestria um auto de arame, rodas, volante e imaginação, tudo em arame, já disse.
Um dia, já a mãe o tinha metido na escola da Missão, o padre Filomeno, italiano de barba branca sobre a sotaina branca (que raio, o gajo andava sempre num brinco, branco era branco, ponto), chamara-o à presença dele. E dera-lhe para a mão um papel de carta em que ele, entre o desconfiado e o espanto, dera a ler o que lá dizia. Era do pai. E tinha preso por agrafe metálico, um tanto enferrujado, um bilhete de barco para Lisboa. O que lhe pareceu o mais importante, no meio da confusão que se lhe instalara na cabeça, por baixo mesmo do cabelo liso. Os outros miúdos bem o chateavam por não usar carapinha.
Convencido de ser branco
Dona Zefa ainda hesitou. Mas o homem que fora o seu, era o pai do minino. Você faz o que queres, já tem idade pra isso. Mas eu lhi aconselho que vás. Foi. Em terceira classe, no Niassa, navio-motor lhe chamavam, que então era quase novinho em folha. Da viagem – só boas recordações. A camarata para 12 pessoas era o menos. O mar era o mais. E, como não enjoava, fartou-se de comer coisas boas, de brancos, convencido de que já era um deles.
Resumindo. O pai, que tinha o mesmo nome, tinha uma taberna e carvoaria, ali para os lados da Morais Soares, quase em frente o cemitério, do outro lado ficava a Praça do Chile. E os eléctricos iam e vinham, à mistura com as carretas funerárias da Agência Abreu. Passou a trabalhar com ele e o sôr Simões pô-lo a estudar à noite, na escola comercial. Uns anos depois, era ajudante de contabilista da praça, do Senhor Raimundo, que fazia as escritas de uma porrada de lojecas e, até, de algumas lojas mais apessoadas.
Pensava meter-se no Instituto Comercial, ali a Santa Catarina, quando rebentou a guerra na Angola que acreditava ter esquecido. Mas o Salazar, ou os gajos quo acolitavam, deu-lhe passagem para lá, depois de ter feito o CSM. Furriel miliciano, farda amarela de caqui, ei-lo que desembarca em Luanda, que coincidência, no mesmo Niassa, agora mais encarquilhado, mal cheiroso a bedum da animalada que transportava e a que chamavam transporte de tropas. Mantendo o navio-motor, diga-se.
A sanzala Serrador
A companhia de caçadores independente passou seis fugazes dias na capital e seguiu em coluna militar para Nambo. A picada relembrara-lhe os anos da infância. E ainda levava a esperança de rever a Mãe Zefa na sanzala, à beira do caminho. Mas, o que viu, gelou-o. Só havia paus a pique queimados, dois cães esqueléticos e uma cabaça rachada. Ninguém a quem perguntar pelo povo.
Já no aquartelamento, ao lado do que fora o clube desportivo, tinham-lhe dito para tentar averiguar algo com o Malaquias do chuto. E quando este, já com uns valentes bagaços no buxo, e por entre fumaças de liamba, lhe contara que ninguém escapara, a militança que viera de Luanda vingara-se das atrocidades da UPA, olho por olho, dente por dente, só um velho ficara para contar, a ele, José Paulo de Carvalho Simões, subira-lhe pela espinhela até chegar ao cocuruto. Nas palhotas, disseram, para justificar a metralha, acoitavam-se muitos bandidos autores dos mais bravios assaltos.
O resto da comissão passou-o na agonia de vingar os mortos da sanzala Serrador, entre os quais a Mãe Zefa. Mas, o que, na verdade, o perseguia era a visão do que não vira: o povo de borco ou de costas, tanto faz, pelo chão, litros de sangue empapando e reforçando o chão já de si avermelhado, homens, mulheres, velhos, velhas e, sobretudo, meninos ou meninas. Raiados a metralha.
Fez o pedido legal para passar à disponibilidade em Angola, alegando (justificadamente, diga-se) que era a sua terra. Entretanto, chegara-lhe do Puto um telegrama. O pai Simões finara-se, qualquer merda do coração, parece que estava a montar uma catraia de vinte e poucos anos, dera-lhe o badagaio, finara-se. A mulher, a legítima - porque a Mãe Zefa fora apenas a que o parira, que o deitara ao Mundo desgraçado que era este – fugira-lhe um ano antes com um marinheiro turco, levando uma porradaria de contos.
Peluda. Conversas no Rangel e no Sambizanga. Numa noite sem luar saíra de São Paulo de Luanda, à boleia de um camionista indicado pelos novos camaradas, tipo seguro, ainda que não seja dos nossos, afirmara-lhe, convicto, o Pintado das ferragens, militante do MPLA, a que aderira também. A vingança teria de ser forte, sentida pelos filhos da puta dos portugas, mas a independência seria ainda mais importante. Fossem chacinar para a cona da mãe da terra deles.
Os tugas já tinham aprendido
A chuva abrandou. Zé Paulo puxa do maço de Hermínios, aponta-lhe um fósforo, engole o fumo até tão fundo que quase lhe chega aos tomates. Fuma também de raiva. O golpe de mão que tentara executar fora um flop de todo o tamanho. Os gajos seus companheiros de Bilhete de Identidade – de mais, não – também já sabiam muito. Tinham-lhe trocado as voltas e o grupo dele, de 12 ficara reduzido a cinco. Sendo que dois muito estragados, um sem uma perna e o outro cego do olho direito. Uma ganda foda.
Com as mãos em concha tenta preservar a pirisca da ex-catarata que o envolve. Acabou-se: a beata e a euforia. Hoje, tudo aquilo que tinha acumulado de sucessos, fora-se, sem ai, nem ui. Tenho de me redimir, cogita. Tenho de os agarrar pela pele dos colhões e dar-lhes cabo da saúde. Levanta-se e anda, silenciosos, para trás e para diante, no meio das folhas de mandioca, em Cabinda fazem um esparregado com elas, o saca-folha, de comer e chorar por mais.
A noite vai-se transformando em matina, já nasceu um sol que tenta desesperadamente, apenas acordou, penetrar as ramas folhosas. Os companheiros foram até ao charco próximo, lavar-se e dar água aos feridos. Um deles, o Cachimba volta para trás. Camarada o cego escapa, o Cuanhama não se safa. Está a acabar. Já não tem sangue quase mesmo. Pediu no Cavibonde que lhi leva a foto da filha pra dar na mãe da minina.
Que idade ela tem? Cachimba olha, surpreso. Afinal o camarada Simões tem coração. Está a perguntar pela menina do Cuanhama. Ninguém diria. Olha camarada, repara só na foto. Tem cinco anos e si chama Joana. Que lhi parece?
A Mãe Zefa; sente que ela lhe põe a mão no ombro como fazia antes de. Zé Paulo, filho, essa minina Joana também é nossa, também é tua. Conserva-lhe. Você não tens filho, agarra ela e que ela lhi chama pai. Puxa da carteira ensebada, de couro andaluz, comprou-a em Sevilha, tinha ido lá numa excursão da escola nocturna, até engatara uma chavala, Mercedes, 22 anos, um espanto na cama. Fora no Parque Maria Luísa que a encontrara, quando se preparava para dar uma volta de charreta com quatro colegas. A bolsa que já foi castanha e brilhante tem a Virgem da Macarena em relevo. Tinha. Dela tira cuidadosamente a única foto que tem, teve e terá da Mãe Zefa.
Junta as duas, a da senhora e a da miúda. Mete-as na carteira. Está decidido. Quem sabe se ainda chegar a tempo, quem sabe quando a guerra vai acabar, quem sabe se arranjará um irmão para a Joana. Depende. Da guerra e da viúva. E dirige-se ao charco. Para também ele se lavar sumariamente. Para mais nada. O Cuanhama já se foi, aiué, como dizia a Mãe Zefa.
Texto retirado do Blog Travessa do Ferreira
e reproduzido no PortugalClub
O rio e a sorte
* Antunes Ferreira
Quando os maçaricos chegavam, ainda a cheirar a cueiros e já carregados de saudades, os veteranos costumavam gozar com eles. O que é mais do que natural, sobretudo em teatro de operações. Já tinham passado pela rábula da caça aos gambozinos, na recruta, noite em claro agarrados aos sacos de serapilheira, à espera. Já tinham engolido os pedidos/ordens dos instrutores – vai-me ali buscar a caixa das estrias. Porra! Mas ali era diferente.
Uma boa parte das saídas era pelo rio, margem acima, margem abaixo, que sacana de vida, então para que raio eram os fusos? Esses é que estavam preparados para a guerra aquosa – ou outra merda qualquer – mas eles, não. E os velhos: cuidado com os tubarões. Mas aqui há tubarões. Não, maricas, os crocodilos comeram-nos todos. E as sanguessugas atirando-se ao couro dos polainitos em busca de sangue fresco, que vida de peixe de rio. Nem a tainha, nem o sável, nada.
Mais abaixo, na curva mais pronunciada do rio, é o local onde nós atacamos. Os tugas, mais ou menos preparados, mais ou menos prevenidos, mais ou menos acagaçados, nem mesmo assim tomam as precauções imprescindíveis. Xi, camarada, essis gajos num tem nada nos cabeça. Antão não repara que esse é o sítio das makas? São burros mesmo. Muitos vão voltar no Puto dentro do sobretudo de pau.
Até dois Cabinda tem
É um grupo lixado, o nosso. Vinte e três patrícios, de muitas sanzalas e muitas diferenças. Repara só, mano, até dois Cabinda tem. Só que todos são MPLA, e o comandante é o Adão que esteve dois anos em São Nicolau – e sobreviveu. Do povo vêm umas mulheres que trazem na malta comida e munições. E desenferrujam os nossos coiso. Um homem está na mata, tem de se alimentar, mas também precisa de fêmea. Todos os bichos fornica, os negros também tem direito.
Eu sou o Sabonete João. Já ando nesta vida há muitos meses. Quase quatro ano. Tem que chega? Não. É preciso atirar os portugas no mar. Para a terra deles, prá cona das mães deles. Pró cu do Salazar. Aka! Muitas vezes me pergunto quem é esse Salazar. É o soba grande dos tugas, disse-me o Sebastião Moluto que andou até ao quinto ano do Salvador Correia. Chama-lhe o pai da pátria, o salvador de Portugal e também lhe conhecem por Esteves.
O Sebastião explica que o gajo chama-se António de Oliveira Salazar. Nunca ninguém avisa onde vai ele amanhã. A PIDE tem ordens para impedir que digam que amanhã o Senhor Presidente do Conselho vai estar na Feira das Indústrias. Podem lhe querer fazer mal, um tiro, uma bomba, sabe-se lá. Por isso é que os jornais, a rádio e agora a televisão dizem sempre que esteve ontem na inauguração do mercado de Palhavã... Por isso, dizem que é o Esteves.
Palmatoada nos preto
Sei ler e escrever, aprendeu no livro com os mininos da mocidade portuguesa na capa. Até sei de cor os rios de Portugal e os seus eflu... afluente, julgo que se diz assim. Do Norte até no Sul, no Algarve. E as linha do caminho de ferro com ramal e tudo. Os padre missionários ensinava tudo direitinha na gente. Se não sabia, pimba, lá vinha a minina de cinco olho, a dar palmatoada nos preto.
Fui ajudante de contínuo na Fazenda, ali na Mutamba, com o senhor director-geral Mendonça. Bom home. A mulher, a Dona Joaquina nem por isso. Dava na lavadeira e nos três criado, uma sardinha e dois batatas pró almoço e eles que cozinhava. E tirava-lhe um dia no salário se faltavam meio dia no serviço. Era cabrita e toda a gente sabe que o patrício diz que o branco é filho de Deus, o preto é filho do Diabo e o mulato, principalmente, o cabrito é filho da puta. Quando o senhor Martins, chefe da repartição me avisou que tens de ir na tropa, fugi. Do Casa Branca até aqui foi uma confusão. Mas cheguei e cá estou.
Pronto. O camarada Adão está lhes chamando para combinar uma emboscada. Vai ser amanhã, ao lusco-fusco, quando o sol ainda não estendeu os raios. Eu fico com a bazuca, o Ganguela com o morteiro, os outros com as Kalachas. Boas arma, essas russas, de carregador em gancho, tem mais bala que a G3 dos colonialistas. Diz o comissário Tunda que se o Salazar não manda comprar elas, os tugas perde a guerra contra os patriota.
Patriota somos nós. O grupo todo é unido e patriota. O comissário nos explicou que patriota é aquele que conquista a sua Pátria. O cipaio não é patriota é chulo. Serve os branco. E os administrador cabo-verdeanos também é traidor. Batem mais que os brancos e não pagam imposto geral mínimo. Até os funcionário paga, mas administrador não paga. Então porque é geral?
Os «voluntário da corda»
Estou a limpar a arma com escovilhão até. Amanhã, na madrugada, ela não vai encravar. Não pode. Senão quem encrava mesmo sou eu, Sabonete João, natural do Golungo Alto, terra do camarada Agostinho Neto. Tudo brilhante, a mira bem aberta, pra acertar neles. Assim, já não pago mais o antigo imposto de palhota. Acaba os escravos, com a luta do povo angolano. O Tarcísio me mostrou uma fotografia de uma fila de pretos atados pelas garganta com uma corda grossa de sisal. Me disse que eram os voluntários para a colheita do café. Os «voluntários da corda» - e fartou-se de gargalhar.
Tenho quatro cigarros e meio, AC, maço vermelho e branco com os letra a preto. Os portuga dizem encarnado, vermelho é comunista, a PIDE proíbe. Essa polícia é futida mesmo. Prende um preto, lhe enfia uma carga de porrada, mas também dá nos branco. Diz que viu que bate menos por ser da mesma cor. Não sei. O agente que eu conheceu na Maria Fernanda (boa fazenda de café, pertinho do Bico do Pato), Almeida qualquer coisa mais, disse que não tem medo de ninguém, nem do governador-geral, nem do bispo.
Que se tramem o Almeida, o governador e o bispo. O Adão chega junto de mim e agarra na arma para lhe experimentar e examinar. Leva a culatra atrás, espreita no cano faz hun-hun e devolve-me a canhota. Lá no céu já estão as primeiras estrela, é noite de lua cheia, bom sinal para daqui a bocado. O Lucungo prepara a mina para pôr debaixo da água, no sítio em que passa os soldados.
É preciso muito cuidado, essas mina são terríveis, rebenta por um cabelinho. Para a armar tem de se ter todos os olhos bem aberto. Todos não. O do fundo das costas deve estar bem apertadinho, quer dizer que tem maúfa, ou se não tem, duvido do herói que não nasce como o capim, à farta. Tem sim de ter muita atenção e muito cuidado, a maldita pode explodir nos nossos não neles.
... ... ... ... ... ... ... ... ... ...
Às quatro da manhã, o primeiro homem põe o pé no sítio da mina. É um soldado preto, desses que ficaram no lado da tropa, com vontade ou sem vontade. Não interessa. Adão deixa-lhe passar, seguem-se os outros, quase um pelotão. Com a água barrenta pela cintura os camuflados semi-flutuam, diluídos no cinzento da madrugada, vão avançando, cuidadosamente, em bicha-de-pirilau. Já estão todos na zona da morte.
O estrondo, medonho, abana o tempo e o ar. Ergue-se uma coluna líquida carregada de espuma e já tinta de sangue. Os gritos são uivos de animal caçado e estralhaçado. Uma nuvem de pó acastanhado e de fumo de enxofre paira por momentos e vai caindo sobre as águas ainda revoltas. Ter-se-á safado algum? Por certo, mas não vale a pena ir lá abaixo contar as baixas. Adão levanta o braço direito, a mão espalmada, em aceno para que a malta se retire, devagarinho, sem sobressaltos nem barulhos.
Vai chegando, no meio da desgraça, o reforço que de nada servirá. O que tinha de se fazer, está feito. Sabonete João estou a coçar o olho direito. Espinho de árvore, lasca de madeira explodida, areia mais grossa arremessada pela deflagração? Ou lágrima pelos muitos que, sem saberem bem porquê, foram mandados para o matadouro no rio? Raio de sorte de quem se habituou, apenas, a obedecer. Uma merda, co'escafandro.
Do P.Club.:
Fantasias de fascista\Socialista?. Não. Não são só fantasias! Este é, e era o agir desses fascistas Socialistas , traidores da Pátria e dos Ideais de Um PORTUGAL grande. O Ideal desta gente era só a URSS. Observem como se referem aos portugueses de Cor, naturais das Provincias, e aos cabo verdianos?. Depois acusam os "Colonos" de racistas?. Casimiro