A Internacional

__ dementesim . . Do rio que tudo arrasta se diz que é violento Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem. . _____ . Quem luta pelo comunismo Deve saber lutar e não lutar, Dizer a verdade e não dizer a verdade, Prestar serviços e recusar serviços, Ter fé e não ter fé, Expor-se ao perigo e evitá-lo, Ser reconhecido e não ser reconhecido. Quem luta pelo comunismo . . Só tem uma verdade: A de lutar pelo comunismo. . . Bertold Brecht
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sexta-feira, outubro 25, 2013

José Pacheco Pereira - O DESPREZO PELOS MANIFESTANTES DA CGTP

O DESPREZO PELOS MANIFESTANTES DA CGTP 

Uma coisa que mostra como quem está do lado do poder não percebe (ou melhor não quer perceber), o que está a acontecer em Portugal, é o modo como exibem um racismo social com os manifestantes da CGTP, tão patente nos comentários à saga da ponte. Pode não ser deliberado, mas sai-lhes do fundo, naturalmente. Os filhos dos comentadores e opinadores podem ir às manifestações dos “indignados”, que são aceitáveis, engraçadas e chiques, e que tem muita cultura e imaginação, mas nenhum irá às da CGTP. Eles “são sempre o mesmo”, ou “mais do mesmo”, eles são “pouco criativos” que insistem em fazer manifestações “que não adiantam nada”. Eles são “os feios, os porcos e os maus”. 

http://ephemerajpp.files.wordpress.com/2013/10/dsc_4706.jpg Os manifestantes da CGTP não são da classe social certa, não ambicionam ir tomar chá com Ricardo Salgado, ou ir comer aos restaurantes da moda, não são frequentáveis e, ainda pior, não se deixam frequentar. Têm, muitos deles, uma vida inteira de trabalho e de muitas dificuldades. Tem um curso, uma pós-graduação e um doutoramento em dificuldades. São velhos, um anátema nos nossos dias. Tiveram ou tem profissões sobre as quais os jornalistas da capital não sabem nada, foram corticeiros, mineiros, soldadores, torneiros, mecânicos, condutores de máquinas, pedreiros, ensacadores, motoristas, afinadores, estivadores, marinheiros, operários têxteis, ourives, estofadores, cortadores de carnes, empregados de mesa, auxiliares educativos, empregadas de limpeza, etc., etc. Foram e são cozinheiros e cozinheiras em cantinas, e nãochefs. E foram ou são, professores, funcionários públicos, enfermeiros, contabilistas. 

 Este desprezo social é chocante quando é feito por quem tem acesso ao espaço público e que trata os portugueses que se manifestam, - e, seja por que critério, são muitos, pelo menos muitos mais, muitíssimos mais dos que estariam dispostos a vir para rua pelo governo, – como uma “massa de manobra” do PCP, que merece uma espécie de enjoo distanciado, umas ironias de mau gosto e um gueto intelectual. Façam vocês o que fizerem, “não contam”. Vocês são umas centenas de milhares, vocês são “activistas” e por isso se vêem muito (quem não se vê nada são os do “outro lado”), mas “não contam” para nada. Existirem ou desaparecerem é a mesma coisa, nenhum dos “de cima” se pode ou deve preocupar convosco. Votam em partidos anacrónicos, têm hábitos plebeus, vão fazer campismo de férias, fazem excursões organizadas pelas autarquias, jogam a sueca, as mulheres passam-se pelo Tony Carreira e todos acham que tem direitos. Vejam lá, imaginem lá o abuso, acham que tem direitos… Eles são os maus portugueses, os que estão de fora do “arco governativo”, os que não percebem o "estado de emergência financeira", aqueles cujos "interesses" bloqueiam o nosso radioso empreendedorismo.

 Tudo isso é verdade, e tudo isso é mentira. Estes portugueses fora de moda e fora das modas, pelo menos tem o enorme mérito de sentirem um agudo sentimento de injustiça, eles que sabem mais da vida real, concreta, vivida do que todos os seus críticos juntos. Não é a eles que se pode dar lições de trabalho, nem de esbanjamento, nem de perseverança, nem de sacrifício. Pode-se discordar deles, mas merecem respeito. Pelo que foram, pelo que são e porque não se ficam.

terça-feira, julho 30, 2013

Portugal não é a Grécia. Nem o Egipto. Nem a Tunísia. Nem o Brasil. Nem a Turquia.




O governo de Passos Coelho e Portas – e Cavaco -, é provavelmente o governo que enfrentou mais contestação pública desde a constituição da Assembleia da República. Greves gerais, greves sectoriais, manifestações sindicais, manifestações de outros movimentos sociais, manifestações de partidos, concentrações, acções, protestos em plena A.R., esperas públicas, invasão de palestras, tem sido este o variado menu de protesto e de proposta de alternativas de Esquerda. Precisamos de o manter e de o alargar, quer na quantidade quer na qualidade.
A coisa só se dá com união, ponderação e determinação. Têm sido muitos a pedir a união das “esquerdas” – coloquem o PS dentro ou fora disto, conforme vos apeteça ideologicamente – e têm sido muitos a trabalhar para essa desunião, muitas das vezes têm sido os mesmos a fazer as duas coisas em paralelo. A bandeira da unidade é frágil, tem um pano enorme e um pau muito pesado, não se ergue com palavras, segura-se com actos.
A crítica costuma rondar sempre a mesma questão: a CGTP e os partidos da esquerda parlamentar não mantêm as pessoas na rua.
 A CGTP e a esquerda parlamentar têm os seus percursos, as suas ideias, as suas formas de fazer e os seus caminhos. Durante anos – décadas no caso da CGTP e do PCP – deram luta ao fascismo, ao “soarismo”, ao “cavaquismo” e agora ao liberalismo económico. Estas lutas não lhes dão autoridade moral em relação aos mais novos e menos experientes, dão-lhes apenas História e maior organização. Em todos esses anos deram passos em frente e passos atrás, reinventaram-se, bem umas vezes e mal outras. Quem está com eles em muitas das suas reivindicações e ideais mas não concorda com os seus planos de acção só tem uma coisa a fazer: meter as mãos à obra e criar o seu espaço.
É preciso coerência e consequência. Disse a Rita Veloso que os críticos das acções da CGTP e da esquerda parlamentar, «curiosamente, nas suas críticas incluem portentos como “deviam era ter convocado assim, ou mobilizado assado”. Ou seja, censuram, censuram, mas continuam à espera de que os outros tomem a iniciativa. Será porque sozinhos a sua capacidade de mobilização é quase nula? Deveriam talvez interrogar-se sobre as razões pelas quais os outros têm a capacidade de mobilização que têm…» Disse e disse bem.
As pessoas deviam, provavelmente, estar todos os dias na rua como o fazem e fizeram no Egipto, na Tunísia, no Brasil e na Turquia. E porque não ir buscar o exemplo de Ghandi? Ou o exemplo de Simon Bolívar? Ou o exemplo do homem que iventou a roda e que, à sua maneira, revolucionou o Mundo? Mas Portugal é Portugal, com as suas qualidades e defeitos, e com a sua rua muito própria e sui generis.
Também estes países são inimitáveis, pela sua cultura, pelos diferentes problemas vividos pelas suas populações, pela influência da religião nos aspectos políticos, pelos tipos de regime e de organização políticia e social dos seus estados e a diversidade infindável de partidos políticos. Especificando as conquistas que naqueles países foram alcançadas com os protestos diários, e de forma resumidíssima, vemos que:
- no Egipto e na Tunísia caíram duas ditaduras. Neste momento, no Egipto, as ruas já fizeram caír o suposto governo da mudança, substituído por um governo marcadamente liberal e pró-imperialista, que tem chacinado os apoiantes de Morsi. Na Tunísia continuam a assassinar-se líderes da oposição;
- na Turquia conservou-se um parque, mas Erdogan continua no poder e sem sinais de o abandonar;
- no Brasil, e porque no poder está um governo teoricamente mais inclinado à Esquerda e que tem como obrigação mínima ouvir as pessoas, o aumento dos transportes foi parado e algumas medidas exigidas pelas ruas podem vir a ser aplicadas. No entanto continuamos em stand-by, à espera de ver Dilma cumprir o pouco que prometeu.
Tivemos revoluções não concretizadas ou que tardam em concretizar-se, tivemos a manutenção de poderes altamente e violentamente criticados e temos um povo posto na expectativa e com uma rua constante mas cada vez menos ruidosa. Parecem-me pequenas conquistas para tão grandes e contínuos protestos, principalmente quando em nenhum deles se atingiu o mais importante: a melhoria inquestionável das condições de vida das suas populações e a implementação de regimes solidamente democráticos.
Se olharmos para Portugal e para a proporcionalidade das massas nos protestos podemos ficar contentes, porque, apesar de não em continuidade, num só dia, 2 de Março de 2013, mais de 20% da população nas ruas, façam as contas e comparem com os outros. Dezenas de outras manifestações tiveram das maiores participações das últimas décadas.
Se olharmos para a proporcionalidade do resultados obtidos, vemos que eles não são muito diferentes dos alcançados nos outros quatro países. Também a nossa rua teve conquistas, umas maiores que outras, mas não atingiu o objectivo mais importante: a melhoria inquestionável das condições de vida das suas populações e a implementação de um regime solidamente democrático.
Para juntar a esta equação temos o nosso país vizinho, a Espanha. Por nos ser mais próximo geográfica e politicamente, a comparação é mais simples. Uma enorme e longa acampada e as gigantescas manifestações semanais que se lhe seguiram tiveram um efeito: colocar no poder um governo ainda mais autoritário que o anterior. Neste momento, esse mesmo governo, demonstra ser um poço de corrupção que as ruas não estão a conseguir guilhotinar e que é surdo a todas as suas reivindicações.
Parece-me provado que não é a constância ou a inconstância da rua que faz ou não a Revolução, é a força que está por detrás dela, a força da sua união em prol de um objectivo comum e concreto, ou, em alternativa, a força das armas que a querem concretizar. Se viajarmos entre Faro e Bragança, percebemos que a “união nacional”, a nossa, a que quer a Revolução está longe de existir. Em muitos pontos do país há até quem suspire pela “união nacional”, mas a outra, a que quer o regresso ao passado.
O governo continua “alive and kicking”. No parlamento, hoje mesmo, conseguiram ver aprovadas uma série de medidas que pioram drasticamente os direitos laborais dos funcionários públicos e das suas famílias. Continua a ser preciso parar este governo. A única hipótese é dar-lhe luta, enfrentá-lo olhos nos olhos e onde lhe dói mais: na rua, no parlamento, nos locais de trabalho, ou seja, em todo o lado. E a CGTP, hoje, esteve à porta da A.R.
E foram a CGTP e também o Que Se Lixe a Troika os dois grupos que mais chamaram a rua e que a tentaram trazer para o nosso lado, cada um com a sua forma de actuar. A rua possível respondeu sempre e esteve e está com eles. Dê um passo convicto à frente quem acha que a estocada final na besta se dá de outra maneira. Convoquem a rua, tirem a limpo se ela está convosco.
André Albuquerque (roubado aqui)

Serena o ser

crónicas de ser e não ser num sereno ser

http://serenaoser.blogs.sapo.pt/112865.html

sexta-feira, novembro 16, 2012

Comunicado do Movimento 12 de Março - Pela Greve Geral, contra a selvajaria policial



Pela Greve Geral, contra a selvajaria policial

Comunicado do Movimento 12 de Março


Início

A 14 de Novembro – dia de uma magnífica Greve Geral Europeia – a democracia portuguesa cobriu-se de orgulho e, ao mesmo tempo, de vergonha.
Orgulho porque milhares de pessoas, trabalhadores, precários, desempregados, pensionistas e reformados mostraram de forma clara e inequívoca que recusam esta politica de austeridade, o Governo e a troika.
Nos locais de trabalho, nos piquetes de greve, nas concentrações e manifestações que ocorreram por todo o país, os que fizerem greve e todos aqueles que a apoiaram mesmo não a podendo fazer, disseram não ao caminho a que o país está a ser conduzido.
Sindicatos, coletivos diversos, movimentos sociais e milhares de pessoas uniram-se e aí estão, para resistir à destruição das nossas vidas, do nosso futuro. Aí estão para dizer que há alternativas, que este orçamento não pode passar e que as funções sociais do Estado democrático e de direito não podem ser destruídas.
Mas o dia manchou-se também de vergonha. Uma vergonha pesada e sentida pela forma selvagem e antidemocrática como a Polícia de Segurança Pública carregou sobre milhares de pessoas que se manifestavam de forma pacífica. A desculpa foi querer parar a ação de “meia dúzia” que atiravam pedras e outros objectos. Como se centenas de polícias, armados até aos dentes e à paisana, treinados ao mais alto nível internacional com o dinheiro dos nossos impostos, não o pudessem ter feito sem colocar em risco a vida dos outros milhares que ali estavam de forma pacífica.
A repressão policial, o ataque e perseguição indiscriminados, a detenção de pessoas sem que tenham o direito elementar e constitucional de defesa, a coação para que assinassem documentos em branco e a agressão premeditada em calabouços esconsos merece, por parte doMovimento 12 de Março, um total repúdio e condenação.
A forma como o Governo ordenou à Polícia para afugentar e terminar com a manifestação,lembra-nos os tempos mais escuros e repugnantes em que há umas décadas vivíamos.
Recusamos e denunciamos a tentativa de instalar o medo entre os que querem, legitimamente, protestar contra estas políticas. Não aceitamos que se queira criminalizar a contestação e bater-nos-emos contra esta tentativa de enlamear a ação dos movimentos sociais e dos sindicatos e de manipular a opinião pública.
Por este motivo, exigimos a demissão imediata do ministro da Administração Interna,Miguel Macedo, e a instauração de um inquérito aos decisores e autores de tais ações.Para que os criminosos não fiquem impunes.
Da parte do Movimento 12 de Março, podem ter a certeza, continuaremos nas ruas ou onde quer que seja a lutar contra a política de austeridade deste Governo e da troika, que está a destruir as pessoas deste país.
A gravidade dos acontecimentos demonstra quão jovem e precária é a nossa democracia. Por isso, este é um momento de união. Juntos saberemos encontrar as soluções.

    
 
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Amadores do Protesto

Ao contrário do que o ministro diz, um iletrado da história dos conflitos sociais, naquela manifestação só havia amadores do protesto. Por isso é que 100 polícias conseguiram mandar uns petardos e 10 000 pessoas fugiram como baratas tontas podendo ter sido mortas só no acto de fugir (e a responsabilidade pelos assassinatos seria única e exclusivamente do Governo).
 
Os mineiros da África do Sul, com uma greve acompanhada de catanas no mês passado, conseguiram quase triplicar o salário. Na Argentina, há 10 anos, os bancos tinham que ter grades 24 horas por dia e 4 presidentes tiveram que demitir-se, tendo um deles fugido de helicóptero, depois de sitiado no Palácio Presidencial; no Novo Mundo, em 1830, os escravos incendiavam as plantações e em todos os estados dos EUA houve escravos condenados por assasinar o seu dono; em Buenos Aires em 2000 havia um grupo de advogados cuja função era defender quem passa fome e tinha roubado comida como «presos políticos»; os mineiros das Astúrias, ainda este ano, descarregaram sobre a polícia que reconheceu publicamente «ter medo deles» e foram recebidos como heróis em Madrid por um milhão de pessoas; durante a greve da Vittel em França em 1970 os operários furaram as garrafas todas que fabricaram; em Turim, em 1980, quando a polícia carregou sobre os operários da Fiat, choveram vasos, atirados pelas mamãs italianas!, do alto das janelas, sob a cabeça dos polícias; em 68 Paris ardia sobre barricadas e pedras da calçada; em 1974 e 1975 Portugal era o país do mundo que mais sequestros tinha de patrões; o Movimento Sem Terra no Brasil ocupa terras levando a bíblia numa mão e uma catana na outra. Em todos estes protestos que referi a violência é organizada em sindicatos, partidos, comités de fábrica ou organizações clandestinas e têm reivindicações económicas e políticas claras e logram ter apoio de massas fora para as suas acções.
Em 1974 nasceu, da revolução, o Pacto Social. Na crise de 81-84 mataram o Pacto Social e nasceu a Concertação Social, dando origem ao neoliberalismo, que sinteticamente dividiu por quase 30 anos os trabalhadores portugueses em 2 – os precários e os que tinham «direitos adquiridos» ou que foram mandados para casa com reformas antecipadas. Esta crise, por necessidades do próprio processo de acumulação de capital, está a destruir os direitos da franja de trabalhadores que ainda tinha direitos. Não sobra portanto nenhuma base social a este regime, a não ser a polícia.
Esta carga policial, que devia ser condenada sem nenhum «mas», visa amedrontar não os «amadores do protesto» mas os profissinais que aí vêm, como foi referido em diversos meios. Requisições civis ou serviços minimos sobre os estivadores, «radicais» detidos e ameaçados nas capas dos jornais, carga policial sem travão, violência sobre os piquetes de greve; tudo isto é o caldo de quem está desesperado, como este ministro, porque compreendeu que as suas medidas estão a juntar a uma  só voz aquilo que ele quer impedir – os trabalhadores precários, os desempregados e os que (ainda) têm direitos.
O fim do Pacto Social, com este massacre da Troika/PS/PSD/CDS, é também o fim da base de apoio deste regime. O Ministro tem razão quando diz que os confrontos se deram depois da manifestação da CGTP mas não percebeu, ofuscado pelas luzes da televisão, que a carrinha de som da CGTP saiu mas os trabalhadores ficaram

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A quem serve o triunfalismo?


Coletivo Passa Palavra


A quem serve o triunfalismo?16 de novembro de 2012   


Importa quebrar com uma espécie de boa moral, que se preocupa mais em defender a lei do que os interesses de quem trabalhaPor Passa Palavra
Por Passa Palavra
No dia 14 de Novembro decorreu em Portugal uma greve geral convocada pela Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses (CGTP). Segundo os organizadores (veja aqui), esta teria sido uma das maiores greves gerais de sempre. O tom triunfalista é absorvido por uma boa parte da esquerda. Mas o triunfalismo, se inconsequente, é um dos maiores perigos para o futuro das lutas sociais. Esse triunfalismo esquece outras variáveis políticas e sociais em jogo e que, estas sim, representam aspectos que qualquer avaliação crítica e honesta das lutas sociais tem de tomar em conta.
O triunfo e as derrotas das lutas sociais estão nos detalhes
Em primeiro lugar, o que significa no Portugal de hoje dizer-se que esta teria sido «uma das maiores greves gerais dos últimos anos em Portugal» (idem)? Para os esquecidos, recordamos apenas que as greves gerais convocadas em Portugal por centrais sindicais foram sete: em 1982, 1988, 2002, 2007, 2011 e 2012 (Março e Novembro). Portanto, colocar esta última no topo das greves gerais é o equivalente a um aluno de uma escola primária chegar a casa e dizer à mãe que é um dos melhores alunos da sua turma de sete elementos… A caracterização seria cómica, não fosse o caso de se estar a viver um período muito conturbado e crítico.
Por outro lado, num comunicado emitido pelo Partido Comunista Português (PCP) no final do dia da greve geral lê-se o seguinte:
«A Greve Geral teve um profundo impacto em todo o País, nas diferentes regiões e sectores de actividade, na indústria e nos serviços, no sector privado e no sector público.
Na indústria com paralisações totais de muitas empresas como o Arsenal do Alfeite, os Estaleiros Navais de Viana do Castelo, Lisnave Mitrena, a Browning e elevadíssimas adesões com paragem quase total do parque industrial da Autoeuropa, e em muitos outros empresas em que se salientam a Fisipe, a Visteon, a Bosch, a Exide/Ex-Tudor, a Roberto Bosch, a Centralcer, a Kraft, a Acral, a Têxtilminho, a Tessimax, a Paulo Oliveira, a Trekar, a S. Gobain, a Sotancro, a Cerâmica da Abrigada, a Valorsul, a Portucel/Setúbal, a Europack, a Fraas» (veja aqui).
Destas empresas do sector industrial mencionadas pelo PCP e pela CGTP, nove delas (Visteon, Acral, Têxtilminho, Tessimax, Paulo Oliveira, Trekar, Cerâmica da Abrigada, Europack e Fraas) nem sequer aparecem entre as mil maiores empresas estabelecidas em Portugal (veja aqui). Por outro lado, basta uma breve consulta aos dados disponibilizados pela CGTP ao final da tarde da jornada de greve geral (vejaaqui) para se perceber a enorme predominância de câmaras municipais [prefeituras], serviços de recolha do lixo e várias entidades públicas. Nos transportes o resultado alcançado também é significativo. Contudo, para organizações que se pelam pela industrialização do país e que se anunciam como as mais genuínas representantes do operariado industrial, não deixa de ser confrangedor verificar-se a existência de apenas 62 empresas do sector industrial. Num total de 351 entradas divulgadas pela CGTP, só 20% ocorreram no sector industrial. Por outro lado, destas 62 só cerca de metade (30) aparecem na lista das mil maiores empresas não-financeiras a operar em Portugal. Mesmo entre as empresas industriais ou de comércio com participação na greve houve casos onde o impacto não foi propriamente de monta ou sequer próximo da totalidade dos trabalhadores. Por exemplo, no caso da 14ª maior empresa a operar em Portugal – o grupo de supermercados e hipermercados Auchan – registou-se uma adesão à greve na loja Box de Faro. Outro exemplo é o caso da EDP, onde só foram afectadas unidades em Vila Real, Chaves, Valença e, o caso mais importante, Sines. Refira-se que pela primeira vez desde 2002 não se registou uma contabilização da adesão à greve na mais importante unidade industrial em Portugal – a Autoeuropa. Apesar de algumas empresas subcontratadas dedicadas à produção de componentes terem praticamente parado a produção, a verdade é que o coração do Parque Industrial da Autoeuropa não regista dados de adesão à greve.
Em suma, se a greve geral ainda teve alguma adesão, tal deveu-se a uma presença relativamente forte dos sindicatos nas empresas públicas e nos serviços do Estado (saúde, educação, entre outros). Estes setores, até há pouco tempo, eram imunes ao processo de divisão quantitativa e qualitativa operada no privado, por um lado, pela divisão das grandes empresas fordistas em cada vez mais pequenas unidades parcelares e, por outro, pelo fracionamento da força de trabalho por vários tipos de categorias contratuais.
O grande malogro sindical nas empresas de capital privado reside, porém, na precarização dos vínculos laborais e no aumento do desemprego. Tais fenómenos, em primeiro lugar, quebram a relação identitária entre indivíduo e trabalho, a qual, paradoxalmente, ainda constitui a espinha organizacional do sindicato. Quando o precário é aquele que, por definição, não tem emprego, mas vai tendo empregos (de vária natureza), importa perguntar qual a vantagem em manter sindicatos estruturados em torno de uma relação que deixou de existir. Em segundo, e associado, o aumento da precariedade e do desemprego deixam o trabalhador à mercê de uma autêntica política de chantagem. Neste sentido, qualquer mínimo sinal de resistência poderá ser punido com a não renovação do contrato.
Esta debilidade permite às empresas não só acabar com todas as ameaças à paz social no seu seio, como auferir de maiores níveis de produtividade com menos custos. Uma das formas mais usadas na persecução desse objetivo é o recurso a prémios, isto é, a manutenção de salários baixos complementados por um «prémio adicional», caso se consigam cumprir determinadas metas. Referimo-nos não apenas, e a título de exemplo, à concretização de uma série número de vendas e/ou assinaturas de contratos por telefone (bastante usual nos call-centers), como também a «subsídios de presença» concedidos a quem não faltar durante um ou vários meses.
Um dos problemas que afetou a greve nas transportadoras privadas foi, justamente, a questão dos prémios. Nalguns casos, estamos a falar de prémios de cerca de 500 euros (correspondentes a uma assiduidade de 4 meses seguidos), que seriam perdidos com uma falta ao trabalho.
Embora difícil, o atual estado da correlação de forças não deve ser encarado como uma fatalidade. Na verdade, os prémios de produtividade estão longe de corresponder a um dado novo. Em Portugal, os primeiros ensaios deram-se ainda no período do Estado Novo, por iniciativa de grupos como a CUF. Perante o desafio, os trabalhadores organizaram-se e decidiram em colectivo boicotar a tentativa de os virar uns contra outros, ou seja, decretaram que todos receberiam por igual. Uma postura que, à altura, era fomentada pela proximidade e por um conhecimento mútuo: afinal, o «gajo» [o cara] que estava ao lado não era só um colega, mas uma pessoa com a qual se confraternizava todos os dias, dentro e fora do local do trabalho. Se isto não fosse importante, as empresas não estariam preocupadas em organizar jantares de Natal ou fins-de-semana de team-building onde gestores e trabalhadores trocam sorrisos e pancadinhas nas costas.
Simultaneamente, importa quebrar com uma espécie de boa moral, que se preocupa mais em defender a lei do que os interesses de quem trabalha. Algumas transportadoras privadas, a título de exemplo, recorrem em dias de greve a autocarros [ônibus] que transportam os motoristas, um a um, a partir das suas casas. Um dos primeiros objetivos do piquete de greve é, portanto, tentar impedir a saída desse autocarro e, deste modo, impedir o comparecimento dos transportados. Como resposta, esse mesmo autocarro começou a ser estacionado de véspera em local público, sendo os motoristas transportados até um ponto próximo do local de trabalho (para que o piquete se confronte com colegas e não com autocarros). Toda a mudança de estratégia do adversário deve, porém, ser interpretada como uma oportunidade ou, pelo menos, como um sinal da necessidade de mudança da nossa própria estratégia. Neste específico caso, o «abandono» do autocarro num local acessível ao público representa, no mínimo, um convite à imaginação. E não há nada que quebre mais a imaginação do que a evocação de uma barreira moral inamovível, independente de toda a reflexão em torno dos seus efeitos.
Ora, a precariedade é a principal razão para as dificuldades de adesão à greve geral. Os dados apresentados previamente acerca da baixa adesão de trabalhadores do sector privado e as dinâmicas acabadas de descrever desmontam o discurso triunfalista. Nesse sentido, o triunfalismo é um veneno para a análise das lutas sociais. Primeiro, porque prefere a celebração encomiástica traduzida nas ruas, mas quase sem qualquer impacto nos locais de trabalho. Em segundo lugar, na medida em que a discrepância entre os discursos públicos oficiais e os próprios dados coligidos pela central sindical reproduz um modelo organizativo em que o debate (se o houver) e a consciência real da amplitude da greve fica para os dirigentes, enquanto para as bases os chavões parecem servir. Em termos muito simples e à boa maneira da estrutura organizacional fordista, persiste uma separação entre os que executam e os que elaboram o plano de acção e de trabalho (sindical). A incapacidade para discutir com as bases é um dos sinais mais fortes do burocratismo do modelo sindical herdado do fordismo. Em terceiro lugar, importa referir que este obscurecimento das enormes dificuldades de actuação da CGTP nos locais de trabalho não é completamente inocente, pois é da condução ordeira e disciplinada dos trabalhadores em luta para o exterior das empresas que a CGTP e o PCP retiram o seu capital político a aplicar no parlamento. Finalmente, e em quarto lugar, se os sindicatos evidenciam uma clara incapacidade para actuar nos locais de trabalho e se os próprios trabalhadores não se revêem nos sindicatos, então há que concluir que só novas modalidades de organização autónoma da parte dos trabalhadores podem relançar as lutas sociais num plano realmente anticapitalista e que se baseie na própria iniciativa das bases.
Notas finais sobre a polícia
Nos últimos tempos, a multiplicação das manifestações e o nível de actuação policial sobre as mesmas tem originado um debate de surdos: de um lado, o «mata, pisa e esfola» o polícia, do outro o «abraça o polícia, que ele é trabalhador». Relativamente a este último argumento, a carga policial sobre centenas de pessoas que se manifestavam em solidariedade com a greve veio a demonstrar a sua fiabilidade. Tal não significa, contudo, que estejamos perante uma horda de bárbaros que se deixam dominar por uma pretensa irracionalidade. O sangue que no fim dessa tarde manchou o pavimento das ruas foi o resultado, antes, de uma operação cirúrgica, ou seja, de um cenário que foi previsto, ordenado e no final aplicado. É esta capacidade de consequência que deve suscitar a maior das preocupações.
Não obstante a resistência oferecida nas imediações da assembleia, assistimos a uma operação policial que se estendeu no espaço e no tempo, chegando a efetuar diversas detenções no Cais do Sodré. De acordo com alguns relatos divulgados nas redes sociais e nos meios de comunicação social, não só estas foram produzidas de forma arbitrária, como os direitos dos detidos a uma representação legal foram violados. Ficámos igualmente a saber que a recolha de imagens realizada pela polícia durante as várias manifestações, à margem do parecer negativo da Comissão Nacional de Proteção de Dados, poderá vir a ser utilizada na identificação e responsabilização judicial dos «profissionais violentos». Tudo isto, importa mais uma vez realçar, não deriva de uma disfunção do aparelho policial e judicial, mas sim da concretização de uma estratégia.
Se compararmos a prática das autoridades nas manifestações de 15 de Setembro e de 14 de Novembro, constatamos diferenças de actuação e não de essência. Na primeira, a reacção perante o abraço de uma jovem de 18 anos não foi diferente do comportamento face ao arremesso de garrafas. A segunda, concomitantemente, pautou-se pela mesma receita: tudo a eito, sem grandes diferenças, pois ordens… são ordens.
Não existe qualquer dúvida da violência que foi praticada pela polícia sobre os manifestantes. Todavia, o facto de estarmos a falar de uma instituição que detém o seu poder de monopólio a nível interno torna difícil distinguir o que é uso e o que é abuso. A lei e os «direitos humanos» continuam, certamente, a contar com a Ordem dos Advogados e com a Amnistia Internacional. Mas a sua vinculação passa apenas a fazer parte das contas e não a definir a conta.
http://passapalavra.info/?p=67566

José Pacheco Pereira - a lagartixa e o jaccaré




Recolha de informação para memória futura.

QUINTA-FEIRA, 15 DE NOVEMBRO DE 2012


Esquerda mole, esquerda dura e esquerda violenta



JOSÉ PACHECO PEREIRA Professor
Revista SÁBADO 15 NOVEMBRO 2012

Quem esteja atento à conflitualidade social e política, expressa publicamente através de manifestações, protestos e greves, percebe que ela está a chegar a um impasse claro na sua mobilização e nos seus efeitos
  
1-Escrevo a um dia da greve geral e depois das manifes­tações contra Merkel, mas penso que o dia da greve não alterará muito do que aqui fica registado. Quem esteja atento à conflitualidade social e po­lítica, expressa publicamente através de manifestações, protestos e greves, per­cebe que ela está a chegar a um impasse claro na sua mobilização e nos seus efei­tos. Cresceu, cresceu muito, mas parece ter atingido um limite difícil de ultrapas­sar. Apenas os movimentos de conteú­do mais corporativo, abrangendo secto­res profissionais, têm vindo a aumentar e a consolidar a sua reivindicação públi­ca, como é o caso dos polícias, dos esti­vadores e dos militares.

2-O Governo escusa de ficar contente com este facto, porque a imensa raiva que a sua política está a gerar, a profun­da desconfiança com governantes e po­líticos, o sentimento de incompetência, desprezo, insensibilidade e mesmo trai­ção estão a crescer exponencialmente. Quando, em Janeiro de 2013, tudo pio­rar ainda mais, e quando, em meados de 2013, novas medidas de austeridade mais gravosas tiverem de ser aplicadas face a mais um incumprimento dos nú­meros da troika, o Governo fará outra edição do "custe o que custar", e essa raiva será a pior das conselheiras. Mas isso é o quadro mais amplo, o fundo.

3-As manifestações como a de 15 de Setembro e a contra Sócrates no ano pas­sado são de natureza diferente. Elas mostram uma recusa generalizada da elite partidária do poder, mas em mui­tos aspectos não diferem da actual nar­rativa governamental sobre as causas da crise, em particular o "viver acima das nossas posses". É por isso que podem fa­cilmente ser "engolidas" pelo poder po­lítico, sem consequências. Nelas se en­contram as pessoas que protestam con­tra os cortes nas pensões, mas são contra as greves; as que acham um abuso os impostos, mas pensam que os trabalha­dores da função pública têm regalias a mais, e por aí adiante. Não são por isso de esquerda.

A MOLE
4-Comecemos pela esquerda mole, ou seja o PS. Sem o PS nada se faz, com o PS nada se faz, este é o dilema dos que querem pensar ou "trazer" o PS à es­querda, o que é a mesma coisa. O PS tornou-se, antes de tudo, como o PSD, uma partidocracia de governo, que não co­nhece outras regras que não seja man­ter lugares, carreiras, território e influên­cia partidária. Não há nem identidade política, nem ideológica, nem sequer a expressão de interesses sociais e isso verifica-se numa altura em que a crise atin­ge profundamente as bases sociais dos dois partidos e acaba por não ter expres­são no topo. A lógica do topo é apenas a da partidocracia e por isso misturam-se com o establishment que servem e ab­sorvem todo o pensamento balofo que para aí circula. A geração de Seguro e de Passos Coelho nos partidos transporta consigo uma enorme necessidade de respeitabilidade, eles sabem que os de cima, com quem lidam, não os respei­tam, e os de baixo os não consideram, e por isso são pouco mais do que intér­pretes do mainstream dos interesses já estabelecidos.

5-Por isso, o PS é a grande dificuldade de toda a esquerda, porque no fundo quem chega à sua direcção não é de es­querda, como quem chega à direcção do PSD não é social-democrata. Entalado entre o silêncio incomodado de Seguro sobre Sócrates, o PS é sempre presa fá­cil para a propaganda governamental e para a sua narrativa da crise. Por outro lado, se assumisse o socratismo, insti­tucionalizaria um keynesianismo cor­rupto, pragmático e oportunista, tão de-sertificador como a actual indecisão es­tratégica e fala-baratismo táctico. Vai ser difícil sair disto.

A MOLE-DURA
6-Classificar o Bloco de Esquerda não é difícil: é hoje um partido socialista ra­dical, próximo de partidos como era o PSU e o PSIUP no passado em França e Itália. No fundo, foi sempre este o pro­jecto de muitos trotskistas, e ele foi com­seguido. O problema do BE é que é pou­co para a crise que se vive, o que torna a sua posição demasiado indistinta. Re­duzido à sua dimensão parlamentar, tem vindo a perder a rua mais radical, deixando a mobilização preguiçosa, fá­cil e enganosa nas redes sociais sobre-por-se à organização pura e dura. Com isto, e aqui os comunistas têm razão, os governos podem bem. Está por isso inó­cuo e acaba por ficar dependente ape­nas da evolução do PS, que é um pouco esperar sentado por um milagre.

A DURA
7-A esquerda dura é o PCP e a CGTP e é composta por um contínuo social e político muito consistente e entreteci­do. Tem uma história, tradições, famí­lias e identidade. Tem uma base social com muito maior homogeneidade do que o PS e o BE e essa base social está em grande parte organizada no partido e nos sindicatos por mecanismos de en­quadramento e mobilização. Não há nada de semelhante em qualquer outro partido, e a comparação que fazia senti­do com o PSD do passado já não tem sentido no PSD do presente.

8-A direcção de Jerónimo de Sousa trouxe um ainda maior reforço de iden­tidade, levando o PCP pela primeira vez na sua história a fazer manifestações como partido e não disfarçado de CDU, ou de qualquer outro rótulo unitário. Jerónimo não suscita o respeito reve­renciai de Cunhal, mas também não re­produz o seu afastamento aristocrático, não desejado mas real. Jerónimo é um deles, próximo e igual, que transporta consigo o mundo da base comunista como ninguém o fez nunca na história do PCP, a que acrescenta a força e a em­patia gerada por ser o único líder polí­tico que no parlamento fica genuina­mente indignado com a sorte dos seus e dos portugueses. É por isso que ele pode sair à rua e ser recebido com esti­ma por muitos que não são comunistas mas que reconhecem a sua genuinida­de. E também por isso travou a crise do PCP, embora não a tenha resolvido. Mas é um facto que o PCP sobreviveu me­lhor à crise do que muitos outros parti­dos europeus, e é impossível falar da es­querda activa e que existe sem falar do PCP. Em França, o PCF, por exemplo, é muito irrelevante.

9-Mas o PCP, ao reforçar a identidade, está a acentuar o seu acantonamento, as suas fronteiras e os seus limites. Usa e abusa da linguagem de pau, como é o caso da designação canónica do acordo com a troika de "pacto de agressão", e tendo a parte de leão na resistência or­ganizada ao Governo, das vaias às gre­ves, parece ter atingido uma barreira de crescimento que a prazo se revelará como impotência.

10-A CGTP tem resistido à crise melhor do que a UGT, perdida nas suas contra­dições. Mas a CGTP com a sua nova li­derança - que é um erro considerar in­capaz - tem tido, também como reflexo do PCP, um processo de auto-afirmação sectária, que lhe pode dar capacidade de organização, mas que dificulta a mobi­lização. Não se compreende do ponto de vista da eficácia, por exemplo, da greve geral, que a CGTP não apareça genuina­mente interessada em obter a adesão dos sindicatos da UGT. Pode-se dizer que muitos vão aderir, mas o impacto de uma greve conjunta das duas centrais seria maior. No actual contexto de contínuas humilhações à UGT, seria difícil, face a um esforço de entendimento e consulta efectivo, a sua direcção recusar uma gre­ve em que os interesses de alguns dos seus principais sectores sindicais (função pública, banca, seguros) são dos mais afectados pelas medidas do Governo.

E A VIOLENTA

11-Existe hoje uma esquerda violen­ta e essa esquerda está a recrutar nos fi­lhos da classe média radicalizada. Seria de estranhar que assim não fosse. As di­visões no BE, com a criação do Movi­mento Alternativa Socialista, mais ra­dicalizado, e alguns movimentos de aliança entre franjas do BE, jovens comunistas-leninistas, trotskistas desirmanados, no Movimento Sem Empre­go, jornais e revistas como Rubra, vá­rias páginas do Facebook, alguns neo-anarquistas, estão a dar origem aos gru­pos que ficam no fim das manifestações diante dos polícias a ver se há pancada.

12-Os comunistas desconfiam deles, que acham demasiado folclóricos para seu gosto, e compreendem o efeito per­verso da simulação simbólica da vio­lência para as câmaras verem, sem con­sequências. Com máscaras de Guy Fawkes, lenços palestinianos a cobrir a cara, parcas a esconder a cabeça e mui­tos arremedos diante dos polícias, der­rubando as barreiras, o que, já se per­cebeu pelo comportamento da polícia, não é considerado motivo para carga, e ficando ali a provocar com petardos e garrafas de cerveja, diante dos robocops, acabam por prestar um péssimo servi­ço à violência revolucionária que pre­tendem encenar. Um bom português, amigo dos forcados amadores, dirá "se eles vão lá para a porrada, porque é que não andam à porrada?" Parecem aque­les que dizem "segurem-me senão vou-me a eles", e não vão.

13-O que se passa no conjunto de to­das as esquerdas, moles, duras e violen­tas é a sua enorme divisão não só estra­tégica como táctica. As suas ideias são diferentes, as suas práticas são diferen­tes, os seus motivos são diferentes. Enormes diferenças geracionais, de es­tilo, cultura política e, acima de tudo, de condição social pesam sobre esta desunião de forma até agora decisiva. Não podem mobilizar a gigantesca for­ça latente que a crise gerou - a recusa populista dos partidos e a raiva contra os políticos - e por isso acantonam-se nos seus territórios entre a nostalgia e a encenação. Vão acabar por votar Se­guro contra Passos Coelho e é difícil encontrar destino mais irónico para a esquerda portuguesa.

Quem nasceu para lagartixa nunca chega a jacaré provérbio popular



ABRUPTO