A Internacional

__ dementesim . . Do rio que tudo arrasta se diz que é violento Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem. . _____ . Quem luta pelo comunismo Deve saber lutar e não lutar, Dizer a verdade e não dizer a verdade, Prestar serviços e recusar serviços, Ter fé e não ter fé, Expor-se ao perigo e evitá-lo, Ser reconhecido e não ser reconhecido. Quem luta pelo comunismo . . Só tem uma verdade: A de lutar pelo comunismo. . . Bertold Brecht
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quarta-feira, junho 13, 2007


Estado do Sítio
Sempre pequeninos


* António Ribeiro Ferreira,
Jornalista



O combate à corrupção é um tema recorrente e muito querido de presidentes da República, de esquerda ou centro-esquerda, de primeiros-ministros, socialistas ou sociais-democratas, dos queridos partidos que tomam conta de todos nós, cidadãos deste sítio cada vez mais mal frequentado, e de esforçados especialistas em várias matérias que, de tempos a tempos, lançam imensas pistas sobre corruptos em comentários avulso em jornais, rádios e televisões. Enfim, todos sabem que a corrupção sempre existiu, que está mais florescente do que nunca nesta democracia com 33 anos e também reconhecem que as empenhadas, esforçadas e de certo competentes polícias nunca conseguiram apanhar um grande corrupto.

Os êxitos neste domínio raramente passam de fiscais de obras de autarquias, guardas de trânsito e de uns poucos presidentes de autarquias pouco prevenidos que são usados como troféus e biombos de um sistema que vive alegre e voluntariamente atolado em corrupção. Um sistema que, para além do mais, pune severamente com o exílio, dourado ou não, quem ousa pôr o dedo na ferida e tem o desplante de fazer propostas altamente perigosas para os senhores e senhoras que acumularam milagrosas fortunas nestes doces anos de santa impunidade e da sagrada presunção de inocência, base essencial de qualquer Estado que se diz de Direito. Um princípio que este Governo do licenciado José Sócrates fez questão de invocar quando recusou liminarmente que o ónus da prova sobre as grandes riquezas ficasse a cargo dos cidadãos e não das autoridades policiais e judiciais. É por isso uma enorme surpresa ver este mesmo Executivo vir agora lançar para a praça pública uma proposta que prevê a suspensão obrigatória dos mandatos dos autarcas arguidos, acusados por um Tribunal de Instrução de ilegalidades administrativas graves, antes de serem julgados e de as sentença transitarem em julgado.

Se a presunção de inocência é a tal base de um Estado de Direito, este projecto pode significar que o Governo chegou à conclusão que este sítio não é um Estado e muito menos um Estado de Direito. Mas também pode ser um enorme embuste, uma imensa cortina de fumo para esconder a grande corrupção e a falta de vontade política de a combater eficazmente.

É o Portugal salazarento no seu melhor. Na política, na economia, na justiça, na mentira, nos hábitos, nos costumes e na corrupção. Os grandes senhores são sempre inocentes até prova em contrário, os pequeninos mexilhões são sempre culpados até prova em contrário.

in Correio da Manhã, 2007.06.11

segunda-feira, abril 23, 2007

KAÚLZA DE ARRIAGA: o general sem vitórias

No passado dia 2 [Fevereiro 2004], faleceu com 89 anos de idade, o general Kaúlza de Arriaga.

* José Pedro Castanheira

No jornal Expresso de ontem, em particular na revista "Única", sai publicado um texto da autoria de José Pedro Castanheira, cujo conteúdo apresenta uma síntese do percurso e ideias do general.

Regista o autor que "Kaúlza de Arriaga foi comandante militar em Moçambique, defendeu teses racistas e quis derrubar Marcelo Caetano, que via como "traidor".

É, pois esse texto, que neste post editamos.

O GENERAL SEM VITÓRIAS

"Faleceu do dia 2, com 89 anos de idade, o general Kaúlza de Arriaga. O seu nome fica associado ao massacre de Wiriamu, ocorrido em 16 de Dezembro de 1972, quando era comandante-chefe das Forças Armadas de Moçambique. Considerado o maior crime de guerra cometido nas antigas colónias, Wiriamu foi denunciado pelo jornal "Times", na véspera da visita de Marcelo Caetano a Londres. Ainda hoje se ignora o número de vítimas civis, causadas pela 6ª Companhia de Comandos. Um relatório da Cruz Vermelha calculou-as em cerca de centena e meia. Os três inquéritos instaurados pelas autoridades portuguesas concluíram por números muitíssimos inferiores. Mas uma investigação feita pelo EXPRESSO, em 1992, apontou para quatro centenas. No rescaldo de Wiriamu, Caetano perdeu a confiança em Kaúlza, que, assim, terminou a sua carreira.

Kaúlza Oliveira de Arriaga nasceu no porto em 18 de Janeiro de 1915. O ex-Presidente Costa Gomes lembra, em O Último Marechal: "Foi aluno distintíssimo na Faculdade de Ciências do Porto e na Escola de Engenharia do Exército". Ainda no Porto, "teve uma grande paixão" pela poetisa Sofia de Mello Breyner.

Ajudante e chefe de gabinete do ministro da Defesa Nacional, Santos Costa, foi nomeado, em 1955, subsecretário de Estado da Aeronáutica, tendo fundado o Batalhão de Caçadores Pára-quedistas. Já secretário de Estado, foi autor, em 1960, de um relatório premonitório. Em Alvorada em Abril, Otelo Saraiva de Carvalho regista que o documento alertava para o risco que a "proletarização das Forças Armadas" poderia constituir para o regime, quando os jovens cadetes, oriundos das classes sociais baixas, chegassem a oficiais.

Em 1961, registou aquela que terá sido a sua principal vitória política. Na sua página na Internet (www.cidadevirtual.pt/k-arriaga) lê-se que "contribuiu decisivamente para fazer abortar um golpe de Estado contra o Presidente Salazar e contra o Ultramar português". Foi a "Abrilada", de que resultou a destituição do ministro da Defesa, Botelho Moniz, e do subsecretário de Estado do Exército, Costa Gomes. Seguiu-se uma remodelação governamental, com Salazar a assumir a Defesa e a dirigir um célebre discurso ao país: "Para Angola, rapidamente e em força".

OPERAÇÃO NÓ GÓRDIO

Encerrada, para seu desgosto, a experiência governativa, foi colocado como professor no Instituto de Altos Estudos Militares (1964/1968). O tomo Problemas Estratégicos Portugueses (um dos 12 livros que escreveu) reúne algumas das suas lições, em que se distinguiu como teórico do racismo branco: "Nós não seremos capazes de manter a dominação branca, que constitui um objectivo nacional, a não ser que o povoamento branco se efectue a um ritmo que acompanhe e ultrapasse, mesmo que ligeiramente, a produção de negros evoluídos".

Presidente da Junta de Energia Nuclear e da emprensa de petróleos Angol, em Junho de 1969, foi colocado em Moçambique, onde, pela primeira e única vez, pôs à prova as suas qualidades e teorias de estratego militar- primeiro como comandante do Exército e, depois, como comandante-chefe das Forças Armadas. A sua acção foi marcada pela operação Nó Górdio.

Envolvendo um efectivo de oito mil homens foi a maior operação dos 13 anos de guerras coloniais. Até ao fim da vida, Kaúlza não se cansou de sublinhar que a operação "foi um sucesso". Vaidoso, chegou mesmo a apresentar-se (em Guerra e Política) como "o segundo melhor perito do mundo em guerra subversiva, logo a seguir a Giap- célebre chefe militar nas guerras da Indochina e do Vietnam". Ponto de vista diametralmente oposto foi sustentado quer por Costa Gomes, quer por Spínola. Para o historiador António Costa Pinto, em O Fim do Império Português, "a operação foi um falhanço, pois passados poucos meses a Frelimo recuperou o terreno perdido".

A Nó Górdio não satisfez Lisboa, que também considerou megalómana e perigosa a proposta de um mesmo comandante-chefe para Angola e Moçambique. Mas o que fez cair Kaúlza foi o escândalo Wiriamu. A 9 de Julho de 1973, Caetano escreveu-lhe a carta fatal: "Reconheço a vantagem, para si, para Moçambique, para todos nós, em outra pessoa rever os conceitos e as tácticas da acção anti-subversiva em Moçambique". Contrafeito, e sempre acompanhado da mulher, regressou à metrópole no mês seguinte. Na sua página na Internet lê-se que "a partir do final do ano de 1973, deixou de crer nas possibilidades em decréscimo do Presidente Caetano, procurando a sua substituição". Com efeito, Kaúlza passou a liderar o que António de Spínola designa (em País sem Rumo) "a revolta dos generais", em ruptura à direita com a política de Caetano.

Posto ao corrente dos planos da extrema-direita militar, os capitães decidiram infiltrar-se. José Manuel Barroso, em Segredos de Abril, refere que Sousa e Castro foi um dos "espiões do MFA". "Reunimo-nos na Pousada de São Filipe, em Setúbal, nos finais de 1973. Explicam-nos que o golpe já tem data marcada, no mês de Dezembro". A 17 de Dezembro, Carlos Fabião denunciou publicamente o golpe de Estado em preparação. Fabião foi punido pela hierarquia militar, mas o golpe foi travado.

ASSÉDIO AO PRESIDENTE

Kaúlza, no entanto, não era homem para desistir e passou a assediar o próprio Presidente da República, Américo Thomaz, com a cumplicidade do cunhado, general Luz Cunha, novo chefe do Estado Maior General das Forças Armadas. Nas suas memórias, Últimas Décadas de Portugal, Thomaz transcreve uma última carta de Kaúlza, exortando-o a que tomasse "em tempo útil, as grandes medidas" capazes de "sustar a evolução no sentido do abismo". Certamente informado do golpe em curso, Kaúlza fazia notar que "os prazos de acção são curtos".

Hesitante e sem poder, Thomaz nada fez. A 25 de Abril de 1974, os capitães puseram termo à ditadura. Três semanas depois, Kaúlza foi passado à reserva. Acabou por ser preso na crise do 28 Setembro, ficando detido 16 meses. Sem culpa formada, foi libertado incondicionalmente em Janeiro de 1976 e processou o Estado português. Em 1977, lançou o Movimento para a Independência e Reconstrução Nacional (MIRN), uma pequeníssima formação de extrema-direita, a que presidiu.

O processo judicial arrastou-se durante mais de dez anos e subiu ao Supremo Tribunal Administrativo, que em 1987 reconheceu a razão do general. O Estado foi condenado a uma indeminização de 100 contos e um escudo. O respectivo acórdão inclui um invulgar juízo político: "O general Kaúlza de Arriaga tinha, realmente, capacidade, vontade e prestígio para liderar um movimento que impedisse a descolonização de Angola e Moçambique".

Vítima de doença de Alzheimer, Kaúlza de Arriaga morreu no Hospital militar da Estrela. O funeral foi no Cemitério dos Prazeres, em Lisboa".


retirado do blog Ciência e História (Sandra Cristina Almeida)