A Internacional

__ dementesim . . Do rio que tudo arrasta se diz que é violento Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem. . _____ . Quem luta pelo comunismo Deve saber lutar e não lutar, Dizer a verdade e não dizer a verdade, Prestar serviços e recusar serviços, Ter fé e não ter fé, Expor-se ao perigo e evitá-lo, Ser reconhecido e não ser reconhecido. Quem luta pelo comunismo . . Só tem uma verdade: A de lutar pelo comunismo. . . Bertold Brecht
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terça-feira, fevereiro 21, 2012

Mário Augusto Jakobskind: Carnaval subordinado ao mercado



21 DE FEVEREIRO DE 2012 - 14H08 


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É carnaval. Muita gente vai perguntar: e daí? Daí que a maioria cai na folia e muitas vezes não se dá conta que a festa está deixando de ser popular para se institucionalizar na base do deus mercado. As escolas de samba entraram nessa lógica e hoje os desfiles viraram espetáculo industrializado com regras castradoras. E para assistir no sambódromo o custo é alto. 

Por Mário Augusto Jakobskind*, no Direto da Redação



O tema é polêmico por natureza. Outro exemplo é dos blocos de rua. Agora, o senso comum anda entoando a cantiga segundo a qual o carnaval de rua ressurgiu com o monobloco etc e tal. Não é verdade, antes da apropriação industrial dos blocos como começa a acontecer, o carnaval de rua sempre se fez presente. Neste 2012 tem até bloco que nem apresenta samba ou marcha, optando pelos Beatles e se dizendo responsável pelo “ressurgimento” do carnaval de rua. 

As exigências que a prefeitura cria para permitir o desfile dos blocos são tantas que muitos desistiram de seguir as normas. A burocratização do carnaval faz parte do esquema industrial que visa a tornar a festa apenas uma fonte de lucros para poucos, como determina a lógica do capital.

Mas, enfim, como o tema é muito sério e complexo, tem muito folião que considera tal discussão chata. Prefere então embarcar na festa, sem perceber que com o andar da carruagem em pouco tempo o carnaval vai se afunilar e será para poucos pagando muito, como exige o mercado. 

Tem mais. Nestes dias de Carnaval, muita coisa que acontece por aqui e pelo mundo afora fica em segundo plano. A mídia de mercado aproveita o embalo e não divulga questões relevantes. É o caso da repercussão que poderia ter um fato ocorrido na França e que envolve uma empresa conhecida nesta plagas abençoadas por Deus e bonita por natureza.

A empresa estadunidense Monsanto foi julgada por um Tribunal da cidade de Lyon, na França, e considerada legalmente “responsável” pela intoxicação de um agricultor. Foi uma decisão judicial em primeira instância e a empresa deverá apelar, o que retardará a decisão final. Mesmo assim, a primeira decisão pode ser considerada uma vitória, pois remete a questão para o debate e questionamento da Monsanto.

É importante os brasileiros serem informados a respeito do acontecido na França, porque de um modo geral a Monsanto por aqui tudo pode e conta com total apoio dos meios de comunicação de mercado, que ignoram os protestos e denúncias contra a empresa acusada de provocar sérios danos ao meio ambiente e à saúde das pessoas ou manipulam o noticiário criminalizando os movimentos de protesto.

Outro tema que continua a ocupar grandes espaços de discussão e matérias mesmo na mídia de mercado é o que se passa em Cuba. Recentemente, por exemplo, a TV Bandeirantes apresentou uma série de matérias completamente manipuladas e equivocadas.

O repórter ouviu apenas um dos lados, ou seja, exatamente o que faz oposição ao regime e sempre com o estímulo dos setores extremistas radicados em Miami que nunca se conformaram com a perda de privilégios.

Foram mostradas imagens com o objetivo de o telespectador concluir ser Cuba um inferno na Terra e que seu povo vive no pior dos mundos. O repórter apurou mal certos fatos, um deles ao afirmar que o CUC, a moeda do turismo, pode ser convertido em dólar pelos cubanos e assim sucessivamente. Esqueceu de dizer o principal, ou seja, que o turista troca a sua moeda, dólar ou euro, pelo CUC para então usar para os gastos em território cubano. Se reconverter, cubano ou turista, para dólar ou euro vai perder, claro. Mas o repórter ignorou essa obviedade. 

Os CUCs deixados pelos turistas, que em 2011 vieram num total de dois milhões e 700 mil, permitem ao Estado cubano aplicações nas áreas de saúde, educação, moradia etc. Ou seja, as divisas do turismo são destinadas exatamente para a utilização em favor do povo. Aí o senso comum prefere dizer apenas que apesar de permitido são pouco os cubanos que têm acesso aos locais frequentados pelos turistas. 

Saúde e educação de boa qualidade e de graça é salário indireto. Se contabilizado, utilizando como termo de comparação muitos países latino-americanos, europeus e mesmo os Estados Unidos, chega-se a cifras altas e até astronômicas. E tem mais um detalhe: saúde cara não raramente pouco acessível a muitos assalariados sem condições de pagar planos de saúde de empresas particulares. E em não poucos países com a saúde pública em péssimas condições.

Mas como as reportagens objetivam apenas reforçar o sentimento contra Cuba, mostrar a realidade sem manipulações não interessa à mídia de mercado, muito menos ao esquema Barack Obama, que corre atrás dos votos de Miami, onde os cubano-americanos têm peso eleitoral. 

*Mário Augusto Jakobskind é correspondente no Brasil do semanário uruguaio Brecha. Foi colaborador do Pasquim, repórter da Folha de São Paulo e editor internacional da Tribuna da Imprensa. Integra o Conselho Editorial do seminário Brasil de Fato. É autor, entre outros livros, de América que não está na mídia, 




Dossiê Tim Lopes - Fantástico/IBOPE.


domingo, fevereiro 20, 2011

As mortes que ninguém quis ver

Domingo, 20 de Fevereiro de 2011 - 18:40

Vasco Neves
Augusta Martinho mudou-se para a rinchoa depois de 40 anos em África

Histórias

As mortes que ninguém quis ver

Sucedem-se os casos de idosos encontrados mortos em casa. A solidão também pode matar
  • 0h00 2011.02.20
Por:José Carlos Marques e Marta Martins Silva


Reza a vizinhança que a luz da cozinha de Augusta Martinho resistiu acesa um ano. Durante esse ano a mesma vizinhança interrogou-se sobre o paradeiro da mulher "de poucas falas que não dispensava o batom vermelho garrido e o lápis preto nos olhos". 
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Mas um dia a luz apagou-se e a maioria foi apagando também da vida de todos os dias as interrogações sobre Augusta, afinal ainda ali tão perto de todos os moradores. Passou um ano, depois outro e outro e outro. Nos quase nove anos em que o corpo da idosa permaneceu sem vida no chão da cozinha do 4º andar direito no número 16 da praceta das Amoreiras, na Rinchoa, onde uma janela semiaberta deixava o ar entrar, muito mudou no edifício. Vizinhos foram, mudaram de poiso, outros vieram, sem suspeitar. 
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Nasceram crianças, muitos fizeram-se adultos, tantos outros envelheceram. Até as caixas de correio, antes na parede lateral, mudaram para as traseiras da porta de entrada depois de umas obras que não fizeram grande mossa, só barulho. Toda a gente apagou Augusta da memória depois da luz da cozinha se apagar, mas uma pessoa manteve firme uma convicção: Aida Martins sempre soube que a vizinha do 4º direito só poderia estar em casa – na casa de onde, desde que o companheiro morreu, só saía para abastecer a despensa de mercearias. 
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Atrás da história de Augusta, nascida a 12 de Fevereiro de 1915, veio a história de Ernesto. E a de José Jerónimo, a de Salomão, a de Januário. E a de tantos outros espalhados pelo País. Idosos que não se conheceram em vida mas partilharam uma morte igualmente só e silenciosa. Nomes que se tornaram retratos de um País envelhecido e sem laços. 
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A VIDA DE AUGUSTA
Na altura do desaparecimento de Augusta, Aida Martins administrava o condomínio. Trocava com a vizinha meia dúzia de palavras que não desvendavam estados de espírito ou qualquer saudade do passado. "Nunca me contou nada da vida dela. Só a vi aflita uma vez: o companheiro tinha caído na banheira e veio a correr chamar-me para a ajudar a tirá-lo de lá". Augusta nunca casou de papel passado. Também não teve filhos. Tinha seis irmãos, que deixou de ver quando abalou para Angola, onde esteve 40 anos.
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"Era muito cumpridora e pagava sempre as quotas do condomínio a tempo e horas. Foi por isso que estranhei quando ela deixou de aparecer. Na altura disseram que ela estava no Algarve mas comecei a achar que era tempo a mais – ela que nem de casa saía – e comecei a minha luta", recorda Aida. 
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Durante anos, esta vizinha subia três andares de elevador, encostava-se à porta, tocava à campainha e cheirava. "Fartei-me de cheirar aquela porta para se ver notava alguma coisa de estranho. Mas nada: a entrada mantinha-se limpinha". A primeira tentativa que fez foi na GNR. "Fui lá e disse: ‘Estou preocupada, uma senhora do meu prédio não aparece e acho que pode estar doente’. E eles perguntavam: ‘Mas é sua familiar?’" Como não era, voltava sempre sem respostas das investidas que fazia. 
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E foram várias: ao tribunal, ao registo predial – a todos os sítios de que se lembrou. "Mas como eu não era família e o prédio não cheirava mal não fizeram nada. Foi aí que resolvi pegar na lista telefónica e ligar para todas as pessoas em Portugal que tivessem o apelido Martinho, como a Augusta, à procura de alguém que me ajudasse". Só quando o apartamento da idosa foi leiloado nas Finanças (por 30 mil euros) e a nova proprietária, uma mulher de nacionalidade ucraniana, se quis inteirar da casa é que descobriram finalmente Augusta. Deitada no chão da cozinha onde estava desde o Agosto quente de 2002.
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"Um dos bombeiros que lá foi é daqueles que vai a todas, que dá o corpo às balas. Até ele ficou chocado com o facto do corpo estar ali há tantos anos", partilha o comandante Luís Pimentel, dos Bombeiros Voluntários de Agualva-Cacém – a corporação que foi chamada pela PSP para abrir a porta. Com décadas de experiência no ofício, a situação que mais marcou o comandante passou-se em Lisboa. "Um senhor, que estava embarcado, estranhou que a mulher não tivesse ligado durante a sua ausência e não conseguiu entrar em casa porque a porta estava trancada por dentro. Quando lá entrámos o cenário era de horror: a senhora estava a ser comida pelos 30 gatos que tinham. Tivemos de chamar uma equipa do Jardim Zoológico para ajudar com a situação". 
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HISTÓRICO DE SOLIDÃO
Augusta não terá cultivado grandes relações nem dentro nem fora da família. "Como ela morou em África mais de 40 anos, a maioria perdeu o contacto com ela. Veio de lá com o companheiro e raramente saía de casa", recorda o primo Armando Gaspar. "Tenho ideia de que ela foi regente escolar, que era uma espécie de professora primária mas sem habilitações. Tanto que depois foi auxiliar de educação", acrescenta Fernanda Borges, vizinha de prédio, que manteve um contacto mais constante com Augusta na altura em que o marido era o administrador do condomínio. "Às oito da manhã lá estava ela a pagar-nos, tão pontual como um relógio. E lembro-me de que certa vez teve uma infiltração de água e disse: ‘Se o seu marido não resolve deixo de pagar’". Pouco mais lhe ouviu.
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Na Amadora, a poucos quilómetros de Augusta, Ernesto Fernandes Henriques, ex-PSP, também vivia sozinho e pouco falava. O saco com as compras da semana era passado pelo proprietário de uma mercearia do prédio onde morava na Mina, através de uma janela. Foi ele que estranhou a ausência e chamou a polícia. Nas duas associações onde o idoso estava inscrito, foram as notícias a desvendar o desaparecimento. 
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"Muitos idosos que vêm aqui não partilham nada da sua vida. Não dizem se andam bem, se andam mal", explica o secretário da associação de reformados onde Ernesto Henriques estava inscrito há dois anos. "O problema foi ele não ser muito assíduo. De vez em quando aparecia mas nem se interessava muito pelos filmes que nós temos aqui para eles estarem entretidos. Jogava às cartas, mas raramente abria a boca. Nunca lhe conhecemos família nem amigos". Diz-se que "ficou assim" depois de ter perdido a mulher. 
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"Acabou por fechar-se ainda mais. Apegou-se a viver sozinho e gostava de beber um copito. Bebia sozinho e sozinho ia". Henrique Monteiro, da mesma associação, revela que quando leu o nome de Ernesto nos jornais associou logo ao antigo polícia e foi confirmar aos registos. "Ainda temos o número de sócio: 564, apesar de ele não pagar as quotas desde Dezembro. Temos pena, mas não conseguimos adivinhar, ele não quis participar aquilo que estava a sofrer". 
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Já à União de Reformados, Pensionistas e Idosos da Amadora, Ernesto "vinha alimentar-se. Comer o almoço e o lanche. Mas não era regular, podia estar quatro, cinco dias sem aparecer nem dizer nada. Não sabíamos nada da vida dele, sentava-se quase sempre sozinho". Por isso ninguém estranhou a ausência de dez dias. Nem ninguém sequer suspeitou que o corpo de Ernesto jazia na casa onde morava sozinho. 
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VIZINHOS PAGAM FUNERAL
Salomão Oliveira teve fado igual na vida (pelo menos na velhice) e na morte. "Parecia ter um problema de solidão, quase uma revolta com a vida", conta o dono do café onde ia o idoso que esteve oito dias em casa morto sem ninguém saber. Sabe-se que trabalhou numa fábrica na Senhora da Hora, em Matosinhos, antes de imigrar para França, de onde regressou para cuidar da mãe. "Ele era muito autoritário e frio, mas com a mãe era um anjo. Esteve ao lado dela até a senhora morrer", conta Maria Pereira, vizinha de porta, que ajudou "com dez euros para pagar o enterro". Porque, "se cada um der o que tem pode ser que a gente consiga. Ele não se dava com ninguém em vida mas merece ter paz na morte".
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A história de José Jesus Jerónimo repete os mesmos hábitos de eremita. Em Balsas, aldeia do concelho de Cantanhede, vizinhos e familiares já se tinham habituado às suas longas ausências. Com problemas de alcoolismo, ficava fechado em casa semanas a fio. "Uma das últimas vezes assustei-me e chamei a GNR para ir ver dele. Apareceu à porta, de boa saúde, e até me chamou parvo por ter chamado as autoridades. Desde aí, não voltei a procurá-lo quando ele ‘hibernava’", conta o primo, também chamado José Jerónimo.
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Antigo sargento do Exército, José era uma pessoa difícil. "Não dava confiança a ninguém", conta o primo. Casado e com um filho, vivia afastado dos seus, que nunca saíram de Lisboa. Em meados de Novembro, o homem de 72 anos enfiou-se dentro de casa e nunca mais foi visto. Na semana passada, o cheiro pútrido alertou os vizinhos – bombeiros e GNR deram com um corpo em decomposição, parcialmente comido pelo cão que era a única companhia que José tolerava. A mulher e o filho continuam sem dar notícias e o corpo foi levado para o Instituto de Medicina Legal da Figueira da Foz, que vai tratar do funeral. José está sozinho na morte, como escolheu estar em vida. 
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BOMBEIROS PRONTOS A AJUDAR
"Connosco, não há porta que fique por abrir". O comandante dos Sapadores de Lisboa explica a forma como a corporação lida com os alertas que lhe chegam. O coronel Joaquim Leitão conta que são raros os casos em que encontram cadáveres fechados em casa, e mesmo esses são detectados ao fim de poucos dias. 
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Sempre que os bombeiros se deparam com alguém em isolamento, são activadas as equipas do Núcleo de Intervenção Social e Apoio ao Cidadão. "Identificamos as pessoas e avisamos a Segurança Social ou a Misericórdia. Mantemos o contacto com os idosos e já conseguimos convencer alguns a procurar ajuda ou a ir para um lar".

NOTAS
SOLIDÃO
Dados da Segurança Social dizem que há 630 mil pessoas a viver sozinhas – 390 mil têm mais de 65 anos.
SEM APOIO
25 a 27 mil pessoas idosas vivem sem qualquer tipo de apoio – nem familiar nem institucional.
AUMENTO
Até 2050, o número de pessoas com mais de 65 anos na UE vai crescer 70% e com mais de 80 anos aumenta 170 por cento.
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