A Internacional

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segunda-feira, março 12, 2012

Do nascimento à morte o que mais conta é a classe social



Em Washington D.C. entre o mais rico dos habitantes e o mais pobre há 18 anos de diferença na esperança média de vida
Em Washington D.C. entre o mais rico dos habitantes e o mais pobre há 18 anos de diferença na esperança média de vida (Scott Olson/AFP)


Saúde
04.03.2012 - 18:02 Por Catarina Gomes


 Michael Marmot veio ao Portugal em crise relembrar que por cada 1% na subida da taxa de desemprego, os suicídios crescem 0,8%. A boa notícia é que descem as mortes por acidentes de viação, ironiza. Viagem ao mundo das desigualdades na saúde com muito humor negro

Já não soa a surpreendente dizer que a esperança média de vida de uma mulher no Zimbabwe é de 42 anos e a de uma japonesa é de 80 anos, uma diferença de 38 anos, portanto. Ou que um queniano morre em média aos 47 anos e um sueco pode chegar contar aos 82, enuncia Michael Marmot, professor catedrático em Epidemiologia e Saúde Pública e director do Instituto Internacional para a Sociedade e Saúde na University College de Londres.


Mas e se o universo de que falamos for antes uma das zonas mais ricas de Londres, Westminster? Isso mesmo, o sítio onde fica o Parlamento britânico "e onde vivem muitos políticos e pessoas ricas". Pois nesta área geográfica, a diferença entre o mais rico e o mais pobre dos habitantes é de 17 anos. Não é preciso, por isso, apanhar um avião para África. "Eu faço este percurso de bicicleta em cerca de 25 minutos", disse o inglês Michael Marmot, na semana passada, perante uma plateia de profissionais de saúde no Instituto Nacional de Saúde Ricardo Jorge, em Lisboa. 

"É um mito pensar que a Europa é uma região rica e não tem estes problemas. Há grandes desigualdades entre as pessoas, dentro dos países". E esta não é uma particularidade de Inglaterra, é possível encontrar o mesmo fenómeno, por exemplo, numa simples viagem de metro na capital norte americana, continua. Em Washington D.C. entre o mais rico dos seus habitantes e o mais pobre distam 18 anos de diferença em esperança média de vida, explicita o académico. Este tipo de desigualdades sociais que se reflectem na mortalidade e no estado de saúde das pessoas são tão transversais e tão permanentes que "até na igualitária Suécia há um estudo que mostra que há diferenças entre um detentor de um doutoramento e o de um mestrado, o doutorado tem maior esperança de vida". 

A ideia de que o grupo social a que se pertence é determinante em termos de saúde é uma verdade que Michael Marmot foi encontrar no mais insuspeito dos grupos: os funcionários públicos britânicos, numa investigação que ficou famosa em Inglaterra, publicada na revista científica Lancet em 1991. Falando ao PÚBLICO após a conferência, disse que "não estamos aqui a falar de pobreza, todos eles têm emprego, casa, uma vida com alguma dignidade". Mas ainda assim encontrou maiores taxas de mortalidade entre os funcionários públicos do final da escala comparados com os do topo. 

O que este estudo veio desmentir foi a ideia de senso comum de que as funções de maior responsabilidade trazem consigo mais stress e por isso mais doença cardiovascular, por exemplo, explicou. Pelo contrário, o que se constata é que é determinante o grau de autonomia que se tem no trabalho. 

Nas investigações deste tipo chega-se à conclusão de que "o exemplo típico do trabalho com os níveis mais altos de stress é aquele em que a pessoa tem que fazer sempre as mesmas coisas da mesma forma e não tem qualquer controlo sobre o que faz, só tem que o fazer", ou seja, há mais stress, por exemplo num operário de uma fábrica, "que tem que pedir para ir à casa de banho, só tem que se fazer o que lhe é dito, não tem qualquer controlo sobre o seu trabalho", do que num administrador público de topo. Este "sabe que o que está a fazer é importante, há realização profissional. É um trabalho exigente mas tem mais controlo sobre o seu trabalho".

Marmot, que também esteve na Universidade do Algarve, tem dedicado o seu trabalho de pesquisa dos últimos 35 anos ao tema das desigualdades em saúde. E o que fez perante este auditório cheio de pessoas ligadas à saúde foi transportá-los ao longo de uma espécie de viagem ao mundo das desigualdades na saúde, que começa desde o nascimento e só termina até na morte. Com muito humor negro à mistura.

O pobre burro fica burro

Comece-se então nos primeiros anos de vida. Um estudo britânico de 2003 avaliou o desenvolvimento cognitivo de crianças dos 22 meses aos 10 anos, acompanhando o percurso de quatro tipos de crianças. Imaginemos que estamos a falar apenas de quatro crianças, para que se perceba: há duas que aos 22 meses pontuaram baixo na escala de desenvolvimento cognitivo, uma destas era originária de uma família de baixo estatuto socioeconómico e outra de um alto; e outras duas crianças que, no início de vida, estão nos valores mais altos do desenvolvimento cognitivo, mas uma é de um baixo estrato social e outra de alto. O que acontece a estas quatro crianças quando crescem? A criança com baixo desenvolvimento cognitivo de uma família rica recupera esse atraso, já aquela que tinha tido o mesmo baixo ponto de partida mantém-se ao mesmo nível. Nos dois meninos a quem foi identificado alto nível cognitivo, o da família pobre desce de desempenho intelectual à medida que avança na idade, o que cresceu num lar rico mantém o seu desempenho alto. O professor resume da seguinte forma este estudo: "Se se for pobre e burro fica-se burro, se se for burro e rico recupera-se. É a prova de que os genes não definem o destino e que a envolvência social é determinante e que o social potencia o biológico".Tomando depois como referência apenas dois elementos que afectam o desenvolvimento infantil sai reforçada a ideia da desigualdade social, continuou o académico. Logo à nascença, as crianças que nascem em famílias mais desfavorecidas têm maior probabilidade de terem mães com depressão pós-parto (cerca de 20%), número que não chega aos 10% no caso de famílias de estrato social mais elevado, revelam dados britânicos oficiais do Departamento da Criança, Escolas e Famílias de 2003-04 que citou. Um pouco mais velhinhos, aos três anos, cerca de 75% dos pais de famílias com estatuto socioeconómico mais alto lêem aos seus filhos todos os dias, uma prática que as estimula em termos cognitivos, número que desce para os cerca de 40% nos lares mais desfavorecidos. 

E se estivermos a falar já da vida activa? E aqui Marmot mostrou um gráfico com uma escala que relaciona o grau de saúde mental com o tipo de vínculo laboral que se tem - dos que trabalhavam sem contrato, aos que têm trabalho temporário, aos que têm contrato e termo e os que estão integrados nos quadros. O estado de saúde mental é muito pior entre os que têm formas de trabalho mais precárias e alcança os melhores níveis entre os trabalhadores com estabilidade laboral. A leitura óbvia será a de que a precariedade laboral é causa de piores níveis de saúde mental, verdade?. "Sabem como é que um grupo de economistas a quem mostrei este gráfico o leram? Disseram que era prova que as pessoas com pior saúde mental estavam a entrar para trabalhos mais precários". E neste momento, como em tantos outros, arrancou gargalhadas à plateia.

Ao Portugal em crise, Marmot veio relembrar que "está provado que o aumento em 1% da taxa de desemprego faz subir em 0,8% a taxa de suicídios e 0,8% a de homicídios. O desemprego leva ao suicídio e a matar outras pessoas". Mas, também é verdade, continuou, que as mortes por acidentes de viação descem 1,4%," circula-se menos porque há menos dinheiro para a gasolina", ironizou. "Se fizermos as contas e quisermos ser cínicos podemos chegar à conclusão que a coisa fica quase ela por ela", concluiu Marmot.

Fumar mata

O professor não se limita a trazer números. O seu tom vai além do académico, assume na sua conferência o papel de porta-voz da uma mensagem que quer fazer passar: "Ouve-se os ministros das finanças dizerem que este é o preço para manter a inflação baixa". "E se a frase fosse antes "o preço de manter a inflação baixa é matar pessoas"- "isto devia ser o mais importante do debate, não é só olhar para alguns números". Para Michael Marmot "devíamos avaliar todas as políticas pelo impacto que estas terão na saúde" porque, ao fim ao cabo,"o que é que pode ser mais importante do que a vida que se pode ter?".E na saúde tudo tem a ver com expectativas, disse ao PÚBLICO. Tomemos como exemplo os fumadores. As maiores taxas de fumadores encontram-se entre os mais pobres e esta é uma causa objectiva que está na origem de maior doença, o cancro do pulmão, por exemplo. "Temos que lidar não apenas com as causas da doença, mas com as causas das causas". Por que é que quanto menos educação mais se tende a fumar"? As razões dá-as em forma de um estudo que pensa ser exemplar. "Houve um estudo britânico que foi estudar mães solteiras, viviam em situações de pobreza e quase todas fumavam". A conclusão subjacente ao estudo era a de que "fumar era a única coisa que faziam para si mesmas. Os miúdos gritavam, faziam barulho, o que é que elas faziam? Acendiam um cigarro, era uma estratégia de lidar com a situação".

Pobres e ricos em Glasgow

Marmot fala de outro estudo que diz que na saúde tudo tem a ver com a forma como se olha para o futuro. "Quem valoriza está disposto a fazer sacrifícios para ganhos futuros. Se não se acha que se tem futuro há menos incentivo a fazer sacrifícios hoje para um futuro que não se sabe se tem". Querem outro exemplo? Michael Marmot providencia. Na parte mais pobre da cidade escocesa de Glasgow há uma diferença de esperança de vida de 28 anos entre os homens, comparando os habitantes das partes mais ricas em relação às mais pobres, "a esperança média de vida entre os homens mais pobres é de 54 anos, é menos oito anos do que a média indiana para homens, que é 62".

"Num encontro onde apresentei estes dados veio uma pessoa ter comigo e disse que vivia na parte mais rica de Glasgow mas que tinha um amigo que vivia na parte pobre que lhe tinha dito que não fez absolutamente nada para vir a ter reforma". Porquê? "Porque achava que não ia chegar lá. Porque as pessoas perceberam que vão ter vidas duras por que é que hão-de se chatear com a ideia de deixar de fumar? As expectativas que temos na vida têm impacto na saúde".

Agora que já sabemos tudo isto, que pesam na balança da saúde e da morte as circunstâncias em que as pessoas nascem, crescem, vivem, trabalham e envelhecem, que temos provas científicas que dão conta destas diferenças por que falta "vontade política"? Em 2008, no relatório encomendado pelo Governo Trabalhista que ficou conhecido como Marmot Review, deixou as áreas principais que podem e devem ser objecto de acção política tendentes a esbater estas diferenças: o desenvolvimento infantil; a educação e formação ao longo da vida; as condições de emprego; o rendimento; a existência de locais saudáveis e sustentáveis na comunidade; e factores como o tabagismo, o consumo de álcool, a obesidade ou o exercício físico. Em Lisboa, Marmot foi ouvido por um auditório cheio de pessoas ligadas à saúde que o aplaudiram de pé. E a sua mensagem foi: "O que é que pode ser mais importante do que a saúde das pessoas?"

Notícia corrigida às 11h02, de 5.03.2012. No primeiro parágrafo "42" foi substituído por "38"

domingo, março 04, 2012

Portugal - Em duas semanas morreram mais de seis mil pessoas

 

Especialistas em saúde pública associam excesso de mortalidade à crise económica

03.03.2012 - 13:37 Por Alexandra Campos

Alterações na estirpe do vírus da gripe estão entre as razões apontadas
Alterações na estirpe do vírus da gripe estão entre as razões apontadas (Foto: Nuno Ferreira Santos)
Responsáveis da Direcção-Geral da Saúde e do Instituto Ricardo Jorge dizem que perfil de mortalidade das últimas semanas não é anormal, já se registou em períodos anteriores, como em 2008/2009.
Em duas semanas apenas, morreram 6110 pessoas em Portugal, pelo menos mais um milhar do que era esperado para esta altura do ano. Os responsáveis da Direcção-Geral da Saúde (DGS) continuam a atribuir este elevado número de mortes ao período de frio extremo, em conjugação com a ocorrência tardia da epidemia de gripe, mas adiantam que está igualmente a ser estudada uma eventual influência de pequenas alterações observadas na estirpe do vírus da gripe que este ano é predominante, a A (H3N3), que afecta sobretudo os mais idosos e que provoca habitualmente um excesso de mortalidade. 

Especialistas como o ex-director-geral da Saúde e professor da Escola Nacional de Saúde Pública Constantino Sakellarides e o presidente da Associação Nacional dos Médicos de Saúde Pública, Mário Jorge Santos, vieram ontem a público defender, porém, que os efeitos da crise económica e do aumento das taxas moderadoras devem também ser levados em linha de conta na análise deste fenómeno. "O facto de as pessoas viverem com mais dificuldades", sentidas no acesso "aos medicamentos e à saúde", e de terem a "electricidade mais cara", são "hipóteses plausíveis" para explicar os anormais picos de mortalidade verificados nas últimas semanas, admitiu Constantino Sakellarides, em declarações à TSF. 

Além do frio e da gripe, que provocam sempre um aumento da mortalidade no Inverno, a manter-se esta tendência, há outros factores que devem ser investigados, como a "perda de rendimento das famílias e o aumento brutal das taxas moderadoras", defendeu Mário Jorge Neves. "Conheço pessoas que deixaram de ir ao hospital, de comprar medicamentos e de fazer alguns exames complementares de diagnóstico por causa das taxas moderadoras", descreveu. 

É preciso ver se as pessoas se estão a vacinar mais ou menos, se retardaram a ida ao médico e se pioraram a sua alimentação, recomenda também Vítor Faustino, coordenador do GripeNet, um sistema de monitorização da actividade gripal. "A gripe mata, mas não pode ser a única explicação. Temos de olhar para todos os lados, não descurar nada, como um detective", afirma o investigador, que lembra que noutros países europeus e nos Estados Unidos não se estão a observar tendências semelhantes. E nos EUA esta foi a gripe mais tardia dos últimos 29 anos.

"São declarações precipitadas", contrapõe o director-geral da Saúde, Francisco George. "Este perfil de mortalidade e de curva epidémica [da gripe] já se registou em anos anteriores, nomeadamente em 2008/2009", ano em que também predominou o A (H3N2), frisa. "Este excesso de mortalidade é da mesma magnitude do observado em 2008/2009", quando houve cerca de 1900 óbitos acima do que era esperado, reforça Baltazar Nunes, bioestatista do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge (INSA), o laboratório nacional de referência da gripe. Recuando mais no tempo, em 1998/99 o excesso de mortalidade foi ainda mais expressivo (8500 óbitos acima do habitual). 

O pico de mortalidade começou a ser observado a partir da semana cinco, no final de Janeiro, e tem vindo a crescer desde então. Mas foi na semanas sete e oito (entre 13 e 19 e entre 20 e a 26 de Fevereiro) que se acentuou, com um total de 3030 e 3080 mortes, respectivamente. Estes picos são coincidentes "com um período de frio e uma epidemia de gripe que neste momento está em fase ascendente", diz Baltazar Nunes. O especialista admite que "neste momento todas as hipóteses são passíveis de ser estudadas", até porque só será possível chegar a conclusões depois de desagregadas as causas de morte, mas considera que relacionar o que está a acontecer com a crise é, por enquanto, "muito especulativo".

"É o padrão da actividade gripal do A (H3). Já em 2008 tive de explicar que não se passava nada de anormal, o que é invulgar é que agora se está a assistir em directo [a este fenómeno]", assegura também Paulo Nogueira, especialista em estatística na DGS. 

Quanto às pequenas alterações que estão a ser observadas no vírus A (H3N2), também ainda é cedo para adiantar conclusões. "Parece haver uma alteração muito ligeira, que está a ser estudada em vários países", explica Isabel Falcão, da DGS. Destaca que este fenómeno não é raro, mas necessita de ser estudado "em profundidade". É o que está acontecer neste momento, até porque está a ser preparada a vacina para o próximo Outono.