1 – De repente, nos últimos dias, começou a surgir no interior da actual classe dirigente, um sector militar de topo, formado, essencialmente, por antigos chefes de Estado-Maior e próximos, na reserva/e/ou reforma, que se coloca em bicos de pés e pretende dar orientações para a governação do Estado, como se eles fossem, na realidade, os mentores políticos do poder executivo.
Merece, todavia, uma reflexão.
Porque este movimento e as suas propostas não são apenas corporativas, nem estão enquadradas, somente, no seu desejo de fazer vir ao de cima a supremacia castrense, com alguns privilégios e prebendas que mantiveram ao longo de toda a segunda metade do século XX.
A questão dos cortes orçamentais nas Forças Armadas portuguesas, que é real, não pode ser analisada apenas do ponto de vista do nacionalismo lusitano, e da sua maior ou menor importância isolada na geo-estratégia europeia e até mundial, como os antigos chefes militares transmitem nos seus argumentos.
O assunto português, e o pretenso patriotismo e nacionalismo desses cínicos que foram os chefes militares desde o 25 de Novembro de 1975, cúmplices com o poder político e económico, tem de ser visto e debatido dentro de um avanço político e estratégico que foi a criação da Unidade Europeia.
A unidade europeia, construída desde a segunda metade do século XX, não é uma questão que possa ser posta em prática, isoladadamente por cada Estado, com a actual crise mundial, provocada pelos Estado Unidos da América, como centro do grande capital financeiro lúmpem e especulativo e não é, além do mais, uma questão centrada, presentemente, na Alemanha.
É um problema político criado pelas burguesias nacionais, que perderam poder e querem sacar mais valias internas à custa do levantamento de uma questão nacional, que é artificial, tal como é colocada por essa gente, mas que somente pode ser equacionada pela perda de poder reivindicativo e económico das classes laboriosas.
2 – A unidade europeia não é produto de uma “ideia utópica” de homens como Monet, Schumann, ou até de Gaulle.
A unidade europeia surgiu, cresceu e vingou, porque se tinha conjugado dentro das diferentes classes - mas principalmente entre as classes trabalhadoras que saíram sempre massacradas pela guerra e entre a parte mais avançada do capital industrial e comercial, que era sempre atingido em larga escala - que somente a interligação económica e política transnacional poderia fazer prosperar a Europa, e colocá-la na vanguarda do desenvolvimento económico e impedia a sua fragmentação entre conflitos nacionais e interesses mesquinhos das respectivas burguesias pró-imperialistas, com a alemã, a francesa, a inglesa, e em menor escala, a italiana.
Ou seja, a unidade europeia tem, no seu bojo, um interesse sumamente económico e material.
Como se agigantou, economicamente, num tempo relativamente curto, desde a segunda metade dos anos oitenta até à primeira década deste século, este unidade, para ser preservada, teria – e terá - de ser construída não só contra os “poderes económicos internos” (não pudemos esquecer que figuras políticas como Cavaco Silva eram contra, antes de ascenderem ao governo e aos dinheiros da Comunidade Europeia, tentaram minar essa construção), mas também contra os “nacionalismos” bacocos de Partidos que se dizem internacionalistas, como o PCP/Verdes/MDP e PC (R) /UDP, este hoje defunto), mas contra as potências político-económico-militares, como o caso principal dos Estados Unidos da América.
Ora, as forças políticas e sociais que forjaram a Unidade Política Europeia deveriam ter a percepção que para se conseguir manter essa unidade, haveria necessidade, de imediato, de lhe dar uma componente unificada de poder militar.
Porque para construir o Estado Federal ou Confederal tem de ser enquadrado por uma força castrense e pública, que seja capazes de agir, colocando-se, acima dos conflitos inevitáveis, de uma reorganização de envergadura como é o avanço dos Estados nacionais para o Estado federal ou confederal , como “ autoridade superior” a todos os empecilhos nacionais, que vão aparecer.
E, se não se conseguir dar este passo, naturalmente os interesses económicos mais pujantes da burguesia imperial alemã, que está a “cristalizar-se” no poder naquele país, sobrepor-se-ão à não existência de uma instituição que, por muito deficiente que seja, tem o poder violento, de retirar veleidades de supremacia a essa mesma burguesia e a outras como a francesa, representada actualmente pelo senhor Hollande.
3 - Significa isto que é mais importante, do meu ponto de vista, que se planeie, desde já, um Orçamento Europeu Militar de Segurança Interna e Externa, do que se façam debates intermináveis sobre a capacidade militar de Portugal, que será sempre nula, na actual conjuntura geo-estratégica, será uma estrutura de servidão de potências, normalmente exteriores ao espaço europeu, como está a acontecer agora.
Porque não houve até agora a definição de um Plano Europeu Comum de Defesa Estratégica?
Porque não uma Marinha Comum Europeia, em que o comandante de um porta-aviões seja português e fique estacionado no rio Tejo, e o imediato um holandês, ou o contrário, porque naõ se estrutura uma flotilha de submarinos de raiz comunitário, cujo espaço principal de actuação seja a zona exclusiva, no presente, portuguesa, flotilha essa que fique sob o comando de um francês.
O mesmo para a Força Aérea ou para o Exército.
Apesar de toda a crise financeira, concentrada desde 2008 num ataque sem precedentes à moeda europeia, porque será que o euro continua a ser uma moeda forte, e atractiva para outros espaços territoriais, fora da órbita da potência norte-americana?
Porque continua a ser a Unidade Europeia, o principal espaço económico produtivo e de consumo comparativo com os valores da sua produção interna e da sua capacidade produtiva, bem como do espaço mais valioso em termos de valor comercial.
4 – Finalmente, umas breves notas sobre a questão castrense e a autoridade.
A História tem-nos mostrado, inclusive nos períodos revolucionários de envergadura, como a Comuna de Paris e a Revolução Soviética de Outubro de 1917, que a possibilidade de construir um novo sistema de autoridade e de organização militar somente terá viabilidade se houver capacidade material e política de dar corpo a um outro Estado social.
Naturalmente, temos de lutar contra a imposição desumana da repressão classista, da autoridade brutal do cacete e da fuzilaria sobre os explorados.
E é nessa luta que se vai construindo a possibilidade de vir a criar e constatar que é possível outro tipo de Estado e de organização social mais igualitária.
Mas, a sociedade onde vivemos tem de continuar a existir e a organizar-se.
Ora, tal pressupõe um sentido de autoridade, que leva em caso extremo à subordinação, apesar de estar assente em leis anti-democráticas. Temos de combate-las.
Todavia, a sociedade actual tem as suas formas de organização, desde a fábrica até à superestrutura militar.
Enquanto o poder estiver nas mãos das classes dirigentes e exploradoras o seu sistema de organização é que prevalece.
Somente quando houver condições materiais para criar uma outra estrutura económica, politica e social, serão corridas as formas repressoras daquelas classes.
Mas, não podemos esquecer que mesmo uma revolução social, para vingar, terá de fazer prevalecer os seus próprios princípios de autoridade.
7 comentários:
Apontam o factor trabalho como a única causa de todos os males e isso é mais uma criatividade lusa, olá se é!
Esses avençados (comentadores económicos da TV) não são burros, fazem-se…
Para mim o mais importante é o numerador do rácio e a determinante, não só do VA, mas de todo o output e que é o PREÇO. A análise desta variável conduz-nos ao poder, à força que domina a «seleção natural» que já passou ao discurso despudorado. O mais forte impõe o preço. Os avençados chamam-lhe mercado. E continuam a medinacarreirar-nos os ouvidos.
Lídia (Vila Real)
Sobre a produtividade há ainda um factor que parece que não foi referido.
Empresas como a PT, Autoeuropa, Cimpor (antes do descalabro provocado pelos novos patrões brasileiros), etc. têm uma produtividade elevada, mais elevada, por exemplo que a do sapateiro aqui ao pé de casa (patrão e um "colaborador").
E isto é importante, Portugal tem micro empresas a mais, parece que cerca de 250.000! E estas micro empresas têm sempre uma produtividade baixa.
O que Portugal precisa não é de um programa de empreendorismo para cada um criar o seu posto de trabalho mas antes um programa de engorda de empresas pois o mix de micro, pequenas, médias e grandes empresas encontra-se demasiado inclinado para as micro empresas. A Alemanha tem uma produtividade maior do que Portugal, a Alemanha ou o Japão mas estes países têm uma percentagem menor de micro empresas e uma percentagem maior de empresas médias.
Se 1% das micro empresas (2.500) passassem a empresas médias com uns 300 trabalhadores em vez dos um ou dois das micro empresas, criavam-se 750.000 postos de trabalho, isto é, o desemprego passava a ser um mínimo técnico e tínhamos de voltar a receber imigrantes, o PIB dava um salto e a produtividade aumentava.
E o que faz o governo? Faz propaganda para convencer que qualquer jovem que não crie uma micro empresa, isto é, não crie o seu posto de trabalho é atrasado mental ou cobarde e, ao mesmo tempo, em vez de ajudar as micro empresas a crescer, afoga-as em impostos e até as obriga, muitas vezes, a endividar para pagar adiantadamente o IVA.
Porque é que o governo não dá um "prémio" fiscal quando uma empresa cresce? Isto é, empresa que aumente as vendas, contrate mais trabalhadores e melhore a sua produtividade, em vez do castigo de pagar mais impostos, não teria antes direito a um desconto nesses mesmos impostos?