A Internacional

__ dementesim . . Do rio que tudo arrasta se diz que é violento Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem. . _____ . Quem luta pelo comunismo Deve saber lutar e não lutar, Dizer a verdade e não dizer a verdade, Prestar serviços e recusar serviços, Ter fé e não ter fé, Expor-se ao perigo e evitá-lo, Ser reconhecido e não ser reconhecido. Quem luta pelo comunismo . . Só tem uma verdade: A de lutar pelo comunismo. . . Bertold Brecht

sexta-feira, janeiro 26, 2007


"Repressão da GNR sobre as populações"





Os «safanões» da PIDE


O melhor português de todos os tempos (3)
Salazar = Cunhal?



Uma infame simetria

* Correia da Fonseca

O apuramento por via plebiscitária/televisiva de quais terão sido os dez maiores portugueses de sempre não trouxe surpresas. Lá estão dois reis de acção decisiva, um deles porque o seu desejo de poder feudal autónomo acabou por grangear-lhe a qualificação de «Fundador da Nacionalidade» (embora, já se vê, ele nem tivesse a mais pequena ideia do que seria isso da nacionalidade), o outro porque mandou que se abrissem portas que haveriam de resultar na expansão portuguesa no mundo. Vasco da Gama, que também por lá aparece, é de algum modo uma figura apendicular da vontade de João II, o que não lhe retira os méritos pessoais mas explica o seu relevo histórico. Lá estão também os dois poetas de que a generalidade dos portugueses actuais mais têm ouvido falar, e de quem até são citados alguns versos, quase sempre os mesmos, acrescendo que Camões é o único de entre todos que tem direito a feriado nacional. Está o Infante, cujo nome está na raiz da iniciativa histórica que deu ao nome de Portugal um prestígio mundial que nenhum outro pequeno povo conseguiu, e está o Marquês, cuja acção reformadora tentou, como mais ninguém o fizera e nunca mais ninguém tentou fazer, acertar o tempo português com o tempo de uma Europa que a várias vertentes se civilizava. Anote-se que a presença de Pombal é a única que pode suscitar alguma estranheza, não decerto porque lhe faltem méritos bastantes mas porque ainda são audíveis os ecos de uma antiga, verdadeiramente secular, campanha de hostilidade e detracção desencadeada não tanto em razão dos duríssimos e cruéis métodos que usou (e que eram, de resto, os que usavam no seu tempo) mas sim por ter ousado combater a influência e o poder de uma espécie de vaca sagrada que até então se passeava e pastava pelo País a seu bel-prazer. Entre os «dez mais» está também o nome de Aristides Sousa Mendes, provavelmente em resultado do voto dos que quiseram votar na coragem perante a ditadura fascista e na solidariedade com os oprimidos e perseguidos mas não puderam, não souberam ou não quiseram, levar essa opção a outra consequência que implicaria uma colaboração política. E estão, como se sabe, os nomes de Salazar e de Álvaro Cunhal.

O criminoso e o resistente

A presença do nome de Álvaro Cunhal não é preciso explicá-la a ninguém de boa-fé e espírito limpo de preconceitos e venenos. A do nome de Salazar também não: mete-se pelos olhos dentro, mesmo pelos olhos de quem os quer manter fechados, que está em curso uma intensa ofensiva que visa branquear o nome e acção do sujeito, o que será o mesmo que branquear o fascismo português, porventura a pretexto de que ele tinha menos fardas e outros adereços vistosos que o nazismo hitleriano e o fascismo de Mussolini. Convém dizer, de resto, que algumas das grandes linhas da propaganda do fascismo salazarista andam por aí à solta há muito tempo: a efectiva militância anticomunista de alguns media, a detracção e hostilização de «os partidos», outras mais. Porém, a inserção do nome de Salazar entre os «dez maiores portugueses de sempre», obtida graças ao voto de alguns saudosos que não sabem muito bem o que significa ser saudoso de uma ditadura criminosa e de outros que sabem lindamente o que fazem, permite agora um outro passo: o de, a pretexto de uma invocada recusa de «ditadores», ser reeditada ao abrigo desta escolha uma suposta simetria, totalmente infame, entre Salazar e Álvaro Cunhal. Não é uma infâmia inteiramente nova: há muito que na comunicação social é referida, implícita ou mesmo explicitamente, uma alegada simetria entre o fascismo e o comunismo, impostura insustentável à luz da mais elementar honestidade intelectual mas contudo prosseguida porque abre caminho a diversas formas de repressão anticomunista, isto é, de facto à recuperação de um dos grandes objectivos do nazifascismo. Porém, no caso da colocação em paridade de Salazar e Álvaro Cunhal a infâmia é particularmente chocante e repugnante. Porque situa em insuportável simetria um homem que mandou torturar, matar, fundar os campos de concentração do Tarrafal e de S. Nicolau, com um homem que foi torturado, camarada de muitos dos assassinados, solidário com todos os que o ditador mandava perseguir, explorar, escravizar. Salazar foi, factualmente, o homem-de-mão dos poderosos, dos exploradores, quando Cunhal era o combatente em favor dos explorados e símbolo de uma esperança colectiva que passava pela desaparição daquele poder opressor e de todas as formas, mesmo as mais dissimuladas, de cumplicidade com ele. Não direi, entenda-se, que «Grandes Portugueses», programa da RTP, foi lançado para servir o lançamento mediático e portanto de reforçado impacto, da indignante simetria que aliás já não era inédita. Mas direi, isso sim, que esse ameaça ser o mais importante efeito da iniciativa sobre a chamada opinião pública. E que, por isso, deve ser intensamente denunciada e combatida.

Correia da Fonseca

in AVANTE 2007.01.25

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