Patriarca diz que democracia na rua corrompe a democracia
12.10.2012 - 18:54 Por António Marujo
Em conferência de imprensa esta tarde, em Fátima, antes do início da peregrinação de 13 de Outubro, o também presidente da Conferência Episcopal Portuguesa afirmou que “há dimensões preocupantes” na actual crise económica e social que se vive no país. “A democracia [portuguesa], que se define constitucionalmente como democracia representativa, na qual as soluções alternativas têm um lugar próprio para serem apresentadas, neste momento, está na rua”, afirmou.
O patriarca está nesta sexta-feira e sábado a presidir, talvez pela última vez, a uma peregrinação em Fátima enquanto patriarca, já que deverá abandonar o cargo dentro de meses. Antes do início das cerimónias, D. José Policarpo acrescentou, respondendo a perguntas dos jornalistas: “O que está a acontecer é uma corrosão da harmonia democrática, da nossa constituição e do nosso sistema constitucional.”
A crise actual, disse o patriarca, foi criada “ao longo de muito tempo”. “Estes problemas foram criados por nós e por quem nos governou”, afirmou, manifestando-se no entanto como “incompetente” para se pronunciar sobre medidas concretas do actual ou de anteriores governos.
O patriarca acrescentou que os problemas não se resolvem “contestando, indo para grandes manifestações” ou fazendo uma qualquer “revolução”. E criticou a “reacção colectiva a este momento nacional, que dá a ideia de que a única coisa que se pretende é mudar o Governo”.
D. José Policarpo considera que “há sinais” de que os sacrifícios levarão a resultados positivos”, quer no país quer na Europa. “A situação criou-se dentro de um sistema económico-financeiro em que estamos inseridos, na União Europeia, e é lá que temos de encontrar as soluções”, disse, para acrescentar: “A democracia faz-se vencendo etapas como estas.”
Sobre o papel da Igreja Católica, o cardeal Policarpo diz que ela está presente junto dos mais necessitados “para ajudar em silêncio”, porque essa deve ser a atitude dos cristãos. “A Igreja, no seu todo, reagiu na atenção às pessoas”, disse. A arte da política deve ser a de promover “a equidade”, protegendo os mais desfavorecidos.
O patriarca insistiu, no entanto, na recusa em acrescentar a sua voz à “balbúrdia das opiniões” que comentam a actualidade, porque isso não faz parte do “ministério do bispo”.
Unidade não é só um caminho
Acabado de chegar do Vaticano, onde participou ontem na abertura oficial do “ano da fé”, proclamado pelo Papa Bento XVI, o patriarca referiu-se ainda aos 50 anos do início do Concílio Vaticano II, que ontem mesmo também se assinalava. Um dos passos mais importantes que a Igreja Católica deve dar é o de “aceitar a diferença, respeitando o essencial da fé”.
O desafio ecuménico é um dos mais importantes para as diferentes igrejas cristãs, acrescentou ainda. “Não haverá unidade se o caminho for conduzir todos ao código romano”, afirmou, acrescentando que o desafio colocado às restantes igrejas cristãs é “chegar ao essencial da fé”.
O Concílio Vaticano II, que entre 1962 e 1965 reuniu todos os bispos católicos encetando várias reformas da Igreja, precisa agora de ser relançado “para as novas gerações que não o conheceram”, afirmou entretanto o bispo de Leiria-Fátima, D. António Marto.
O mesmo responsável referiu-se ainda ao Nobel da Paz hoje atribuído à UE, afirmando que ele é “um reconhecimento do valor do projecto da União Europeia e do seu sentido para a construção da paz entre os povos da Europa e do mundo”. O Nobel “não foi apenas atribuído aos líderes”, mas “a todos os cidadãos e povos da Europa” num momento difícil em que o projecto europeu “está abalado” nos seus fundamentos e ameaça “desfazer-se em ruínas”, acrescentou o bispo, que é delegado da Conferência Episcopal Portuguesa na Comissão dos Episcopados da Comunidade Europeia.
José Policarpo: A crise actual foi criada “ao longo de muito tempo” ()
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