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terça-feira, agosto 19, 2008

Anistia não vale para crimes contra a humanidade, diz juiz espanhol


Vermelho

19 DE AGOSTO DE 2008 - 12h03

Anistia não vale para crimes contra a humanidade, diz juiz espanhol


O juiz espanhol Baltasar Garzón, que se notabilizou por emitir mandados de prisão contra ditadores latino-americanos, entre eles o chileno Augusto Pinochet, afirmou ontem, numa palestra em São Paulo, não acreditar que o sistema democrático se quebre por causa da investigação de crimes de tortura. Defendeu que a ocultação de cadáveres de ex-militantes de esquerda é um crime continuado, fazendo coro com o ministro Paulo Vannuchi, da Secretaria de Direitos Humanos, que falou sobre as "duas últimas e tensas semanas" e cobrou que o Brasil revele o passado e faça uma reconciliação sem preconceitos.



Convidado a vir ao Brasil pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República (Sedh), o juiz espanhol Baltasar Garzón, famoso por ter decretado em 1998 a prisão do ditador chileno Augusto Pinochet, defendeu nesta segunda-feira (18) em São Paulo a punição penal para crimes contra a humanidade cometidos durante o período da ditadura brasileira.


"Quando se trata de crimes contra a humanidade, entendo que não é possível a anistia e que a prescrição também não é possível. Há a primazia do direito penal internacional sobre o direito local sempre quando o país que estamos falando faz parte do sistema internacional de Justiça, como o caso do Brasil", disse.


Garzón destacou que há uma obrigação "não só moral, mas legal" de investigar os crimes. "Creio que internacionalmente está cristalizada a doutrina jurídica de que esses crimes internacionais devem obter uma resposta da via penal, da Justiça penal", ressaltou.


Questionado se os crimes cometidos durante a ditadura poderiam ser alvo de uma ação de uma corte internacional, o juiz espanhol disse que não se manifestaria sobre o assunto em respeito às instituições que estão investigando e atuando nos casos. Mas ele opinou que os crimes contra os direitos humanos são universais e todos os Estados têm direito de investigá-los e, eventualmente, prender seus autores. "Nós vivemos no mundo. As vítimas do Brasil não são só brasileiros. Portanto, o Estado espanhol tem tanto direito de punir os seus autores quanto o Estado brasileiro."


Garzón defendeu ainda a abertura dos arquivos da ditadura. Para ele, o livre acesso aos documentos "é uma questão de justiça reparadora" e não pode ser tratado como uma questão política ou ideológica.


Garzón disse ainda que as pessoas torturadas viram seu sofrimento continuar quando os torturadores não foram punidos e, mais ainda, quando o seu país se declara incapaz de promover investigações que produzam resultados contra os torturadores.


O juiz espanhol disse não entender por que alguns Estados acham que podem viver sem aprofundar as investigações que lhes permitam conhecer o seu passado.


Antes dele, Vannuchi defendeu a apuração de responsabilidades dos torturadores do regime militar. Ele explicou que na reunião com o ministro Tarso Genro, da Justiça, no dia 31 de julho, eles não pregaram a revisão da Lei de Anistia. "Por isso, não recuamos depois, como se disse." Afirmou que determinados crimes cometidos no regime militar não podem ser abrangidos pela Lei de Anistia porque são continuados. "Quem ocultou os cadáveres de 140 brasileiros reincidiu no crime porque sabe onde eles estão enterrados e se nega a revelar."


O juiz espanhol chega ao Brasil em um momento de efervescência das discussões sobre a abertura dos arquivos e a punição dos torturadores dos anos de ditadura militar.


Ainda ontem, o juiz espanhol visitou o antigo prédio do DOPS (Departamento de Ordem Política e Social), atual Estação Pinacoteca. O prédio, onde ocorreram crimes de tortura e assassinatos nos anos mais duros da ditadura militar, serve de palco para a exposição "Direito à Memória e à Verdade", organizada pela Sedh, ligada à Presidência da República.


Garzón participa ainda do seminário internacional "Direito à Memória e à Verdade", promovido pela Sedh, em parceria com a Universidade Estadual Paulista (Unesp) e a revista Carta Capital. Nesta terça-feira (19), em Brasília, o juiz espanhol se encontrará com autoridades do Executivo, Legislativo e Judiciário e fará uma palestra no debate promovido pela Universidade de Brasília (UnB) e a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos.


Da redação,
com agências

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