Teve uma raposa como animal de estimação, mas a caça à corrupção está a correr-lhe mal. Conseguiu uma condenação a um corrupto: uma multa de cinco mil euros. Suspeita que tem o telemóvel sob escuta e não consegue desembrulhar-se dos mega-processos. É o Procurador-geral da República portuguesa…
O discurso de posse prometia um vingador: "Várias leis foram elaboradas com o fim de combater a corrupção, várias experiências foram tentadas, várias iniciativas tomadas, mas a corrupção está aí, tão viva como sempre, minando a economia, corroendo os alicerces do Estado democrático. É aqui, penso, que se coloca um dos pontos-chave da luta contra a corrupção em Portugal. É fundamental a criação de um juízo de censura, de um desejo de punibilidade existente na consciência moral do homem médio, que por isso deve ser sensibilizado para o problema". Dito isto, Pinto Monteiro, 67 anos, natural de Almeida, tomou conta da Procuradoria-geral da República a nove de Outubro de 2006. Três anos depois, está embrulhado em mega-processos que envolvem o primeiro-ministro, proeminentes figuras do PS e do PSD, ex-autarcas e autarcas ainda em funções. Saberia Pinto Monteiro que os seus potenciais alvos não seriam criminosos vaga-lume, mas sim os agora mais conhecidos e notados da política nacional?
Pinto Monteiro chegou entre o rufar dos tambores justiceiros e a tentativa de apagar a má memória que tinha deixado o antecessor, Souto Moura. Um dia, confessou, julgava ter o telemóvel sob escuta. “Aquilo faz um barulho esquisito”. Seria apenas mais um dos principais garantes da democracia a ser escutado: Sócrates foi-o no âmbito do processo “Face Oculta”, o Presidente da República teme tê-lo sido – e disse-o publicamente.
Os 10 dramas de Pinto Monteiro
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O julgamento do processo Casa Pia ameaça ultrapassar as 500 sessões. A acusação feita pelo Ministério Público, segundo as notícias que saem da sala de audiências, esboroa-se a cada sessão. Apenas os factos apresentados contra Carlos Silvino, o motorista da Casa Pia acusado de violação e proxenetismo se mantém em pé. Réus como Carlos Cruz ou Ferreira Diniz estão cada vez mais descansados, porque, aparentemente, os dias e as horas dos alegados crimes não coincidem com as provas e os testemunhos. E do socialista Paulo Pedroso já todos parecem ter-se esquecido. Pinto Monteiro apanhou o caso a meio, uma espécie de herança do seu antecessor, Souto Moura. Agora, o procurador João Aibéu tenta salvar a “honra do convento”, mas a cada acusação parecem surgir mais testemunhas, mais contra-provas e mais problemas. O caso, que data de 2003, ainda não tem fim à vista – nem se sabe onde param as certidões que em tempos o MP disse terem sido extraídas para mais investigações e acusações.
Pinto Monteiro assegurou ao País que estava a ler o livro “Eu Carolina”, escrito pela ex-companheira de Pinto da Costa, o presidente do Futebol Clube do Porto. Leu, mas não disse se gostou ou não. As acusações de Carolina Salgado lá chegaram a tribunal, mas nem ela nem os alegados culpados de corrupção de árbitros, troca de favores por sexo com prostitutas e agressões físicas tiveram, neste caso, desfecho de cárcere. O outro processo, “Apito Dourado”, esse sim, já condenou pequenos dirigentes e agentes de segurança. Pinto da Costa, acusado no livro pela sua ex-mulher, escapou.
A edição portuguesa da revista “Focus” alertou para a existência de voos ilegais da CIA a passar em Portugal. Ana Gomes fez disso “cavalo de batalha” no Parlamento Europeu. O escândalo tornou-se mundial, mas Pinto Monteiro acabaria, já este ano, e depois de três anos de investigação, por arquivar o processo. O pingue-pongue entre Sócrates e Monteiro foi visível quando, no início de 2009, o primeiro-ministro remetia todas as respostas para a procuradoria. Em resumo: vários países, incluindo Espanha, provaram que o seu espaço aéreo foi violado pela secreta norte-americana. Mas no nosso país, um espaço aéreo utilizado, de certeza, pois as rotas que a Espanha e outros Estados indicaram tinham mesmo de cruzar o nosso céu, em Portugal, dizíamos, nada. Arquivado.
Duas dores de cabeça. A primeira a investigação em si, com a aparente indigência do Ministério Público, que admitiu ter a investigação parada durante anos por causa da falta de recursos humanos em Alcochete. Depois, uma investigação que parecia andar a conta-gotas, ao sabor das notícias da comunicação social. Em causa a aprovação da construção de um espaço comercial às portas de Lisboa. Suspeita-se que uma firma britânica terá pago luvas a agentes políticos para aprovar o Freeport. À época, o principal responsável político era o actual primeiro-ministro, José Sócrates. Um vídeo mostra um dos promotores do negócio a acusar directamente Sócrates de ter recebido luvas. A investigação britânica foi arquivada, porque para nas terras de Sua Majestade, o assunto não passa de um caso de fuga ao fisco local. Por cá até já tem arguidos. Mas as sessões em tribunal tardam a ver-se.
Outra dor de cabeça foi a alegada interferência do presidente do Eurojust, Lopes da Mota, junto dos dois procuradores que conduzem a investigação. Lopes da Mota foi acusado pelos homens de Pinto Monteiro. Mas o caso perdeu-se nas prateleiras da investigação. Ninguém foi condenado. Pinto Monteiro chegou a dizer que o Eurojust tinha sido afastado do processo – apesar de ser o organismo que deve coordenar as investigações das polícias da União Europeia. Mas era mentira: o Eurojust afastara-se ele mesmo, antes de o Procurador o solicitar.
Mais um caso sem conclusão. Quando se soube que o actual primeiro-ministro tinha sido licenciado a um domingo e que o seu último exame tinha sido entregue por fax, Pinto Monteiro disse que iria investigar o caso. Nenhum resultado se conhece até agora. E a Universidade Independente acabou. Do processo de má gestão e desvios de dinheiro resulta apenas um detido, Rui Verde. Mas sobre a investigação à metodologia seguida na UNI para licenciar os seus alunos, nada mais se soube. Pelo menos da parte de Pinto Monteiro.
A menina de cinco anos, que desapareceu de um aldeamento turístico no Algarve, provocou mais uma troca de correspondência entre Portugal e Inglaterra. As autoridades britânicas criticaram violentamente a investigação portuguesa, que nunca foi capaz de se decidir por uma das duas teses: ou assassinato ou desaparecimento. Pinto Monteiro teve ainda de lidar com os desajustes da Polícia Judiciária, que ao despedir Gonçalo Amaral da investigação do caso o tornou um mártir. Amaral escreveu um livro onde afirma que Maddie morreu no quarto. Foi processado pelos pais da menina. A Procuradoria-geral da República, depois de algumas declarações de circunstância durante dois anos, decidiu arquivar o processo. Nem morta nem desaparecida. Apenas arquivada.
Um processo complicado, que implicava a tentativa de suborno de agentes políticos da Câmara Municipal de Lisboa por parte da empresa minhota Bragaparques, envolvida em vários negócios na capital – entre eles, o dos terrenos da antiga Feira Popular. Já em Fevereiro deste ano, e depois de serem ouvidas dezenas de pessoas, Domingos Névoa, o administrador da empresa, seria condenado a pagar uma mera multa de cinco mil euros por ter tentado corromper o vereador José Sá Fernandes, então do Bloco de Esquerda. A tentativa de corrupção foi gravada e publicada pelo jornal “Expresso”. Pinto Monteiro, sabe-se, ficou incomodado com a decisão judicial – considerou-a branda.
O abate de sobreiros em terrenos perto de Lisboa e a eventual operação financeira que teria, alegadamente, levado dinheiro aos cofres partidários, esteve também sob alçada do actual Procurador Geral da República. O caso continua a ser investigado, sem conclusões. Os responsáveis políticos estão intocados, os responsáveis empresariais também. Pinto Monteiro nada diz sobre este processo há meses.
BPN
A alegada gestão danosa do Banco Português de Negócios já deteve o seu antigo dirigente, Oliveira e Costa, e lança sombra suspeita agora sobre várias pessoas, entre as quais Manuel Dias Loureiro, antigo Conselheiro de Estado e administrador do banco. O drama é tão grande que envolveu a nacionalização da instituição, não fosse o tecido bancário nacional rasgar-se. Ao Ministério Público pede-se que acuse os autores da má gestão e dos alegados ilícitos criminais. Mas até agora, nem sequer foi deduzida acusação contra Oliveira e Costa, que tem data limite de 21 de Novembro. “Esperemos que nessa altura – se não houver nenhum terramoto, se não houver nada que nos transtorne os planos –, os meus colegas, que estão a trabalhar neste processo muito complexo, consigam impedir a alteração da situação em que os arguidos se encontram”, disse Cândida Almeida, a procuradora que coordena o processo. Em suma: nos EUA Madoff foi acusado de fraude a 12 de Dezembro de 2008 e condenado a 29 de Junho de 2009. A 18 de Fevereiro de 2008 rebentou o escândalo BPN, que ainda nem sequer tem acusação formada.
Face Oculta
Um sucateiro de Águeda, vários quadros médios de empresas do sector empresarial do Estado, um vice-presidente do maior banco privado português – e amigo do primeiro-ministro – são as principais personagens da história mais recente dos escândalos portugueses. Na investigação a PJ escutou Armando Vara e José Sócrates em conversas sobre temas que, alegadamente, passam pela comunicação social, a salvação de um grupo privado de comunicação social e o financiamento do PS. As escutas a Vara e Sócrates sobrepuseram-se ao crime de colarinho branco. Uma guerra entre Pinto Monteiro e um velho adversário, o presidente do Supremo Tribunal de Justiça, fez com que as ditas conversas – gravadas em 52 cassetes – fossem ou estivessem a caminho da destruição. O Procurador desespera e anuncia que esta semana diz mais sobre o caso. Noronha do Nascimento, o presidente do “Supremo”, sacode a água do capote. A oposição critica a Justiça. O primeiro-ministro diz que isto “já passou todas as marcas”. O Diábo
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in PortugalClub - qua 18-11-2009 00:13
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