A Internacional

__ dementesim . . Do rio que tudo arrasta se diz que é violento Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem. . _____ . Quem luta pelo comunismo Deve saber lutar e não lutar, Dizer a verdade e não dizer a verdade, Prestar serviços e recusar serviços, Ter fé e não ter fé, Expor-se ao perigo e evitá-lo, Ser reconhecido e não ser reconhecido. Quem luta pelo comunismo . . Só tem uma verdade: A de lutar pelo comunismo. . . Bertold Brecht

sexta-feira, novembro 27, 2015

Bashar al-Assad e as bandeirinhas francesas no facebook

24 de novembro de 2015 - 20h24 


 
 

Há poucos dias, 18 de novembro para ser mais preciso, o presidente da República Árabe da Síria, Bashar al-Assad, concedeu uma entrevista à TV estatal italiana RAI, acrônimo de “Radio Audizioni Itália”. Entrevistar longamente, como fez a RAI, um dos personagens centrais de uma grave crise humanitária que afeta dramaticamente milhões de pessoas no Oriente Médio e na Europa, sem qualquer censura às perguntas, algumas, aliás, beirando a provocação, é sem dúvida, um relevante fato jornalístico. 



Mas a repercussão no Brasil foi próxima de zero. Isso se explica pelas desconcertantes respostas que Assad deu aos questionamentos, que soam como bofetadas na hipocrisia geral. No Brasil um dito popular assevera que “quem fala a verdade não merece castigo”. Para a nossa mídia hegemônica, quem fala a verdade deve ser silenciado.

O que disse Assad

A primeira bofetada – não no jornalista, que estava cumprindo seu dever, mas no senso comum construído midiaticamente – veio logo na primeira pergunta, quando se indagou ao presidente sírio sobre como ele reagiu aos atentados de Paris. Principal trecho da resposta: “Este é um crime terrível. Ao mesmo tempo, é muito triste termos que ouvir sobre a morte de pessoas inocentes sem razão ou justificativa. Nós, na Síria, compreendemos bem o significado da perda de familiares, de entes queridos, de amigos ou de pessoas que você conhece, num crime tão terrível quanto este. Nós, na Síria, estamos sofrendo com estes eventos há cinco anos e compartilhamos dos sentimentos dos franceses. Assim como compartilhamos dos sentimentos dos libaneses, há alguns dias atrás, e dos russos que perderam seus familiares e entes queridos no acidente que derrubou o avião no Sinai. Vale o mesmo para iemenitas. Mas será que o mundo e, especialmente, o Ocidente compartilha do sentimento destas pessoas? Ou será que sentem apenas pelos franceses? Será que sentem pela dor dos sírios, que estão sofrendo deste tipo de terrorismo por cinco anos? Não devemos politizar os sentimentos porque os sentimentos não estão relacionados com o nacionalismo, mas sim à humanidade de forma geral”. Muita gente, que com a melhor das intenções, colocou bandeirinha francesa no perfil do  facebook, deveria refletir sobre estas palavras.

O Tapete furado

Assad disse muito mais coisa da mesma lavra. Verdades incômodas, que são jogadas para debaixo de um imenso tapete de desinformação, foram reveladas com calma e firmeza. Ao ser perguntado sobre o porquê de o território Sírio ser uma importante base dos terroristas, Assad respondeu: “Isso acontece com o apoio dos turcos, dos sauditas, dos qataris e, claro, das políticas ocidentais, que apoiaram terroristas de várias maneiras, desde o início da crise”. O presidente Sírio disse isso exatamente há sete dias atrás. Nesta terça-feira (24) a Turquia abateu um caça russo que estava bombardeando posições do Estado Islâmico, provocando um sério incidente diplomático. O ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov, suspendeu a visita que faria à Turquia. O presidente russo Vladimir Putin foi duro: "A perda de hoje é uma facada nas costas que foi dada pelos cúmplices dos terroristas". Quem se interessar pode ler a transcrição completa da entrevista com Bashar al-Assad abaixo. A mídia hegemônica a serviço do imperialismo terá que redobrar os esforços para continuar falseando a realidade. O tapete está cada vez com mais furos. 

Íntegra da entrevista com Bashar al-Assad

Jornalista: Sr. Presidente, gostaria de agradecê-lo pela oportunidade de entrevistá-lo. Vamos começar por Paris. Como foi a sua reação à notícia sobre acontecimentos em Paris? 

Presidente Bashar al-Assad: Posso começar dizendo que este é um crime terrível. Ao mesmo tempo, é muito triste termos que ouvir sobre a morte de pessoas inocentes sem razão ou justificativa. Nós, na Síria, compreendemos bem o significado da perda de familiares, de entes queridos, de amigos ou de pessoas que você conhece, num crime tão terrível quanto este. Nós, na Síria, estamos sofrendo com estes eventos há cinco anos e compartilhamos dos sentimentos dos franceses. Assim como compartilhamos dos sentimentos dos libaneses, há alguns dias atrás, e dos russos que perderam seus familiares e entes queridos no acidente que derrubou o avião no Sinai. Vale o mesmo para iemenitas. Mas será que o mundo e, especialmente, o Ocidente compartilha do sentimento destas pessoas? Ou será que sentem apenas pelos franceses? Será que sentem pela dor dos sírios, que estão sofrendo deste tipo de terrorismo por cinco anos? Não devemos politizar os sentimentos porque os sentimentos não estão relacionados com o nacionalismo, mas sim a humanidade de forma geral. 

Jornalista: O "Daesh" está por trás deste crime. Baseado na perspectiva de Damasco, o quão forte é o "Daesh"? Qual seria, em sua opinião, a maneira de lutar contra os terroristas no terreno? 

Presidente Bashar al-Assad: Se você quer falar sobre o poder da "Daesh", a primeira coisa que você deve perguntar é se ele possui uma tutela real ou natural numa determinada comunidade. Até o presente momento, posso afirmar que o "Daesh" não possui uma tutela natural ou social dentro da Síria. Isso é bom e reconfortante. Mas, ao mesmo tempo, se este se tornar um problema crônico, tal ideologia pode até mudar uma sociedade. 

Jornalista: Mas alguns dos terroristas foram treinados na Síria, a poucos quilômetros daqui. O que isso significa? 

Presidente Bashar al-Assad: Isso acontece com o apoio dos turcos, dos sauditas, dos qataris e, claro, das políticas ocidentais, que apoiaram terroristas de várias maneiras, desde o início da crise. Mas não é este o caso. Primeiramente, se não houver uma tutela, não devemos nos preocupar. Por outro lado, eles podem se tornar fortes, já que têm o apoio de diferentes países, tanto no Médio Oriente quanto no Ocidente.

Jornalista: Sr. Presidente, há especulações no Ocidente de que o senhor estava entre aqueles que apoiaram o "Daesh", no início da crise, a fim de dividir a oposição e os rebeldes. Qual é a sua resposta para isso? 

Presidente Bashar al-Assad: Na verdade, de acordo com algumas autoridades norte-americanas, incluindo Hillary Clinton, a Al Qaeda foi criada pelos americanos, com o apoio financeiro e ideológico wahabista da Arábia Saudita. A mesma coisa foi dita por muitas outras autoridades dos Estados Unidos. O "Daesh" e a "Al Nusra" são duas ramificações da Al Qaeda. Quanto ao "Daesh", este foi criado no Iraque, em 2006, e seu líder era Al-Zarqawi, morto pelas forças americanas na época. Portanto, o “Daesh” foi criado no Iraque, sob a supervisão dos americanos. O líder atual do "Daesh" é o chamado Abu Bakr al-Baghdadi, que estava detido nas prisões americanas, em Nova York, e depois posto em liberdade. Portanto, não há relação da Síria nisso. O Daesh não foi criado na Síria e sim no Iraque e, de acordo com o que eles disseram, já atuava no Afeganistão. Tony Blair disse, recentemente, que a guerra no Iraque contribuiu para o surgimento do "Daesh". Então, a confissão deles é a prova mais importante no que se refere à sua pergunta. 

Jornalista: Sr. Presidente, quando olhamos para o mapa da Síria, parece que as fronteiras entre a Síria e o Iraque já não existem mais. Qual é a parte que vocês controlam, de fato, atualmente na Síria? 

Presidente Bashar al-Assad: Se você está se referindo ao aspecto geográfico, isso muda a cada dia. Mas, o mais importante é o número de habitantes que vivem nas áreas controladas pelo governo. Na realidade, a maior parte da área controlada pelos terroristas foi esvaziada de seus moradores, tanto pelos terroristas quanto pela própria população, que fugiu para as áreas controladas pelo governo. Em termos militares, você pode ganhar algumas áreas ou pode perder uma determinada área. De qualquer forma, o exército não pode estar presente em todos os cantos da Síria. Mas olhando para o mapa descrito por você ou assistindo, de vez em quando, a mídia ocidental, quando dizem que o governo controla 50% ou menos dos territórios, a realidade é que 50% ou 60% dos territórios sírios são terras vazias, sem habitantes, e por isso as colocam sob o controle dos terroristas, já que estão completamente vazias. 

Jornalista: Sim. Gostaria de perguntar sobre a fronteira entre a Síria e o Iraque. 

Presidente Bashar al-Assad: Tudo bem. A região localizada depois de Damasco, indo em direção ao Iraque, está vazia e, por isso, não se pode falar em controle. No que diz respeito às fronteiras, isso está relacionado aos terroristas e aos governos que os apoiaram, como o governo turco, de forma essencial, bem como o governo da Jordânia. Ambos os governos apoiam os terroristas. Por esta razão, as fronteiras estão soltas, porque quando você quer o controle das fronteiras, este controle deve ser feito pelos dois lados e não de forma unilateral. 

Jornalista: Foram realizadas, na semana passada, duas importantes conferências que abordaram a situação na Síria, uma em Viena e a outra em Antalia. A maioria dos países fala sobre um processo de transição na Síria. Existem diferentes posições. Mas, basicamente, a maioria dos países concorda com a ideia de realizar eleições depois de dezoito meses. Entretanto, dizem que, neste ínterim, deve ocorrer a sua destituição do poder. Qual é a sua posição em relação a isso? 

Presidente Bashar al-Assad: A declaração não contém nada sobre o presidente. A principal parte (da declaração) da Conferência de Viena diz que tudo o que se refere ao processo político depende do que for acordado entre os sírios. Desta forma, a frase mais importante que resultou da conferência está relacionada à Constituição e ao presidente. Qualquer que seja o presidente, ele deve ocupar ou deixar o cargo em conformidade com os procedimentos constitucionais e não de acordo com os critérios de alguma força ou de algum país ocidental. Então, desde que a conversa seja sobre o acordo entre sírios, devemos esquecer todo o resto do que foi dito em Viena, exceto este ponto. No que diz respeito ao calendário, isso depende do acordo que podemos, como sírios, alcançar. Se não alcançarmos um acordo no prazo de dezoito meses, que importância tem isso? Eu acho que existem muitas coisas que não são importantes ou essenciais. A coisa mais importante é que sentemos juntos, como sírios, e possamos definir a agenda e o plano que nos convém.

Jornalista: Eu entendo. Mas a probabilidade de sua destituição do cargo não seria algo que o senhor deveria levar em consideração? Quero dizer, o senhor imagina um processo eleitoral sem a sua participação?

Presidente Bashar al-Assad: Isso depende do que você quer dizer com o processo eleitoral. Você se refere às eleições presidenciais ou parlamentares?

Jornalista: Me refiro às eleições parlamentares. 

Presidente Bashar al-Assad: Claro. Ocorrerão eleições parlamentares, porque essas eleições mostrarão quais forças políticas têm peso real na Síria, do ponto de vista do povo sírio. E qual dessas forças tem bases populares. Neste momento, qualquer um pode dizer: "Eu represento a oposição". O que isso significa? Como podemos traduzi-lo? A tradução será feita através das eleições e do número de assentos que eles ocuparão no parlamento. E isso determinará a sua participação no governo que será formado. Isto é um exemplo. É claro que isso vai acontecer depois da homologação da nova Constituição. Eu estou apresentando apenas um exemplo de proposta e não definindo o que deve ser acordado.

Jornalista: E sobre as eleições presidenciais?

Presidente Bashar al-Assad: Se durante os diálogos os sírios decidirem pela realização de eleições presidenciais, não haverá nenhuma linha vermelha no que diz respeito a este assunto. Esta decisão deve estar sujeita ao acordo entre os sírios.
Jornalista: Mas poderia haver outra pessoa em quem o senhor confia para participar das eleições, no seu lugar?

Presidente Bashar al-Assad: Uma pessoa em quem eu confie? O que você quer dizer com isso? 

Jornalista: Eu quero dizer alguém que o senhor confie para ocupar o cargo de presidente. 

Presidente Bashar al-Assad: Parece-me que estamos falando das minhas posses, de forma que eu possa escolher quem me substituirá. O assunto sobre o qual estamos falando não se refere a uma propriedade privada. Estamos falando de um processo nacional. Somente os sírios têm o direito de escolher a pessoa em quem confiar. Não importa se eu confio ou não em alguém. A pessoa que tiver a confiança dos sírios é quem deve ocupar o cargo. 

Jornalista: Deixe-me ver se eu entendi o que o senhor disse. Qual seria o calendário realista para isso? Qual seria o calendário, do seu ponto de vista, para sair desta crise?

Presidente Bashar al-Assad: Se você quer falar sobre um calendário, então ele começa a valer após a derrota do terrorismo. Antes disso, não valeria a pena definir qualquer calendário, porque não seria possível conseguir qualquer conquista política no momento em que os terroristas controlam muitas das áreas na Síria. Os terroristas são, como eram originalmente, o principal obstáculo frente a qualquer progresso político. E se você quer falar sobre o que vai acontecer depois disso, creio que um ano e meio ou dois anos seriam suficientes para qualquer período de transição. O que eu quero dizer é: Se você quiser homologar uma nova Constituição e, em seguida, realizar um referendo, logo depois as eleições parlamentares e quaisquer outros procedimentos, sejam eles presidenciais ou não, não importa. Tudo isso não levaria mais do que dois anos.

Jornalista: No que diz respeito à oposição, o senhor insistiu em dizer, ao longo dos últimos anos, que as partes que pegam em armas e lutam não fazem parte da oposição. O senhor mudou de opinião?

Presidente Bashar al-Assad: Você pode aplicar isso no seu próprio país. Vocês não aceitam qualquer oposição que pegue em armas em seu país. Isso se aplica a qualquer outro país. Qualquer um que pega em armas, aterroriza as pessoas, destrói propriedade privada ou pública e mata pessoas inocentes não pode ser um oposicionista. A oposição é uma expressão política. Você não pode definir o que é uma oposição baseando-se numa opinião pessoal, mas sim através das eleições e das urnas.

Jornalista: Então quais são as partes que o senhor considera parte da oposição política no momento?

Presidente Bashar al-Assad: Você pode perguntar aos sírios sobre quais as partes que eles consideram oposição. Se eles a elegerem, esta será a verdadeira oposição. Por isso eu disse que só poderemos defini-la após as eleições. Mas se estamos falando sobre a minha opinião, então a oposição é formada pelas partes que detêm bases populares e pertencem a este país. Você nunca será oposição se você for formado, tanto como pessoa quanto como entidade, num ministério estrangeiro ou nas sedes dos serviços de inteligência dos outros países. Você não pode ser um fantoche ou um agente ou um mercenário. Você deve ser, unicamente, um sírio. 

Jornalista: Vemos, agora, na Europa, na Itália, muitos refugiados sírios. O que o senhor gostaria de dizer a estas pessoas que fugiram do seu país?

Presidente Bashar al-Assad: Certamente direi que qualquer pessoa que deixa este país é uma perda para a Síria. Isso é fato. Estamos tristes e sentimos pelo sofrimento deles, porque cada refugiado tem uma história de sofrimento dentro da Síria. É disso que devemos tratar e nos perguntar sobre o motivo deles saírem. Eles estão saindo por várias razões. A primeira razão é a ameaça à qual estão expostos por parte dos terroristas. A segunda razão é o impacto que os terroristas causam quando destroem grande parte da infraestrutura e o efeito disso na vida destas pessoas. A terceira razão, ligada à importância deste impacto terrorista, é o embargo ocidental à Síria. Se você perguntar a muitos desses refugiados se eles querem voltar para a Síria, você verá que eles querem voltar imediatamente. Mas como voltar para a Síria num momento em que foram afetados, de forma drástica, todos os alicerces de sua vida e de seus meios de subsistência. Por esta razão, eles não conseguem ficar na Síria. Os impactos do embargo ocidental e dos terroristas colocaram estas pessoas numa posição difícil, entre a cruz e a espada.

Jornalista: Mas o senhor não se sente responsável, de alguma forma, pelo que aconteceu com o seu povo?

Presidente Bashar al-Assad: Você se refere a mim, como pessoa? 

Jornalista: Sim. 

Presidente Bashar al-Assad: A única coisa que temos feito, desde o início da crise, é lutar contra o terrorismo e apoiar o diálogo. O que mais podemos fazer, além disso? Existe alguém que se oponha ao diálogo? Existe alguém que se oponha à luta contra o terrorismo? Se você quer falar sobre detalhes e sobre a propaganda ocidental, então não vamos desperdiçar o nosso tempo. É mera propaganda. Porque o problema, desde o início, em relação ao Ocidente é que eles não querem tal presidente. Eles querem que este governo falhe e entre em colapso, de modo que eles possam muda-lo. Todos sabem disso. Todo esse jogo ocidental é para mudar os regimes. Independentemente do que se entende por regime. Nós não temos um regime. Temos um Estado. Mas eu estou falando sobre os seus conceitos e princípios. Desta forma, você pode culpar a quem você quiser. Mas a responsabilidade principal é do Ocidente, que apoiou estes terroristas e criou o “Daesh” e a “Frente Al Nusra” na Síria, dando-lhes a cobertura necessária para proteger tais organizações terroristas.

Jornalista: Então o senhor não assume qualquer responsabilidade?

Presidente Bashar al-Assad: Eu, como um sírio, não digo que nós não cometemos erros. Existem erros cometidos, em nível tático, em todos os dias de atuação. Mas existem estratégias e as estratégias que temos adotado estão configuradas nestas duas abordagens. Em termos táticos, temos cometido erros todos os dias. Cada sírio é responsável pelo que vem acontecendo. Nós, como sírios, somos responsáveis quando permitimos que esses terroristas venham para a Síria, porque alguns sírios têm a mesma mentalidade deles. E alguns sírios aceitaram servir de fantoches nas mãos dos países do Golfo e dos países ocidentais. É claro que assumimos a responsabilidade. Mas se você quiser falar sobre a minha responsabilidade pessoal, então ela está relacionada aos detalhes e isso é difícil de julgar neste momento.

Jornalista: Gostaria de perguntar sobre como foi sua visita a Moscou? 

Presidente Bashar al-Assad: A visita foi para discutir a situação militar, porque ela ocorreu duas semanas antes das tropas russas iniciarem os ataques aéreos. Bem como para discutir o processo político, porque a visita também ocorreu poucos dias antes da Conferência de Viena. Foi uma visita muito proveitosa porque os russos compreendem bem esta região, em virtude de laços históricos que nos unem. Eles têm suas embaixadas e todas as relações e os meios necessários que lhes permitem desempenhar o seu papel. Desta forma, posso descrever a visita como frutífera.

Jornalista: Em Roma, o Papa disse que matar em nome de Deus é uma forma de infidelidade. Esta é, na realidade, uma guerra religiosa? 

Presidente Bashar al-Assad: Na verdade, não. Não é uma guerra religiosa. É uma guerra entre aqueles que se desviaram da verdadeira religião, principalmente do islamismo, e se viraram para o extremismo, e nós não os consideramos como parte de nossa religião. É uma guerra entre os verdadeiros muçulmanos, de um lado, e os extremistas de outro lado. Esta é a essência da guerra hoje. É claro que eles dão outros nomes a esta guerra, tais como a guerra contra os cristãos ou a guerra contra outras seitas. Isso não é nada, senão nomes usados pelos extremistas para promover a sua guerra. Enquanto que a verdadeira questão é a guerra entre eles e todos os outros muçulmanos, compostos, em sua maioria, pelos moderados.

Jornalista: Mesmo se eles estejam lutando em nome de Deus e matando ao dizer Deus é grande?

Presidente Bashar al-Assad: Exatamente. É desta maneira que eles promovem a sua guerra. Para isso, eles usam estas expressões ou frases sagradas. Para convencer as pessoas comuns, nesta região, de que estão lutando pela causa de Deus. Isto não é verdade, em absoluto. Alguns deles usam estas expressões, mesmo sabendo que não é verdade. E alguns as usam por ignorância e por acreditar que esta guerra é pela causa de Deus. É por isso que eu a descrevi como um desvio. Estas pessoas se desviaram do verdadeiro Islã, de forma consciente ou inconsciente.

Jornalista: E quanto ao futuro dos cristãos na Síria e na sua região? 

Presidente Bashar al-Assad: Na verdade, esta região, creio que os italianos e muitos no Ocidente sabem disso, é uma região moderada. Uma comunidade moderada. Especialmente na Síria. Tanto em termos políticos, sociais ou culturais. E a verdadeira razão para esta moderação é a existência da diversidade sectária e étnica. Mas um dos fatores mais importantes na história da Síria é o fator cristão, especialmente após o advento do Islã a esta região há quatorze séculos. Sem cristãos, esta região rumaria em direção a um extremismo maior e assim por diante. O futuro deles é importante e não pode ser separado do futuro dos sírios. Quero dizer que, se houver um bom futuro para os sírios, então o futuro de cada um dos componentes da nossa sociedade será bom e vice-versa.

Jornalista: Bem, então o senhor acha que eles têm um futuro aqui. Mas parece que os cristãos estão sendo alvos. 

Presidente Bashar al-Assad: Não, isso não é verdade. Na verdade, o número de muçulmanos que foram mortos na Síria é muito maior do que o número de cristãos. Portanto, não se pode dizer que eles estão sendo alvos em particular. Novamente, os extremistas estão usando isso para promover a guerra. Eles dizem que é uma guerra contra os ateus e pela causa de Deus e tal, mas a realidade é outra. 

Jornalista: Sr. Presidente, antes de terminarmos esta entrevista, deixe-me fazer outra pergunta. Como o senhor vê o seu futuro? O que o senhor considera mais importante, o futuro da Síria ou permanecer no poder? 

Presidente Bashar al-Assad: Primordialmente, o futuro da Síria é tudo para nós. Quero dizer que até mesmo o meu futuro, como um cidadão, não pode ser separado do futuro dela. Como um cidadão, se meu país não estiver seguro, eu não estarei seguro. Se o meu país não estiver bem, não terei um bom futuro. Isto é basilar. Mas, novamente, se você quer colocar as coisas na balança, você dirá: Se o presidente ficar, o futuro da Síria será ruim. E se o presidente se for, o futuro da Síria será bom. Isto faz parte da propaganda ocidental. E este não é o caso na Síria. Não dentro da Síria. Há quem apoia o presidente e há quem não o apoia. E assim será se o meu futuro for bom para a Síria. Se o povo sírio me quiser como seu presidente, o futuro será bom. Mas se os sírios não quiserem a minha presença e eu me agarrar ao poder, então o fato de eu ser o presidente será ruim para a Síria. É uma questão muito simples. Então não devemos seguir a propaganda ocidental e agir de acordo com ela, porque ela está longe da realidade. Nós temos que agir de acordo com a nossa realidade.

Jornalista: Obrigado, Sr. Presidente, por esta oportunidade de conhecê-lo. 

Presidente Bashar al-Assad: Obrigado por terem vindo para a Síria.

http://www.vermelho.org.br/noticia/273232-367

quinta-feira, novembro 26, 2015

Os arrufos de um general sem tropas e sem armas no seu labirinto

26
NOV 15
PUBLICADO POR JOSÉ SIMÕES, ÀS 22:25


Cavaco, O Avisador, O Institucionalista, O Provedor do Povo, o presidente de facção e delegado desportivo ao inter-turmas do liceu, pode demitir o Governo. E depois faz o quê, indica Passos Coelho primeiro-ministro com uma maioria de esquerda no Parlamento para o chumbar outra vez enquanto António Costa continua à frente de um Governo de gestão?

Cavaco, O Avisador, O Institucionalista, O Provedor do Povo, o presidente de facção e delegado desportivo ao inter-turmas do liceu, pode demitir o Governo. E depois faz o quê, nomeia um Governo de iniciativa presidencial com uma maioria de esquerda no Parlamento para chumbar tudo e mais alguma coisa que dali saísse?

Cavaco, O Avisador, O Institucionalista, O Provedor do Povo, o presidente de facção e delegado desportivo ao inter-turmas do liceu, pode demitir o Governo. E está criado um caso e a comunicação social, mais os paineleiros-comentadeiros com lugar cativo nas televisões e que dormem num anexo do estúdio numa mesma cama como os marinheiros dos submarinos para estarem permanentemente em directo a fazer colheres, já têm argumento de conversa para uma semana, mesmo que o tema da conversa não tenha a ponta de um corno por onde se lhe pegue. Deve ser a famosa pedagogia para o cidadão anónimo, consumidor de telenovelas e de casas com segredos.

[Imagem de Fabio Valerio]

O gajo ainda aí está, preparado para tudo

 por Júlio  

O emplastro de Belém insinuou hoje que, até Março, ainda tem o poder de demitir o governo – para o que só poderia alegar que as instituições democráticas não estariam a funcionar regularmente. Não teve tomates para o dizer claramente, mas isso não escapou a Constança Cunha e Sá. Outros comentadores, mais ingénuos, viram naquela insinuação apenas a ameaça do uso do veto presidencial.

Preparemo-nos para o pior, porque o odre está a transbordar de ódio e é bem capaz de jogar a cartada da demissão do governo, mesmo sabendo que ela seria altamente controversa e desafiadora da Constituição – que em 1982 retirou ao PR toda e qualquer tutela política do governo. Cavaco sabe que (infelizmente) em Portugal nenhum órgão de soberania, incluindo a AR e o Tribunal Constitucional, tem o poder de verificar a inconstitucionalidade dos seus actos – os quais não seriam “sindicáveis”, como Portas pretendeu há dias! – e pode querer arriscar tal cartada, agora que está de despedida. Ele até já declarou que estudou todos os “cenários possíveis”…

Escudado na sua eleição por sufrágio universal (mencionou isso hoje) e na opinião dos compinchas que há anos o incitam a agir “perante a nação”, Cavaco conserva na manga essa possibilidade de hostilizar frontalmente o governo legítimo e a maioria do parlamento, mesmo correndo com isso o risco de lançar o país numa grave crise de legitimidade política.

http://aspirinab.com/julio/o-gajo-ainda-ai-esta-preparado-para-tudo/

Na íntegra: o discurso de Cavaco Silva na tomada de posse de Costa



O Governo que hoje toma posse foi formado na sequência da crise política aberta pela rejeição do Programa do XX Governo Constitucional. Nos termos da Constituição, tal implicou automaticamente a sua demissão, ficando o Executivo limitado à prática dos atos estritamente necessários para assegurar a gestão dos negócios públicos.
Ao Primeiro-Ministro cessante, que chefiou o Governo de Portugal durante mais de quatro anos, bem como aos membros dos seus governos, expresso público reconhecimento pelos serviços prestados ao País em circunstâncias muito difíceis, e desejo os maiores sucessos pessoais e profissionais.
Em resultado da demissão do Governo, e tendo presente que se vive um tempo em que o Presidente da República não dispõe da faculdade de dissolver o Parlamento e convocar novas eleições, decidi auscultar a opinião dos parceiros sociais e de instituições e personalidades da nossa vida pública conhecedoras da realidade económica, social e financeira do País.
Nessas audiências, obtive informações relevantes sobre as opções de política económica que devem ser seguidas em ordem a preservar a trajetória de crescimento e de criação de emprego, a estabilidade do sistema financeiro e o financiamento do Estado e da economia, assim como sobre a importância do cumprimento das regras de disciplina orçamental e de sustentabilidade da dívida pública.
Entretanto, quatro forças políticas assinaram três documentos de diferente alcance, designados “posições conjuntas”, com vista à apresentação de uma solução governativa alternativa.
Os referidos documentos são omissos quanto a alguns pontos essenciais à estabilidade política e à durabilidade do Governo, suscitando questões que, apesar dos esforços desenvolvidos, não foram totalmente dissipadas.
Trata-se de uma solução inédita na história da nossa democracia, suportada por uma maioria parlamentar que se comprometeu a não inviabilizar a entrada em funções de um novo Executivo, o que confere às forças políticas envolvidas a responsabilidade pelo Governo que hoje é empossado.
Senhoras e Senhores,
A entrada em funções do XXI Governo Constitucional inicia um novo ciclo político.
No entanto, os objetivos estratégicos do País permanecem. Como afirmei no passado dia 30 de outubro, «o superior interesse nacional é muito claro: devemos consolidar a trajetória de crescimento económico e preservar a credibilidade externa. Não podemos regredir num caminho que foi árduo, em que foram pedidos muitos sacrifícios aos Portugueses.»
Nesse sentido, e como referi então, e cito «exige-se ao Governo que agora toma posse que respeite as regras europeias de disciplina orçamental aplicáveis aos países da Zona Euro e subscritos pelo Estado português, nomeadamente o Pacto de Estabilidade e Crescimento e o Tratado Orçamental, de modo a que Portugal saia rapidamente do Procedimento por Défice Excessivo, reduza o rácio da dívida pública e alcance o objetivo de médio prazo fixado para o défice estrutural.»
Trata-se de compromissos de Estado que a Assembleia da República sufragou por esmagadora maioria.
No momento histórico que atravessamos, é uma ilusão pensar que um país como Portugal pode prescindir da confiança dos mercados financeiros e dos investidores externos e, bem assim, do apoio de instituições internacionais.
Importa, a este propósito, ter presente algumas verdades elementares de política económica que, por serem lembradas por entidades independentes e credíveis, um Governo não pode deixar de ter em conta.
Já este mês, a OCDE, referindo-se às perspetivas económicas para Portugal, afirmou: «o não cumprimento dos objetivos orçamentais afeta negativamente a confiança e aumenta os juros dos empréstimos».
Por outro lado, no seu último relatório, o Conselho de Finanças Públicas advertiu, e cito: «o País precisa de um modelo de crescimento estável da economia e do emprego, assente no aumento da produtividade e na competitividade da economia e não no seu endividamento e no aumento das despesas públicas».
Referindo-se a uma política que pusesse em causa as medidas necessárias para sair do Procedimento por Défices Excessivos a que Portugal ainda se encontra sujeito, o Conselho de Finanças Públicas acrescenta que o impacto de uma política em que o crescimento seria impulsionado pelo consumo privado e pela quebra da poupança seria insustentável, em resultado do aumento das importações e da deterioração do saldo das contas externas.
O Conselho de Finanças Públicas deixa ainda, no seu recente Relatório, um aviso muito sério: «uma política virada para o curto prazo e assente num grau minimalista de consolidação orçamental não só não cumpriria as atuais regras europeias como teria implicações negativas sobre o endividamento do País e a produtividade».
Na mesma linha, o Banco de Portugal, no seu Boletim Económico de outubro de 2015, afirma, de forma inequívoca: «O cumprimento dos compromissos das autoridades nacionais no âmbito das regras orçamentais europeias é essencial para assegurar a redução do nível da dívida pública em percentagem do PIB, que constitui uma vulnerabilidade latente da economia portuguesa».
Há que prestar uma atenção particular à defesa da estabilidade do sistema financeiro, dado o seu papel fulcral no financiamento da economia portuguesa. Há que estimular e respeitar os nossos empresários e trabalhadores, verdadeiros heróis do aumento da atividade exportadora. Há que combater o desemprego através do crescimento da economia.
É neste quadro de grande responsabilidade que o novo Executivo inicia funções.
Perante os desafios que tem pela frente, podem contar, este Governo e o seu Primeiro-Ministro, com a lealdade institucional do Presidente da República para a salvaguarda dos superiores interesses nacionais.
Não abdicando de nenhum dos poderes que a Constituição atribui ao Presidente da República – e recordo que desses poderes só o de dissolução parlamentar se encontra cerceado – e com a legitimidade própria que advém de ter sido eleito por sufrágio universal e direto dos Portugueses, tudo farei para que o País não se afaste da atual trajetória de crescimento económico e criação de emprego e preserve a credibilidade externa.
Sendo o Governo minoritário, e não resultando inteiramente claro dos documentos assinados entre os partidos a garantia de durabilidade no horizonte temporal da legislatura, a tomada de posse e entrada em funções do novo Executivo constitui uma prova para a capacidade de diálogo não só com as demais forças políticas mas também com os parceiros sociais e as instituições da sociedade civil.
É fundamental que a concertação social seja valorizada enquanto elemento decisivo para o desenvolvimento do País e para a coesão da sociedade portuguesa. Esvaziar o papel dos parceiros sociais teria um custo muito elevado para o nosso futuro.
Desejo a Vossa Excelência, Senhor Primeiro-Ministro, e aos membros do XXI Governo Constitucional, os maiores sucessos nas exigentes funções que agora iniciam.
Muito obrigado.

http://expresso.sapo.pt/politica/2015-11-26-Na-integra-o-discurso-de-Cavaco-Silva-na-tomada-de-posse-de-Costa

Na íntegra: o discurso de António Costa na tomada de posse

POLÍTICA26. 11.2015 às 18h01   Senhor Presidente da República
Senhor Presidente da Assembleia da República
Senhor Presidente do Tribunal Constitucional
Senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça
Senhor Primeiro-Ministro cessante,
Demais Autoridades civis, militares e diplomáticas,
Minhas Senhoras e meus Senhores
É com muita honra, mas é sobretudo com profundo sentido de serviço ao País e à República, que hoje assumo, diante de todos os portugueses, meus concidadãos, a exigente tarefa de liderar o Governo de Portugal.
Num tempo que todos sabemos ser de muitas incertezas e enormes desafios - para o nosso País, mas também para a Europa e para o Mundo - não ignoro, e portanto não minimizo, as muitas dificuldades que temos pela frente, nem as restrições que limitam o nosso leque de opções e condicionarão a nossa ação.
Mas quero que o País saiba que o Governo que hoje aqui toma posse não é um Governo temeroso do futuro, angustiado com o peso das suas competências ou preso de movimentos ante a dimensão das suas tarefas. Que não fique a mínima dúvida: este é um governo confiante. Confiante, antes de mais, no seu projeto mobilizador do País e na solidariedade da maioria parlamentar que lhe manifestou apoio e lhe confere inteira legitimidade.
O resultado das eleições legislativas do passado dia 4 de outubro confronta todos os agentes políticos com uma dupla responsabilidade.
Por um lado, a todos exige um esforço adicional de diálogo e compromisso, de modo a que seja possível assegurar um governo coerente, estável e duradouro.
Por outro lado, o respeito do sentido claro da votação popular exige que o Governo assuma como sua linha de orientação a mudança das políticas, dando prioridade ao crescimento económico, à criação de emprego, à redução das desigualdades, assim permitindo em bases mais sãs e sustentáveis a consolidação orçamental e o equilíbrio das contas públicas.
O Governo que hoje aqui se apresenta está precisamente à altura dessa dupla responsabilidade: por um lado, é fruto de um compromisso político maioritário alcançado no novo quadro parlamentar, correspondendo assim à vontade genuinamente democrática que se expressa no Parlamento diretamente eleito pelos cidadãos; por outro lado, perfilha um programa claramente apostado no virar de página da austeridade, e orientado para mobilizar Portugal e os Portugueses num triplo propósito: mais crescimento, melhor emprego e maior igualdade.
Vale a pena lembrar que o Parlamento livremente eleito pelo povo é tão plural quanto quem o escolheu. Da mesma maneira que numa eleição todos os votos contam, também contam todos os mandatos parlamentares, quer para efeito de representação, quer para efeito de governação. A democracia portuguesa ficou demasiado tempo refém de exclusões de facto, que limitavam o leque de soluções políticas possíveis e defraudavam o sentido do voto de boa parte dos nossos concidadãos.
A solução politica que viabiliza este Governo valoriza o pluralismo parlamentar, diversifica as alternativas ao dispor dos portugueses e por isso enriquece a nossa democracia.
O Governo provém da Assembleia da República - e é perante a Assembleia que responde politicamente. É preciso, por isso, que a formação e a orientação programática do Governo respeitem a sua composição e realizem os compromissos que essa composição ao mesmo tempo exige e permite.
Com a entrada em funções deste Governo, termina um momento político, certamente complexo e delicado, mas inteiramente normal numa democracia parlamentar. Através de um processo de diálogo político transparente e democrático, formou-se uma maioria estável que assegura, na perspetiva da legislatura, o suporte parlamentar duradouro a um Governo coerente.
Hoje empossado por Vossa Excelência, senhor Presidente, o XXI Governo Constitucional torna-se o Governo de Portugal.
É agora tempo de assumirmos todos, por inteiro, as nossas responsabilidades, o que quer dizer, no que respeita ao Governo, a máxima lealdade e cooperação institucional com o Presidente da República, no respeito escrupuloso pelas competências próprias do Presidente da República, do Parlamento e do poder judicial, no apreço pelas autonomias regionais e o poder local, na cultura do diálogo e da concertação social, na modernização e dignificação da administração pública, na transparência e prestação de contas face ao conjunto dos cidadãos.
Este é um Governo de garantia.
Da garantia fundamental e primeira de um Estado de Direito Democrático, o respeito pela nossa lei fundamental, a Constituição da República Portuguesa.
Da garantia da continuidade do Estado nos seus compromissos internacionais e no quadro da União Europeia.
Da garantia da estabilidade do quadro das opções estratégicas que a geografia, a história e a vontade soberana do povo português definiram como o novo lugar que o 25 de Abril abriu ao Portugal democrático.
O lugar de Portugal na União Europeia e na zona euro. O lugar de Portugal na Comunidade de Países de Língua Portuguesa. O lugar de Portugal na grande ligação atlântica, incluindo na Organização do Tratado do Atlântico Norte. O lugar de Portugal na comunidade internacional, no sistema das Nações Unidas e demais organizações multilaterais. Portugal afirma-se em todos estes domínios através das comunidades portuguesas espalhadas pelo Mundo, da qualidade da sua diplomacia, bem como na cooperação para o desenvolvimento e na segurança cooperativa, designadamente através das Forças Armadas.

Todos sabemos que o País atravessou momentos muito duros ao longo destes últimos anos. Ninguém tenha dúvidas, o trajeto que seguimos deixará marcas, e marcas profundas, ainda por muito tempo. Alguns dirão que tinha de ser, outros dizem que havia alternativas. Por mim, confio à História esse debate, porque julgo ser meu dever e dever do Governo que lidero, centrar-se no que lhe é exigido hoje para construirmos o futuro.
Mas o que em qualquer caso não podemos ignorar é que, infelizmente, e depois de tantos sacrifícios, a nossa sociedade está hoje mais pobre e desigual a nossa economia mais enfraquecida no seu potencial de crescimento e o País mais endividado.
O aumento e proteção do rendimento disponível das famílias, o alívio da asfixia fiscal da classe média, o desendividamento e condições de investimento das empresas, o combate à pobreza, a garantia de serviços e bens públicos essenciais são necessidades do tempo da urgência social e económica, condição de relançamento da economia e da criação de emprego.
Mas a satisfação das necessidades do País não se basta neste tempo da urgência, antes exigindo a continuidade que permite enfrentar os bloqueios estruturais à competitividade, que tanto têm dificultado a adaptação da economia nacional ao novo quadro resultante da globalização, do alargamento da UE e da participação no euro.
Como comprovámos dolorosamente, não recuperamos competitividade por via do empobrecimento coletivo, da precarização do trabalho ou do sacrifício da qualidade e proximidade de serviços públicos. A austeridade não gera crescimento, nem a desvalorização interna prosperidade.
As reformas que temos de fazer são outras e exigem persistência e continuidade no investimento no conhecimento e na inovação, na modernização do tecido empresarial e da administração pública, na valorização do território e dos seus recursos, na promoção da saúde, no reforço da coesão e na redução das desigualdades.
Só assim será duradouramente sustentável um novo impulso para a convergência com a União Europeia e o objetivo essencial de qualquer boa governação de assegurar finanças públicas equilibradas, que este Governo prosseguirá através da exigente trajetória de redução do défice orçamental e da dívida pública no ciclo desta Legislatura.
Esta é matéria para a discussão do Programa do Governo que faremos no órgão de soberania que detém a competência exclusiva para a sua apreciação - a Assembleia da República.
Mas a estrutura do Governo hoje empossado é também expressão desta visão estratégica.
Daí a centralidade atribuída à Cultura, à Ciência e à Educação como pilares da sociedade do Conhecimento. Ou à política do Mar, esse enorme manancial de recursos que o País tarda em valorizar devidamente. Ou a dimensão transversal da Modernização Administrativa, fator-chave de desenvolvimento.

Este Governo nasceu da recusa da ideia de que não haveria alternativa à política que vem sendo prosseguida e a sua posse por V. Exa. é a prova que a democracia gera sempre alternativas.
Não viemos, portanto, nem com uma atitude de resignação ante as pretensas fatalidades do destino - seja o destino nacional, seja o destino do projeto europeu -, nem para trazer aos portugueses, e sobretudo aos jovens portugueses, palavras inaceitáveis de demissão e desistência, como se não restasse aos nossos jovens qualquer alternativa senão ir procurar lá fora os sonhos que, sabe-se lá porquê, aqui seria impossível cumprir.
O espírito que anima este Governo é outro - e bem diferente. O que desejamos é construir aqui, passo a passo, projeto a projeto, medida a medida, um tempo novo para Portugal e para os portugueses.
Um tempo novo - é essa, verdadeiramente, a nossa ambição.
Um tempo novo para a vida das famílias, dos trabalhadores e das empresas; um tempo novo para a economia e para o emprego; um tempo novo para o Estado e para os serviços públicos; um tempo novo para o combate à pobreza e às desigualdades; um tempo novo para a aposta nas chaves do futuro - a Ciência, a Educação e a Cultura; um tempo novo, enfim, de oportunidades e de esperança, que assinale, de uma vez por todas, o reencontro das prioridades da governação com os projetos de vida dos portugueses que têm direito a ser felizes aqui.
Houve ao longo deste tempo - fruto de diversas contingências, mas também por força de um certo discurso político sobre os nossos problemas e a natureza da crise que atravessámos - uma grave degradação dos valores e dos laços que unem a comunidade nacional e que são imprescindíveis para fazer de nós uma sociedade coesa e solidária.
São falsas, demagógicas e perigosas as dicotomias simplistas que pretendem pôr em confronto os interesses e os direitos de jovens e velhos; de activos e pensionistas; de empregados e desempregados; de trabalhadores do sector público e trabalhadores do sector privado. Tal como são inaceitáveis, erradas e, além do mais, inconstitucionais, as pretensões que pretendem pôr em causa os alicerces em que assenta o nosso contrato social, tornado possível pelo regime democrático, e que garante a solidariedade entre as gerações, em particular no sistema público de segurança social, ao mesmo tempo que proporciona o acesso de todos aos serviços públicos, sem os quais não poderá haver uma sociedade mais justa.
Para acudir aos verdadeiros problemas, todas as Portuguesas e todos os Portugueses são necessários. Ninguém é dispensável. Pelo diálogo, pela concertação e pelo compromisso, temos de chegar, a partir dos interesses legítimos das partes, a uma plataforma comum de vontade e mobilização.
Este é, portanto, o tempo da reunião. Não é de crispação que Portugal carece, mas sim de serenidade. Não é altura de salgar as feridas, mas sim de sará-las. O bom conselheiro desta hora não é o despeito ou o desforço, mas a determinação em mobilizar as vontades para vencermos os desafios que temos pela frente.
Não progrediremos com radicalizações. A conduta do XXI Governo pautar-se-á, pois, pela moderação. Moderado será o seu programa, realizando uma alternativa à vertigem austeritária, que só agravou os problemas económicos, sociais e mesmo orçamentais; mas será uma alternativa realista, cuidadosa e prudente. E moderada será a sua atitude.
Senhor Presidente
Minhas Senhoras e meus Senhores
Permitam-me, ainda, duas palavras antes de concluir.
A primeira, para dirigir uma cordial saudação democrática ao Primeiro-Ministro cessante, Dr. Pedro Passos Coelho, e a toda a sua equipa. As nossas divergências políticas, naturais e até salutares em democracia, que são bem conhecidas, não me impedem de prestar aqui público reconhecimento à dedicação e esforço empenhados pelo Primeiro-Ministro cessante na sua ação governativa, num período tão crítico e de grandes dificuldades, em prol da sua convicção do interesse nacional.
Uma palavra, também, de sentido agradecimento a todos aqueles, mulheres e homens, que, de forma tão generosa, aceitaram o meu convite para integrarem este XXI Governo Constitucional.
Foi para um projeto entusiasmante que vos convidei. E é com a vossa dedicação e o vosso entusiasmo que conto, para que o XXI Governo ajude Portugal a triunfar nos desafios do século XXI.
É para servir Portugal que aqui estamos. Essa, aliás, é mesmo a nossa única razão de ser: Portugal.

http://expresso.sapo.pt/politica/2015-11-26-Na-integra-o-discurso-de-Antonio-Costa-na-tomada-de-posse

Portugal. A DIREITA NO SEU ESPLENDOR QUANDO O FUTURO É DA ESQUERDA

quinta-feira, 26 de novembro de 2015




Libertos da canga, apesar das responsabilidades acrescidas, podemos sorrir


Olhar em frente e alimentar alguma esperança. Entramos em terra incógnita, é tudo novo. Como em 1974. Deixamos para trás a direita em todo o seu esplendor. As últimas semanas testemunharam um crescendo da direita como ingenuamente se chegou a julgar impossível. Utilizando um estilo arruaceiro de que são belos exemplos os debates na televisão com muita gesticulação, numa torrente palavrosa, quase histriónica, a impedir que outros falassem, numa enumeração de factos e temores insustentáveis, as vozes em falsete, o tom ameaçador, a insinuação de que estávamos perante um golpe de estado, mesmo as ameaças. Tudo isto em directo, à fartazana, em todos os canais televisivos sejam abertos ou não. Até à exaustão para quem os ouvia, para quem os tentava moderar, para quem os tinha de suportar à mesa do debate. Pouco satisfeitos com este andamento, a cereja no topo do bolo: a peregrina sugestão de rever a Constituição porque se perdeu a maioria parlamentar! Coisa de criança, inexplicável. Ao lançar esta proposta, o primeiro-ministro tentava aliciar o PS? Foi uma proposta desenvergonhada, despropositada a revelar bem como Passos Coelho estava de cabeça perdida. A história caminhava para o seu fim mas haveríamos ainda de registar três episódios. A visita de Cavaco Silva à Madeira com momentos anedóticos, escusados, foi o primeiro desse Grande Final. Depois seguiram-se as consultas em Belém, dizem, a personalidades. Assistir pela televisão à entrada e saída de tantos notáveis (!) ficará para sempre na pequena grande história. Uma encenação de poder. Para a representação de cada organização, um pequeno grupo, o mais importante uns passos à frente dos outros (suspeito que ensaiaram), ar dorido e circunstancial, passo largo mas decidido. À saída, a grande oportunidade das declarações urbi et orbi cada uma a vaticinar um futuro mais negro que o do prognóstico anterior. Gente exímia, certamente, neste lançar de terror mas cabe perguntar quem são aquelas personalidades? Porquê aquelas todas conotadas com a direita e nem uma afecta à esquerda (exceptuando os representantes sindicais)? Mais o banqueiro surpresa a colorir o conjunto. Sobretudo o desfile de economistas, escolhidos a dedo. Sim, claro, resultado de um escrutínio democrático feito por Belém. Assim, como num concurso cujo resultado já era antes de o ser. Episódio ridículo e tristérrimo. Para encerrar a história, a chamada repetida de António Costa a Belém. Se a intenção era a de “posso, quero e mando”, resultou mal. Nenhum dos partidos envolvidos com o novo governo se atemorizou e, apesar de contrariada, a indigitação acabou por sair.

Eis o novo governo. Será o 21º desde 1974, não será o que verdadeiramente se chamaria de governo de esquerda mas, renovando as expectativas, constitui um bom ponto de partida. Ao olhar para a situação, teremos de sabiamente aproveitar as condições criadas e começar a construir. Que seja pedra sobre pedra. Trabalho não vai faltar para um apoio fundamentado, para as reversões legislativas que se impõem, para a preparação de dossiers que permitam ir recuperando terreno. Ninguém imagina que se vai fazer este caminho sem dor ou algum tropeção mas a alegria (e convicção) de poder reaver, ainda que aos poucos, aquilo que foi retirado aos trabalhadores, aos pensionistas, aos desempregados, aos jovens, a inabalável confiança num futuro menos sombrio construído por nós próprios, traz o alento necessário e suficiente para avançar. Para abandonar o desânimo e somar forças a cada escolho ultrapassado. Recuperar a dignidade, recusar a austeridade que se faz tarde.

*Esquerda.net - Luísa Cabral  Bibliotecária reformada da função pública. Candidata do Bloco de Esquerda nas eleições legislativas de 2015, pelo círculo eleitoral de Lisboa.