A Internacional

__ dementesim . . Do rio que tudo arrasta se diz que é violento Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem. . _____ . Quem luta pelo comunismo Deve saber lutar e não lutar, Dizer a verdade e não dizer a verdade, Prestar serviços e recusar serviços, Ter fé e não ter fé, Expor-se ao perigo e evitá-lo, Ser reconhecido e não ser reconhecido. Quem luta pelo comunismo . . Só tem uma verdade: A de lutar pelo comunismo. . . Bertold Brecht

quinta-feira, novembro 26, 2015

Na íntegra: o discurso de António Costa na tomada de posse

POLÍTICA26. 11.2015 às 18h01   Senhor Presidente da República
Senhor Presidente da Assembleia da República
Senhor Presidente do Tribunal Constitucional
Senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça
Senhor Primeiro-Ministro cessante,
Demais Autoridades civis, militares e diplomáticas,
Minhas Senhoras e meus Senhores
É com muita honra, mas é sobretudo com profundo sentido de serviço ao País e à República, que hoje assumo, diante de todos os portugueses, meus concidadãos, a exigente tarefa de liderar o Governo de Portugal.
Num tempo que todos sabemos ser de muitas incertezas e enormes desafios - para o nosso País, mas também para a Europa e para o Mundo - não ignoro, e portanto não minimizo, as muitas dificuldades que temos pela frente, nem as restrições que limitam o nosso leque de opções e condicionarão a nossa ação.
Mas quero que o País saiba que o Governo que hoje aqui toma posse não é um Governo temeroso do futuro, angustiado com o peso das suas competências ou preso de movimentos ante a dimensão das suas tarefas. Que não fique a mínima dúvida: este é um governo confiante. Confiante, antes de mais, no seu projeto mobilizador do País e na solidariedade da maioria parlamentar que lhe manifestou apoio e lhe confere inteira legitimidade.
O resultado das eleições legislativas do passado dia 4 de outubro confronta todos os agentes políticos com uma dupla responsabilidade.
Por um lado, a todos exige um esforço adicional de diálogo e compromisso, de modo a que seja possível assegurar um governo coerente, estável e duradouro.
Por outro lado, o respeito do sentido claro da votação popular exige que o Governo assuma como sua linha de orientação a mudança das políticas, dando prioridade ao crescimento económico, à criação de emprego, à redução das desigualdades, assim permitindo em bases mais sãs e sustentáveis a consolidação orçamental e o equilíbrio das contas públicas.
O Governo que hoje aqui se apresenta está precisamente à altura dessa dupla responsabilidade: por um lado, é fruto de um compromisso político maioritário alcançado no novo quadro parlamentar, correspondendo assim à vontade genuinamente democrática que se expressa no Parlamento diretamente eleito pelos cidadãos; por outro lado, perfilha um programa claramente apostado no virar de página da austeridade, e orientado para mobilizar Portugal e os Portugueses num triplo propósito: mais crescimento, melhor emprego e maior igualdade.
Vale a pena lembrar que o Parlamento livremente eleito pelo povo é tão plural quanto quem o escolheu. Da mesma maneira que numa eleição todos os votos contam, também contam todos os mandatos parlamentares, quer para efeito de representação, quer para efeito de governação. A democracia portuguesa ficou demasiado tempo refém de exclusões de facto, que limitavam o leque de soluções políticas possíveis e defraudavam o sentido do voto de boa parte dos nossos concidadãos.
A solução politica que viabiliza este Governo valoriza o pluralismo parlamentar, diversifica as alternativas ao dispor dos portugueses e por isso enriquece a nossa democracia.
O Governo provém da Assembleia da República - e é perante a Assembleia que responde politicamente. É preciso, por isso, que a formação e a orientação programática do Governo respeitem a sua composição e realizem os compromissos que essa composição ao mesmo tempo exige e permite.
Com a entrada em funções deste Governo, termina um momento político, certamente complexo e delicado, mas inteiramente normal numa democracia parlamentar. Através de um processo de diálogo político transparente e democrático, formou-se uma maioria estável que assegura, na perspetiva da legislatura, o suporte parlamentar duradouro a um Governo coerente.
Hoje empossado por Vossa Excelência, senhor Presidente, o XXI Governo Constitucional torna-se o Governo de Portugal.
É agora tempo de assumirmos todos, por inteiro, as nossas responsabilidades, o que quer dizer, no que respeita ao Governo, a máxima lealdade e cooperação institucional com o Presidente da República, no respeito escrupuloso pelas competências próprias do Presidente da República, do Parlamento e do poder judicial, no apreço pelas autonomias regionais e o poder local, na cultura do diálogo e da concertação social, na modernização e dignificação da administração pública, na transparência e prestação de contas face ao conjunto dos cidadãos.
Este é um Governo de garantia.
Da garantia fundamental e primeira de um Estado de Direito Democrático, o respeito pela nossa lei fundamental, a Constituição da República Portuguesa.
Da garantia da continuidade do Estado nos seus compromissos internacionais e no quadro da União Europeia.
Da garantia da estabilidade do quadro das opções estratégicas que a geografia, a história e a vontade soberana do povo português definiram como o novo lugar que o 25 de Abril abriu ao Portugal democrático.
O lugar de Portugal na União Europeia e na zona euro. O lugar de Portugal na Comunidade de Países de Língua Portuguesa. O lugar de Portugal na grande ligação atlântica, incluindo na Organização do Tratado do Atlântico Norte. O lugar de Portugal na comunidade internacional, no sistema das Nações Unidas e demais organizações multilaterais. Portugal afirma-se em todos estes domínios através das comunidades portuguesas espalhadas pelo Mundo, da qualidade da sua diplomacia, bem como na cooperação para o desenvolvimento e na segurança cooperativa, designadamente através das Forças Armadas.

Todos sabemos que o País atravessou momentos muito duros ao longo destes últimos anos. Ninguém tenha dúvidas, o trajeto que seguimos deixará marcas, e marcas profundas, ainda por muito tempo. Alguns dirão que tinha de ser, outros dizem que havia alternativas. Por mim, confio à História esse debate, porque julgo ser meu dever e dever do Governo que lidero, centrar-se no que lhe é exigido hoje para construirmos o futuro.
Mas o que em qualquer caso não podemos ignorar é que, infelizmente, e depois de tantos sacrifícios, a nossa sociedade está hoje mais pobre e desigual a nossa economia mais enfraquecida no seu potencial de crescimento e o País mais endividado.
O aumento e proteção do rendimento disponível das famílias, o alívio da asfixia fiscal da classe média, o desendividamento e condições de investimento das empresas, o combate à pobreza, a garantia de serviços e bens públicos essenciais são necessidades do tempo da urgência social e económica, condição de relançamento da economia e da criação de emprego.
Mas a satisfação das necessidades do País não se basta neste tempo da urgência, antes exigindo a continuidade que permite enfrentar os bloqueios estruturais à competitividade, que tanto têm dificultado a adaptação da economia nacional ao novo quadro resultante da globalização, do alargamento da UE e da participação no euro.
Como comprovámos dolorosamente, não recuperamos competitividade por via do empobrecimento coletivo, da precarização do trabalho ou do sacrifício da qualidade e proximidade de serviços públicos. A austeridade não gera crescimento, nem a desvalorização interna prosperidade.
As reformas que temos de fazer são outras e exigem persistência e continuidade no investimento no conhecimento e na inovação, na modernização do tecido empresarial e da administração pública, na valorização do território e dos seus recursos, na promoção da saúde, no reforço da coesão e na redução das desigualdades.
Só assim será duradouramente sustentável um novo impulso para a convergência com a União Europeia e o objetivo essencial de qualquer boa governação de assegurar finanças públicas equilibradas, que este Governo prosseguirá através da exigente trajetória de redução do défice orçamental e da dívida pública no ciclo desta Legislatura.
Esta é matéria para a discussão do Programa do Governo que faremos no órgão de soberania que detém a competência exclusiva para a sua apreciação - a Assembleia da República.
Mas a estrutura do Governo hoje empossado é também expressão desta visão estratégica.
Daí a centralidade atribuída à Cultura, à Ciência e à Educação como pilares da sociedade do Conhecimento. Ou à política do Mar, esse enorme manancial de recursos que o País tarda em valorizar devidamente. Ou a dimensão transversal da Modernização Administrativa, fator-chave de desenvolvimento.

Este Governo nasceu da recusa da ideia de que não haveria alternativa à política que vem sendo prosseguida e a sua posse por V. Exa. é a prova que a democracia gera sempre alternativas.
Não viemos, portanto, nem com uma atitude de resignação ante as pretensas fatalidades do destino - seja o destino nacional, seja o destino do projeto europeu -, nem para trazer aos portugueses, e sobretudo aos jovens portugueses, palavras inaceitáveis de demissão e desistência, como se não restasse aos nossos jovens qualquer alternativa senão ir procurar lá fora os sonhos que, sabe-se lá porquê, aqui seria impossível cumprir.
O espírito que anima este Governo é outro - e bem diferente. O que desejamos é construir aqui, passo a passo, projeto a projeto, medida a medida, um tempo novo para Portugal e para os portugueses.
Um tempo novo - é essa, verdadeiramente, a nossa ambição.
Um tempo novo para a vida das famílias, dos trabalhadores e das empresas; um tempo novo para a economia e para o emprego; um tempo novo para o Estado e para os serviços públicos; um tempo novo para o combate à pobreza e às desigualdades; um tempo novo para a aposta nas chaves do futuro - a Ciência, a Educação e a Cultura; um tempo novo, enfim, de oportunidades e de esperança, que assinale, de uma vez por todas, o reencontro das prioridades da governação com os projetos de vida dos portugueses que têm direito a ser felizes aqui.
Houve ao longo deste tempo - fruto de diversas contingências, mas também por força de um certo discurso político sobre os nossos problemas e a natureza da crise que atravessámos - uma grave degradação dos valores e dos laços que unem a comunidade nacional e que são imprescindíveis para fazer de nós uma sociedade coesa e solidária.
São falsas, demagógicas e perigosas as dicotomias simplistas que pretendem pôr em confronto os interesses e os direitos de jovens e velhos; de activos e pensionistas; de empregados e desempregados; de trabalhadores do sector público e trabalhadores do sector privado. Tal como são inaceitáveis, erradas e, além do mais, inconstitucionais, as pretensões que pretendem pôr em causa os alicerces em que assenta o nosso contrato social, tornado possível pelo regime democrático, e que garante a solidariedade entre as gerações, em particular no sistema público de segurança social, ao mesmo tempo que proporciona o acesso de todos aos serviços públicos, sem os quais não poderá haver uma sociedade mais justa.
Para acudir aos verdadeiros problemas, todas as Portuguesas e todos os Portugueses são necessários. Ninguém é dispensável. Pelo diálogo, pela concertação e pelo compromisso, temos de chegar, a partir dos interesses legítimos das partes, a uma plataforma comum de vontade e mobilização.
Este é, portanto, o tempo da reunião. Não é de crispação que Portugal carece, mas sim de serenidade. Não é altura de salgar as feridas, mas sim de sará-las. O bom conselheiro desta hora não é o despeito ou o desforço, mas a determinação em mobilizar as vontades para vencermos os desafios que temos pela frente.
Não progrediremos com radicalizações. A conduta do XXI Governo pautar-se-á, pois, pela moderação. Moderado será o seu programa, realizando uma alternativa à vertigem austeritária, que só agravou os problemas económicos, sociais e mesmo orçamentais; mas será uma alternativa realista, cuidadosa e prudente. E moderada será a sua atitude.
Senhor Presidente
Minhas Senhoras e meus Senhores
Permitam-me, ainda, duas palavras antes de concluir.
A primeira, para dirigir uma cordial saudação democrática ao Primeiro-Ministro cessante, Dr. Pedro Passos Coelho, e a toda a sua equipa. As nossas divergências políticas, naturais e até salutares em democracia, que são bem conhecidas, não me impedem de prestar aqui público reconhecimento à dedicação e esforço empenhados pelo Primeiro-Ministro cessante na sua ação governativa, num período tão crítico e de grandes dificuldades, em prol da sua convicção do interesse nacional.
Uma palavra, também, de sentido agradecimento a todos aqueles, mulheres e homens, que, de forma tão generosa, aceitaram o meu convite para integrarem este XXI Governo Constitucional.
Foi para um projeto entusiasmante que vos convidei. E é com a vossa dedicação e o vosso entusiasmo que conto, para que o XXI Governo ajude Portugal a triunfar nos desafios do século XXI.
É para servir Portugal que aqui estamos. Essa, aliás, é mesmo a nossa única razão de ser: Portugal.

http://expresso.sapo.pt/politica/2015-11-26-Na-integra-o-discurso-de-Antonio-Costa-na-tomada-de-posse

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