por Sérgio Barroso*
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As primeiras revoltas de famintos e famélicos no Haiti, África Ocidental ou Bangladesh implicaram até numa (cínica) advertência registrada pelo Banco Mundial e o FMI. Seis pessoas morreram em Port au Prince (Haiti), em recentes e desesperadores levantes. Como disse Mike Whitney “as pessoas enlouquecem quando não podem alimentar seus filhos” (Tumultos alimentares e especuladores, Counterpunch, 26-27/4 2008).
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Na Indonésia, Vietnam e Índia adotaram-se controles sobre as exportações de arroz. Os preços do trigo, do milho e da soja estão a bater recordes. A própria ONU - adepta de carteirinha da “globalização financeira” - denominou a atual crise alimentar global de ''tsunami silencioso''. Via de regra, praticamente todas as commodities vêm subindo. Pari passu à profunda crise financeira, deflagrada pela oligarquia gringa ianque.
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De fato, entre 2004-2007, os preços dos alimentos subiram em média de 83%. Assustado, o economista-sênior do Financial Times, liberal Martin Wolf afirma que a causa principal para o surgimento de um novo surto inflacionário encontrar-se-ia na alta mundial e espetacular dos preços das commodities. Segundo escreveu, entre 2002 e 2008 (fevereiro), o índice amplo do Goldman Sachs foi de 288%, o do preços da energia 358%, o de metais industriais 263% e o de produtos agrícolas 220% (Valor Econômico, 5/3/2008).
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Ora, seguindo exatamente a orientação de política monetária do chefão do Federal Reserve (Fed, Banco Central dos EUA), Ben Bernanke, um verdadeiro vagalhão especulativo de commodities sacudiram os preços para a lua. Como assim? “O dólar fraco continuará afetando a economia européia porque dificultará as exportações européias'', declarou ontem o premiado com o Nobel de economia (2001), J. Stiglitz, a uma revista austríaca. Conforme imagina, além do euro, a ultravalorização do iene é parte de uma política proposital para ''empobrecer os vizinhos''. [O cara-pálida esqueceu o real!]
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Assim, enquanto o dólar está, por decisão do Estado norte-americano, muito mais barato, para, também, fortalecer suas exportações, a especulação grossa torna os alimentos e as matérias-primas muito mais caros. Não à toa a inflação corre solta na maior parte dos Estados do Golfo Pérsico, “informalmente” dolarizados.
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Escassez de petróleo? Uma gigantesca mentira! Os especuladores estão simplesmente jogando à estratosfera o preço do barril de petróleo. Assim agindo, nada mais fazem do que fugir da desvalorização de grande parte dos ativos financeiros, deslocando-se temporariamente do dólar e, óbvio, das ações do mercado imobiliário.
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Corretíssima a análise do destacado economista Elmar Altvater: formou-se uma ''aliança diabólica'' entre transnacionais petrolíferas, o setor automobilístico, a indústria farmacêutica e setores agrícolas propondo-se a transformar superfícies cultiváveis do Sul global numa plataforma para a produção de combustível destinado ao Norte global. “Ambas crises, a dos combustíveis fósseis e a dos alimentos, são as duas faces de uma mesma moeda” - assegura.
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Sim, digo eu: capitalismo que mata gente de fome em meio à exuberância, por sadismo congênito.
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O presidente Hugo Chávez, como qualquer pessoa, deve ter muitos defeitos. Contudo, talvez, na seara política, o maior deles seja dizer as coisas com as palavras que lhes correspondem – em luta contra o fracasso humano.
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O capitalismo, historicamente, é sistema obsoleto. Mas será necessária ampla consciência para transformá-lo.
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Artigo publicado originalmente em O Jornal (AL), 30/4/2008
*Sérgio Barroso, Médico, doutorando em Economia Social e do Trabalho (Unicamp), membro do Comitê Central do PCdoB.
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in vermelho - 1 DE MAIO DE 2008 - 18h08
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