Choque de titãs
Se  este tem sido um ano de terramotos pelo mundo fora, preparem-se para  mais um, mas agora na política portuguesa. O grau do abalo ainda não é  conhecido, mas a dar-se poderá ser um dos mais fortes de sempre desde  Abril de 74. Exagero meu? Olhem que não, como dizia o outro. A recente  revelação de que o PSD de Passos Coelho está disponível para uma  coligação com o CDS-PP de Portas pode alterar profundamente a lógica da  situação nacional.
. 
Vamos por partes.  Com Sócrates em perda permanente, obrigado à gestão de uma crise dura,  não é de espantar que Passos Coelho, que chegou agora, é esperto, está  virgem e tem boa imagem, esteja a subir nas sondagens. Animadas as  hostes laranjas e vencido o ciclo depressivo do pós--Barroso/Lopes, o  partido acredita que pode ganhar eleições. 
. 
Contudo,  uma maioria absoluta solitária é difícil, para não dizer impossível.  Mas em coligação com o CDS-PP essa maioria fica à mão de semear e é  quase uma certeza matemática. Se não existisse uma eleição presidencial  pelo caminho, eram favas contadas. Só que as presidenciais existem, e o  PSD não só conta com Cavaco reeleito como antecipa a sua jogada  seguinte: uma dissolução do parlamento, que estenderia a passadeira  vermelha a Passos e Portas a caminho do poder. O problema é Alegre, e  também, em menor grau, Cavaco. Ao preparar já uma coligação com o  CDS-PP, Passos Coelho atira para a mão de Alegre um importantíssimo  trunfo. 
. 
O bardo de Águeda agitará, sem hesitação,  o espectro da maioria de direita, que aí vem. A ideia de uma  conspiração contra o PS será repetida até à exaustão, acusando Cavaco de  estar feito com Passos e Portas para correr, logo que possa, com o PS. À  sombra de Alegre, toda a esquerda – PS, PCP, Bloco, Verdes e restantes  tresmalhados – terá uma oportunidade de união, e pelo caminho pode  derrotar Cavaco.
. 
Se ganhar, Alegre patrocinará, a  partir de Belém, uma frente de esquerda unida, e nem sequer dará à  direita uma dissolução. Se perder, embora perca o controle do timing,  procurará unificar essa mesma frente nas legislativas seguintes,  provocando um choque de titãs entre dois blocos, um à direita e outro à  esquerda, o que nunca aconteceu em Portugal. A coligação entre PSD e  CDS-PP faz todo o sentido, mas faz também nascer o imprevisível. 
. 
O fim do período socrático, claramente à vista, promete o  regresso em força da política. Ainda bem. Num país anémico, um disparo  de paixões políticas é sempre bem-vindo. 
.
.

 
 
Sem comentários:
Enviar um comentário