Terça-feira, 25 de Janeiro de 2011
por Daniel Oliveira
Quando perguntaram a Winston Churchill se os seus inimigos se sentavam na outra bancada, a resposta foi certeira: do outro lado sentam-se os meus adversários, os meus inimigos sentam-se deste lado. É sempre bom não esquecer esta lição de baixa política para perceber os bastidores do poder.
Quem tivesse duvidas sobre a relação do Presidente da República com aquele que, muito provavelmente, será o próximo primeiro-ministro esclareceu-as quando Passos Coelho foi apresentado, num comício em Vila Real, como presidente da Assembleia Municipal. O desconforto de Cavaco Silva com o líder do PSD voltou a ser sentido quando lhe foi pedido para dizer se a presença de Passos lhe agradava. Parecia evidente que Cavaco não tencionava dar, com a sua previsível vitória, um empurrão a Passos Coelho. E muito menos dividir com ele os louros da sua reeleição. Mais relevante: Passos também não queria essa ajuda.
Este divórcio sem litígio não seria grave se não fosse a costumeira deselegância do Professor, que fez questão em tratar o "presidente da Assembleia Municipal de Vila Real" com um desprezo indiscreto. A resposta sentiu-se nos últimos dias de campanha, quando a preciosa máquina do PSD desapareceu da campanha e Cavaco ficou com a mobilização reduzida ao mínimo.
Quem não tivesse entendido o recado teve a explicação mais clara no discurso de Passos de domingo: a vitória era de Cavaco e ele nada tinha a ver com ela. Ao contrário de Paulo Portas, que logo se pôs em bicos de pés, o líder do PSD explicou que aquilo não eram nem legislativas nem primárias delas.
O novo PSD não quer empurrões de Cavaco porque não lhe quer dever nada. E não lhe quer dever nada porque sabe que, se não há almoços grátis, com Cavaco Silva eles costumam ter o preço de um banquete. Cavaco Silva sempre quis e continua a querer governar por interposta pessoa. Sempre quis pôr e dispor do PSD e não perdoa que o Partido tenha tido o descaramento de escolher como líder que receberá o poder no colo um homem que não é de sua confiança. Pior: um homem que ele despreza e que o despreza a ele.
O preço de uma boleia de Cavaco seria, para Passos, o de lhe prestar vassalagem, o único tipo de relação que Cavaco conhece com os outros. Passos nunca o fará. E no domingo suspirou de alívio: o Presidente eleito com menos votos e reeleito com menos percentagem não estará em condições de exigir vassalagem a ninguém.
A política não é feita epenas de política. As relações humanas contam. Elas são, mais coisa menos coisa, grande parte das motivações de muitos dos confrontos internos nos partidos. E a relação de despeito mútuo entre estes dois homens será muito importante nos próximos anos.
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Mesmo sem força para tanto, Cavaco não desistirá da ideia de tutelar o próximo governo ou até de evitar que ele venha a ser liderado pelo jovem desobidiente que lhe calhou na rifa. E, no partido, os cavaquistas conspirarão na sombra, sabendo que se for Passos a chegar ao poder eles perderão para sempre a sua oportunidade.
Passos não desistirá de não dever nada a Cavaco. Começando por não lhe dever umas eleições antecipadas. Se o governo tem de cair, Passos vai querer que caia às maõs do seu PSD e não de Belém. E se chegar a São Bento a tempo tratará de fazer a limpeza interna que tanto deseja. Para os cavaquistas ficarão os comentários na televisão e nos jornais e pouco mais.
A animosidade entre o fedelho arrivista de Massamá e o empertigado professor de Boliqueime - imagino que seja assim que cada um veja o outro - marcará as lutas de poder no PSD. As diferenças ideológicas que as várias fações irão simular, sempre muito preocupadas com os destinos do País, não serão mais do que uma farsa. Um será mais liberal e extremista, outro mais caritativo e provinciano. Mas o que conta, o que contará, é a luta entre o professor galo e o jovem coelho.
Publicado no Expresso Online
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http://arrastao.org/2153742.html
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