A Internacional

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quarta-feira, fevereiro 27, 2008

Reflexões sobre a China: (3) Economia Política + Geografia



por Elias Jabbour*

O pilar de minha pesquisa reside no ponto de encontro entre a Economia Política e a Geografia, mais notadamente entre as categorias nodais da Economia Política com a categoria marxista de Formação Econômico-Social. Desta forma nesta parte 3 ao procurar trilhar os caminhos percorridos pelas disciplinas citadas tento assentar as bases metodológicas da investigação em curso.


Não somente isso: demonstrar, também, que o grande paradigma metodológico - não somente à compreensão da China - das ciências humanas e do marxismo de uma forma geral reside na apreensão e utilização da categoria marxista de Formação Econômica Social. Essa perspectiva – da Formação Econômico-Social – deve ser enfatizada no mesmo grau de proporção que formas generalizantes de método (esquemas circulacionistas, tipo “teoria da dependência”, o “sistema-mundo” de I. Wallerstein e sua pobre ramificação em R. Kurz) ganham corpo e espaço tanto no campo marxista, quanto nas ciências humanas como um todo.

O objeto da Economia Política e seu caráter de classe


Independente da exposição de esquemas e modelos de desenvolvimento é importante proceder, mesmo que de forma inicial, a uma relação entre a Economia Política – e seu objeto de estudo – e a Geografia e uma de suas subtotalidades - a Geografia Econômica. Isto serve a uma melhor compreensão pari passu à consciência de que a própria aplicação de modelos e/ou esquemas deve-se obedecer à lógica do funcionamento da Formação sócio-espacial. Até por que a formação Econômico-social, como construção histórica, pode ser tida e lida como o ponto de encontro entre diferentes ramos das ciências humanas. E isso fica mais clarificado na medida em se chega no nível do específico, como é o caso da China e seu processo recente de desenvolvimento, como veremos mais adiante.


***


O processo econômico é um conjunto de ações humanas que se repetem constantemente. Em condições determinadas, resultantes de um certo desenvolvimento histórico da sociedade, essas ações se repetem de maneira definida, isto é, caracterizam-se por um conjunto de regularidades específicas. Podemos decompor essas regularidades em certos elementos, constituídos por relações repetindo-se constantemente entre as diversas ações ou atividades que compõem essas ações. Tais ações são designadas pelo nome de leis econômicas (1). Tais leis, que podem ser aludidas como as “leis da Economia Política” refletem o caráter regular de processos que se realizam independente da vontade humana. Porém, diferentemente das leis da natureza, que têm caráter duradouro, as leis econômicas têm caráter historicamente definido.


Segundo Stálin, “Aqui, da mesma forma que nas Ciências Naturais, as leis do desenvolvimento econômico são objetivas, refletem os processos do desenvolvimento econômico, que se realizam independente da vontade dos homens. Os homens podem descobrir essas leis, conhecê-las, e, baseando-se nelas utilizá-las no interesse da sociedade, dar outro rumo à ação destruidora de algumas leis, limitar sua esfera de ação, dar livre curso a outras leis que abrem caminho pra adiante; mas não podem destruí-las ou criar novas leis econômicas” (2).


Logo, as leis econômicas: seu caráter, sua objetividade, alcance histórico, modo de ação, relações mútuas e suas conseqüências nas múltiplas determinações do concreto são o objeto de estudo da Economia Política.

O desenvolvimento científico da Economia Política, historicamente, está ligado aos interesses de determinadas classes progressistas. Seu desenvolvimento inicial remonta ao momento histórico em que se verificava na burguesia um reservatório de idéias avançadas. Em primeiro lugar, a Economia Política desenvolveu-se no quadro da superação do feudalismo pelo capitalismo e em associação com a burguesia progressista de então. Na medida em que a oposição capital-trabalho tornou-se a contradição principal – e com o surgimento do imperialismo, esta contradição principal criou um aspecto principal residido nas relações centro-periferia – a ciência em questão tornou-se associada aos interesses da classe operária e dos movimentos de libertação ocupados não somente com a libertação nacional em si, mas com a apreensão dos mecanismos essenciais de planejamento econômico aos seus programas de reconstrução nacional.


Assim, ligando-se ao empreendimento magno da humanidade, o socialismo científico, é que a Economia Política pode se desenvolver, e em compasso com outras ciências, dar maiores contribuições à busca da síntese das relações entre homem e natureza.

O caminho percorrido pela Geografia


Alguma similaridade pode ser encontrada na Geografia com o caminho percorrido pela Economia Política. Isso no que se refere, essencialmente, a um determinado fim de percurso em que ambas áreas do conhecimento passaram a ser influenciadas pelo marxismo, ou ao menos a caminharem ladeadas, pois o marxismo, assim como a Geografia e a Economia Política deve ser visto como uma ciência. Quanto ao método, isso fica a cargo da dialética, as leis gerais que regem o movimento.


Retornando, a tendência a uma postura holística e histórica da Geografia moderna é explicada por sua raiz filosófica comum ao marxismo, a filosofia clássica alemã. Porém diferente do marxismo, que nasce das idéias igualitaristas (típicas das terras comunais) embandeiradas pela burguesia radical no ápice da transição feudalismo-capitalismo, a Geografia surge a serviço do nacionalismo prussiano contra as investidas napoleônicas, sendo assim uma determinação que jogou papel de proa à arrancada alemã no rumo de seu capitalismo tardio (3).


Porém, somente após a Segunda Guerra Mundial é que essas duas correntes hegelianas se encontram. Expressão do grande prestígio alcançado pela vitória da União Soviética na citada guerra, o marxismo passa a pautar o estudo de geógrafos franceses. Em primeiro lugar, na abordagem em termos de gênero de vida e na escala em que foi importante à superação dos limites inerentes a tal noção, foi ganhando campo entre os geógrafos (4). Ao longo de algumas décadas, no âmbito da geografia francesa, o marxismo abriu luz à análise de estruturas objetivas (relações centro-periferia, p. ex.) e lançando mão de categorias analíticas, como por exemplo, imperialismo, colonialismo, forças produtivas, relações de produção, entre outros.

O paradigma das ciências humanas modernas na categoria de Formação Econômico-Social


Nesta explosão de criatividade acadêmica é que a categoria marxista de Formação Econômico-Social (ou Formação Social ou Formação Sócio-Espacial) é resgatada e em Milton Santos é elevada à condição de mais completa e apta categoria com capacidade de elevar qualitativamente o aparato metodológico da Geografia. Este salto permitiu o reencontro com uma Geografia humboldtiana, ou seja, uma ciência do todo e suas relações, mas principalmente, como a Economia Política para Engels, “uma ciência pautada pela matéria histórica” (5).


Marx utilizou de forma muito genérica a categoria de formação social como se vê no Prefácio à Crítica da Economia Política onde emprega esta expressão no mesmo sentido que deu à categoria de sociedade. A expressão e/ou categoria de formação social ganha força na análise estruturalista, porém ainda muito pobre, pois a relaciona sem muito rigor à categoria de modo de produção e que em muitos casos, como freqüentemente pode se observar em Althusser, acaba negando a unidade dialética de continuidade e descontinuidade do tempo histórico. Em oposição à leitura estruturalista, Emilio Sereni aufere que a noção de formação social permite revelar o funcionamento lógico-estrutural e/ou sociológico de uma dada sociedade. Assim, em Sereni a categoria de formação social ganha mais corpo e mais legitimidade epistemológica.


Porém, numa visão particular, é em Milton Santos que essa categoria atinge sua maturidade e ápice como unidade científica, pois para ele, mesmo que a formação social seja intrinsecamente ligada à categoria de modo de produção, ela está ligada à evolução de uma dada sociedade em sua totalidade histórica. Segundo ele (1982, p. 11), “A localização dos homens, das atividades e das coisas no espaço explica-se tanto pelas necessidades externas, aquelas do modo de produção puro, quanto pelas necessidades internas, representadas essencialmente pela estrutura de todas as procuras e a estrutura das classes, isto é, a formação social propriamente dita”.


Pela inclusão da localização dos homens como uma determinação que pode e deve ser abarcada pela categoria de formação social é que Armen Mamigonian (1996, p. 202) nos lembra que M. Santos, “(...) percebeu que formação social e geografia humana não coincidem completamente, menos pelas teorias que embasam aquela categoria marxista e esta área do conhecimento acadêmico do que pela prática indispensável de localização da geografia, nem sempre usada nos estudos de formação social, daí ter proposto a categoria de formação sócio-espacial.”


Daí não somente devermos a M. Santos um estado de maturidade dada a categoria de formação social, mas também a uma contribuição ao desenvolvimento do marxismo de grande vulto. Isso tem grande valia dada uma conjuntura que possibilita a transformação em senso comum de determinados “contrabandos conceituais” de tipo substituição da categoria de imperialismo por “globalização”, ou mesmo, a troca da idéia de “consciência de classe” pela vazia categoria de “cidadania”, que mais serve à perpetuação do atual status quo do que a sua necessária substituição.


Voltando ao cerne, é justamente por ser uma construção histórica (como concreto) é que vemos na categoria de Formação Econômico-Social o fio de Ariadne possibilitador de um estudo que combine Economia Política e Geografia permitindo assim, um verdadeiro salto na contribuição à elaboração de uma Economia Política do socialismo renovada e em condições de ser parte de um todo que envolve os desafios impostos tanto à teoria marxista quanto aos movimentos operários e de libertação nacional deste início de século.

Notas:


(1) LANGE, O.: Moderna Economia Política. Fundo de Cultura. Rio de Janeiro, 1962. p.55.


(2) STÁLIN, J.: Problemas Econômicos do Socialismo na URSS. Anita Garibaldi, 1991. pp. 03-04.


(3) Sobre isto ler: AMARAL PEREIRA, R. M.: Da geografia que se ensina à gênese da geografia moderna. Editora da UFSC, Florianópolis, 3° Edição, 1999, pp. 110 a 114.


(4) Para Max Sorre, gênero de vida, “(...) é uma noção que designa o conjunto mais ou menos coordenado das atividades espirituais e materiais consolidadas pela tradição, graças às quais um grupo humano assegura sua permanência em determinado meio.” In, SORRE, M.: “Fundamentos da geografia humana”. In, MEGALE, J. (org.): Max Sorre. Coleção Grandes Cientistas Sociais. n° 16, Ática, São Paulo, 1984, p. 90.


(5) idem ao 14, p. 221. Sobre a categoria de Formação Econômico-Social ler: SERENI, E. “La categoria de formación económico-social”. In, Cuadernos de Pasado e Presente. n° 39. Córdoba. Siglo XXI, 1976; SANTOS, M. Sociedade e Espaço: a formação social como teoria e como método. Espaço e Sociedade. Vozes, 2° edição. Petrópolis, 1982; MAMIGONIAN, A.: “A geografia e a formação social como teoria e como método”. In, SOUZA, M. A. A. (org.): O mundo do cidadão, o cidadão do mundo. Hucitec. São Paulo, 1996.





*Elias Jabbour, é Doutorando e Mestre em Geografia Humana pela FFLCH-USP, membro do Conselho Editorial da Revista Princípios e autor de ''China: infra-estruturas e crescimento econômico'' 256 pág. (Anita Garibaldi).


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in VERMELHO -
30 DE JANEIRO DE 2008 - 13h16

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