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| Quando, ainda em 1974, principiaram as agressões a gente que festejava o 25 de Abril e a liberdade, em Bragança e noutras cidades e vilas do norte e do interior, aí ressurgia a ditadura velha e salazarista, no meio de tanta generosidade que se ampliava. . Reuniões de ex-ministros vindos de Espanha, com grandes proprietários e figuras do fascismo, em quintas do Vale da Vilariça, em Macedo de Cavaleiros e noutras terras, configuravam já, no verão de 1974, o que viriam a ser o ELP e o MDLP, o bombismo e a morte que espalharam. . No entanto, a participação popular em cada concelho, em cada lugar, substituía a velha Câmara Municipal, a Junta de Freguesia dos atestados e dos legionários, por gente disposta a transformar o meio e a vida local. . Essa capacidade de dar, essa abertura ao que era novo, a democracia, os ideais mais dignos e transformadores, desencadearam o ódio de quem mandara e dominara cada bocadinho de terra, cada gesto, cada assomo de revolta, durante 48 anos de miséria e de abdicação do que era nosso. . Dessa reacção violenta ou ainda encapotada, e mesmo desse fingimento de estar em bem com a democracia, nasceram comportamentos arrivistas e até corrupções, mais tarde, também no seio de gente oriunda de uma pequena e média burguesia que até aí fora passiva e ignorada, mas que, com o 25 de Abril, viu surgirem oportunidades de singrar na vida. . Recentes notícias sobre projectos e obras «magníficas» do engenheiro José Sócrates na Guarda e, se calhar, noutros concelhos dessas terras do frio e do diabo, são exemplos de anos e anos a proteger os amigos, a criar redes de «cooperação interessada» em cidades, vilas e aldeias novamente enterradas no tempo do «cala-te e come», do «se ele não se aproveita, se está no poder e não faz pela vida, é porque é parvo»… . Daí que, em ligação estreita com governos do PS, do PSD e do CDS-PP que quiseram enterrar a liberdade e a democracia no mais fundo do silêncio e do passado, tivessem emergido figuras em cada sítio, em cada região, que tudo fazem para reinstalar neste país o medo de falar, de agir, de lutar pelo avanço das coisas, logo que chegam ao poder. Eliminaram e eliminam direitos ao trabalho e a uma vida nova, destruindo a economia independente e soberana, as empresas de transformação e de grandes potencialidades de que dispúnhamos. Odeiam a vida social digna que se configurou com o 25 de Abril, substituindo-a, onde podem, pela caridadezinha e a esmola, destruindo a vida familiar e a estabilidade mínima de que cada ser humano necessita. . Abril cresce . Atacam a vida política, a participação democrática, através de leis como a dos Partidos Políticos ou do Financiamento dos Partidos e de polícias e vigilâncias cada vez mais sofisticadas, montadas para reprimir, vigiar, coarctar e levar ao silêncio e ao abandono da afirmação humana e corajosa. Transformam o poder criado com Abril em poder ditatorial e ignoram e atacam a Constituição da República, através da prepotência e da liquidação do que resta de direitos, de estruturas sociais e do bem-estar construído em cada concelho e nas regiões do país. . A participação na vida cultural foi intensa, com a descentralização, a vida associativa, a música, o teatro, a dança, o cinema, a literatura, cada área de criação a tornar-se um bem diário na vida de quem trabalhava. Mas eliminaram estruturas no poder central e foram entravando a intervenção do poder local, dos intelectuais e das associações, favorecendo a redução, o controlo e a elitização da cultura, na ausência de uma comunicação social estimulante, que, ao contrário, destrói e desinforma, e de uma escola que foi sendo conduzida para a mera formatação de cada criança e de cada jovem, para ser obediente e produtor amestrado da riqueza dos outros, a minoria cada vez menor e mais dominadora de governos obedientes, como o de José Sócrates. . A tudo isto e a muito mais que acontece e de que, às vezes, nem sequer temos notícia, a um governo que é o pior e mais autoritário desde 1976 até agora, opõem-se o sobressalto democrático e a resistência popular ao fecho do hospital e da escola, à retirada de trabalho e de salários, ao ataque à vida sindical, à destruição da dignidade humana. Pelo país fora, há trabalhadores, intelectuais e populações que se afirmam e surgem mais atitudes de coragem e de luta. . Novamente Abril cresce e se aproxima na nossa participação diária e na memória dos que resistiram ao fascismo, dos que criaram comissões de defesa da liberdade de expressão e de apoio aos presos políticos do salazarismo, dos que lutaram na clandestinidade, dos que ergueram movimentos democráticos amplos e representativos, no meio das prisões e das torturas. Essa dignidade de assumir ideias e ideais próprios integra-se no caminho criado e no exemplo de homens e mulheres que honraram a própria vida e fizeram um destino corajoso e livre onde os fascistas impunham cobardia e miséria. . Aí estarão todos connosco, aí estaremos, a festejar Abril e Maio em liberdade, a realizar iniciativas que se impõem, em cada sítio onde os ditadores deste tempo tentam calar e perseguir, nas ruas e avenidas do presente e do futuro, a afirmar o que há de melhor na vida, a liberdade e a democracia que continuaremos a defender e a impulsionar, combatendo os inimigos do desenvolvimento integrado e criador, os que tentam impedir a participação de todos na construção de um país digno e com futuro. . Não há instalação do medo que fique para sempre e a política repressiva e destruidora de Sócrates provoca já uma rejeição e um combate generalizado que serão decisivos para abrir novos caminhos de liberdade e de afirmação da democracia de Abril. . in Avante 2008.04.24 . .
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