o tempo das cerejas*
um blogue de esquerda em homenagem à Comuna de Paris
08/02/11
Passos Coelho e o passe social
Mea culpa, mea maxima culpa
Segundo leio aqui, parece que Pedro Passos Coelho «acha estranho que as pessoas possam aceder ao passe social sem apresentarem uma declaração de rendimentos», o que, confesso, é um assunto premente pois, ainda no passado dia 31, me encontrei com Ricardo Salgado numa fila da CP para compra do passe social.
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Mas quero começar por dizer que não perdoo ao Daniel Oliveira ter-me estragado o dia com esta notícia. Eu explico: por volta de 1992, portanto ainda nos finais do cavaquismo, eu escrevi um artigo para um número da revista POLITIKA que já não chegou a sair, onde comentava, tanto em vertente séria como em vertente irónica, as já então impetuosas teorias que sustentavam que a gratuitidade ou tendencial gratuidade de todo um conjunto de serviços sociais (saúde, educação e outros) devia ficar dependente do nível de rendimentos de cada. E, aqui há uns bons anos, recuperei ideias e observações desse artigo para uma crónica no Avante! ou no Semanário de que não encontro cópia ou ficheiro. Para além da vertente séria, em que com tanta actualidade como hoje explicava caridosamente que é em sede de impostos que esta questão deve ser resolvida e não mutilando a universalidade de certos serviços sociais, o que tinha mais graça era a vertente irónica. Com efeito, eu escrevia então que, um dia destes, estes tipos ainda vão descobrir que os ricos também podem comprar passes sociais e ter os filhos na primária (era assim que eu escrevia) à borliu. E depois sugeria que, não sendo viável, por tenebrosas ressonâncias históricas, ressuscitar o sistema das estrelas de diversas cores cozidas nas lapelas, talvez o Ministério das Finanças pudesse emitir para cada um de nós um cartão plastificado apenas com as letras A, B, C, D e E, ou vá lá um selo sobre o cartão de cidadão, assim sinalizando de forma oficial, prática e portátil o escalão de rendimentos a que pertencemos.
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Moral da história: tendo escrito isto a gozar e havendo a probabilidade, ainda que ínfima, de Passos Coelho me ter lido, só me resta fazer um mea culpa, mea maxima culpa por o líder do PSD vir agora levantar a questão dos passes sociais. Já não me vai servir de muito, mas fica a lição: nunca brinques com coisas sérias pois o rídiculo ou impensável numa época pode sempre tornar-se em realidade uns anos depois, ao menos nas meninges neo-liberais de certos protagonistas políticos.
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