A Internacional

__ dementesim . . Do rio que tudo arrasta se diz que é violento Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem. . _____ . Quem luta pelo comunismo Deve saber lutar e não lutar, Dizer a verdade e não dizer a verdade, Prestar serviços e recusar serviços, Ter fé e não ter fé, Expor-se ao perigo e evitá-lo, Ser reconhecido e não ser reconhecido. Quem luta pelo comunismo . . Só tem uma verdade: A de lutar pelo comunismo. . . Bertold Brecht

sábado, abril 21, 2007

33 anos depois da Revolução de Abril 1/4
Domingo Abril 15th 2007


* João Aguiar

Mais de três décadas após o derrube do regime fascista, Portugal continua sem ver concretizados os ideais da Liberdade, da Democracia e da Justiça Social que a Revolução de 25 de Abril consagrou. De facto, os ataques que os vários governos PS e PSD enfeudados à política de direita têm conduzido contra as conquistas de Abril, em sintonia com o acentuar da ofensiva internacional do imperialismo, funcionam como poderosas alavancas para amordaçar a luta popular e suas justas exigências de paz, liberdade e justiça social. Neste processo, por exemplo, as tentativas de criminalização do comunismo na UE ou a ilegalização da Juventude Comunista da República Checa são um claro aviso da tendência para a actual fascização da generalidade dos chamados Estados democráticos ocidentais. Conservando instituições formalmente democráticas e sem destruir as chamadas regras do jogo democrático, por outro lado, está a ocorrer uma clara concentração do poder político nos órgãos executivos do Estado com a correlativa militarização e securitarização da vida social. Também por esta via o legado democrático e libertador de Abril está ameaçado.Feitas estas primeiras (e muito telegráficas) observações do pano de fundo do contexto actual, importa enquadrar historicamente a Revolução do 25 de Abril de 1974. Tal objectivo esbarra inevitavelmente na necessidade de classificarmos o período histórico que lhe antecedeu. No fundo, trata-se de perceber o que foi afinal o Estado Novo.

O Estado Novo foi um fascismo

Nos dias de hoje, muitos há que definem o regime político que vigorou em Portugal entre 1926 e 1974 como um mero regime autoritário ou como um Estado de Direito com pequenos laivos de autoritarismo. Na prática, trata-se de uma variante da linguagem salazarenta dos “safanões a tempo”. Em vários blogs e textos de opinião de membros do PS, PSD e mesmo do Bloco de Esquerda têm surgido insistentemente argumentos que afirmam que teria existido um Estado de Direito (quase) democrático dada a existência de uma Constituição. Como se todas as ditaduras fascistas, como o tenebroso nazismo de Hitler, não tivessem uma Constituição! Ao mesmo tempo, afirmam que a ligação do Estado Novo com a Igreja Católica teria impedido que o regime se tivesse tornado fascista evitando assim tendências repressivas. Como se o conluio do Vaticano relativamente ao próprio nazismo não tivesse sido uma evidência! Como se não tivesse existido repressão em Portugal durante o fascismo! Por estas teses perpassa todo um sentido de branqueamento da História, procurando expurgar o Estado Novo da sua verdadeira essência: ter sido um Estado fascista. A classificação que os comunistas e outros democratas dão de fascista ao Estado Novo de Salazar e Marcelo Caetano não é fruto de qualquer aleatoriedade ou para efeitos de propaganda política como os apologistas mais ou menos encapotados do revisionismo histórico procuram fazer crer. Na realidade, o Estado Novo foi efectivamente a variante portuguesa do movimento fascista que varreu a Europa dos anos 20 a 40. Sem querer ser exaustivo, basta lembrar as saudações nazi-fascistas que os seguidores de Salazar lhe dirigiam em qualquer cerimónia pública, o retrato de Mussolini na mesa do gabinete de Salazar, o decretar de 3 dias de luto nacional aquando da morte de Hitler ou a ajuda mais ou menos encoberta, mais ou menos pública do governo português ao esforço de guerra franquista na guerra civil de 1936-39 ou às potências do Eixo na Segunda Guerra Mundial. Para além destes factos mais palpáveis, e aproveitando para entrar num registo ligeiramente mais teórico, o Estado Novo era objectivamente fascista em pelo menos dois níveis.Num primeiro nível, o fascismo português traduz semelhanças e propriedades óbvias com os fascismos italiano e alemão. Os fascismos surgiram sempre como derivados do estado de desorganização política das classes dominantes. Ou seja, quando a instabilidade política das ditas elites é colossal, quando não há uma fracção dominante capaz de legitimar um programa político que unifique o conjunto das classes dominantes, afigura-se óbvia a possibilidade de se implantar uma forma de Estado fascista. Este apresenta-se como um Estado acima das classes e dos indivíduos procurando a unidade nacional o que é o mesmo que dizer: 1) que consegue unificar e organizar politicamente as classes dominantes. Salazar e o Estado Novo representaram a pacificação das enormes fricções entre a burguesia industrial (e comercial) e a camada latifundiária que estiveram na base de grande parte da instabilidade política da I República; 2) o fascismo desempenha não só um papel de organização política (de uma parte – restrita – da população) como igualmente desorganiza politicamente a restante maioria popular. Em Portugal isso é perfeitamente visível na repressão do movimento operário e dos sindicatos e partidos que rejeitavam o novo regime. Em termos de desenvolvimento histórico o mesmo se passou na Itália de Mussolini e na Alemanha de Hitler. Na Itália entre a burguesia industrial e financeira e a burguesia agrária do Sul. Na Alemanha entre os Junkers que controlavam as terras, a burguesia industrial do Ruhr e a burguesia financeira. Ao mesmo tempo, ambos reprimiram o movimento operário nos mesmos moldes. Se Salazar matou e reprimiu menos tal não invalida a sua profunda semelhança relativamente ao que se passou na Itália e Alemanha. Há diferenças de grau mas não de natureza.Num segundo nível, o fascismo define-se pela relação que o Estado estabelece com a matriz sócio-económica e as classes existentes numa determinada sociedade. O fascismo português veiculou uma política económica claramente beneficiária para as classes dominantes. Ou seja, desde o condicionamento industrial até à política de baixos salários e elevados horários de trabalho, passando pela rapina das riquezas naturais das colónias em África, o fascismo português era objectiva e inequivocamente um instrumento da grande burguesia portuguesa para aumentar a exploração do povo português e oprimir os povos das ex-colónias e sugar os seus recursos naturais.Finalmente, gostaria de citar o próprio Salazar que se auto-intitulava de fascista. Só por aqui se vê o carácter imoral e criminoso das teses que procuram branquear o fascismo português.Referindo-se ao Estado Novo, «a nossa Ditadura [repare-se no pormenor do D maiúsculo salientado pelo próprio Salazar, JA] aproxima-se evidentemente, da Ditadura fascista no reforço da autoridade, na guerra declarada a certos princípios da democracia [desta vez, repare-se que a palavra democracia é escrita em minúsculas, JA]». O ditador fascista não se fica por aqui: «Tenho o orgulho de dizer que a obra da Ditadura portuguesa, guardadas as proporções do meio, não é inferior, nos seus resultados e nas suas directrizes, à obra da ditadura italiana». Estas afirmações podem ser encontradas nas famosas entrevistas dadas a António Ferro em 1933. Como negar que o salazarismo – e sua extensão cosmética de Marcelo Caetano – não era fascista quando é o próprio que confirma isso mesmo? Só má-fé e desculpabilização do fascismo explicam a defesa de teses revisionistas e branqueadoras da essência real do Estado Novo.

Portanto, esta forma fascista de organização da sociedade e do Estado resultou na repressão brutal dos trabalhadores que se manifestavam contra o regime ou por melhores condições de vida e melhores salários. A repressão estendeu-se sobretudo ao PCP através da perseguição, da prisão, da tortura e recorrendo mesmo ao assassinato (relembro apenas os casos de Dias Coelho, Catarina Eufémia, Alex, Bento Gonçalves). Registaram-se pelo menos 96 assassinatos políticos, fora os massacres ocorridos na guerra colonial. Ao mesmo tempo, só nos primeiros 25 anos do regime ocorreram mais de 20 mil prisões políticas. Um regime que condenou gerações de portugueses à exploração mais despudorada, à miséria, ao analfabetismo, ao obscurantismo. Um regime sanguinário que não hesitou em oprimir barbaramente os povos de Angola, Moçambique, Guiné, São Tomé e Cabo Verde concretizando a rapina das riquezas destes povos em prol de um punhado de grandes capitalistas. Um regime que entregou milhares e milhares de jovens portugueses a morrer numa guerra contra povos irmãos. Por tudo isto, um regime com tais características só pode ser um regime fascista. Como disse anteriormente, não se trata de uma questão de propaganda política ou sequer académica. Trata-se sim de repor a verdade sobre o que realmente se passou neste país durante quase meio século. A reposição objectiva do que foi o fascismo é uma tarefa vital que enquanto comunistas temos de transmitir às novas gerações. Porque ao mostrarmos a essência profunda do fascismo, ressaltam imediatamente aos olhos de qualquer pessoa de boa-fé e com honestidade intelectual, os homens e mulheres – comunistas e não comunistas – que lutaram contra o regime iníquo de Salazar e Caetano. Sem uma plêiade de democratas e de revolucionários que durante 48 anos enfrentaram o fascismo não teria ocorrido o 25 de Abril e, tão ou mais importante, este não teria sido a revolução libertadora que foi.

retirado do blog As Vinhas da Ira

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