No lançamento da Conferência Nacional do PCP sobre as Questões Económicas e Sociais, Jerónimo de Sousa sublinhou que, com esta iniciativa, o PCP «assume a defesa da soberania nacional como questão central e estratégica para a defesa dos interesses nacionais e para a construção de uma Europa de cooperação entre Estados soberanos e iguais em direitos», salientando que esta Conferência «coloca na ordem do dia a ruptura com o actual modelo de políticas económicas e sociais e que assume como um grande desafio o apontar do caminho para a inadiável tarefa de tirar o país da estagnação».
No seguimento da decisão do Comité Central do PCP, damos hoje início com a presente iniciativa ao lançamento da Conferência Nacional sobre as Questões Económicas e Sociais que se realizará nos dias 24 e 25 de Novembro.
Nesta Conferência Nacional visamos realizar uma análise global e integrada dos problemas económicos e sociais do país, a partir do aprofundamento do conhecimento das suas estruturas socio-económicas e das suas actuais dinâmicas, bem como os problemas do enquadramento internacional, com particular atenção para o processo de integração comunitária e para as suas consequências no desenvolvimento do país. Uma conferência que não deixará de reflectir e considerar também os mais importantes problemas sociais, o papel do Estado e do mercado na vida económica e social, seus estrangulamentos e potencialidades, e debruçar-se sobre as teses neoliberais protagonizadas pelo PS e PSD que conduziram o país ao último patamar da União Europeia.
Com a presente iniciativa abre-se o longo período da sua preparação que contará com um vasto programa de reuniões, debates sectoriais e regionais de análise da realidade socio-económica do país, das regiões e dos mais importantes sectores de actividade da vida nacional que aprofundarão também o conjunto de reflexões e de propostas que têm vindo a ser elaboradas no âmbito da iniciativa “Portugal Precisa, o PCP Propõe”.
Programa que se abre à participação de todo o colectivo partidário e que, certamente, contará também como desejamos, em muitas das suas iniciativas, com os contributos e a presença de trabalhadores, intelectuais e quadros técnicos, micro, pequenos e médios empresários e das outras camadas da população que estão interessadas e procuram uma verdadeira solução para os problemas nacionais.
A persistência de uma grave situação económica e social que teve nestes primeiros anos do século uma mais inquietante evolução, tornou incontornável e inadiável, não apenas o questionamento das grandes orientações políticas e acção governativas do PS e do PSD que lideraram os governos dos últimos anos, mas essencialmente e perante tão preocupante e negativa evolução a necessidade de aprofundar e confrontar a sociedade portuguesa com a existência e a real possibilidade de concretização de um caminho alternativo e de uma política económica e social alternativa às soluções da política de direita, capaz de promover e garantir um país mais justo e mais desenvolvido.
A gravidade da situação económica e social de Portugal é hoje indisfarçável.
O país vive o mais prolongado período de estagnação económica das últimas décadas, uma situação que combina um prolongado período de recessão com outros de incipiente crescimento, com profundas consequências na contínua destruição dos sectores produtivos nacionais, enquanto se agrava e cresce o défice das contas externas e se mantém sem solução um conjunto de significativos défices, como os agro-alimentares, tecnológico e energético e que se traduzem não só fortes bloqueios ao nosso desenvolvimento, como condenam o país à dependência crónica.
O desemprego atingiu no último trimestre de 2006 a mais alta taxa dos últimos vinte anos dando origem a um novo surto de emigração e o trabalho precário medido pelo INE e referente ao mesmo período abrange cerca de 21,3% dos trabalhadores por conta de outrem, colocando Portugal no topo dos países da União Europeia em matéria de precariedade laboral.
O desemprego de longa duração ultrapassa 50% dos desempregados.
Os salários além de baixos são cada vez mais desvalorizados por uma deliberada política de contenção salarial na diminuição dos salários reais que quer continuar a prender o país a um modelo de desenvolvimento assente em baixas remunerações do trabalho e na fraca incorporação científica e tecnológica no processo produtivo que fragiliza o país e o torna cada vez mais dependente.
Não se estranhe, por isso, também que o relatório da Comissão Europeia sobre protecção e inclusão social, publicado a semana passada, nos volte a confirmar como o país dos actuais 25 países da União Europeia, com menos justiça social e que sejamos um dos países mais desiguais na distribuição dos rendimentos.
Situação que se agudiza à medida que recrudesce a ofensiva contra os serviços públicos na saúde, a escola pública e a segurança social penalizando os portugueses com novos e mais pesados encargos, ao mesmo tempo que se torna mais difícil o acesso a esses serviços com o seu desmantelamento e encerramento, como é o caso do programa de reestruturação das urgências no sector da saúde. Mas não deixa de ser significativo e exemplo de uma opção que permanece na condução da política económica e social portuguesa o recente episódio protagonizado pelo ministro da economia Manuel Pinho na recente visita à China do governo português que o primeiro-ministro avalizou, quando valorizou os baixos salários dos portugueses como uma vantagem competitiva na captação de investimentos estrangeiros para o futuro.
Ou que o QREN, falando de «coesão social», não tenha uma palavra sobre política salarial!
Afirmações que contrariam todas as perspectivas, até hoje anunciadas, sobre a construção de um novo paradigma para a nossa economia e para o desenvolvimento do país e que o tão cantado e louvado Plano Tecnológico deveria impulsionar.
Afirmações que são o reconhecimento antecipado do falhanço de uma política que sob o manto da propaganda de modernidade visa manter e perpetuar todos os mecanismos de exploração que têm sido suporte de um modelo de desenvolvimento desequilibrado, socialmente injusto e inadequado à afirmação de um país soberano e independente.
Mecanismos que não se confinam à exploração directa do trabalho, mas que se ampliam a outros domínios da vida económica e social e que concorrem para a crescente centralização e concentração da riqueza nas mãos de uma minoria que tudo controla.
Teses que afirmam o primado do mercado e da concorrência para reconstituir o capitalismo monopolista. Que afirmam a abertura da economia portuguesa e a globalização para entregar ao capital transnacional partes crescentes dos sectores estratégicos e o comando da economia nacional.
A difícil situação económica e social do país é hoje indissociável do acelerado processo de concentração e centralização de capitais nas mãos do grande capital económico e financeiro e do seu domínio sobre a vida económica e social do país.
Os astronómicos lucros dos quatro bancos privados que em 2006 atingiram 1,9 mil milhões de euros de lucro, mais 30,5% do que em 2005, mas também das restantes empresas cotadas na bolsa no índice PSI 20 são o resultado de uma política económica e social dirigida para a reconstrução dos grandes grupos monopolistas à custa da ruína de milhares de micro, pequenas e médias empresas e do crescente endividamento das famílias e das empresas não financeiras que atingem os mais altos níveis de sempre. Milhões de euros de lucro que pouco ou nada contribuem para o relançamento da economia portuguesa e que evidenciam a chocante contradição da actual situação económica e social marcada pela crise para a generalidade do tecido económico do país e pelo aumento das desigualdades sociais e o crescente florescimento do grande capital financeiro e dos grandes grupos económicos.
Quanto maior parece ser a crise, quanto maiores são as dificuldades das famílias, dos trabalhadores, dos reformados e maiores são as dificuldades que enfrentam a generalidade dos micro, pequenos empresários e agricultores, mais engorda o grande capital económico e financeiro, alimentado também pela via das privatizações, aquisições e fusões que são pretexto, não só para a absorção de elevados volumes de fundos públicos e novos despedimentos, mas para liquidar o papel do Estado nos sectores estratégicos da economia e obter o domínio monopolista sobre o mercado com a consequente imposição draconiana das condições e preços aos restantes sectores económicos como vem acontecendo.
Os elevados custos da energia, das tarifas eléctricas e dos combustíveis são hoje, juntamente com os custos do dinheiro inquestionáveis factores de agravamento da situação económica e social.
Os acontecimentos recentes de imposição de elevadíssimos aumentos das tarifas da electricidade são um exemplo da consequência de anos de politica de direita e das soluções neoliberais, neste caso energéticas, de clara subestimação dos interesses nacionais e da economia portuguesa.
São o resultado de uma política deliberada de desmembramento do sector eléctrico nacional, da privatização da EDP e da liberalização do mercado de energia. Uma política orientada para satisfazer apenas os interesses do grande capital financeiro nacional e internacional e garantir lucros escandalosos à custa da generalidade do tecido empresarial português e dos consumidores. Lucros que têm sido dos mais elevados de sempre, tanto em 2005 com mais de mil milhões de euros, como no ano de 2006.
E está hoje confirmado, pela insuspeita voz de entidades reguladoras, que era possível o País ter tarifas de energia eléctrica mais baixas. Menores preços dos combustíveis. À custa de quê? Com a redução daqueles enormes lucros!
Iludindo o real peso na revitalização da economia portuguesa, anunciam-se e empolam-se os impactos das diversas OPA’s em curso que se anunciam como um sinal positivo para a saída da crise, mas efectivamente sem qualquer expressão na realidade económica e social.
O anúncio da OPA da Sonae sobre o Grupo PT é um claro exemplo, da concretização de uma estratégia, assente numa poderosa campanha mediática, que visa apenas colocar o sector estratégico das telecomunicações exclusivamente nas mãos do grande capital nacional e internacional, pondo em causa uma política nacional de telecomunicações integrada numa estratégia de desenvolvimento do país.
A mesma perspectiva que agora se quer impor com a privatização da ANA, como contrapartida ao negócio do novo aeroporto da OTA, dando mais um passo na submissão do interesse nacional ao mundo aos negócios. Esta evolução extremamente negativa da situação económica e social portuguesa tem causas reais que não podem ser branqueadas e dissimuladas. Esta evolução é consequência clara e inequívoca da conjugação das políticas económicas, financeiras e sociais concretas. É, antes de mais, o resultado das políticas orçamentais, submetidas ao fundamentalismo do Pacto de Estabilidade, com gravosas consequências no investimento público e no crescimento económico, na política salarial e nas políticas sociais. Políticas restritivas e monetaristas centradas no défice das contas públicas que não resolvem o problema do défice, nem dinamizam a economia e o emprego.
Esta evolução é também o resultado das políticas de desprotecção das actividades produtivas nacionais, da crescente financeirização da economia, da entrega ao estrangeiro das principais alavancas da economia do país, da sacralização dos dogmas da concorrência do menos Estado, das políticas de privatização, liberalização e crescente desregulamentação dos mercados. Tal como é consequência da perda de competitividade interna e externa da produção nacional decorrente de um Euro sobrevalorizado, mas também das políticas de aplicação das ajudas comunitárias que a política de direita e os sucessivos governos concretizaram com programas dirigidos para o grande capital e para a reprodução de um perfil produtivo de baixo valor acrescentado que absorveram mais de 50 mil milhões de euros com resultados desastrosos para o país.
Ao contrário do que afirmam os ideólogos do neoliberalismo dominante não são o défice das contas públicas, os direitos dos trabalhadores, a dimensão do Estado e os “privilégios” dos trabalhadores da função pública ou a pretensa rigidez das relações laborais que são a causa das dificuldades do país.
Não é o Estado que suga e debilita as empresas portuguesas como afirma a propaganda da direita e neoliberal, mas a banca e o grande capital económico e a sua sede de lucro que sufocam as micro, pequenas e médias empresas.
Não é no sector público e na dimensão do Estado social que radicam as principais causas da falta de competitividade da economia portuguesa, mas nos custos desproporcionados dos bens e serviços essenciais ao desenvolvimento do tecido económico nacional, em resultado da privatização e monopolização dos sectores estratégicos da economia nacional pelo grande capital económico e financeiro.
Tal como não é nos salários dos portugueses do sector público ou do sector privado e na existência dos actuais direitos dos trabalhadores que se devem encontrar as dificuldades que enfrenta a economia e a competitividade do país, mas sim numa política que pouco faz para alterar um tecido produtivo debilitado, com fraca incorporação científica e tecnológica, de baixo valor acrescentado e fraca inovação.
As respostas à grave situação económica e social não podem ser encontradas dando continuidade às políticas de direita que já provaram que não resolvem os problemas nacionais e muito menos promover o seu aprofundamento como o faz o actual governo do PS de José Sócrates prosseguindo a sua ofensiva global visando a reconfiguração do papel do Estado, agravada com anunciada intenção de reduzir as suas funções nucleares, apenas às funções de soberania, abrindo ainda mais as portas à privatização das suas principais funções sociais, à liquidação de direitos dos trabalhadores e do povo com a concretização do seu vasto programa de contra-reformas anti-sociais.
As soluções não podem continuar a ser encontradas agravando a desregulamentação das relações de trabalho, a precariedade e o desemprego, agora com a chamada “flexisegurança” que, sob a capa da necessidade modernização e da competitividade, o que se visa é impor a total liberalização dos despedimentos e a total precarização do mercado de trabalho.
Situação que agravará não apenas a precariedade da vida dos trabalhadores, mas igualmente a precariedade da formação, da experiência profissional e da produtividade do trabalho, comprometendo o desenvolvimento do país.
As soluções não passam pela demissão da responsabilidade do Estado na garantia do acesso de todos os portugueses aos cuidados de saúde como está bem patente na política de encerramento de serviços, maiores barreiras na acessibilidade aos cuidados de saúde, na deterioração da qualidade dos serviços prestados e nos custos mais elevados para os utentes, mas pela defesa, valorização e reforço de um Serviço Nacional de Saúde de qualidade e uma rede de cuidados em todo o território nacional.
As soluções não passam por adequar o sistema de ensino ao objectivo de “formatar” as futuras gerações de acordo com os interesses da ideologia dominante e do grande capital, na garantia de uma mão-de-obra qualificada, obediente e barata que se ajuste ao seu mercado flexível e precário, mas pela valorização de uma Escola Pública e um ensino com conteúdos de qualidade, virado não apenas para o ensino específico, mas para a formação integral dos portugueses e o desenvolvimento do país.
As soluções não podem ser encontradas transformando a segurança social pública, num sistema residual e assistencialista, mas elevando os padrões de protecção social de todos os portugueses e assegurando e desenvolvendo um verdadeiro sistema de protecção público universal e solidário capaz de contribuir para uma mais justa repartição do rendimento nacional.
A Conferência Nacional do PCP sobre as Questões Económicas e Sociais realizar-se-á para mostrar e demonstrar que o actual caminho que a política de direita impõe não é único, nem inexorável, que há alternativa e que há outras soluções capazes de resolver os problemas nacionais e garantir o desenvolvimento sustentado e equilibrado do país e melhores condições de vidas aos portugueses.
Uma Conferência Nacional que queremos desenhada no encontro e no diálogo com o país real, que parta da vida, que identifica e analisa os principais bloqueios e potencialidades da situação económica e social do país e que tem como uma importante matriz de referência a Constituição da República.
Uma Conferência que perspective uma efectiva mudança no modelo de desenvolvimento do país que decididamente promova a valorização do trabalho nacional, com uma efectiva redistribuição do Rendimento Nacional e uma aposta decidida na educação, na qualificação profissional, no investimento na I&D, no desenvolvimento cultural.
Uma Conferência que dê resposta à grande questão que se tornou num dos problemas centrais da sociedade portuguesa: o crescimento económico, vigoroso e sustentado acima da média europeia, potenciador de emprego e com uma dimensão espacial, social e ambiental.
Uma Conferência que defina os grandes eixos de uma política orçamental e fiscal, que atenta ao equilíbrio das contas públicas e ao desperdício dos fundos rompa com o espartilho do PEC promova o investimento público, dinamize o investimento privado e desenvolva as políticas sociais e os serviços públicos na saúde, ensino e segurança social.
Uma Conferência que aponte soluções e orientações para a valorização da produção e de defesa e modernização do aparelho produtivo nacional, o combate aos défices externos e pelo aumento do investimento indutor da produtividade.
Uma Conferência que dê resposta aos crescentes desequilíbrios no desenvolvimento que aponte as medidas de combate às assimetrias regionais e assegure a efectiva descentralização e a regionalização das políticas de desenvolvimento regional.
Uma Conferência que perspective como uma questão estratégica um papel mais activo do Estado na economia, nomeadamente nos sectores estratégicos – banca, energia, transportes, entre outros – e que intervém na resposta atempada aos problemas, que defina as orientações estratégicas da economia e planifica o seu desenvolvimento.
Uma Conferência que assume a defesa da soberania nacional como questão central e estratégica para a defesa dos interesses nacionais e para a construção de uma Europa de cooperação entre Estados soberanos e iguais em direitos.
Uma Conferência que coloque na ordem do dia a ruptura com o actual modelo de políticas económicas e sociais e que assume como um grande desafio o apontar do caminho para a inadiável tarefa de tirar o país da estagnação, da prolongada divergência e atraso que o prende à cauda da Europa.
Políticas alternativas só possíveis com a participação empenhada, a energia criadora dos trabalhadores, dos agricultores, dos pescadores, dos pequenos empresários, dos quadros técnicos e científicos, da juventude deste País, de todos os patriotas e democratas preocupados com este estado de coisas.
Uma Conferência que recuse o fatalismo e as inevitabilidades e dê mais confiança no futuro que aí vem! |
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