Profissões em vias de extinção (14)
Abegão (Ferrador e Ferreiro)
O etnógrafo José da Silva Picão, na sua obra de 1903, esclarece assim das responsabilidades do abegão: “Encarregado principal de todos os serviços desempenhados pela ganharia de que é mandante e cabeça. «Chavão da lavoura», no dizer de alguns campónios”. Mas, quando discorre sobre os carpinteiros anuncia: “Mestres carpinteiros, mas de «obra grossa», «de machado e enxó» para não se confundirem com os de «obra fina». No concelho de Campo Maior nem carpinteiros de machado lhe chamam. Conhecem-nos por abegãos, dando ao verdadeiro abegão o nome de apeirador”.
No que me é dado saber, a nomenclatura de mestre Picão no que concerne ao abegão, era apenas localizada no seu concelho de Elvas. Mesmo o apeirador tinha, no restante Alentejo, a denominação de feitor. Quanto ao abegão, também no restante Alentejo, não era mais que o mecânico da ucharia agrícola, no que concerne a artefactos de madeira. Já para os artefactos de ferro a responsabilidade do seu maneio cabia ao mestre ferreiro.
Nalguns acentos de lavoura (montes), o abegão era pau para toda a obra. Fazia a manutenção do equipamento agrícola metendo a mão na madeira e no ferro, e, nalguns casos, também fazia as vezes de ferrador. Isto porque os mestres ferreiros, geralmente, tinham oficina aberta apenas nos povoados de maior dimensão, vilas e cidades. O ferreiro também exercia a função de ferrar as cavalgaduras. Por regra, os ferreiros eram mais bem pagos que os abegãos, daí que o lavrador exigisse ao segundo uma habilidosa polivalência. Não era mais que a hoje propalada gestão apropriada dos recursos humanos.
Comentários: Mecânicos da ucharia agrícola
Posso acrescentar, com a devida licença, que não era incomum o abegão dar 'uns toques' na tosquia...
Um abraço,Francisco NunesAfixado por Planície heróica em setembro 27, 2004 02:01 AM
Um abraço,Francisco NunesAfixado por Planície heróica em setembro 27, 2004 02:01 AM
De facto, existem algumas diferenças entre Ferrador e Ferreiro, tem um pouco a ver com certas zonas da "nossa" região do Endovélico. Ferrador profissão das mais antigas muitas vezes com oficinas (nos montes tinha algumas nuances)onde se encontrava a forja onde se faziam os diferentes moldes para cascos de mulas, cavalos, e burros. Escolhido o tipo de ferradura de acordo com a variedade do terreno a pisar e com as características do animal, este era colocado para ser ferrado numa armação de madeira apropriada à tarefa e a que se chamava "Tronco". Para maior segurança prendia-se os beiços do animal com um instrumento a que se dava o nome de "aziar". O ferrador preparava os cascos com os desbastes precisos para ser colocada a ferradura com "cravos" batidos a martelo.
Quanto ao Ferreiro, o essencial já referenciado, apenas uma achega com alguma carga mais histórica. Foi sobretudo a partir da Idade Média que o ferro (numa escala até aí nunca conhecida)começou por ser utilizado no fabrico de alfaias domésticas e agrícolas. Com o desenvolvimento das feiras e mercados os objectos de ferro serviam como objectos de troca por outros artigos e/ou como meio de pagamento de serviços, dada a inexistência de circulação monetária. Nessa altura e em alguns locais o ferreiro acumulava também as funções de ferrador: executava grande quantidade de utensílios para animais.
Numa época de grande instabilidade e insegurança social, os instrumentos de defesa era feitos em ferro. Desde essa época, uma oficina de ferreiro ocupava no mínimo, 4 pessoas: uma que acarretava o ferro, a lenha e o carvão para a forja; outra que se destinava apenas a alimentar a fornalha e que se chamava "foleiro"; mais um ou dois trabalhadores malhavam/batiam o ferro e por último havia um "mestre" do ofício que executava as peças. Durante séculos e séculos, este ofício manteve-se próspero, activo e com grande prestígio social.
Num passado mais recente as oficinas de ferreiro situavam-se perto das abegoarias(oficina de carpintaria grossa). Eram ofícios complementares na construção de alfaias. Os ferreiros estiveram também muito ligados à medicina popular ( curar o cobro - irritação cutânea, etc ).
Joaquim, espero não ter maçado em demasia mas apeteceu-me divagar um pouco sobre o assunto. Já sei que para a próxima "levo nas orelhas"... é mesmo assim!
Um abraço.Afixado por Albardeiro em setembro 28, 2004 12:57 AM
Foto Luís Pavão
Retirado do blog Alentejanando
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