A subversão encapotada da Constituição
Terminado o VI processo de revisão, votado a mata-cavalos, poder-se-ia concluir que foram afastadas as «ameaças» de subversão da Constituição apresentadas pelo PSD/CDS, pois mantiveram-se sem alteração o preâmbulo e os capítulos relativos à organização unitária e republicana do Estado e aos princípios da organização económica e aos direitos e deveres económicos, sociais e culturais, com ajustamentos positivos quanto à regionalização autonómica.
Ora a verdade é que foi introduzida no artº 8º uma norma nova, aprovada pelo PS/PSD/CDS e rejeitada pelos restantes partidos parlamentares, com duas importantes consequências que são, por um lado, a Constituição passar a admitir a possibilidade das normas do direito da União Europeia prevalecerem sobre as normas de direito português, incluindo a Constituição e, por outro, os termos em que se processa essa prevalência serem definidos pelo próprio direito da União. Deste modo é reconhecido ao direito da União (sem especificar qual direito da União) a faculdade de definir os termos em que as suas normas vigoram em Portugal. Numa palavra, esta revisão reforçou o poder legislativo das regiões e afirmou a legitimidade constituinte ou constitucional das instituições da União Europeia, num sentido federalizador e este constitui o seu ponto nevrálgico, central e subversivo, feito nas costas do povo português, tornando inútil qualquer referendo sobre a matéria.
Com efeito, esta revisão constitucional viabilizou desde já a ratificação do projecto de constituição europeia, o que é feito ainda antes de esse projecto ter sido aprovado em definitivo. Ao admitir a prevalência duma futura Constituição Europeia cujo conteúdo se desconhece mas adivinha, o PS/PSD/CDS abdicam da soberania nacional e popular, abrindo a porta à «revisão» e «subversão» do que resta da Constituição de Abril. Com efeito, a Europa que está em marcha não é a Europa Social dos Trabalhadores mas a Europa da livre circulação do capital, das mercadorias e das pessoas, no interesse das transnacionais e dos países capitalistas mais desenvolvidos, numa altura em que o neoliberalismo impõe as sua desregulamentação e desresponsabilização social do Estado.
Regista-se que um grupo de cidadãos, professores de direito e políticos, entregou ao Presidente da República, ao Procurador-Geral da República e ao Provedor de Justiça uma petição que pede a fiscalização sucessiva da constitucionalidade da recente revisão constitucional. Em causa, as normas que estabelecem o primado da Constituição europeia sobre a ordem interna e que, segundo os subscritores, resulta dum «processo meio obscuro que consubstancia, apesar de tudo, um golpe violento na natureza do Estado». Portugal deixaria de ser um Estado soberano e passaria a ser um Estado federado ou uma simples região autónoma.
Fotografias retiradas do Blog Amnesia
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