A recente discussão [1996], no Conselho da Europa, de um projecto cujo objectivo essencial era a criminalização e proibição do comunismo e do ideal comunista, marca uma nova etapa da actual fase da ofensiva anticomunista. À excepção do Avante! que - com 75 anos de experiência na matéria, 43 dos quais em tempo de fascismo - conhece bem o significado de operações deste tipo e lhes dá a resposta adequada, o facto quase passou despercebido na generalidade dos média portugueses. Talvez porque o objectivo não foi totalmente alcançado. Com efeito, tendo sido aprovado o relatório com o seu conteúdo fascisante, o mesmo não aconteceu ao texto que recomendava aos governos da Europa a tomada de medidas para que os partidos comunistas dos respectivos países abjurassem o marxismo-leninismo – isto é, deixassem de ser comunistas - e, caso não o fizessem, que se agisse em consonância com a gravidade da desobediência…
O anticomunismo tem sempre como alvo primeiro a ideologia. No ideal comunista reside a força essencial dos partidos comunistas. Os anticomunistas sabem, por experiências mil vezes repetidas, que podem prender e matar – e prendem e matam – as pessoas, mas não podem prender nem matar os ideais. Salazar vivia obcecado com os «perigos do marxismo-leninismo que os comunistas querem instaurar progressivamente em todo o Mundo». O relator fascistóide do Conselho da Europa alertava, até, para essas coisas perigosíssimas que são os ideais de «justiça social e igualdade». E também quando os ataques aos partidos comunistas têm origem interna, o eixo central da ofensiva é sempre a ideologia – nestes casos através da modalidade do seu abandono, traduzido na rejeição do leninismo…
Esta tentativa do Conselho da Europa deve ser vista como uma entre as muitas manifestações da actual ofensiva anticomunista, a qual assume as mais diversificadas expressões à escala mundial e à escala de cada país e é também, e em simultâneo, uma ofensiva contra a democracia. Com efeito, mostra-nos a história que, da mesma forma que o fascismo é, sempre e em primeiro lugar, anticomunista, também o anticomunismo é sempre antidemocrático.
No caso de Portugal, por exemplo, as chamadas leis dos partidos aprovadas na Assembleia da República há três anos (sintomaticamente no dia 24 de Abril…) com os votos dos partidos da política de direita – PS, PSD e CDS – sendo leis de conteúdo fascisante e anticomunista, e tendo como alvo exclusivo o PCP, são simultaneamente um ataque ao regime democrático saído da revolução de Abril. E o facto de serem apresentadas em nome da democracia só lhes confere maior gravidade.
Aliás, a invocação da democracia é característica comum a todas as manifestações de anticomunismo. A legião de historiadores que, à escala planetária, procede à revisão contra-revolucionária da história das revoluções, fá-lo em nome da democracia, ou seja: ao serviço dos interesses e das directrizes do imperialismo norte-americano. As tradicionais «fundações» criadas pelo grande capital nos EUA (e, por isso, dispondo de fabulosos recursos financeiros) funcionam como uma espécie de sítios com links disponíveis para qualquer ponto do planeta onde haja historiadores disponíveis para, a troco de umas mãos cheias de dólares, fazerem história…
Assim, não surpreende que a criminalização da revolução de Outubro – primeira grande tentativa de construção de uma sociedade liberta de todas as formas de opressão e exploração – constitua a preocupação maior desses historiadores e o alimento principal de manifestações de anticomunismo como a do Conselho da Europa.
Por tudo isso, é necessário relembrar, neste ano de 2006 – em que o sistema dominante exibe todos os dias, das formas mais brutais, a sua essência opressora, exploradora, violadora dos mais elementares direitos humanos; e em que o PCP comemora 85 anos de vida e de luta contra a opressão, a exploração e pelos direitos humanos – que o Partido assume, sem hesitações nem ambiguidades, que o projecto de sociedade pelo qual se bate desde que foi criado, em 1921, tem as suas raízes nesse acontecimento maior da história universal que foi a revolução de Outubro, geradora dos maiores avanços políticos, económicos, sociais, culturais, civilizacionais alguma vez verificados. E que foi tendo essa referência presente que gerações sucessivas de militantes comunistas portugueses se bateram contra o fascismo durante quase meio século; e que nesse tempo em que lutar pela liberdade, pela democracia, pelos direitos humanos, tinha como consequências a prisão, a tortura, por vezes a morte, a primeira fila da luta foi sempre – sublinhe-se: sempre - ocupada pelos comunistas; e que, nessa luta pela liberdade e pela democracia, os comunistas portugueses contaram sempre com o apoio solidário, fraterno, da União Soviética; e que o regime fascista contou sempre com o apoio dos EUA e da generalidade das chamadas democracias ocidentais. E que este cenário se repetiu em todo o mundo; que os comunistas foram, em todas as situações, as primeiras vítimas do fascismo; que a perseguição aos partidos comunistas e a prisão e o assassinato de militantes comunistas foram, sempre, as primeiras medidas tomadas pelos regimes fascistas e sempre com o apoio dos EUA - que, na maioria dos casos, foram os promotores da instauração de sangrentas ditaduras fascistas, contra as quais, insista-se, os comunistas lutavam com a ajuda solidária da União Soviética.
Atenção: eles andam por aí. E se se deslocam com pezinhos de lã é porque não podem usar as botas cardadas dos seus sonhos.
in AVANTE 2006.02.23
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