A Internacional

__ dementesim . . Do rio que tudo arrasta se diz que é violento Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem. . _____ . Quem luta pelo comunismo Deve saber lutar e não lutar, Dizer a verdade e não dizer a verdade, Prestar serviços e recusar serviços, Ter fé e não ter fé, Expor-se ao perigo e evitá-lo, Ser reconhecido e não ser reconhecido. Quem luta pelo comunismo . . Só tem uma verdade: A de lutar pelo comunismo. . . Bertold Brecht

quarta-feira, abril 18, 2007


Álvaro Cunhal e as mulheres que tomaram partido (*)

Novo livro de João Céu e Silva


Esta é uma edição que honra a Asa, pelo esmero e beleza do livro como objecto, mas sobretudo pelo paciente, interessantíssimo (e tão rico de resultados) jornalismo de investigação que João Céu e Silva levou a cabo, unindo o rigor à sensibilidade e ao tacto. Está sempre presente a sua profunda compreensão dos seres humanos, uma desvelada atenção, onde transparece o afecto a cada uma destas mulheres que, como ele diz no título, «tomaram partido».

Tomar partido era, nesse tempo de trevas, sujeitarem?se ao desconforto, ao mau passadio e correr o risco da prisão, da tortura, de todos os vexames que é possível infligir a uma mulher.

João Céu e Silva interroga e elas respondem, mulheres de Lisboa ou do Couço, de origem burguesa ou operária ou camponesa e nos depoimentos, geralmente muito simples e directos, falam das famílias, dos estudos, as que os tiveram, da tomada de consciência, das privações da clandestinidade, do seu sentido de missão (de como se sacrificavam para dar apoio à imprensa clandestina e quanto sofriam por vezes de solidão), dos companheiros que acabavam por escolher, dos camaradas com quem por vezes simulavam estar casadas, das qualidades de uns e outros, do machismo residual de alguns. E uma luz de sacrifício, de coragem, de superação dos limites banha muitas dessas páginas.

É um documento valiosíssimo e, na sua humildade, cheio de grandeza.

Álvaro Cunhal está, mesmo quando ausente, muito presente neste livro, a partir de memórias, do conhecimento que dele tiveram muitas dessas heroínas apagadas.

Aqui surgem figuras brilhantes, no coração da batalha, como outras menos notórias mas não menos generosas, que foram nalguns casos terrivelmente marcadas pelo sofrimento e por experiências de autêntico martírio, quase incríveis, tão sujos e brutais nos surgem aqui descritos os «interrogatórios».

Registo alguns nomes (o inventário está longe de se esgotar na história destas tão naturais, tão singelas heroínas) para vos convidar a mergulhar nestas conversas reais, na descoberta de um mundo sempre surpreendente: Maria Júlia Mendes Brito, Maria Machado, Georgette Ferreira, Sofia Ferreira e Mercedes Ferreira, Maria Armanda Serra, Maria Carvalho, a já citada Margarida Tengarrinha, Maria da Piedade Gomes, Teodósia Gregório, Isaura Moreira, Sisaltina Santos, Conceição Matos, talvez de todas a mais cruelmente torturada, Veríssima Rodrigues, Maria Lourença Cabecinha, Laura Vieira, Olímpia Braz, Ortelinda Nunes, Narcisa Aleixo, Vitalina Pires, Francisca Aço, Margarida Nunes, Maria Galveias, Catarina Pires.

Maria Eugénia Cunhal fala das lembranças que tem do irmão Álvaro. João Céu e Silva esteve em muitos centros de trabalho do PCP, andou pelo Couço e pelo Barreiro, recolheu todo este material vivo e autêntico, forte e comovente, compilou testemunhos riquíssimos do ponto de vista histórico, sociológico e humano.

Mostra?nos o Portugal secreto dos anos do fascismo, com incidência nos duros anos quarenta e cinquenta.

Devemos?lhe uma palavra de agradecimento, não só os comunistas, mas os portugueses em geral por esta desocultação da história, por este contacto tão próximo que nos proporciona com as mulheres que, afrontando todos os riscos e dificuldades, especialmente a prisão, que a muitas arruinou a saúde, consagraram os melhores anos das suas existências às tarefas clandestinas da resistência.

(*)Asa Editora, Porto, 2006, 332 pp.

in AVANTE 2006.11.16

Sem comentários: