Injustiças nas juntas médica
Casos de política
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As situações de negação de aposentação a trabalhadores gravemente doentes, por parte da Caixa Geral de Aposentações, tiveram por base «uma clara orientação política», acusa o STFPSA/CGTP-IN.
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Para o Sindicato dos Trabalhadores da Função Pública do Sul e Açores, o facto de José Sócrates, reagindo aos casos que vieram a lume recentemente, ter vindo rapidamente anunciar que a composição das junta médicas ia ser alterada e que iria ser apresentada nova legislação sobre esta matéria (a qual ainda não é conhecida do sindicato), «prova que, de facto, o problema das juntas médicas e da injustiça no tratamento das graves situações dos trabalhadores é um problema político e não meramente um problema de composição das juntas médicas».
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Num comunicado que emitiu dia 26 de Julho e a que juntou a descrição de seis casos exemplares, o sindicato revela que «a CGA não fornece os dados acerca do número de trabalhadores que viram negada a aposentação por motivos de saúde». Admitindo que «foram certamente muitos, com injustiças gritantes», o STFPSA defende que «a aposentação foi negada porque havia uma clara orientação política para que assim fosse». Nesta orientação vê o sindicato «a única explicação para tamanhas injustiças e humilhações». «A orientação política das juntas médicas trata os trabalhadores doentes como um bando de preguiçosos e sugere que adoecem só para terem uma desculpa para não irem trabalhar» (ainda que sejam doenças oncológicas ou hepáticas); os profissionais de Saúde, que atestam a situação dos trabalhadores, são tratados «como um conjunto de incompetentes e, por isso, nem sequer merecem que os seus relatórios e fundamentações sejam tidos em conta».
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O sindicato sublinha que «os indeferimentos compulsivos, para obedecer a critérios políticos, atiram os trabalhadores para a aposentação antecipada, com uma forte redução da pensão», pelo que, auferindo salários muitos baixos, há funcionários que «têm graves problemas de saúde e ficam com pensões de miséria», o que constitui «uma desumanidade completa».
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Cosmética não basta
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Perante o actual estado de coisas e a reacção do Governo, o sindicato defende que «o que se exige politicamente não é apenas uma operação de cosmética, de alteração de composição das juntas médicas», mas «uma correcção desta orientação política», de forma que «a dignidade da vida humana» passe a ser o critério principal para avaliar os pedidos de aposentação por motivos de saúde.
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Ao executivo do PS e de Sócrates, o STPFSA aponta uma obrigação, «no mínimo»: assegurar, a todos os trabalhadores que tenham sofrido avaliações semelhantes às tornadas públicas, a reapreciação dos seus casos «por juntas médicas sérias» e «sem obedecer a critérios políticos de falsas moralizações ou de reduções de despesa».
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Na semana anterior, já a Federação Nacional dos Professores tinha expressado reservas quanto à eficácia das «duas medidas mais relevantes que o Governo adoptou» (que apenas médicos integrem as juntas médicas e que se faça uma auditoria ao funcionamento das juntas médicas), deixando por resolver a situação de muitos docentes com incapacidade permanente para o serviço, que continuam sem poder aposentar-se, e não apurando responsabilidades nem retirando consequências da auditoria.
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Ao primeiro-ministro, a Fenprof exigiu: a reapreciação dos casos indeferidos pela Junta Médica da CGA, o apuramento de responsabilidades e punição exemplar de quem se arrogou o direito de jogar com a vida de outras pessoas, e o ressarcimento de todos os que foram gravemente penalizados.
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Terror no atendimento
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Os seis exemplos descritos pelo Sindicato da Função Pública vêm dar mais alguma luz ao quadro que começou a ser conhecido da opinião pública (e reconhecido pelo Governo) apenas depois da morte de dois professores.
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São relatados os casos de duas trabalhadoras do Ministério da Economia, um trabalhadores do Ministério da Cultura, um trabalhador e uma trabalhadora do Ministério da Agricultura, e uma trabalhadora do Ministério do Trabalho. Sofrem de doenças do foro oncológico, renal, psiquiátrico. Têm tratamentos regulares de quimioterapia e radioterapia, ou de hemodiálise; apresentam sequelas permanentes; o Serviço Nacional de Saúde atribuiu-lhes, para fins fiscais, graus de incapacidade de 85 por cento, 80 por cento, 75 por cento; em dois casos, a Junta Médica da ADSE e o serviço de Medicina no Trabalho declararam as funcionárias com incapacidade permanente para trabalhar.
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O atendimento na Junta Médica da Caixa Geral de Aposentações, relativamente a estes seis trabalhadores, tem autênticos traços de terror, apesar de durar apenas dois, três ou, quando muito, cinco minutos.
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Em cinco das seis situações, o sindicato afirma que o presidente da Junta Médica não verificou os exames médicos. Entre as expressões citadas, na interpelação dos trabalhadores pelo presidente, figuram: «A senhora não quer é trabalhar», «Gastou o Estado tanto dinheiro a formá-la e agora não quer trabalhar», «O senhor está bem», «O senhor tem é de trabalhar», «Mas a senhora já cá veio e volta cá outra vez».
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O indeferimento, na base da decisão da Junta, foi comunicado pela Direcção da CGA em prazos muito curtos (oito dias, na maior parte dos casos), porque o funcionário ou funcionária em causa não se encontrava absoluta e permanentemente incapaz para o exercício das suas funções.
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Uma socióloga do Ministério do Trabalho, com três doenças oncológicas (intestinos, mama e ovários) e um macroadenoma da hipófise, sujeita a tratamentos de quimioterapia, radioterapia e outros, com sequelas graves (dores, incontinência, redução da visão em 25 por cento), requereu a aposentação por doença incapacitante (o que garantiria a pensão por inteiro, sem penalização por idade ou tempo de serviço). «A senhora está com muito bom aspecto, quer é andar para aí a passear», comentou o presidente da Junta Médica da CGA.
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A funcionário recorreu do primeiro indeferimento, com novo relatório médico, baseando-se no agravamento do adenoma hipofisário. «Ah! A senhora já se livrou dos carcinomas», comentou no segundo atendimento o presidente da Junta Médica.O pedido de aposentação acabou por ser deferido, mas «por motivo de saúde», com redução do valor da pensão por tempo de serviço em falta.
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in Avante 2007.08.02
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