A Internacional

__ dementesim . . Do rio que tudo arrasta se diz que é violento Mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem. . _____ . Quem luta pelo comunismo Deve saber lutar e não lutar, Dizer a verdade e não dizer a verdade, Prestar serviços e recusar serviços, Ter fé e não ter fé, Expor-se ao perigo e evitá-lo, Ser reconhecido e não ser reconhecido. Quem luta pelo comunismo . . Só tem uma verdade: A de lutar pelo comunismo. . . Bertold Brecht

segunda-feira, julho 16, 2007


Os ataques injustificados à obra de um Governo


* Paulo Gaião



Talvez Sócrates pense que sem autoridade, sem força, os portugueses vão uns contra os outros, bloqueiam-se, fragmentam-se.


Já faltou mais para que os socialistas obriguem os funcionários públicos a preencherem uma declaração em que se obrigam a não criticar o governo da Nação. No fascismo, recorde-se, cada funcionário público tinha de assinar um papel em que declarava que "estava integrado na Constituição de 1933, com activo repúdio do comunismo e de todas as ideias subversivas".


Houve alguns intelectuais (poucos) que por uma questão de princípio se recusaram a assinar a declaração. Um deles foi o professor Agostinho da Silva, que pagou alto o preço desta ousadia, sendo proibido de ensinar em Portugal. No tempo de Salazar, o presidente do Conselho pôde muitas ser magnânimo e até passar por democrata e defensor do livre pensamento. Numa das suas célebres entrevistas a António Ferro, que pode ser lida numa antologia de textos recentemente publicada (ed. Verbo, org. Mendo Castro Henriques e Gonçalo Sampaio de Mello), Salazar dizia que nos tempos de juventude até tinha sido vítima da censura, confessando que se tinha magoado, irritado, que tinha chegado a ter pensamentos revolucionários.


No entanto, na mesma entrevista, à cândida pergunta de António Ferro de porque é que não revogava, então, a censura , Salazar responde: "Tentamos reduzir a sua acção ao indispensável.


Não é legítimo, por exemplo, que se deturpem os factos, por ignorância e má-fé, para fundamentar ataques injustificados à obra de um governo." Trazem-se estes factos à lembrança para demonstrar que é fácil encontrar justificações para a censura. Como é fácil, e até o foi para Salazar, fazer prova do seu passado anticensura e dos pensamentos revolucionários que teve.


Quando o actual governo legitima a instauração de um processo disciplinar a Fernando Charrua por desrespeito ao primeiro-ministro ou quando faz uma tempestade num copo de água por causa da afixação no SAP de Vieira do Minho de uma entrevista infeliz de Correia de Campos, também encontra razões para actuar desse modo. Ou porque um alto funcionário não deve ofender o chefe supremo da Administração Pública, o primeiro-ministro José Sócrates. Ou porque um SAP não é um espaço de intervenção política. Mas, salvas as devidas distâncias, o governo não está a fazer mais do que encontrar razões justificativas como Salazar as encontrou.


Até, certamente, as mesmas razões supremas de os actos constituírem ataques injustificados à obra de um governo corajoso, que está a fazer as reformas que ninguém teve os nervos de aço para fazer. O mesmo se diga das justificações que muitos socialistas dão sobre o disparate de serem acusados de terem um projecto global de poder, autoritário ou mesmo totalitário. É óbvio que Sócrates, Correia de Campos, Augusto Santos Silva são democratas acima de qualquer suspeita. O ministro dos Assuntos Parlamentares até ficou incomodado, esta quarta-feira, por Francisco Pinto Balsemão o acusar de estar a castrar a liberdade dos jornalistas com uma "fúria legislativa" de que não há memória. Santos Silva respondeu que é um democrata de antes do 25 de Abril. Muito bem.


A questão não é, porém, essa. Tal como a censura salazarista é uma questão e o facto de Salazar ter sido censurado na juventude e ter tido ímpetos revolucionários por causa disso é outra questão, o facto de Santos ter sido um antifascista e hoje estar a fazer um trabalho de cerceamento da liberdade de imprensa e de opinião, é outra questão. Durante o regime de Salazar, houve gente aos magotes que foi mais papista que o Papa.


Ao ponto de o ditador ter tido, algumas vezes, espaço de manobra para se mostrar complacente, resolver pequenos e grandes problemas que os directores-gerais e a PIDE criavam. Hoje, também são os directores-gerais que estão a ser mais papistas que o Papa. Com a agravante de Sócrates não ter percebido, ou não querer perceber, que devia ter parado a tempo os processos promovidos pelos seus zelosos funcionários, sejam eles uma directora-geral da Educação no caso Charrua, ou o ministro Correia de Campos, no caso do SAP de Vieira do Minho. As dúvidas em relação a Sócrates são muito preocupantes. Há três hipóteses.


Ou Sócrates, sendo um engenheiro, com formação pós-graduada em economia, tem pouca sensibilidade para os direitos, liberdades e garantias. Ou deixou passar os casos em branco, para não fazer estragos no governo, o que mal se compreende, já que a demissão da directora da DREN não ameaçaria, certamente, a estabilidade política. Ou está, de forma bastante sofisticada a jogar com o mais profundo da alma portuguesa, o nosso lado um tanto desequilibrado, que faz com que precisemos tanto de períodos de libertação, como foram os tempos da I República e do PREC, como de nos sentirmos presos, de gostarmos que mandem em nós e que nos proíbam, pondo na ordem, precisamente esse lado destravado, como aconteceu durante o Estado Novo, depois do 25 de Novembro de 1975 e, mais recentemente, como aconteceu, com esse travozinho autoritário que existiu nos governos de Cavaco e existe hoje no de Sócrates.


Voltando a Salazar e à censura. Esta semana, Jaime Nogueira Pinto lançou "Salazar, o Outro Retrato" (ed. Esfera dos Livros").


No livro há um relato inédito de uma conversa entre Nogueira Pinto e o ex-ministro Santos Costa, em que este, tentando desfazer a sua imagem de ultra do regime, contou ao autor uma conversa tida com Salazar.


Santos Costa perguntava a Salazar porque não acabava com a censura. Salazar respondeu-lhe: "Não se pode pensar nisso. Ia ser um pandemónio, como foi no fim da Monarquia e na Primeira República. Isto é uma gente complicada, um povo difícil. Parte celtas, parte godos, parte bárbaros, parte mouros. Só a força da autoridade, os consegue juntar. Sem autoridade, sem força, vão uns contra os outros, bloqueiam-se, fragmentam-se. Só com uma mão forte, com força, se pode mantê-los unidos e defender o conjunto. E dê o Senhor graças a Deus, enquanto os que tivermos a força, o poder, formos nós, que somos pessoas cristãs e de bem, moderadas, que não abusamos dessa força e desse poder. Se forem outros a tê-los vai ser muito pior, muito pior.


"Ora, a questão a avaliar é se Sócrates em vez de saber de mais de engenharia e economia e menos de liberdades, sabe de mais dos celtas, dos godos, dos bárbaros e dos mouros. E sabe, sobretudo, que isto é uma gente complicada mas que gosta que lhes mostrem quem manda neles. Como dizia Jorge Perestrelo, Ripa na Rapaqueca, é isso que o meu povo gosta. De futebol e do chicote. E Sócrates sabe muito bem.



SEMANÁRIO - 2007.07.o5
Foto - Rigoberto Rodríguez

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