Terra em risco
Chuva e calor matam 36 na Europa
A dez dias do Live Earth, que junta músicos em Lisboa e noutras cidades do Mundo preocupados com as questões ambientais, o CM inicia uma série de trabalhos sobre problemas que já não preocupam só os cientistas. Neste caso, as alterações no clima que levam a que o Verão faça vítimas na Europa.
Pelo menos quatro pessoas morreram, e milhares ficaram isoladas ou desalojadas, devido às chuvas torrenciais ocorridas na segunda-feira em Sheffield (norte de Inglaterra) e outras zonas deste país e de Gales segundo revelaram as autoridades locais. Por outro lado, o calor excessivo esteve na origem de 30 mortes na Roménia, a maioria das quais em Bucareste, capital do país, onde se registaram mais de 40º à sombra e um máximo de 54,5º à torreira do sol. As altas temperaturas estiveram ainda na origem de dois óbitos na Grécia, em cuja capital, Atenas, o mercúrio subiu aos 39º.
MILHARES AFECTADOS
Só em Sheffield, uma das cidades inglesas mais atingidas pelas chuvas torrenciais, registaram-se dois mortos, um descoberto pela polícia e o outro pelos bombeiros de uma localidade próxima.
A polícia localizou o corpo de um jovem, ainda não identificado, cuja causa de morte aponta para o afogamento.
Já os bombeiros de Hull, nos arredores, tentaram, sem sucesso e ao longo de várias horas, resgatar um outro homem, de 28 anos, que caiu numa boca de esgoto inundada.
Além dos quatro mortos, ficaram milhares de ingleses bloqueados nas suas viaturas ou refugiados em cima dos telhados para fugir às inundações, sem poderem contar com energia eléctrica. Para o resgate foram mobilizados helicópteros da polícia e do exército britânicos, na tentativa de ajudar o maior número possível de pessoas.
Consideradas as piores dos últimos anos no Norte de Inglaterra, estas inundações criaram uma situação caótica, que pode ainda agravar-se - apesar de os sites meteorológicos da BBC, Sky News e CNN preverem uma acalmia no tempo. Houve localidades inglesas em que os valores de precipitação igualaram em horas o volume normal de um mês. Em consequência da subida das águas, foram improvisados abrigos para acolher os desalojados, incluindo famílias com bebés e crianças menores.
Se em Inglaterra e Gales foi o valor da precipitação que atingiu valores anormais, já na Roménia e Grécia o calor é que fez estragos durante o fim--de-semana. Das 30 vítimas mortais romenas, quatro deveram-se a ataques cardíacos em homens, entre os 40 e os 61 anos de idade, que faleceram em lugares públicos.
Outro exemplo de clima extremo é a anormal onda de frio que actualmente assola o Peru (na América do Sul), onde pelo menos 48 crianças já morreram de pneumonia por causa do frio excessivo.
"VAMOS TER APENAS DUAS ESTAÇÕES POR ANO",
Anthímio de Azevedo, Cientista, especialista em meteorologia
- Como é que se explica que chova no Verão e por vezes tenhamos temperaturas baixas ?
- Penso que não estamos a dar conta da alteração astronómica em curso e que vai provocar a mudança das estações. Não lhe sei dizer se é para o ano ou daqui a dez, mas a realidade é que progressivamente vamos passar a ter apenas duas estações por ano.
Viveremos entre a Primavera e o Outono?
- A tendência é mais ou menos essa. Se repararmos, as andorinhas, que têm um relógio biológico rigoroso, começaram a aparecer mais cedo do que o habitual. Este fenómeno está a conduzir à precessão do equinócio, que começou mais cedo
.- Acredita que voltaremos a ter estações rigorosas?
- Não será nos nossos tempos de vida porque esta modificação da precessão dos equinócios realiza-se de 18 mil a 24 mil anos. Creio que isto já está em marcha e um dos indicadores são as andorinhas que chegam mais cedo.
- O que é que podemos esperar para este Verão?
- Apesar de termos um Verão instável e de podermos ter pequenos aguaceiros, este irá ser um Verão quente.
"EM MINHA CASA ATÉ CHEGO A LAVAR O LIXO"
Zé Pedro, guitarrista dos Xutos e Pontapés, banda que toca no Evento Live Earth no dia 7 de Julho, em Lisboa
- Correio da Manhã - Em que altura da sua vida sente que despertou para as questões ambientais?
- Zé Pedro - Há muito tempo que me preocupo com estes problemas do ambiente, mas recordo-me que, por exemplo, o aparecimento do Greenpeace me alertou muito para a questão do nuclear, assim como a guerra do Iraque o fez para as questões relacionadas com o petróleo. Mais recentemente, o Al Gore veio trazer estes problemas para a ordem do dia, atacando empresas e indústrias, e penso que nos dias de hoje não há ninguém que não esteja sensibilizado para o ambiente e para todas as questões ecológicas. Não se fala muito mas o próprio degelo dos pólos é uma questão muito preocupante.
- De que forma tenta contribuir no dia-a-dia para minimizar os problemas ambientais?
- Em minha casa procuro sempre cumprir à regra a separação do lixo e até chego a lavar as embalagens de plástico e de vidro. Mas é interessante ver que são os comportamentos das gerações mais novas que têm despertado a consciência dos mais velhos. E isso tem acontecido muito comigo por causa dos meus sobrinhos.
- Como músico, que lugar ocupa na sua lista de preocupações a poluição sonora?
- É curioso que o nosso técnico de som tenha uma enorme preocupação com os decibéis e com o som excessivo (risos). Mas o barulho dos carros é muito pior. Os construtores deviam preocupar-se mais.
- Pode a música ajudar a sensibilizar as pessoas para a preservação do planeta? Acredita na iniciativa Live Earth?
- Claro que sim. A música rock tem tido uma intervenção social muito grande em diversas áreas, das guerras às questões humanitárias, passando, claro, pelo ambiente.
- Durante a actuação no Pavilhão Atlântico, os Xutos vão passar alguma mensagem? Têm discurso preparado?
- Ainda não preparámos nada, porque acreditamos que o melhor é o que sai na altura. Nos concertos, eu e o Tim temos sempre a preocupação de falar, pelo que no concerto teremos uma palavra a dirigir ao público.
UM PROBLEMA QUE É DA CULPA DE TODOS
Evocando um tema dos Xutos e Pontapés até parece que o mundo anda mesmo ao contrário. Chove no Verão e faz calor no Inverno. As temperaturas estão a aumentar e o gelo dos pólos a derreter. Em causa está o efeito de estufa. Nas palavras de Zé Pedro, o importante é que todos reconheçamos que temos responsabilidades na matéria e que, de uma vez por todas, juntemos esforços para melhorar as coisas. "Neste momento já nem interessa descobrir culpados em concreto. Os problemas ambientais são políticos e cívicos e dizem respeito a todos", diz o guitarrista que lembra que em matéria de ambiente os pequenos gestos já fazem a diferença. "Já lá vai o tempo em que, por exemplo, atirava beatas para o chão ou despejava o cinzeiro do carro na rua. Há gestos que são tão fáceis de realizar no nosso dia-a-dia..."
O músico acredita nos resultados do Live Earth e remata que é importante a intervenção de pessoas credíveis nesta matéria.
TRÊS MEDIDAS PARA SALVAR O PLANETA,
Gonçalo Ribeiro Telles, Tem 81 anos. É arquitecto paisagista e ambientalista
PRIMEIRA É difícil falar em termos de ambiente para o mundo inteiro, porque temos ecossistemas distintos no globo. No entanto, se houvesse mais Justiça nestes temas e uma maior sensibilização das populações, viveríamos melhor.
SEGUNDA O ambiente é uma construção que se faz constantemente com a ordenação do território. E, em Portugal, é necessário fazermos esse ordenamento, o que corresponde à criação de uma paisagem viável em termos de qualidade de vida.
TERCEIRA É urgente um plano ecológico das cidades. Não podemos viver de construções inertes. Por exemplo, em Lisboa, a Câmara Municipal adia sucessivamente o Plano Verde, o que significa que adia a qualidade de vida dos cidadãos.
in Correio da Manhã, 2007.06.27
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