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* F. J. Gonçalves
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Governa a Birmânia desde 1992 com punho de ferro, mas boa parte dos cerca de 50 milhões de habitantes do país nunca lhe ouviu a voz. O general Than Shwe recorre a assessores para ler os discursos na rádio e evita tanto quanto possível aparecer em público. Nem mesmo agora que uma revolta popular desafia o poder dos militares a sua atitude de isolamento sofreu alterações. Como acontece relativamente a todos os ditadores solitários, ficção e realidade sobrepõem-se no que toca a Shwe, líder da junta militar de um país que, por sua ordem, desde 1993 passou a chamar-se Myanmar.
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Shwe não toma qualquer decisão sem consultar os astros. Quando em 2003, com medo de uma invasão tailandesa patrocinada pela CIA, pondera a mudança do governo para local mais seguro que Rangoon (actual Yangon), pede orientação estelar. Em segredo manda construir infraestruturas em Naypidaw, localidade isolada, rodeada de selva e infestada de serpentes e malária, e a 6 de Novembro de 2005 dá início à transferência para a nova capital. A operação começa exactamente às 6h37 da manhã, hora recomendada pelo seu astrólogo.
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O primeiro emprego de Shwe foi como carteiro. Aos 20 anos deixa a sua cidade natal, Kyaukse, a família pobre e a entrega de correio e entra na carreira militar. Daí ao poder político foi um passo, tornado possível pela sua discreta ascensão na hierarquia e pelo golpe de Estado de 1962. Durante o golpe (na altura era capitão) esteve entre as forças do general Ne Win. Em 1986 foi promovido a general e dois anos volvidos teve papel de relevo na repressão do movimento democrático. Três mil pessoas foram mortas. A conduta fiel abriu- -lhe as portas do gabinete de 21 conselheiros do general Saw Maung, sucessor de Win. Em 1992 Maung resigna alegando razões de saúde e Shwe assume a liderança da junta militar. Começa por tomar iniciativas moderadas: liberta presos políticos e abranda o regime de detenção de Aung San Suu Kyi, líder do movimento pró-democracia e Prémio Nobel da Paz, que desde 1990 estava em prisão domiciliária. No entanto, em 2003 ordena o ataque a uma caravana de viaturas da activista. Oitenta pessoas são assassinadas e Kyi é devolvida ao isolamento.
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Desde 1997 a repressão entra em crescendo. Os jornais da oposição são encerrados, os telefones são escutados, as casas são revistadas sem pré-aviso. Não há tribunais independentes e os militares ocupam a quase totalidade dos cargos no governo. Em teoria há liberdade religiosa, mas os monges budistas são vigiados e os seus ensinamentos censurados.
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Os birmaneses estão cansados do carteiro silencioso, do homem que lidera na sombra um país rico em recursos naturais reduzindo a população à miséria. Se não for a doença a depô-lo, será a força da revolta. Mas esta pode abrir a porta a um novo ditador. O general Maung Aye, ‘N.º2’ da junta e rival de Shwe, está à espreita.
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in Correio da Manhã 2007.09.30 O poder das sombras
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29-09-2007 - 00:00:00 Soldados levam os cadáveres
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O primeiro emprego de Shwe foi como carteiro. Aos 20 anos deixa a sua cidade natal, Kyaukse, a família pobre e a entrega de correio e entra na carreira militar. Daí ao poder político foi um passo, tornado possível pela sua discreta ascensão na hierarquia e pelo golpe de Estado de 1962. Durante o golpe (na altura era capitão) esteve entre as forças do general Ne Win. Em 1986 foi promovido a general e dois anos volvidos teve papel de relevo na repressão do movimento democrático. Três mil pessoas foram mortas. A conduta fiel abriu- -lhe as portas do gabinete de 21 conselheiros do general Saw Maung, sucessor de Win. Em 1992 Maung resigna alegando razões de saúde e Shwe assume a liderança da junta militar. Começa por tomar iniciativas moderadas: liberta presos políticos e abranda o regime de detenção de Aung San Suu Kyi, líder do movimento pró-democracia e Prémio Nobel da Paz, que desde 1990 estava em prisão domiciliária. No entanto, em 2003 ordena o ataque a uma caravana de viaturas da activista. Oitenta pessoas são assassinadas e Kyi é devolvida ao isolamento.
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Desde 1997 a repressão entra em crescendo. Os jornais da oposição são encerrados, os telefones são escutados, as casas são revistadas sem pré-aviso. Não há tribunais independentes e os militares ocupam a quase totalidade dos cargos no governo. Em teoria há liberdade religiosa, mas os monges budistas são vigiados e os seus ensinamentos censurados.
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Os birmaneses estão cansados do carteiro silencioso, do homem que lidera na sombra um país rico em recursos naturais reduzindo a população à miséria. Se não for a doença a depô-lo, será a força da revolta. Mas esta pode abrir a porta a um novo ditador. O general Maung Aye, ‘N.º2’ da junta e rival de Shwe, está à espreita.
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Para saber mais sobre a Birmânia (Myanmar) ver:
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